Vol. nr.: 1 | Semestral SCIENTIFIC JOURNAL OF NATURAL MEDICINE REVISTA CIENTÍFICA DE MEDICINA NATURAL DEZEMBRO / 2013 Centro de Investigação em Medicina Natural Instituto Português de Naturologia notas prévias SCIENTIFIC JOURNAL OF NATURAL MEDICINE REVISTA CIENTÍFICA DE MEDICINA NATURAL Indíce Diretor: Professora Doutora Maria Manuela N. da Costa Maia da Silva Notas Prévias Maria Manuela N. da Costa Maia da Silva 3 Editorial Rui Miguel Freitas Gonçalves 4 O Direito à Saúde e a Responsabilidade Individual - O processo de regulamentação das Terapêuticas não Convencionais em Portugal 5 O Papel da Acupuntura no tratamento da Artrite Reumatóide. Uma Revisão Bibliográfica 17 A Medicina no Diário de Miguel Torga 27 Da Perceção do Risco ao Exercício da Atividade nas Terapêuticas não Convencionais 40 Conselho Científico: Professora Doutora Ana Cláudia Barreira Nunes Professora Doutora Ana Cristina Esteves Professora Doutora Ana Cristina Estrela de O. C. Cordeiro Professor Doutor António José Afonso Marcos Professor Doutor Arménio Jorge Moura Barbosa Professor Doutor Carlos Manuel Moreira Mota Cardoso Professor Doutor João Paulo Ferreira Leal Doutor José Maria Robles Robles Professor Doutor Luis Alberto Coelho Rebelo Maia Professora Doutora Maria Isabel do Amaral A.V. P. de Leão Professora Doutora Maria Manuela N. da Costa Maia da Silva Professor Doutor Miguel Tato Diogo Doutor Rui Miguel Freitas Gonçalves Editor: Doutor Rui Miguel Freitas Gonçalves Depósito legal: Os artigos são da responsabilidade dos seus autores. São reservados todos os direitos. Toda a reprodução, desta revista, seja qual for o meio, sem prévia autorização, é ilícita e incorre em responsabilidade civil e criminal. Dezembro/2013 Publicação Semestral Edições: Centro de Investigação em Medicina Natural Instituto Português de Naturologia E-mail: [email protected] Parceiros e Projetos: Membros do Conselho Científico (Resumo Curricular) 50 Normas para Publicação 53 e-medico+ O Comité Internacional de Bioética da Unesco acordou, em Setembro, de 2012, durante a XIXª reunião, instar todos os governos do mundo a garantirem o acesso dos cidadãos aos tratamentos alternativos e a reconhecê-los como uma opção na saúde. Pede-se, em suma, o mesmo que já se havia pedido em sede de Conselho da Europa, na sua resolução de 1.206, de 1999. Na reunião de Genebra a OMS apelava “à maior evidência possível na idoneidade destes tratamentos com critérios de segurança, eficácia e qualidade”. A Lei 71/2013, de 2 de Setembro, veio regular, em Portugal, o acesso às profissões das terapêuticas não convencionais, bem como o seu exercício, no setor público e privado. Todavia, a medicina natural vai muito mais longe que o exercício de uma profissão: é tanto uma forma de vida como um conceito de cura que emprega diferentes meios naturais para tratar a doença. Nas palavras dos médicos Murray e Joseph Pizzorno, estamos perante uma revolução nos cuidados de saúde: «A ciência e a medicina dispõem, atualmente, de tecnologia e conhecimentos necessários para apreciar o valor das terapias naturais». O reconhecimento do estudo e da investigação, nestas áreas, é uma condição prévia para a criação de um “espaço europeu aberto” e transparente em matéria de educação e formação. Verifica-se uma evolução acentuada nos últimos anos em matéria de publicações científicas dedicadas à Medicina Complementar e Alternativa, em diversos centros académicos, quer na Europa, quer nos EUA. A Scientific Journal of Natural Medicine - Revista Científica de Medicina Natural vai rasgar e reforçar este caminho de estudo e de investigação, constituindo-se como uma atitude ativa em prol da saúde e uma referência, no panorama português e internacional. Publicada em português e inglês, com protocolos com Centros de Investigação Creditados (CLEPUL e outros) e revistas internacionais, nasce com a convicção de ser um projeto arrojado, um espaço de originalidade na abordagem da saúde, fundado na ética e no rigor científico. Este passo pretende ir mais além do que tem sido possível em termos académicos, rasgando e ousando abordar esta matérias de forma rigorosa, abrindo horizontes para o futuro do conhecimento e da saúde. Será um trabalho ambicioso e árduo. Mas com toda a certeza, bem sucedido. “Genius is one per cent inspiration, ninety-nine per cent perspiration.” (Thomas A. Edison - Harper’s Monthly, 1932) A Diretora Maria Manuela Nunes da Costa Maia da Silva 2 Scientific Journal of Natural Medicine | Vol. 1 Scientific Journal of Natural Medicine | Vol. 1 3 editorial O DIREITO À SAÚDE E A RESPONSABILIDADE INDIVIDUAL O processo de regulamentação das Terapêuticas não Convencionais em Portugal “The most savage controversies are about matters as to which there is no good evidence either way.” (Bertrand Russel) A realização de grandes feitos começa, sempre, por passos discretos e de pequena monta. A acumulação de conhecimento científico, felizmente, não é exceção a esta regra. Até ao presente momento a área da Medicina Natural tem vindo a merecer relevo da parte de investigadores das mais diversas áreas científicas mas, infelizmente, o número e a excelência dos seus fóruns de debate é insatisfatória. A Medicina Natural encontra-se, neste momento, numa encruzilhada entre duas visões muito claras: o atavismo de uma rejeição perentória de tudo o que defende e, por outro lado, a tentativa de alguns profissionais da área e membros da comunidade científica em avaliar e, eventualmente, validar, conhecimentos com base empírica, por vezes milenar. Neste último grupo inserem-se os editores desta revista, um espaço aberto de discussão científica séria acerca da Medicina Natural por profissionais reconhecidos da área, ou fora desta, que desejem fazer progredir uma base de conhecimento científico acerca da temática. Maria Manuela N. C. Maia da Silva* [email protected] Resumo: O direito à saúde e os novos paradigmas na relação entre o indivíduo, a sociedade e o Estado levam à necessidade de regular uma nova realidade social. As TNC vieram despertar algumas temáticas que, aparentemente adormecidas, têm sido debatidas ao longo destes últimos anos, nomeadamente, medicalização da saúde, o homo medicus, a saúde persecutória, o tratamento legal a dar a novas áreas terapêuticas, o reconhecimento dos seus profissionais, o seu enquadramento no contexto atual da saúde, os direitos dos pacientes, dos utilizadores e da sociedade em geral. “The doctor of the future will give no medicine but will interest his patients in the care of