RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO 734.067 RIO GRANDE DO SUL RELATORA :MIN. CÁRMEN LÚCIA RECTE.(S) :JAYME COPSTEIN ADV.(A/S) :FLOR EDISON DA SILVA FILHO E OUTRO(A/S) RECTE.(S) :EMPRESA JORNALÍSTICA PAMPA LTDA ADV.(A/S) :RICARDO HANNA BERTELLI E OUTRO(A/S) RECDO.(A/S) :FERNANDO FLORES CABRAL JUNIOR ADV.(A/S) :FERNANDO ANTÔNIO ZANELLA DECISÃO AGRAVO EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO. EMPRESA JORNALÍSTICA PAMPA LTDA. PROCESSUAL CIVIL. FUNDAMENTOS DA DECISÃO AGRAVADA NÃO IMPUGNADOS. SÚMULA N. 287 DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. AGRAVO AO QUAL SE NEGA SEGUIMENTO. JORNALISTA JAYME COPSTEIN. CONSTITUCIONAL. LIBERDADE DE EXPRESSÃO: DIREITO DE CRÍTICA. PRECEDENTES. AGRAVO E RECURSO EXTRAORDINÁRIO PROVIDOS. Relatório 1. Agravos nos autos principais contra decisão que inadmitiu recursos extraordinários interpostos com base no art. 102, inc. III, alínea a, da Constituição da República. O caso 2. Em 14.5.2008, Fernando Flores Cabral Júnior, juiz de direito, ajuizou ação de indenização por danos morais contra a Empresa Jornalística Pampa Ltda. e o jornalista Jayme Copstein. Relatou que, em 5.3.2008, na página três do Caderno Colunistas do jornal “O Sul”, teria sido publicado artigo assinado pelo jornalista Jayme Copstein que teria ofendido gravemente a honra do magistrado titular da Vara de Execuções Criminais do Fórum de Porto Alegre/RS (fls. 3-10, doc. 0). O artigo jornalístico teria o seguinte teor: “Balengo, o ingrato. Data vênia, e com todo o respeito, o Judiciário deve providenciar com urgência assinaturas de jornais e acesso a internet a todos os seus juízes. Para que não se repita o caso do titular da Vara de Execuções Criminais de Porto Alegre, que não sabia o que todos os jornais noticiaram em manchete à época em que Carlos Antônio da Silva, o Belengo, foi preso com 40 comparsas, quando a quadrilha cavava um túnel para furtar dinheiro do Banrisul e da Caixa Econômica. Balengo já tem condenações de sobra fora do Rio Grande do Sul, mas o seu alentado currículo não era sabido do juiz que lhe concedeu o regime semiaberto, após cumprir a sexta parte da pena de sete anos por tentativa de furto. Sendo esse o crime menor que lhe era imputado, não caberia remetê-lo de volta à Justiça de São Paulo, que também o procurava, cobrando-lhe dívidas bem maiores? Leite derramado, o 'reeducando' só esperou 12 horas pela 'carroça', para sumir em 'lugar incerto e não sabido'. Mesmo assim, os calhordas do bom mocismo, que atrelam à Nação ao Código dos Rábulas de Porta de Cadeira, vão chorar pela ingratidão de Balengo. Ó, como ele pôde fazer isso?” (fl. 4, doc. 0). Em 13.10.2009, o juízo da 4ª Vara Cível de Porto Alegre/RS julgou procedente a ação “para condenar os réus, na forma solidária, a indenizarem ao autor, a título de dano moral, pela soma de R$ 15.000,00 devidamente corrigida pela variação do IGP-M, a contar desta data, mais juros de mora de 1% ao mês, a contar da dada do comentário ofensivo, em 05.03.2009, na forma da súmula 54 do Superior Tribunal de Justiça” (fls. 75-76, doc. 4). Contra essa decisão Fernando Flores Cabral Júnior, a Empresa Jornalística Pampa Ltda. e Jayme Copstein interpuseram apelação. Apenas o recurso do ora Agravado foi provido para majorar a condenação em dano moral a ele devida: “Apelação cível. Responsabilidade civil. Indenização. Dano moral. Publicação de artigo ofensivo ao atuar do magistrado e dirigido a sua pessoa, causando danos à imagem e constrangimentos inabaláveis, além de ordem psicológica. À unanimidade, afastadas as preliminares, deram provimento” (fl. 58, doc. 7). Confira-se excerto do voto do Relator, Desembargador Luís Augusto Coelho Braga: “Conforme se depreende dos autos, após publicação de artigo escrito pelo corréu Jayme Copstein, na edição do jornal “O Sul”, publicado em 5.3.2008, sob o título “A voz do bom senso”, especificamente no subtítulo ‘Balengo, o ingrato”, menção à decisão judicial elaborada pelo autor, então juiz da Vara de Execuções Criminais desta Capital, que em 29.01.2008 determinou a progressão de regime para o semiaberto do apenado Carlos Antonio da Silva, vulgo “Balengo”, originou-se a presente ação, visando dano moral, sob a alegação do autor que foram publicadas inverdades ao afirmar, o jornalista Jayme, que (a) “o autor desconhecia o conteúdo do processo que julgara” e que (b) “o autor decidiu contra o que constava no processo do citado apenado”. Além disso, depois de chamar o autor de “calhorda”, na expressão “calhorda do bom mocismo”, lançou sobre ele a seguinte frase que se retira acusação de corrupção: “Ó, como ele pôde fazer isso?”