Terceiro ensaio: Emprego e Desenvolvimento Econômico Local Maggie Scott; 1o de abril, 2003 I. O SETOR INFORMAL O setor informal abriga uma grande parcela dos empregos tanto em países menos desenvolvidos como em países industrializados, representando 30%- 70% da mão de obra urbana na América Latina (Maloney, 2003). Portanto, é natural que os responsáveis pelo planejamento e pelas políticas públicas procurem direcionar sua atenção para fortalecer esta grande fonte de empregos urbanos. Entretanto, antes que eles se precipitem a intervir é importante examinar as duas definições de economia informal que foram discutidas nas leituras desta seção. Uma definição de economia informal diz que ela é “uma resposta construída pela sociedade civil para uma interferência indesejada do estado” (Portes, 1995). Levenson e Maloney definem a formalidade como uma “participação nas numerosas instituições da sociedade civil” sugerindo inversamente que o setor informal esquiva-se destas instituições. Ambos sugerem que a intervenção – não importando quão bem intencionada ela seja – pode não ser desejada pelas empresas se as suas intenções forem permanecer fora do radar das instituições do governo. As razões estão enraizadas no fato do setor informal ser uma expressão das tensões entre o controle do estado e a sociedade civil. Portes destaca três paradoxos desta tensão: um deles é que quanto mais o estado tentar intervir na economia informal, mais ela irá se refugiar nos subterrâneos para evitar esta intervenção (1995). Empresas que procuram evitar o pagamento dos custos de 1 seguridade social, pensões e outros programas sociais podem não querer procurar o apoio do governo de nenhuma forma. Estas preocupações ensejam questões sérias sobre a sensatez de se desenvolver intervenções explicitamente direcionadas ao setor informal. A preferência deve ser dada a políticas de base ampla que beneficiam a todos os setores da sociedade e não apenas os pobres de maneira desproporcional – programas como educação básica e clínicas médicas. A leitura também soa o alarme na questão de se fornecer crédito indiscriminadamente às microempresas e pequenos negócios como uma forma de fortalecê-los, sejam eles formais ou informais. Em economias ou setores econômicos estagnados a provisão de crédito pode resultar em um desnivelamento do campo de jogo e em uma simples redistribuição da mesma renda ao invés de gerar algum crescimento econômico (Haggblade, Hazell e Reardon, 2002). Também porque as pequenas empresas têm uma taxa de fracasso extremamente alta, a provisão de microcrédito para empresas nascentes pode representar uma péssima relação de custo-eficácia para o governo (Mead e Liedholm, 1998). Governos sem muitos recursos financeiros não podem se dar ao luxo de confundir redistribuição com crescimento. 2 II. SETOR FORMAL INVESTIR NO CAPITAL HUMANO O capital humano é “o único recurso que famílias pobres possuem em abundância” (Haggbalde, Hazell e Reardon, 2002). Retornando às lições de outras seções deste curso, Haggblade enfatiza a importância de políticas sociais de base ampla, como a educação primária para capacitar os setores mais pobres da sociedade. A educação de adultos e o treinamento de trabalhadores são programas adicionais que podem ter um impacto duradouro sobre o desenvolvimento econômico local. Programas descentralizados, focando a educação ou o treinamento de trabalhadores, em grande harmonia com as condições locais, como nos aglomerados industriais europeus, podem ter um papel importante ao auxiliar as empresas a se adaptarem à inconstância do mercado. (Schmitz e Musyck, 1994). FAZENDO A LIÇÃO DE CASA As intervenções mais propícias a trazer um aumento no número de empregos a longo prazo são aquelas que fazem sua lição de casa antes de intervirem. São intervenções que reconhecem a história específica, a cultura e as políticas locais e nacionais, identificaram motores locais de crescimento e focalizam em uma assistência baseada no mercado. 1. Consideração das Condições Locais As leituras asseguram unanimemente a importância de programas customizados para as condições específicas locais – incluindo organizações e 3 instituições existentes, normas culturais, estrutura política, distribuição de recursos. Intervenções com diretrizes políticas modificam o equilíbrio pré-existente destas condições, afetando não apenas o objetivo pretendido (a distribuição de renda, por exemplo) mas também outros elementos em equilibro no cenário da política local. (Gotsch, 1972). O estudo de Gotsch sobre a perfuração de poços no Paquistão e em Bangladesh ilustra como diferentes condições locais préexistentes, como o grau de partidarismo político, distribuição de recursos e organização social levaram a um sucesso maior, em termos de equidade de rendas, em Bangladesh do que no Paquistão, onde a nova tecnologia na prática exacerbou as desigualdades de renda. (1972) 2. Um olhar sobre o ambiente das políticas nacionais Apesar da questão acima da necessidade de harmonia entre os responsáveis pelas políticas e pelo planejamento e as condições locais, o entendimento das condições reguladoras políticas e econômicas nacionais também é vital para se delinear um programa eficaz. Um sistema jurídico forte e um sistema regulador justo são sinais para as firmas de que é seguro investir, de que os contratos serão respeitados e de que o campo de jogo será mais ou menos