the human frame, in diet and in the cause and prevention of disease.” Thomas A. Edison O DIREITO À SAÚDE E A NOVA REALIDADE SOCIAL JUSTIFICAÇÃO DA TEMÁTICA É com extrema satisfação que acolhemos trabalhos originais que visem elucidar os profissionais de saúde, a comunidade científica e o público geral acerca da avaliação, validação, desenvolvimento e integração da Medicina Natural com recurso a estratégias científicas robustas em que o rigor metodológico e formal é de suma importância. A saúde constitui parte integrante da felicidade de cada indivíduo. Daí a sua importância no nosso dia a dia e a necessidade do envolvimento de todos, sociedade e Estado, na obtenção do seu equilíbrio. Tendo como referência que a saúde é muito mais do que a ausência de doença, o bem estar fí- Aguardamos a sua contribuição, * Síntese curricular: O Editor Rui M. Gonçalves, PhD 4 Scientific Journal of Natural Medicine | Vol. 1 sico e emocional passa, não só, por um atitude ativa e dinâmica de cada um de nós como indivíduo mas, também, como seres inseridos num contexto coletivo. O nosso bem ou mal estar vai influenciar o equilíbrio da própria sociedade, o meio onde vivemos, a família, o trabalho, a produtividade, etc. Licenciatura em Direito. 3.º Ciclo de Estudos Direito pela Faculdade de Direito da Universidade de Santiago de Compostela. Bolseira de Investigação da JNICT durante 4 anos, com estatuto de Investigadora. Doutoramento Europeu em Direito, pela Faculdade de Direito da Universidade de Santiago de Compostela, reconhecido pela Faculdade de Direito de Coimbra e publicado em Diário da República. Mestre em Medicina Natural e Aplicação em Atenção Primária, pela Faculdade de Medicina da Universidade Santiago Compostela. Pós-graduação em Acupunctura e Moxibustão pela Associação Médica Chinesa, Beijing, China. Diretora Geral do Instituto Português de Naturologia. Professora Universitária. Exercício de vários cargos de direção e reitoria em instituições de ensino superior. Presidente do Conselho Científico de uma das universidades. Membro integrado do CLEPUL. Membro consultor em Comissões de elaboração de diplomas legais. Membro de Conselho Científico de várias revistas científicas. Presidente da APSANA - Associação Europeia de Profissionais de Saúde Natural. Membro fundador de Centros de Investigação e membro atual de alguns Centros de Investigação. Autora de várias publicações. Scientific Journal of Natural Medicine | Vol. 1 5 O direito à proteção da saúde, previsto no art 64 da Constituição da República Portuguesa (CRP), envolve uma complexidade política, económica, social e jurídica que vai além da sua vertente ética. Trata-se de uma área de intervenção multidisciplinar, com envolvimento de vários grupos profissionais, cortando com o paradigma tradicional referenciado ao profissional médico. O reforço do princípio da autonomia individual, com o direito de cada um em decidir sobre o que lhe é proposto, no domínio da saúde, reconhecendo-se o direito a exigir informação adequada quanto ao objetivo e natureza da intervenção, veio traduzir-se no consentimento livre e esclarecido. Esta nova referência e atitude reforça o fundo ético da dignidade da pessoa, reconhecendo-lhe a liberdade de escolha pelos seus projetos e formas de vida. Tomar uma decisão é, naturalmente, fazer escolhas e opções. Daqui decorre a responsabilidade como a atitude de responder pelos efeitos que estes atos possam produzir. Tomar uma decisão implica conhecimento, informação esclarecida e inequívoca: delibero, decido, ajo. O mundo onde impera a informação, o profissional de saúde age de acordo com a sua esfera de responsabilidade, a sua ética e nos termos das melhores práticas (best pratices), da leges artis. Vivemos, atualmente, um período em que o Estado se mostra incapaz de zelar por todos os agentes e interesses da sociedade. A ideia do Estado Pai não é, mais, viável. A sociedade representa uma realidade a que o Estado não pode estar indiferente. A dialética atual da sociedade, o seu dinamismo, tem de ser acompanhado pela estrutura do Estado e pelo seu poder legislativo, sem a sufocar ou castrar. É nesta nova realidade social que nos aparece a Lei n.º 45/2003, de 22 de Agosto, ao estabelecer o enquadramento da atividade e do exercício das terapêuticas não convencionais (TNC) praticadas pela Acupunctura, Homeopatia, Osteopatia, Naturopatia, Fitoterapia e Quiroprática, estabele- 6 cendo «tal como são definidas pela Organização Mundial de Saúde» (art. 1) . Todavia, não foi, posteriormente, regulamentada. O Governo Português, em 29 de Novembro de 2012, no âmbito do seu poder de iniciativa da lei, veio apresentar a Proposta de Lei nº 111/XII (2º) (adiante designada por PL) que pretendia regular o acesso às profissões no âmbito das terapêuticas não convencionais (TNC) e o seu exercício, no sector público ou privado (art. 1º da PL). Como se refere na Exposição de Motivos desta Proposta, com base nas recentes orientações adoptadas pela Organização Mundial de Saúde e no estipulado na Lei n.º 45/2003, de 22 de Agosto, «quem pretenda praticar estas terapêuticas deve ter uma formação a fixar em portaria dos membros do Governo das áreas da saúde e do ensino superior, que terá por base os termos de referência fixados para cada um destes tipos de área de conhecimento pela Organização Mundial de Saúde. Esta formação deverá ser de nível superior, uma vez que pressupõe a aquisição prévia de conhecimentos de nível secundário. Só após obtenção da exigida formação poderão ter acesso à cédula profissional, a qual lhes permitirá a utilização exclusiva do título profissional respetivo». Após vários debates desta Proposta foi publicada a Lei n.º 71/2013, de 2 de Setembro, prevendo alterações à anterior Lei n.