. Lendo-se o contexto do artigo, torna-se evidente o objetivo de atacar a decisão judicial proferida na execução penal, bem como de ofender o autor como magistrado e não como agente político, como pretendeu o corréu Jayme fazer crer. Em primeiro lugar, atribuiu aos juízes a falta de leitura aos jornais do País e ao acesso a internet para que não repetissem o “erro” praticado pelo autor, ao deliberar sobre a progressão de regime sem ter feito tais consultas. Na verdade, sua intenção era de atacar e atribuir ao autor, e somente a ele, o seu despreparo no mister das leituras que ele, jornalista, entende ser imprescindíveis para a atuação judicial. Já no primeiro parágrafo de seu artigo atribuiu ao autor o agir relapso em não saber que “Balengo” era um dos 40 comparsas que cavavam um túnel para furtar dinheiro do Banrisul e da Caixa Econômica Federal, além de não ter conhecimento – isso já no segundo parágrafo - que “Balengo” já tinha condenações de sobra fora do Rio Grande do Sul, “mas o seu alentado currículo não era sabido do juiz...”. Assim, no entender do jornalista, ao invés de o autor, na condição de juiz, ao invés de remeter “Balengo” para o Estado de São Paulo, teria lhe concedido a progressão, aos o cumprimento de somente um sexto da pena de 7 anos a que fora condenado por tentativa de furto. Ocorre que o jornalista réu deveria ter se informado antes qual era a situação verídica do apenado “Balengo”, exercendo o seu dever de investigação dos fatos, dirigindo-se até a SUSEPE ou à Vara das Execuções Penais, para então elaborar seu artigo. Sob o manto do dever de investigar e informar, inteirando-se dos fatos, poderia então enviar seu comentário ao jornal para publicação. Assim tivesse agido, teria verificado que havia um parecer do Ministério Público Estadual de primeiro grau, que atua junto à Vara de Execuções Penais dando conta, com vista em laudos elaborados para a obtenção da progressão, que nada havia registrado quanto à eventual prisão temporária ou preventiva emitida por qualquer autoridade do Poder Judiciário Nacional. O depoimento prestado em juízo pelo agente da Susepe Roberto Domingos Marcolino é bem elucidativo sobre como se processa o desenrolar do deferimento de progressão de regime, assim como o depoimento do desembargador aposentado Marco Antônio Bandeira Scapini, que elucidam o cuidado que tem o Órgão Estatal no cumprimento de decisão, pois pesquisam junto aos órgãos competentes e disponíveis e, em havendo qualquer impedimento, comunicam ao juízo da execução penal da existência de qualquer obstáculo que impeçam o efetivo cumprimento da medida judicial. No caso em exame, posto nas peças elaboradas pelas partes, em momento algum constou que houvesse qualquer impedimento na decisão tomada pelo magistrado/autor. O fato de constar na internet ou em jornais de grande circulação no País, no sentido de que determinado bandido teria enfrentado a polícia em confronto de combate à violência, ou participado de eventual assalto, caso não esteja documentado nos autos de pedido de progressão de regime, não impede a sua concessão. Ainda que o jornalista seja leigo, deveria precaver-se e consultar os assessores jurídicos da empresa antes de divulgar matéria não verdadeira e com cunho de obter somente o sensacionalismo. O esclarecimento prestado pela Corregedoria-Geral da Justiça deste Estado, publicado na edição de 6.3.2008, serviu para demonstrar aos réus o abuso de direito que cometeram com as informações errôneas, que causaram o constrangimento moral no autor, pois não havia sequer um impedimento de concessão do benefício. E tal informação poderia ter partido daquele Órgão, que agiu em defesa do Poder Judiciário. Em defesa do autor, a presente ação interposta é que levará os réus a ressarcirem o dano moral que lhe causaram, independentemente de direito de resposta que pudesse ter exercido, pois não é condição de ação aquele proceder. O jornalista réu sustentou que em momento algum se dirigiu à pessoa do juiz, mas que apenas teceu críticas ao Sistema Judiciário, face à falta de informações entre os Estados da Federação, pois “Balengo” era procurado em outros Estados, como São