nivelado. (Levy, Berry e Nugent, 1999; Haggblade, Hazell e Reardon, 2002). Entretanto, não é incomum desenterrar políticas econômicas nacionais que são tendenciosas contra empresas de pequena escala. Em suas análises de micro e pequenos negócios na Europa, Schmitz e Musyck acharam que reformar estas políticas é essencial mas difícil, uma vez que elas não são “a conseqüência de 4 tecnocratas mal orientados, mas de interesses adquiridos.” (Schmitz e Musyck, 1994) 3. Identificar os motores de crescimento. Não é nada revolucionário afirmar que os governos têm recursos escassos que devem ser convergidos de forma estratégica. Uma conseqüência prática disto é que os governos devem focar em um subsetor da economia para uma intervenção objetiva de forma a maximizar o impacto (Mead e Liedholm, 1998). Um método com boa relação de custo-eficácia para servir os setores que crescem é o governo enfatizar políticas de intervenção que beneficiem muitas empresas similares simultaneamente enquanto vigia a eqüidade geral da economia e garante que os pobres não saiam perdendo. Usar explicitamente critérios de redistribuição na seleção dos subsetores, ao mesmo tempo continuando a focalizar naqueles que demonstram o maior potencial de crescimento, pode resultar em um ganho de eqüidade para os pobres. (Haggblade, Hazell e Reardon, 2002). Focalizar nas pequenas empresas existentes que estão estabilizadas para se expandir, ao invés de ajudar na criação de novas empresas, pode ser um método de intervenção com uma relação melhor de custo-eficácia por causa da grande taxa de fracassos em novas empresas e de pesquisas indicando que os empresários de pequenos negócios tendem a abrir suas firmas com capital pessoal, de amigos ou da família. A pesquisa de Mead e Liedholm com micro e pequenas empresas reafirma este ponto indicando que, por causa do grande número de insucessos nos primeiros anos de operação de micro e pequenas 5 empresas iniciantes, a intervenção do governo naquele estágio é ineficiente (1998). Muito já foi escrito na literatura sobre o tão anunciado agrupamento de pequenas empresas que as permite alcançar economias de escala enquanto ainda servem objetivos de eqüidade. Infelizmente, a pesquisa tem mostrado que o governo pode apenas desempenhar um papel secundário na ajuda a este aglomeramento. Em sua pesquisa de conjuntos de micro e pequenas empresas na Europa, Schmitz e Musyck mostraram que a política pública não foi bem sucedida na tentativa de criar grupamentos novos destas firmas (1994). Entretanto, uma vez que estes grupos alcancem uma massa crítica sozinhos, o setor público pode fornecer uma assistência útil através de intervenções como a criação de parques tecnológicos e incubadoras. (Levy, Berry e Nugent, 1999). ASSISTÊNCIA BASEADA NO MERCADO Diversos autores também reforçam a importância de se focalizar na assistência baseada no mercado (Mead e Liedholm, 1998; Haggblade, Hazell e Reardon, 2002). Levy, Berry e Nugent salientam que uma abordagem de apoio às micro e pequenas empresas sem interferências diretas pode não ser suficiente e que o papel dos governos não é meramente intervir no caso de falhas no mercado mas também trabalhar para "aumentar, cultivar e melhorar" os mercados (1999). Uma vez que um subsetor apropriado é determinado, os governos podem intervir ligando os compradores aos vendedores; analisando cadeias de suprimento e removendo estrangulamentos; e fornecendo acesso às feiras de comércio domésticas e internacionais (Levy, Berry e Nugent, 1999). A instituição de padrões 6 de segurança ou de qualidade para fazer os produtos mais atrativos no mercado doméstico, e mais particularmente no estrangeiro, também pode lubrificar as engrenagens para exportações. Os exemplos incluem derivados de leite no Chile, vegetais processados no sudeste do Brasil e a truta no Peru (Mead e Liedholm, 1998). DESCENTRALIZE OPERAÇÕES PARA INSTITUIÇÕES EXISTENTES Diversos autores também expressam uma forte preferência para a instituição descentralizada – das associações da indústria às câmaras de comércio – para implementar políticas (Schmitz e Musyck, 1994; Levy, Berry e Nugent, 1999). Diversos autores enfatizam que criar instituições novas para executar objetivos da política em nível local pode freqüentemente causar mais problemas do que resolvê-los (Levy, Berry e Nugent, 1999). Isto contradiz as lições anteriores que ressaltam que as novas instituições podem forçar as existentes a operar mais eficazmente ou a assumir as responsabilidades das quais elas previamente se esquivavam (Tendler, 1989) e indica uma perspectiva que procura complementar e se baseia nas instituições existentes, em vez das tensões criativas, para aumentar a produtividade entre elas. Uma forma de descentralização são as organizações de auto-ajuda de sócios que apóiam as necessidades da empresa de pequeno porte e ajudam as firmas, que são muito arriscadas para os empréstimos convencionais, a encontrar acesso ao crédito (Levy, Berry e Nugent, 1999). Estes programas podem fazer com que os empréstimos às firmas com maior grau de risco sejam mais atrativos aos bancos convencionais, como no exemplo dos Consórcios de Garantia de 7 Empréstimo (Loan Guarantee Consortia) de Modena, uma organização de empresas associadas que fornece garantias mútuas de empréstimo, ou o Bürgchaftsbank Baden-Wüttemberg, um banco criado pelas câmaras de comércio locais (Schmitz e Musyck, 1994). 8