º 45/2003, de 22 de Agosto e abrindo caminho a orientações distintas das previstas na Proposta de Lei nº 111/XII (2º). A CONTEXTUALIZAÇÃO A NÍVEL INTERNACIONAL A nível internacional esta realidade tem sido estudada e debatida. O Comité Internacional de Bioética da Unesco acordou, no passado mês de Setembro, de 2012, durante a XIXª reunião, instar todos os governos do mundo a garantirem o acesso dos cidadãos aos tratamentos alternativos e a reconhecê-los como uma opção na saúde. O Scientific Journal of Natural Medicine | Vol. 1 Comité, pelas palavras de Stefano Semplici, anima os Estados a integrar estes tratamentos no seio do sistema sanitário e a estabelecer normas de acreditação para os seus especialistas. De facto, para o Comité Internacional de Bioética não deveriam ser consideradas uma segunda opção, mas tratamentos realmente alternativos e complementares à medicina convencional. Pede-se, em suma, o mesmo que já se havia pedido em sede de Conselho da Europa, na sua resolução de 1.206, de 1999. No extenso trabalho da OMS, Estratégia da OMS sobre Medicina Tradicional 2002-2005, defende-se o interesse económico para a sociedade, se os Estados implementassem a prática das medicinas alternativas1 . A OMS utiliza o termo Medicina Tradicional quando se referencia a África, Iberoamérica, Sud Este Asiático e Pacífico Ocidental e Medicina Complementar e Alternativa ao referir-se à Europa, NorteAmerica e Austrália. Desde algum tempo que a OMS, já na reunião de Genebra, apelava “à maior evidência possível na idoneidade destes tratamentos com critérios de segurança, eficácia e qualidade”, calculando que só as plantas medicinais movem dezenas de milhões de euros ao ano e a tendência será de aumentar, pelo que há acordo em garantir a sua qualidade, assim como promover a sua aceitação. Muitos outros organismos têm desenvolvido estudos, mais ou menos aprofundados, sobre o estado das CAM (Complementary, Alternative Medicine) pelos vários países: A CAMDOC Alliance representa a união das quatro maiores organizações europeias na área das CAM, num total de 132 associações europeias: o European Committee for Homeopathy 1 A OMS (WHO) já tomou várias Resoluções , em Assembleia Geral da OMS, em matéria de CAM: Resolução da Assembleia Geral da OMS WHA 56.31, de 2010, onde convida os Estados Membros a implementarem medidas e legislação de forma a apoiar correta utilização da medicina tradicional http://www.who.int/medicines/technical_briefing/tbs/Technical_briefing_11_10.pdf (consulta em 17 de Dezembro de 2013). Também a Resolução da Assembleia Geral da OMS WHA 62.13, de 2009, veio instar os Estados membros a incluir a Medicina Tradicional nos sistemas de saúde e a regulamentar a matéria de qualificação, acreditação e licenciamento dos profissionais http://www2.paho.org/hq/dmdocuments/2009/CE144-inf-05-A-e.pdf (consultado em 17 de Dezembro de 2013). (ECH), o European Council of Doctors for Plurality in Medicine (ECPM), o International Council of Medical Acupuncture and Related Techniques (ICMART) e o International Federation of Anthroposophic Medical Associations (IVAA)2 . Também a EUROCAM representa uma rede que engloba todas as vertentes das CAM, na UE3 . Neste sentido, o mais recente estudo – CAMbrella4 – veio apresentar a diversidade de políticas e orientações em matéria de legislação e regulamentação das CAM, referindo que a abordagem se desenvolveu de forma diferente, nas várias regiões da Europa: desde países sem qualquer legislação, a outros com legislação mas sem regulamentação e outros de regulamentação muito cerrada. A situação de disparidade verifica-se, também, na medi- 2 Existem vários modelos de prestação de serviços e formação das CAM nos Estados Membros da União Europeia. Relativamente à formação, a diversidade está instalada: «According to a survey published in 2006 [2], CAM education is available in 42% of medical faculties in the EU-15 countries and in 20% of faculties in the ‘new’ EU countries. CAM education is conducted by a separate department in 10% of medical faculties in the EU-15 countries and in 7% of faculties in the ‘new’ EU countries. Separate familiarisation courses in CAM are available in 42% of the EU-15 and in 20% of the ‘new’ EU member state medical universities. Separate CAM courses are compulsory in 13% of medical faculties in the EU-15 member states. There are no compulsory CAM courses in any of the medical faculties in the ‘new’ EU countries» http://www.camdoc. eu/Survey/Introduction.html (consultado em 17 de Dezembro de 2013). 3 http://www.camdoc.eu/Survey/Introduction.html. Realizou-se, no Parlamento Europeu, em 9 de Outubro de 2012, uma Conferência subordinada ao tema Complementary and Alternative Medicine - Inovation and Added Value for European Health Care onde «Members of the European Parliament, health professionals, patients and policy makers gathered in the European Parliament to hear and debate presentations on the innovative added value of Complementary and Alternative Medicine (CAM) for European Healthcare. The potential that CAM has to maintain health, prevent ill-health promote healthier lifestyles and contribute to the sustainability of health systems should not be disregarded by the European Union at a time when health funding is under so much pressure from economic and demographic pressures…» http://camdoc. eu/CAM_for_Europe/CAM_Conference_2012.html (consultado em 17 de Dezembro de 2013). 4 Este documento constitui o primeiro relatório do projeto produzido pela rede CAMbrella (Deliverabel 9, Report nº 1), sobre CAM, nos países europeus. Descreve o estatuto legal, a supervisão governamental relativamente às CAM bem como o reembolso dessas práticas, pelo Estado, nos diferentes 27 Estados Membros e em mais 12 Estados Associados (consultado em 17 de Dezembro de 2013)http://uit.no/Content/321567/ Deliverable%209%20-%20Report%20No.1%20CAM%20in%20European%20countries%20-%20Webb.pdf (consultado em 17 de Dezembro de 2013). Scientific Journal of Natural Medicine | Vol. 1 7 cina convencional, mas, naquela, é muito maior5 . Também na formação e nos programas curriculares há disparidade de critérios e abordagens: desde a ausência total de legislação e regulamentação, a uma legislação mais exigente: desde países onde a atividade não exige qualquer formação prévia, até aqueles em que só pode ser exercida por médicos formados em CAM. Todavia, apesar da disparidade de abordagens por parte dos diferentes países membros, de realçar o facto de Portugal ter já uma orientação que nem é demasiada fechada e minuciosa, como em alguns países, nem totalmente omissa. Como é referido no Relatório, dos 15 membros iniciais da EU, Portugal, juntamente com a Bélgica e Alemanha, tem uma lei geral sobre CAM6 , onde foram nomeadas algumas das técnicas, a ser regulamentadas posteriormente. Alguns têm sido os esforços no sentido de uniformização do sistema e a necessidade de uma regulamentação mais homogénea e uniforme, mesmo a nível mundial, de forma a garantir uma maior segurança e tutela das legítimas expectativas dos cidadãos, uma concretização do seu direito de livre escolha e opção, bem como a garantia da liberdade de circulação. O reconhecimento dos estudos e dos títulos académicos é uma condição prévia para a criação de um “espaço europeu aberto” e transparente em matéria de educação e formação de forma a promover a mobilidade dos estudantes. Significa isto que a fixação do número de créditos do ciclo de estudos, para as diferentes áreas de formação, deverá adoptar valores similares aos das instituições de ensino superior no espaço europeu, tendo em vista assegurar aos estudantes portugueses condições de mobilidade, formação e integração profissional semelhantes, em duração e conteúdo à dos restantes Estados que integram o espaço europeu (arts 8 e 9 do Decreto Lei nº 74/2006, de 24 de Março). A acreditação, por sua vez, realiza-se no quadro do sistema europeu de garantia de qua5 Produzido pela rede CAMbrella (Deliverabel 9, Report nº 1), pág. 41. 