Paulo, por ser quadrilheiro, tendo faltado então prudência ao ter o regime de pena trocado, sem qualquer consulta a outros Órgãos. Ora, como foi dito acima, e longamente explicitado, faltou ao jornalista réu a procura pela verdade real. Ainda que tenha dado conotação diversa da que se depreende da leitura do artigo, na parte em que refere “Mesmo assim, os calhordas do bom mocismo, que atrelam à Nação ao Código dos Rábulas de Porta de Cadeia, vão chorar pela ingratidão de Balengo”, creio que entrelinhas pretendia sim chamar o autor de calhorda. Dizer que faz parte de uma corrente que combate a permanência na prisão dos malfeitores, ao contrário de decisões judiciais que assim não pensam, não afasta, no meu ver, sua intenção de agredir verbalmente o autor, pois completa o seu pensamento com a frase “Ó, como ele pôde fazer isso”? Dentro do contexto, como já referi acima, não resta dúvidas que a pretensão era de realmente referir-se à decisão judicial proferida pelo autor, causando-lhe constrangimentos e dor psicológica pelo agir do jornalista réu. A frase como posta, tanto pode ser dirigida ao “Balengo”, como afirma o jornalista réu, como pode ser estendida ao magistrado/autor. Então, ainda que a intenção de ataque ao autor fosse mínima e recheada com “dúvidas”, aplica-se à intenção do réu em desacreditar o autor, até porque posteriormente, meses depois do ingresso da presente ação, o “Balengo” veio a falecer em confronto com a polícia, pois teria fugido do regime semiaberto algumas horas após lá chegar. O jornal “O Sul” limitou-se a dizer que havia carência de ação e ilegitimidade passiva sua, pois seus jornalistas são independentes ao escrever, tanto que consta na base da coluna que são de exclusiva responsabilidade deles, tudo que constar no Caderno apropriado para divulgação de seus artigos. Enfim, não se aplica ao caso em concreto, o disposto no art. 1º, da Lei 5.250/67, devendo os réus responder pelos abusos que cometeram. Mais, o art. 27, II, da referida lei, também não se enquadra, visto que não agiu o jornalista e o jornal dentro dos parâmetros para evitar a incidência de abuso no exercício da liberdade de manifestação de pensamento e de informação, pois a crítica e a informação não foi inspirada no interesse público, mas sim com o intuito direto de atingir o autor. Da mesma forma o disposto no art. 220 e 221 da CF não dão respaldo ao agir dos réus, pois o direito de informação e opinião extrapolou os limites impostos em lei. Ainda não encontra amparo no art. 5º, inc. XXXIII, da CF/88, o agir dos réus, pois a publicidade que deram ao caso em exame não correspondeu a verdade que estava estampada nos autos, onde o jornalista Jayme baseou suas informações. Para fins de prequestionamento, considero prequestionados os artigos citados em contestação e nas peças produzidas pelos réus. Ante o exposto, dou provimento ao recurso do autor, para o fim de majorar a condenação em dano moral pelo magistrado “a quo”, tendo em vista a situação socioeconômico do autor e o porte econômico dos réus, principalmente do Jornal “O Sul”, ainda ter sido a imagem do autor denegrida perante a opinião pública e seus pares, tendo sido necessária a intervenção da Corregedoria-Geral da Justiça para esclarecer os fatos, ainda que de forma espontânea daquele Órgão, aumento a indenização para R$ 100.000,00 (cem mil reais), que será corrigida quando do efetivo pagamento nos mesmos moldes fixados na sentença, que mantenho quanto ao mais” (fls. 58-63, doc. 7, grifos nossos). Os embargos de declaração opostos foram acolhidos para esclarecer que “a condenação realmente ficou na razão de R$ 50.000,00 e não como constou no acórdão, mantendo-se a correção monetária do valor conforme fixado na sentença parcialmente reformada” (fl. 83, doc. 7). Contra essa decisão os ora Agravantes interpuseram recursos extraordinários, nos quais afirmaram que o Tribunal de origem teria contrariado os arts. 5º, incs. IV, V, IX e XIV, 220 e 221 da Constituição da República. Sustentam, em síntese, que o artigo do colunista teria apenas repercutido outras manifestações da impressa a respeito do assunto e a revolta da população contra a criminalidade no País, sem críticas pessoais ao juiz que teria deferido o pedido de progressão de regime ao apenado. Ressaltam que teriam agido no limite do direito de liberdade de impressa e de manifestação, previsto na Constituição da República. Requerem a improcedência da ação proposta. O recurso extraordinário interposto pela Empresa Jornalística Pampa Ltda. foi inadmitido sob o fundamento de incidência da Súmula n. 282 do Supremo Tribunal Federal; e o interposto por Jayme Copstein, por ausência de ofensa constitucional direta (fls. 47-55, doc. 9, e fls. 35-37, doc. 10). 