H.3.1 - Literatura
A metáfora da luz na poesia brasileira – do concreto ao abstrato
Ivone da Silva Rebello¹
Eliana da Cunha Lopes²
1. Professora Doutora – Secretaria Estadual de Educação e Cultura do RJ; *[email protected]
2. Professora Mestra – Faculdade Gama e Souza – FGS/RJ – [email protected]
Palavras-chave: Poesia brasileira, Metáfora, Crítica e interpretação
Introdução
Esta pesquisa tem como objetivo a análise da linguagem
metafórica presente em textos poéticos diversos, tomandose como fio condutor a obra A metáfora viva de Paul
Ricoeur (2005), na qual o autor trata da metáfora em três
níveis: “a figura pode ser indiferentemente referida à
palavra, à frase ou aos traços do discurso...” (2005:89)
Assim, no nível da palavra (semiótico), a metáfora seria
discutida nas suas relações de substituição; no nível da
frase (semântico), “a linguagem sai de si mesma, e a
referência indica a transcendência da linguagem a si
mesma” (2005:120); e no nível do discurso (semântico), o
sentido da metáfora dependeria das relações de sentido
oriundas da criação entre as palavras que formam o
enunciado e que, por sua vez, cria o todo significativo do
discurso. O corpus básico desta pesquisa são poemas de
autores brasileiros de diferentes estilos de época, nos
quais procuramos analisar, descrever e interpretar o
tratamento dado à palavra LUZ no nível da palavra, da
frase e do discurso. A seleção do corpus não foi aleatória,
pois foram escolhidos poemas nos quais a palavra luz, ao
ser lida, já sugeria um novo sentido, conforme o contexto
onde se apresentava. Partindo-se, pois, de um estudo
sobre as imagens metafóricas da luz – certeza,
esclarecimento, guia, intuição da consciência, razão,
recordação dentre outras – as quais norteiam a linguagem
poética e a emotividade de seus respectivos autores,
ressaltamos como as imagens provenientes dessa palavra
se transforma num novo conceito/significado metafórico,
conferindo um novo significado à realidade, a qual reporta
e uma mudança de sentido (Castro, 1978). Destacamos,
ainda, como a mente humana cria metáforas a partir dos
diferentes significados expressos pela palavra luz, os quais
dão um novo papel no interior do discurso poético.
Conforme afirma Derrida (1973:330), “a linguagem é
originariamente metafórica. A metáfora é o traço que
reporta a língua à sua origem [...] A poesia, primeira forma
de literatura, é de essência metafórica.” Utilizamos, em
nossa pesquisa, outros autores que tecem comentários
críticos a respeito da obra de Ricoeur: Filipak (1983),
Sacks (1992), Pontes (1990). Além desses, consideramos
a obra de Ernst Curtius – Literatura Europeia e Idade
Média Latina (2013) – o capítulo sobre Metaforismo (VII:
175-194).
Resultados e Discussão
A metáfora, em geral, é um modo de se utilizar a
linguagem de forma figurada com o intuito de se transferir
significados e ideias abstratas. Conforme afirma Ricoeur
(2005:108), “a definição real de metáfora em termos de
enunciado não pode eliminar a definição nominal em
termos de palavra ou de nome, na medida em que a
palavra continua a ser a portadora do efeito de sentido
metafórico; é da palavra que se diz tomar um sentido
metafórico; eis por que a definição de Aristóteles não é
abolida por uma teoria que não se refere mais ao lugar da
metáfora no discurso, mas ao próprio processo
metafórico.” Os textos poéticos são produzidos com uma
linguagem marcada pelo sistema metafórico –“a poesia,
primeira forma de literatura, é de essência metafórica”
(Derrida, 1973:330) -, o qual estrutura o nosso
pensamento e cujas palavras representam para o poeta
signos e coisas e a ação possível dessas coisas. Na
análise dos poemas, focamos a nossa atenção para os
possíveis significados metafóricos expressos pela palavra
luz em seus respectivos contextos. Em “Se és tão formosa
a luz, por que não dura?”, Gregório de Matos nos remete à
instabilidade da própria luz que ilumina a natureza; em
“Auriverde pendão de minha terra, [...] / Estandarte que a
luz do sol encerra”, Castro Alves traça uma imagem
paradisíaca do Brasil, presenteada pela luz do Sol. Assim,
a palavra luz, dentro dos diversos enunciados poéticos,
adquire uma nova significação linguística propiciada pelo
sentido metafórico. E, conforme afirma Ricoeur
(2005:339), “a estratégia de linguagem própria à poesia,
isto é, à produção do poema, parece justamente consistir
na constituição de um sentido que intercepta a referência
e, no limite, anula a realidade.”
Conclusões
Concluímos, portanto, que as expressões metafóricas
numa obra literária refletem a intenção do autor em
expressar o seu sentimentalismo, o seu modo de ver e
avaliar os acontecimentos e fatos de sua sociedade e,
ainda, estabelecer juízos de valos acerca do mundo. A
metáfora da luz, nos poemas analisados, tem se
identificado com a claridade poética, a êxtase, a entidades
ontológicas (corpo e espírito, Deus, criatura e Criador) etc.,
atingindo uma nova dimensão que passa a firmar-se como
uma nova realidade. Em nosso estudo críticointerpretativo, analisamos diferentes poemas, nos quais a
palavra luz ganha novos significados, pois a metáfora no
discurso poético faz-se portadora de um novo efeito de
sentido, ou seja, cria uma expressão renovada, liberta-se
do sentido monovalente do uso linguístico e confere um
novo sentido à palavra – luz -, cria novas realidades.
Segundo Barthes (1971:60), a “palavra poética nunca pode
ser falsa porque é total; ela brilha com uma liberdade
infinita e prepara-se para resplandecer no rumo de mil
relações incertas e possíveis.” Em “Pálida à luz da
lâmpada sombria [...]/ Entre as nuvens do amor ela
dormia”, Álvares de Azevedo retrata a mulher amada
através de um mundo irreal, comparando-a à luz sombria
da lâmpada; em “A manhã, toldo de um tecido tão
aéreo/que, tecido, se eleva por si: luz balão”, João Cabral
fecha o poema comparando o nascer da manhã à luz de
um balão que sobe. Enfim, as expressões metafóricas da
luz e sua descrição refletem a intenção dos poetas
analisados em expressar sua emoção, seu modo de ver o
mundo, de avaliar os fatos, de questionar a realidade e de
expor todo o sentimentalismo e subjetivismo poéticos.
67ª Reunião Anual da SBPC
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