6 Produzido pela rede CAMbrella (Deliverabel 9, Report nº 1, pág. 15. 8 lidade no ensino superior, visando garantir o cumprimento dos requisitos mínimos que conduzem ao reconhecimento oficial dos estabelecimentos de ensino superior e dos seus ciclos de estudo e baseando-se na avaliação da qualidade, conforme disposto no regime jurídico da avaliação da qualidade do ensino superior 7. O DIREITO À SAÚDE E A CAM, EM PORTUGAL. AS TERAPÊUTICAS NÃO CONVENCIONAIS No seguimento do que foi dito, já muito trabalho foi feito e muito, ainda, haverá para fazer, no âmbito europeu, de uniformização da formação. Nada impede, todavia, que Portugal vá, desde logo, tomando a iniciativa legislativa e seja precursor. Como se verificou, o legislador nacional já se pronunciou pelo reconhecimento de algumas das terapêuticas, de entre as CAM, o que se traduz num passo decisivo para a sua regulamentação. Em Portugal, a publicação da Lei 45/2003, de 22 de Agosto, veio reconhecer e consagrar, juridicamente, a existência das seguintes terapêuticas não convencionais: Acupunctura, Naturopatia, Homeopatia, Osteopatia, Fitoterapia e Quiropráxia (art. 3º nº 2). Era, ainda, reconhecida a autonomia técnica e deontológica no exercício profissional da prática (art. 5º), cabendo a definição das condições de formação e de certificação de habilitações aos Ministérios da Educação e da Ciência e do Ensino Superior (art. 7º). No âmbito do art. 8º foram criadas Comissões que apresentaram propostas «com vista à definição dos parâmetros específicos de credenciação, formação e certificação dos respectivos profissionais e avaliação de equivalências» (nº 2), posteriormente sujeitas à discussão pública. Nos termos do art. 19 º, esta Lei seria regulamentada no prazo de 180 dias a contar da data da publicação. O que não aconteceu. Recentemente, a Lei n.º 71/2013, de 2 de Setembro, acrescentou, no seu art. 2º, a Medicina Tradi7 Lei 38/2007, de 16 de Agosto. Scientific Journal of Natural Medicine | Vol. 1 cional Chinesa. Estes diplomas constituem, sem dúvida, dois marcos históricos na regulamentação das terapêuticas não convencionais, da Medicina Natural, ou da Medicina Complementar, qualquer que seja a designação adotada. Desde logo, de referir a opção do nosso legislador em usar a terminologia de terapêuticas não convencionais em vez de Medicina Complementar ou Alternativa (CAM), à semelhança da designação dos organismos internacionais. Independentemente dos motivos, que não analisaremos, esta designação peca, desde logo, por dois motivos: - por se tratar de uma referência pela negativa, em todo desaconselhável na hora de designar uma área do conhecimento; - por induzir, os incautos, que se trata de um conjunto de técnicas desgarradas, sem homogeneidade, coerência científica ou substrato filosófico, de aplicação instrumental. Na verdade, as áreas agora reconhecidas, não constituem meras técnicas, mas sim verdadeiras áreas ancestrais de conhecimento, com filosofia e abordagem metodológica própria. A publicação da Lei 45/2203, de 22 de Agosto, demonstrou a necessidade de intervir numa realidade social onde se afirmava a eficácia terapêutica destes métodos, quer na amplitude da sua utilização e reconhecimento pelo público, quer na necessidade de consolidar e desenvolver a sua formação. Apesar de não se ter verificado a regulamentação prevista na citada Lei, as áreas nela previstas transformaram-se numa realidade intrínseca à sociedade e de reconhecimento público, movimentando a economia nacional, com centenas de profissionais e milhares de utilizadores, contribuindo para uma população física e mentalmente mais saudável8 . 8 Em termos de tratamento de dados e estudos realizados, no âmbito das TNC, em Portugal, podemos salientar, entre outros, o trabalho monográfico, para fins de conclusão de formação em Medicina Tradicional Chinesa-Acupuntura, realizado por Marta Moreira e Rita Gonçalves, intitulado «Medicina Tradicional, Complementar e Alternativa, no mundo. O Processo de Regulamentação em Portugal – o caso da Acupuntura», 2011, http://www.ipnaturologia.com/sites/default/files/A_MTCA_no_ Mundo_O_proc_reg_Port_a_acupuntura.pdf (consultado em 23 de Dezembro de 2013). Não poderemos esquecer que os sistemas de medicina natural desempenham, atualmente, um papel muito importante na sociedade, pois constituem um verdadeiro motor na promoção da saúde: nas sociedades mais precárias integram a prestação de cuidados médicos básicos em situações de dificuldade de acesso a outros meios e insuficiência de verbas; nas sociedades mais esclarecidas e cultas constituem uma forma de prevenção e de qualidade de vida. Como se refere no trabalho monográfico já citado, a «Medicina Tradicional, Complementar e Alternativa tem algumas características notáveis, das quais salientamos: grande diversidade e flexibilidade; nível comparativamente baixo de exigências em investimento tecnológico; custo global comparativamente baixo; maior disponibilidade e acessibilidade em países em vias de desenvolvimento; crescente popularidade em países desenvolvidos, designadamente pela procura por parte de setores da população cada vez mais preocupados com a utilização de substâncias químicas artificiais em excesso e desejosos de terapêuticas mais holísticas; crescente divulgação e procura a nível internacional global, apesar dos importantes avanços da medicina convencional; crescente importância económica»9 . A publicação da atual Lei n.