3. No agravo, a Empresa Jornalística Pampa Ltda. alega que “o direito não socorre ao Autor-Recorrido porque, ao contrário do que expressa o r. acórdão, a notícia publicada no jornal da Empresa-Recorrente encontra-se balizada nas garantias constitucionais previstas nos artigos 220 e 221 da Carta Magna, que tratam da liberdade de imprensa, sob o título da comunicação social, razão pela qual não há como prosperar a decisão de procedência da ação” (fl. 12, doc. 10). 4. Jayme Copstein afirma que, “ao contrário do argumento no r. despacho agravo, as razões do presente recurso extraordinário indicam lesão frontal e direta aos artigos 5º, incisos IV, IX, e XIV, e 220 e seu parágrafo 1º, todos da Constituição Federal” (fl. 46, doc. 10). Assevera que “no recurso extraordinário foi expressamente afirmado que o v. acórdão, ao considerar ofensivas críticas de natureza institucional e ao impor ao recorrente elevada, porém, indevida indenização, está exatamente a cercear o direito à liberdade de imprensa, garantido pelos dispositivos constitucionais acima arrolados, os quais, por via de consequência, restaram vulnerados pelo aresto recorrido” (fl. 47, doc. 10). 5. Em 26.5.2013, determinei vista deste agravo ao Procurador-Geral da República, que, em 8.11.2013, manifestou-se pelo não conhecimento do agravo da Empresa Jornalística Pampa Ltda. e pelo parcial provimento do agravo e do recurso extraordinário de Jayme Copstein: “Recurso extraordinário com agravo. Responsabilidade civil. Indenização por dano moral. Publicação de artigo ofensivo à decisão do magistrado titular da VEC de Porto Alegre. Não deve ser conhecido o agravo da Empresa pessoa jurídica, pois não impugnou os fundamentos do despacho agravado: limitou-se a repetir as razões do recurso extraordinário: incidência das Súmulas 283 STF e 182 do STJ. Os diversos incisos do art. 5º da Constituição, apontados como violados pelo agravante pessoa natural, não foram prequestionados: nem os embargos de declaração levantaram os pontos para discussão – aplicação das Súmulas 282 e 356 do STF, a barrar o conhecimento do recurso no ponto. Demonstrada a violação ao art. 220 da Constituição: a matéria jornalística objeto do presente recurso extraordinário, além de não mencionar o nome do magistrado, consubstancia crítica a decisão judicial que, segundo o recorrente, refletiria a falibilidade do próprio sistema judiciário e prisional. Não há interesse em ofender ou difamar o magistrado; a intenção é a de relatar fatos verdadeiros e, inspirado no interesse coletivo, fazer crítica em tom contundente ao que o jornalista entende constituir grave falha da legislação de execução penal. Existência de duas espécies de crítica divulgadas na mesma nota jornalística – objeção até irônica contra a falta de comunicação entre os órgãos judiciários encarregados da execução penal e menoscabo aos defensores de legislação penal demasiado branda –, de modo que pessoas licitamente abrangidas pela primeira crítica não se podem supor atingidas pela segunda, cujo caráter seria ilícito, por haver superado os limites do direito de informação para atingir a honra de pessoas. Parecer pelo não conhecimento do agravo da empresa jornalística Pampa Ltda. e pelo parcial provimento do agravo e do recurso extraordinário de Jayme Copstein” (doc. 18). Examinados os elementos havidos no processo, DECIDO. 6. O art. 544 do Código de Processo Civil, com as alterações da Lei n. 12.322/2010, estabeleceu que o agravo contra decisão que inadmite recurso extraordinário processa-se nos autos do processo, ou seja, sem a necessidade de formação de instrumento, sendo este o caso. Analisam-se, portanto, os argumentos postos no agravo, de cuja decisão se terá, na sequência, se for o caso, exame do recurso extraordinário. 7. No agravo, a Empresa Jornalística Pampa Ltda. deveria impugnar os fundamentos da decisão agravada e demonstrar, de forma específica e objetiva, as razões pelas quais ela deveria ser superada. A controvérsia jurídica veiculada nas razões do recurso extraordinário somente seria passível de análise, se, superado o obstáculo da decisão agravada, estivesse devidamente prequestionada. Assim, por exemplo: “AGRAVO - OBJETO. Visando o agravo a fulminar a decisão que se ataca, as razões devem estar direcionadas de modo a infirmá-la. O silêncio em torno dos fundamentos consignados é de molde, por si só, a levar à manutenção do que assentado. Frente ao descompasso entre a decisão impugnada e as razões do agravo, este transparece como sendo meramente protelatório. AGRAVO - CARÁTER INFUNDADO - MULTA. Surgindo do exame do agravo a convicção sobre o caráter manifestamente infundado, impõe-se a aplicação da multa prevista no § 2º do artigo 557 do Código de Processo Civil” (AI 567.171-AgR, Relator o Ministro Marco Aurélio, Primeira Turma, DJ 27.10.2006). “Agravo regimental em recurso extraordinário. 2. Razões do agravo regimental não atacam os fundamentos da decisão agravada. Aplicação da Súmula 287. Precedentes. 3. Atraso no pagamento de precatório. Fixação de multa contra a Fazenda Pública. Discussão de índole infraconstitucional. RE-RG 608.852, rel. Min. Ellen Gracie, DJe 4.6.2010. 4. Agravo regimental a que se nega provimento” (RE 584.485-AgR, Relator o Ministro Gilmar Mendes, Segunda Turma, DJe 12.4.2013). No caso dos autos, a Empresa Jornalística Pampa Ltda. não impugnou a decisão agravada. Incide na espécie a Súmula n. 287 do Supremo Tribunal Federal. 8. Cumpre afastar o fundamento da decisão agravada de que a controvérsia veiculada no recurso extraordinário interposto por Jayme Copstein demandaria o exame de legislação infraconstitucional, pois a matéria é de natureza constitucional. Superado esse óbice, razão jurídica assiste ao Agravante Jayme Copstein. 9. O Estado Democrático de Direito pressupõe divergências de ideias, de pensamentos e de manifestações, quer dizer, possibilita o confronto de opinião. Assegura-se, portanto, o direito de se expressar livremente. Nas palavras de Francois-Marie Arouet (Voltaire), pode não se concordar com nenhuma das palavras que se diz, mas se defende o direito de dizê-las. No julgamento da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental n. 130, ressaltei que a liberdade de imprensa pela importância da matéria diz respeito ao próprio Estado, tal como posto na Constituição de 1988, ou seja, no Estado Democrático. Esclareci que o fundamento da Constituição é a democracia, que não se compadece absolutamente com qualquer tipo de restrição. Dessa forma, com exceção das restrições impostas pela Constituição, qualquer outra forma de obstar e inibir a atuação da imprensa é inconstitucional. Este Supremo Tribunal assentou que o exercício da liberdade de expressão, pelos profissionais da imprensa, assegura ao jornalista o direito de expender crítica, ainda que desfavorável e em tom contundente, contra autoridades ou órgãos públicos, desde que inocorra agravos à honra e à imagem da pessoa. Assim, por exemplo, o voto proferido pelo Ministro Celso de Melo na Reclamação n. 9.428: “O exercício concreto, pelos profissionais da imprensa, da liberdade de expressão, cujo fundamento reside no próprio texto da Constituição da República, assegura, ao jornalista, o direito de expender crítica, ainda que desfavorável e em tom contundente, contra quaisquer pessoas ou autoridades (Pet3.486/DF, Rel. Min. CELSO DE MELLO). Ninguém ignora que, no contexto de uma sociedade fundada em bases democráticas, mostra-se intolerável a repressão estatal ao pensamento, ainda mais quando a crítica – por mais dura que seja – revele-se inspirada pelo interesse coletivo e decorra da prática legítima, como sucede na espécie, de uma liberdade pública de extração eminentemente constitucional (CF, art. 5º, IV, c/c o art.220). Não se pode desconhecer que a liberdade de imprensa, enquanto projeção da liberdade de manifestação de pensamento e de comunicação, reveste-se de conteúdo abrangente, por compreender, dentre outras prerrogativas relevantes que lhe são inerentes, (a) o direito de informar, (b) o direito de buscar a informação, (c) o direito de opinar e (d) o direito de criticar. A crítica jornalística, desse modo, traduz direito impregnado de qualificação constitucional, plenamente oponível aos que exercem qualquer atividade de interesse da coletividade em geral, pois o interesse social, que legitima o direito de criticar, sobrepõe-se a eventuais suscetibilidades que possam revelar as pessoas públicas. É por