º 71/2013, de 2 de Setembro, que resultou de apurado debate da Proposta de Lei nº 111/XII (2º), veio reconhecer as profissões de Acupuntor, Fitoterapeuta, Homeopata, Medicina Tradicional Chinesa, Naturopata, Osteopata e Quiroprático (art 2º), bem como a sua autonomia técnica e deontológica no exercício dessa atividade (art.3º). O acesso a estas profissões dependerá da titularidade do grau de licenciado, a regulamentar (art.5º) e da obtenção de uma Cédula Profissional (art. 6º). Além de um seguro profissional de responsabilidade civil (art. 10º) para exercício da atividade, os locais de prestação devem estar sujeitos, com as devidas adaptações, ao 9 Moreira, M; Gonçalves, R. : «Medicina Tradicional, Complementar e Alternativa, no mundo. O Processo de Regulamentação em Portugal – o caso da Acupuntura», cit., pág. 80. http://www.ipnaturologia.com/sites/ default/files/A_MTCA_no_Mundo_O_proc_reg_Port_a_acupuntura. pdf (consultado em 23 de Dezembro de 2013). Scientific Journal of Natural Medicine | Vol. 1 9 disposto no Decreto lei nº 279/2009, de 6 de Outubro. Está, ainda, prevista a constituição de um orgão, não remunerado, de apoio ao Ministro da Saúde, para questões relativas ao exercício, formação , regulamentação e regulação destas profissões (arts. 17º e 18º). De salientar que a maioria destas matérias necessita de ser regulada em diplomas específicos pelo que esta Lei define, apenas, as linhas gerais de enquadramento da matéria, remetendo para diplomas específicos a sua regulamentação. Esta postura legislativa mereceu severas críticas nos trabalhos preparatórios que se refletiram, nomeadamente, na declaração de voto do Partido Comunista Português e do Bloco de Esquerda10. A CONSTITUIÇÃO DE UM DIREITO-DEVER À SAÚDE E OS VALORES CONFORMADORES DO DIREITO: A JUSTIÇA, A SEGURANÇA JURÍDICA E A CONFIANÇA LEGÍTIMA O direito de protecção da saúde revela-se, não só numa série de direitos dos doentes, nomeadamente no direito de escolha, direito à autonomia e informação, direito à privacidade, direito ao acompanhamento, etc. , mas, também, no direito de acesso à prevenção em matéria de saúde. Beneficiar de cuidados médicos é considerado, na União Europeia, como um direito de solidariedade (CFR CDFUE, art II95), que exige um elevado nível de 10 O BE absteve-se na votação da Lei pois considerou que o texto apesar de conter avanços importantes era, ainda, insuficiente. O BE reconheceu a importância desta Lei «ao consagrar a autonomia técnica e deontológica tal como estava expresso na Lei n.º 45/2003 ou de garantir um período de transição de cinco anos para que as escolas possam adaptar-se ao ensino superior, sendo estas, aliás, duas das propostas pelas quais o Bloco de Esquerda se bateu na discussão na especialidade da PL nº 111. No entanto – e para referir apenas alguns exemplos - discordamos que o conteúdo funcional das profissões ora regulamentadas seja retirada do anexo à Lei em favor de encaminhamento para portaria do Governo (Artigo 3ª), discordamos da obrigatoriedade de que o utente tenha que indicar por escrito quais os medicamentos, convencionais ou naturais, que está a utilizar (número 3 do Artigo 8º), discordamos que o Conselho Nacional Para as TNC passe a designar-se Conselho Consultivo e que os profissionais das TNC estejam em minoria (Artigos 16.º e 17.º)». Vide Declarações de Voto do Partido Comunista Português e do Bloco de Esquerda, de 29 de Julho de 2013. 10 proteção da saúde humana. «Trata-se de um direito estruturalmente dependente de recursos financeiros, mas impeditivo de uma liberdade de conformação política neutralizadora dos níveis de protecção já alcançados»11 . Prevê, o art. 64º da Constituição da República Portuguesa, que todos têm o direito à protecção da saúde e o dever de a defender e promover, realizado, em primeira linha, através de um serviço nacional de saúde universal e geral e, tendo em conta as condições económicas e sociais dos cidadãos, tendencialmente gratuito. No desenvolvimento das premissas constitucionais, a Lei de Bases da Saúde, Lei 48/90, de 24 de Agosto, veio definir como princípios gerais que a proteção da saúde constitui um direito efectivado pela responsabilidade conjunta de cidadãos, da sociedade e do Estado, em liberdade de procura e de prestação de cuidados, admitindo a prestação de cuidados de saúde por serviços e estabelecimentos privados, com ou sem fins lucrativos, sob fiscalização do Estado. Reconhece-se, nomeadamente, que «os cidadãos são os primeiros responsáveis pela sua própria saúde, individual e colectiva, tendo o dever de a defender e promover», sendo «reconhecida a liberdade de prestação de cuidados de saúde, com as limitações decorrentes da lei, designadamente no que respeita a exigências de qualificação profissional»12 . O reconhecimento da liberdade de escolha no acesso à rede nacional de prestação de cuidados de saúde ficou, contudo, sujeito às limitações decorrentes dos recursos existentes e da organização dos serviços 13. Apesar de a nossa Constituição ter como objecto a saúde pública e não a saúde privada, ou seja o Estado não pode exigir do cidadão o dever de cuidar da sua saúde, a não ser que o seu comportamen- 11 Gomes Canotilho, J.J. e Vital Moreira: Constituição da República Portuguesa, 4ª ed, Revista, Coimbra Editora, 2007, pág. 831. 12 N.º 1 e 3 da Base V, da Lei n.º 48/90, de 24 de Agosto. 13 N.º 5 da Base V, da Lei n.º 48/90, de 24 de Agosto. Scientific Journal of Natural Medicine | Vol. 1 to se reflita no estado sanitário da comunidade14 , sempre defenderemos que bastará um comportamento auto lesivo da saúde individual que acione o sistema de saúde público, para pôr em causa o direito à saúde colectivo. Dito de outra forma: o dever fundamental de defender e promover a saúde individual é , também, um dever de saúde pública, enquanto dever do cidadão se manter em boa forma e boa saúde, na medida necessária para não dispender recursos públicos. Numa sociedade em que os recursos já não são só escassos, mas começam a ser inexistentes, recai sobre cada cidadão o dever positivo de cuidar da sua saúde e de contribuir, também, para a saúde da comunidade, não só com comportamentos de acção (facer) como de omissão (abster-se de ter determinadas atitudes que possam comprometer a sua saúde, a dos outros cidadãos , bem como os recursos económicos existentes). Entendendo que a proteção da saúde constitui um direito, mas também um dever dos indivíduos e da comunidade, que se efectiva pela responsabilidade conjunta, a atitude que se espera do poder político e legislativo penderá pela conciliação destes direitos e deveres do cidadão para com a comunidade. Não sendo mais viável e tolerada a manutenção da velha concepção do Estado/Pai, o actual poder político e legislativo deverá adotar medidas de incentivo à responsabilização do cidadão e das instituições. Com esta contextualização