tal razão que a crítica que os meios de comunicação social dirigem às pessoas públicas, por mais acerba, dura e veemente que possa ser, deixa de sofrer, quanto ao seu concreto exercício, as limitações externas que ordinariamente resultam dos direitos da personalidade. (...) É importante acentuar, bem por isso, que não caracterizará hipótese de responsabilidade civil a publicação de matéria jornalística cujo conteúdo divulgar observações em caráter mordaz ou irônico ou, então, veicular opiniões em tom de crítica severa, dura ou, até, impiedosa, ainda mais se a pessoa a quem tais observações forem dirigidas ostentar a condição de figura pública, investida, ou não, de autoridade governamental, pois, em tal contexto, a liberdade de crítica qualifica-se como verdadeira excludente anímica, apta a afastar o intuito doloso de ofender. Com efeito, a exposição de fatos e a veiculação de conceitos, utilizadas como elementos materializadores da prática concreta do direito de crítica, descaracterizam o ‘ animus injuriandi vel diffamandi ’, legitimando, assim, em plenitude, o exercício dessa particular expressão da liberdade de imprensa. (...) Entendo relevante destacar, no ponto, analisada a questão sob a perspectiva do direito de crítica – cuja prática se mostra apta a descaracterizar o ‘animus injuriandi vel diffamandi’ (CLÁUDIO LUIZ BUENO DE GODOY, “A Liberdade de Imprensa e os Direitos da Personalidade”, p. 100/101, item n. 4.2.4, 2001, Atlas; VIDAL SERRANO NUNES JÚNIOR, “A Proteção Constitucional da Informação e o Direito à Crítica Jornalística”, p. 88/89, 1997, Editora FTD; RENÉ ARIEL DOTTI, “Proteção da Vida Privada e Liberdade de Informação”, p. 207/210, item n. 33, 1980, RT, v.g.) -, que essa prerrogativa dos profissionais de imprensa revela-se particularmente expressiva, quando a crítica, exercida pelos “mass media” e justificada pela prevalência do interesse geral da coletividade, dirige-se a figuras notórias ou a pessoas públicas, independentemente de sua condição oficial. (...) Vê-se, pois – tal como tive o ensejo de assinalar(Pet3.486/DF, Rel. Min. CELSO DE MELLO, “in” Informativo/STF nº 398/2005) –, que a crítica jornalística, quando inspirada pelo interesse público, não importando a acrimônia e a contundência da opinião manifestada, ainda mais quando dirigida a figuras públicas com alto grau de responsabilidade na condução dos interesses de certos grupos da coletividade, não traduz nem se reduz, em sua expressão concreta, à dimensão do abuso da liberdade de imprensa, não se revelando suscetível, por isso mesmo, em situações de caráter ordinário, de sofrer qualquer repressão estatal ou de se expor a qualquer reação hostil do ordenamento positivo. Não é menos exato afirmar-se, de outro lado, que o direito de crítica encontra suporte legitimador no pluralismo político, que representa um dos fundamentos em que se apoia, constitucionalmente, o próprio Estado Democrático de Direito (CF, art. 1º, V). (...) Não custa insistir, neste ponto, na asserção de que a Constituição da República revelou hostilidade extrema a quaisquer práticas estatais tendentes a restringir ou a reprimir o legítimo exercício da liberdade de expressão e de comunicação de ideias e de pensamento. É preciso advertir, bem por isso, notadamente quando se busca promover, como no caso, a repressão à crítica jornalística, mediante condenação judicial ao pagamento de indenização civil, que o Estado – inclusive o Judiciário - não dispõe de poder algum sobre a palavra, sobre as ideias e sobre as convicções manifestadas pelos profissionais dos meios de comunicação social. Essa garantia básica da liberdade de expressão do pensamento, como precedentemente assinalado, representa, em seu próprio e essencial significado, um dos fundamentos em que repousa a ordem democrática. Nenhuma autoridade, mesmo a autoridade judiciária, pode prescrever o que será ortodoxo em política, ou em outras questões que envolvam temas de natureza filosófica, ideológica ou confessional, nem estabelecer padrões de conduta cuja observância implique restrição aos meios de divulgação do pensamento. Isso, porque “o direito de pensar, falar e escrever livremente, sem censura, sem restrições ou sem interferência governamental” representa, conforme adverte HUGO LAFAYETTE BLACK, que integrou a Suprema Corte dos Estados Unidos da América, “o mais precioso privilégio dos cidadãos (...)” (“Crença na Constituição”, p. 63, 1970, Forense). (...) Não constitui demasia insistir na observação de que a censura, por incompatível com o sistema democrático, foi banida do ordenamento jurídico brasileiro, cuja Lei Fundamental – reafirmando a repulsa à atividade censória do Estado, na linha de anteriores Constituições brasileiras (Carta Imperial de 1824, art. 179, nº 5; CF/1891, art. 72, § 12; CF/1934, art. 113, nº 9; CF/1946, art. 141, § 5º) – expressamente vedou “(...) qualquer censura de natureza política, ideológica e artística” (CF/88, art. 220, § 2º). Cabe observar, ainda, Senhor Presidente, que a repulsa à censura, além de haver sido consagrada em nosso constitucionalismo democrático, representa expressão de um compromisso que o Estado brasileiro assumiu no plano internacional. Com efeito, o Brasil, dentre tantos outros instrumentos de proteção internacional dos direitos humanos, subscreveu a Declaração Universal dos Direitos da Pessoa Humana, promulgada pela III Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas, há exatos 61anos, em 10 de dezembro de 1948. Esse estatuto contempla, em seu Artigo XIX, previsão do direito à liberdade de opinião e de expressão, inclusive a prerrogativa de procurar, de receber e de transmitir informações e ideias por quaisquer meios, independentemente de fronteiras. O direito fundamental à liberdade de expressão, inclusive à liberdade de imprensa, é igualmente assegurado pelo Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos (Artigo 19), adotado pela Assembleia Geral da ONU em 16/12/1966 e incorporado, formalmente, ao nosso direito positivo interno, em 06/12/1992 (Decreto nº 592/92). Vale mencionar, ainda, por sumamente relevante, a Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem, promulgada pela IX Conferência Internacional Americana, realizada em Bogotá, em abril de 1948, cujo texto assegura, a todos, a plena liberdade de expressão (Artigo IV)” (Rcl 9.428, Relator o Ministro Cezar Peluso, Plenário, DJe 25.6.2010, grifos nossos). Confira-se excerto do parecer do Subprocurador-Geral da República Odim Brandão Ferreira: “Não caracteriza hipótese de responsabilidade civil a publicação de matéria jornalística que narre fatos verídicos ou verossímeis, embora eivados de opiniões severas, irônicas ou impiedosas, sobretudo quando se trate de figuras públicas que exerçam atividades tipicamente estatais, gerindo interesses da coletividade, e a notícia e crítica referirem-se a fatos de interesse geral relacionados à atividade pública desenvolvida pela pessoa noticiada. Nessas hipóteses, principalmente, a liberdade de expressão é prevalente, atraindo verdadeira excludente anímica, a afastar o intuito doloso de ofender a honra da pessoa a que se refere a reportagem. Nesse sentido, precedentes do egrégio Supremo Tribunal Federal: ADPF 130/DF, de relatoria do Ministro Carlos Britto; AgRg no AI 690.841/SP, de relatoria do Ministro Celso de Mello” (fl. 9, doc. 18, grifos nossos). O parecer da Procuradoria-Geral da República acolhe a jurisprudência deste Supremo Tribunal sobre a matéria. Confiram-se: “A liberdade de imprensa, enquanto projeção das liberdades de comunicação e de manifestação do pensamento, reveste-se de conteúdo abrangente, por compreender, dentre outras prerrogativas relevantes que lhe são inerentes, (a) o direito de informar, (b) o direito de buscar a informação, (c) o direito de opinar e (d) o direito de criticar. - A crítica jornalística, desse modo, traduz direito impregnado de qualificação constitucional, plenamente oponível aos que exercem qualquer atividade de interesse da coletividade em geral, pois o interesse social, que legitima o direito de criticar, sobrepõe-se a eventuais suscetibilidades que possam revelar as pessoas públicas ou as figuras notórias, exercentes, ou não, de cargos oficiais. - A crítica que os meios de comunicação social dirigem às pessoas públicas, por mais dura e veemente que possa ser, deixa de sofrer, quanto ao seu concreto exercício, as limitações externas que ordinariamente resultam dos direitos de personalidade. - Não induz responsabilidade civil a publicação de matéria jornalística cujo conteúdo divulgue observações em caráter mordaz ou irônico ou, então, veicule opiniões em tom de crítica severa, dura ou, até, impiedosa, ainda mais se a pessoa a quem tais observações forem dirigidas ostentar a condição de figura pública, investida, ou