compreende-se, com facilidade, as questões que se colocam aos decisores responsáveis pela política de saúde quanto à introdução de novas valências, no sistema. Segundo a OMS, para um governo de um país, a decisão de introdução da acupuntura num sistema baseado na medicina ocidental convencional levanta um número significativo de questões a ter em conta, designadamente relacionadas com o sistema de ensino/formação e investigação; com a estruturação do sistema de exames nacionais e do acesso à profissão; com a supervisão, monitorização e avaliação; e com a formação contínua e desenvol14 Vide referência a esta matéria e citações, nomeadamente do Tribunal Constitucional, em Miranda, J.; Medeiros, R.: Constituição da República Portuguesa, Tomo I, arts 1 a 79, 2ª ed. , Coimbra Editora, 2005, pág. 1320. vimento de carreiras (WHO, 1999) 15. Num país, como Portugal, a formação merece especial cuidado quando consegue responder às expectativas e motivações dos jovens à procura da sua formação inicial, como, também, àqueles que, já no mercado de trabalho, pretendem fazer a sua qualificação académica, a título de complemento de formação. O art. 73º da Constituição da República Portuguesa ao dispor o direito à educação e cultura estabelece um verdadeiro “direito social”. A educação, como processo de aquisição e transmissão de conhecimentos e valores, através da escola e de outros meios formativos, tem como objectivos contribuir para a igualdade de oportunidades e para a superação das desigualdades económicas, sociais e culturais (art .73º nº 2, 2ª parte). O direito de todos à educação e ao ensino não só envolve o Estado e o seu dever de proporcionar condições a uma educação formal, por via da escola e das instituições de ensino, mas também se revela como um direito-dever de todos os cidadãos se envolverem na formação para a garantia de um bem estar melhor. A educação envolve não só o Estado, mas, também, cada um de nós, individualmente, constituindo uma obrigação enquanto cidadãos, na construção da sociedade. A todos cabe um papel activo na educação, na construção da sociedade assente em valores constitucionais, mesmo que o Estado se revele ausente, em algum desses processos16 . Em sede própria, o Tribunal Constitucional já se pronunciou, por várias vezes e em diferentes Acór15 WHO - World Health Organization. (1999). WHO Guidelines on Basic Training and Safety in Acupunture. World Health Organization. http://apps.who.int/medicinedocs/en/d/Jwhozip56e/ onde se referem algumas orinetações no âmbito da formação em acupunctura (consultado em 20 de Dezembro de 2013). 16 Partindo da ideia que o homem necessita de uma certa segurança para planear e conformar a sua vida, o Estado de Direito tem como elementos constitutivos os princípios da segurança jurídica e da confiança do cidadão. Estes princípios apontam para a necessidade de uma conformação formal e material dos actos jurídicos. Gomes Canotilho, J. J.: Direito Constitucional, Almedina, Coimbra, 1991, pág. 376 . Scientific Journal of Natural Medicine | Vol. 1 11 dãos, sobre a importância da segurança jurídica, nas relações dos indivíduos. O princípio da confiança pressupõe uma determinada actuação do Estado que implica um mínimo de certeza no direito das pessoas e nas expectativas que lhe são criadas. Refere que «a liberdade do legislador tem de estar limitada ou comprimida pelo respeito dos princípios da confiança jurídica e da boa fé, corolários do princípio da segurança jurídica, que estão todos eles ínsitos na ideia de Estado de Direito democrático constitucionalmente consagrado no artigo 2.º da lei fundamental. E deles deriva a proibição de que, de forma arbitrária, intolerável e demasiado opressiva, segundo critérios economicistas (…)». Assim sendo, se há alterações legislativas que alterem os direitos dos indivíduos, «de forma arbitrária, intolerável e demasiado opressiva estar-se-á a violar os princípios citados da confiança jurídica e da boa fé, corolários da segurança jurídica, que são pilares estruturantes de um verdadeiro Estado de Direito democrático, proclamados ou ínsitos no artigo 2.º da Constituição, a par do princípio da dignidade da pessoa humana, expresso no artigo 1.º» 17. No mesmo sentido, o Supremo Tribunal de Justiça tem entendido, em muitas das suas decisões, que o princípio da confiança legítima está, «intrinsecamente ligado aos princípios da segurança jurídica e do Estado de Direito, tem como finalidade proteger prioritariamente as expectativas legítimas que nascem no cidadão (...)» 18. Por fim, por elucidativo, por isso o transcrevemos, o Acórdão do Tribunal Constitucional nº 383/2011, Processo nº 900 10, que, citando outros acórdãos, nomeadamente o Acórdão n.º 188/2009 (disponível em www. tribunalconstitucional.pt) refere que «para que haja lugar à tutela jurídico -constitucional da «confiança» é necessário, em primeiro lugar, que o Estado (mormente o legislador) tenha encetado comportamentos capazes de gerar nos privados «expectativas» 17 Acórdão n.º 3/2010, do Tribunal Constitucional, Processo n.º 176/09, de 6 de Janeiro de 2010: http://www.dgaep.gov.pt/upload/Legis/2010_ acordao_3_02_02.pdf (consultado em 25 de Dezembro de 2013). 18 Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça nº 506/10.3TBPNF-E.P1.S1 http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/8216f9 d8077a72a580257a2100318e69?OpenDocument (consultado em 25 de Dezembro de 2013). 12 de continuidade; depois, devem tais expectativas ser legítimas, justificadas e fundadas em boas razões; em terceiro lugar, devem os privados ter feito planos de vida tendo em conta a perspectiva de continuidade do «comportamento» estadual; por último, é ainda necessário que não ocorram razões de interesse público que justifiquem, em ponderação, a não continuidade do comportamento que gerou a situação de expectativa. Este princípio postula, pois, uma ideia de protecção da confiança dos cidadãos e da comunidade na estabilidade da ordem jurídica e na constância da actuação do Estado. Todavia, a confiança, aqui, não é uma confiança qualquer: se ela não reunir os quatro requisitos que acima ficaram formulados a Constituição não lhe atribui protecção»19 . Esta nova disciplina, que se pretende vir a implementar com a nova regulamentação da Lei 71/2013, de 2 de Setembro, atinge situações jurídicas e garantias geradas no passado e, relativamente às quais os cidadãos e as instituições têm a legítima expectativa de não serem perturbadas. E aqui, embora aceitemos a necessidade de alguma tolerância, quanto à necessidade de adequação das circunstâncias à força conformadora do Direito, temos como certo e necessário saber se a nova normação jurídica irá tocar «desporporcionada, desadequada e desnecessariamente dimensões importantes dos direitos fundamentais, ou se o legislador teve o cuidado de prever uma disciplina transitória justa para as situações em causa»20 . Como já referimos e defendemos em anteriores trabalhos, cabe ao Direito a importante tarefa de motor da evolução social e, até, de corte com a estabilidade retrógrada dos (maus) hábitos. O Direito terá de ser, também, um fator de mudança, evolução e progresso, por vezes impermeável a 19 Diário da República, 2.ª série , N.º 137 , de 19 de Julho de 2011, pág. 30037 http://dre.pt/pdf2sdip/2011/07/137000000/3003730040.pdf (consultado em 25 de Dezembro de 2013). Mutatis mutandis, vide Parecer da Procuradoria Geral da República nº PGRP00000610; Parecer: P00062199 PPA19940114006200 http://www.dgsi.pt/pgrp.nsf/0/6205e0 adf0e5847c80256617004206c4?OpenDocument (consultado em 25 de Dezembro de 2013). 20 Gomes Canotilho, J. J.: Direito Constitucional, cit., pág. 383. Scientific Journal of Natural Medicine | Vol. 1 alguma estabilidade retrógrada. Todavia, torna-se necessário defender uma solução de compromisso21 . Nas palavras de Gomes Canotilho «o princípio da protecção da confiança justificará que o Tribunal Constitucional controle a conformidade constitucional de uma lei, analisando se era ou não necessária e indispensável, uma disciplina transitória, ou se ela regulou de forma justa, adequada e proporcionada, os problemas resultantes da conexão de efeitos jurídicos da lei nova e pressupostos – posições, relações, situações- anteriores e subsistentes no momento da sua entrada em vigor» 22. Nas palavras de Manuel de Andrade, na apresentação do Código Civil, em 26 de Novembro de 1966: «o legislador, quer se trate do Governo, quer estejam em causa as assembleias legislativas, não pode comparar-se, no exercício da função que lhe é cometida, ao escultor a quem o Estado encomenda e paga uma obra de arte, para que, uma vez exposta a peça ao público, cada um de nós a interprete e a sinta a seu modo; nem a lei deve rebaixar-se à categoria de simples artigo pronto a ser digerido segundo as variáveis necessidades fisiológicas do organismo social»23 . Qualquer disposição legal proporciona múltiplos sentidos, mesmo que utilize expressões claras e simples. Dito de outra forma: por muito simples e clara que seja a norma, sempre se torna necessário um trabalho intelectual, por mais simples que seja, como «condição para extrair da matéria o espírito que a matéria encerra»24 . A sua aplicação aos casos concretos da vida pode apresentar dúvidas e dificuldade de entender o seu verdadeiro significado. Coloca-se aqui um desafio ao jurista, em matéria de interpretação. Interpretar significa traduzir de forma clara e inequívoca, o sentido e conteúdo do pensamento contido no texto. Ou seja: fixar o sentido e o alcance com que o texto deve valer, no caso de haver vários sentidos possíveis25 . Como refere Manuel de Andrade, na falta de dados precisos sobre a vontade real do legislador, o intérprete deverá partir do «pressuposto que o legislador, não sendo um literato ou um purista da língua, e nem sempre conseguindo (como nenhum dos pobres mortais) evitar o uso das expressões ambíguas, é pessoa capaz de exprimir convenientemente o seu pensamento, por saber redigir um texto com a necessária correção» 26. É notória a preocupação, do poder governativo, pela salvaguarda do interesse público, da saúde pública e a sua abertura para que a que se tenha conseguido um diploma de maior consenso. Nesse interesse público estarão, com toda a certeza, a estabilidade social, o crescimento económico, o equilíbrio e ajustamento dos agentes económicos. Na saúde pública estará, não só o dever do Estado regular e controlar os padrões de eficiência e qualidade, mas também a mobilização da sociedade para uma auto responsabilização de todos os cidadãos na prevenção de doenças, libertando o Estado do jugo e da árdua tarefa de Estado–Pai. É importante que a sociedade assuma, como uma obrigação, o seu papel activo na construção da saúde, não delegando essa tarefa, exclusivamente, no Estado. 21 Teremos, aqui, algumas soluções de compromisso: «… entrada gradual em vigor da nova lei; dilatação da vacatio legis; disciplinas específicas para situações, posições ou relações jurídicas imbricadas com as «leis velhas» e as «leis novas»». Gomes Canotilho, J. J.: Direito Constitucional, cit., pág. 376 . 22 Gomes Canotilho, J. J.: Direito Constitucional, cit., pág. 384 . 23 Antunes Varela, J. M.: «Do projeto ao Código Civil», BMJ, nº 161, pág. 21. 24 Oliveira Ascenção, J.: O Direito. Introdução e Teoria Geral, 13ª edição, Almedina, 2011, pág. 391. 25 ão absurdas as orientações históricas surgidas no tempo da Revolução Francesa que, desconfiando da capacidade do intérprete, pretendiam excluir a função interpretativa, para que o arbítrio do intérprete não ofuscasse a segurança da lei revolucionária. 26 Antunes Varela, J. M.: «Do projeto ao Código Civil», cit., pág. 25. Scientific Journal of Natural Medicine | Vol. 1 13 A Biomedicalização da saúde e a abertura para um novo paradigma não nos pode ser indiferente todo o trabalho realizado pela sociedade, nomeadamente por alguns dos seus agentes, para atenuar estes efeitos. A saúde tem-se transformado numa complexa teia de interesses que, por vezes, ou se encontram ou conflituam, transformando-se num bem valioso muito apreciado e procurado. O culto da saúde, a crença na saúde perfeita, na beleza eterna, a informação sobre problemas inerentes à saúde, a longevidade, a qualidade de vida, são motivos suficientes para que, cada um de nós se sensibilize para os perigos da medicalização da sociedade e concretize a verdadeira autoresponsabilização individual. As novas forças que surgem, quer no âmbito da indústria farmacêutica, dos equipamentos médicos, das seguradoras, das entidades privadas de saúde, fazem nascer uma nova forma de poder, quase autolegitimado com pretensão de verdade sobre a vida e a saúde. Esta realidade leva a repensar os atuais paradigmas. O Estado de Direito tem de se construir a todo o momento e a sociedade tem de ser parte dessa construção, reservando ao Estado, o garante do normal funcionamento das instituições. Foi isso que se verificou ao longo destes anos em matéria das TNC: uma sociedade construtiva, autoregulamentadora