não, de autoridade governamental, pois, em tal contexto, a liberdade de crítica qualifica-se como verdadeira excludente anímica, apta a afastar o intuito doloso de ofender. Jurisprudência. Doutrina. - O Supremo Tribunal Federal tem destacado, de modo singular, em seu magistério jurisprudencial, a necessidade de preservar-se a prática da liberdade de informação, resguardando-se, inclusive, o exercício do direito de crítica que dela emana, por tratar-se de prerrogativa essencial que se qualifica como um dos suportes axiológicos que conferem legitimação material à própria concepção do regime democrático. - Mostra-se incompatível com o pluralismo de ideias, que legitima a divergência de opiniões, a visão daqueles que pretendem negar, aos meios de comunicação social (e aos seus profissionais), o direito de buscar e de interpretar as informações, bem assim a prerrogativa de expender as críticas pertinentes. Arbitrária, desse modo, e inconciliável com a proteção constitucional da informação, a repressão à crítica jornalística, pois o Estado – inclusive seus Juízes e Tribunais – não dispõe de poder algum sobre a palavra, sobre as ideias e sobre as convicções manifestadas pelos profissionais da Imprensa. Precedentes do Supremo Tribunal Federal. Jurisprudência comparada (Corte Européia de Direitos Humanos e Tribunal Constitucional Espanhol)” (AI 705.630-AgR, Relator o Ministro Celso de Mello, Segunda Turma, DJe 6.4.2011, grifos nossos). “A Constituição reservou à imprensa todo um bloco normativo, com o apropriado nome "Da Comunicação Social" (capítulo V do título VIII). A imprensa como plexo ou conjunto de "atividades" ganha a dimensão de instituição-ideia, de modo a poder influenciar cada pessoa de per se e até mesmo formar o que se convencionou chamar de opinião pública. Pelo que ela, Constituição, destinou à imprensa o direito de controlar e revelar as coisas respeitantes à vida do Estado e da própria sociedade. A imprensa como alternativa à explicação ou versão estatal de tudo que possa repercutir no seio da sociedade e como garantido espaço de irrupção do pensamento crítico em qualquer situação ou contingência. Entendendo-se por pensamento crítico o que, plenamente comprometido com a verdade ou essência das coisas, se dota de potencial emancipatório de mentes e espíritos. O corpo normativo da Constituição brasileira sinonimiza liberdade de informação jornalística e liberdade de imprensa, rechaçante de qualquer censura prévia a um direito que é signo e penhor da mais encarecida dignidade da pessoa humana, assim como do mais evoluído estado de civilização (…). Sem embargo, a excessividade indenizatória é, em si mesma, poderoso fator de inibição da liberdade de imprensa, em violação ao princípio constitucional da proporcionalidade. A relação de proporcionalidade entre o dano moral ou material sofrido por alguém e a indenização que lhe caiba receber (quanto maior o dano maior a indenização) opera é no âmbito interno da potencialidade da ofensa e da concreta situação do ofendido. Nada tendo a ver com essa equação a circunstância em si da veiculação do agravo por órgão de imprensa, porque, senão, a liberdade de informação jornalística deixaria de ser um elemento de expansão e de robustez da liberdade de pensamento e de expressão lato sensu para se tornar um fator de contração e de esqualidez dessa liberdade. Em se tratando de agente público, ainda que injustamente ofendido em sua honra e imagem, subjaz à indenização uma imperiosa cláusula de modicidade. Isto porque todo agente público está sob permanente vigília da cidadania. E quando o agente estatal não prima por todas as aparências de legalidade e legitimidade no seu atuar oficial, atrai contra si mais fortes suspeitas de um comportamento antijurídico francamente sindicável pelos cidadãos” (ADPF 130, Relator o Ministro Ayres Britto, Plenário, DJe 6.11.2009, grifos nossos). Dessa orientação jurisprudencial divergiu o acórdão recorrido. 10. Pelo exposto, nego seguimento ao agravo interposto pela Empresa Jornalística Pampa Ltda. e dou provimento ao agravo e, desde logo, ao recurso extraordinário interposto por Jayme Copstein (art. 544, § 4º, inc. II, alínea c, do Código de Processo Civil), para julgar improcedente a ação indenizatória ajuizada pelo ora Recorrido, invertidos os ônus da sucumbência. Publique-se. Brasília, 25 de novembro de 2013. Ministra CÁRMEN LÚCIA Relatora