e que muito tem contribuido para a prevenção das doenças e bem estar dos cidadãos. Actualmente, os cidadãos começam a sentir-se mais responsáveis pela sua saúde, pela sua vida e pelos cuidados a prestar ao seu corpo e mente, como forma de atingirem a felicidade e se afastarem da sua instrumentalização pelas forças do biopoder. O uso crescente das TNC demonstram essa tendência, quer como opção pontual ou esporádica, quer como opção de vida. Numa sociedade em que os recursos financeiros são, cada vez mais escassos, o envelhecimento da população é patente, a resistência aos antibióticos e o seu malefício, em determinadas situações é uma evidência, as doenças crónicas, a morbilidade da população, cada vez mais depressiva é uma realidade, E esta é uma realidade sobre a qual o legislador terá de refletir. Qualquer regulamentação, no âmbito da atual lei das TNC, deverá ter em conta que: 14 a) A Medicina Tradicional, Complementar e Alternativa (CAM) assume, pelas suas teorias e práticas de intervenção, uma grande importância na provisão dos cuidados de saúde dos países mais esclarecidos em matéria de cuidados de saúde, quer pela sua eficácia, quer pela sua adequabilidade aos parcos recursos com que, atualmente, vivemos. b) Os sistemas associados às CAM têm-se revelado muito eficazes na promoção da saúde e na dinamização da economia, dado os seus baixos custos de investimento e manutenção. c) O direito à saúde é, também, um direito de solidariedade, em que todo o cidadão é um agente activo, tem o dever de cuidar da sua saúde, não prejudicar a saúde de terceiros e contribuir, no que estiver ao seu alcance, para gerar saúde aos demais (nomeadamente através de disponibilização de serviços, conhecimento, informação, etc, sempre que possíveis), principalmente numa sociedade em que os recursos são, cada vez menores ou inexistentes. d) Também a Educação e, naturalmente, a formação como parte integrante desta, constitui um verdadeiro “direito social”. A todos cabe um papel ativo no processo da educação, mesmo que o Estado se revele ausente, em algum desses momentos. e) As instituições existem para criar estabilidade e ordem na comunidade. Cabe ao Direito acrescentar postulado da Justiça e da Segurança. Para tal, as normas devem ser formuladas de forma clara, que não deixem margem a ambiguidade de interpretação nem a lacunas. A tutela das legítimas expectativas de cada um, Scientific Journal of Natural Medicine | Vol. 1 para governar a sua vida, impõe, ao Direito, a segurança como “certeza jurídica”. O princípio do Estado de Direito exige muito mais do que a defesa dos direitos e liberdades contra o Estado mas, também, a defesa dos mesmos contra quaisquer poderes sociais de facto. f) A vida jurídica pressupõe, antes de mais, um grau de estabilidade mas, também, de previsibilidade. Nisto se traduz a tutela das legítimas expectativas dos indivíduos. A condescêncencia legislativa préfigura a permissividade e necessidade de ajustamento social. Na sociedade, a regulação das condutas deve permitir a informação antecipada do que é permitido e a antecedência dos cenários proibidos, para dar a possibilidade, às pessoas, de se ajustarem ao Direito. O princípio da segurança jurídica ou da certeza jurídica constitui um princípio geral do Estado de Direito Democrático e decorre do próprio art. 2º da Constituição da República Portuguesa. g) Inerente ao princípio da segurança jurídica está, o não menos importante, princípio da confiança legítima. Embora não tenha consagração expressa no texto constitucional, este princípio decorre do Estado de Direito. A necessidade que cada um de nós tem em saber com o que conta, em poder orientar-se pelos padrões de confiança na convivência humana, em ver convalidadas as suas legítimas expectativas e poder pautar-se pela boa fé das relações sociais, constitui o verdadeiro fundamento do mundo jurídico. h) Como já referimos e defendemos em anteriores trabalhos, cabe ao Direito, também, a importante tarefa de motor da evolução social constituindo um factor de mudança, evolução e progresso, no respeito pelo princípio da proporcionalidade, adequada e exigível. A vocação do Direito postula para o futuro, estando implícita a ideia, em cada preceito legal, de “vigorar para a frente”. A realização do direito à saúde constitui, atualmente, um verdadeiro desafio à conceção de saúde e doença, quer na sua vertente holística, quer na vertente convencional. Será, aqui, que o Direito se revelará, na sua plenitude, como fator de boa evolução e convalidação dos direitos do indivíduo. PALAVRAS-CHAVE: Direito, direito à saúde, consentimento informado e esclarecido, terapêuticas não convencionais, regulamentação, legislação, medicalização da saúde, homo medicus, saúde persecutória. Scientific Journal of Natural Medicine | Vol. 1 15 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS1 - 2: • Antunes Varela, J. M.: «Do projeto ao Código Civil», BMJ, nº 161 • Gomes Canotilho, J. J.: Direito Constitucional, Almedina, Coimbra, 1991 • Gomes Canotilho, J.J. e Vital Moreira: Constituição da República Portuguesa, 4ª ed, Revista, Coimbra Editora, 2007 • Miranda, J.; Medeiros, R.: Constituição da República Portuguesa, Tomo I, arts 1 a 79, 2ª ed. , Coimbra Editora, 2005 • Oliveira Ascenção, J.: O Direito. Introdução e Teoria Geral, 13ª edição, Almedina, 2011 REFERÊNCIAS ELETRÓNICAS: • http://www.who.int/medicines/technical_briefing/tbs/Technical_briefing_11_10.pdf (consulta em 17 de Dezembro de 2013) • http://www2.paho.org/hq/dmdocuments/2009/CE144-inf-05-A-e.pdf (consultado em 17 de Dezembro de 2013) • http://www.camdoc.eu/Survey/Introduction.html (consultado em 17 de Dezembro de 2013) • http://camdoc.eu/CAM_for_Europe/CAM_Conference_2012.html (consultado em 17 de Dezembro de 2013) • http://uit.no/Content/321567/Deliverable%209%20-%20Report%20No.1%20CAM%20in%20European%20countries%20-%20Webb.pdf (consultado em 17 de Dezembro de 2013) • Moreira, M. e Gonçalves, R: «Medicina Tradicional, Complementar e Alternativa, no mundo. O Processo de Regulamentação em Portugal – o caso da Acupuntura», 2011, http://www.ipnaturologia.com/ sites/default/files/A_MTCA_no_Mundo_O_proc_reg_Port_a_acupuntura.pdf (consultado em 23 de Dezembro de 2013) • http://www.google.pt/url?sa=t&rct=j&q=&esrc=s&source=web&cd=5&ved=0CEkQFjAE&url= http%3A%2F%2Faphomeopatia.weebly.com%2Fuploads%2F3%2F4%2F2%2F5%2F3425631%2F be_declaracao_de_voto.pdf&ei=L0bdUtyWA8rH7AbW44CYCg&usg=AFQjCNGpO3OUS_Wog3tg8 O8sZslCKLCuAQ&bvm=bv.59568121,d.ZGU • http://apps.who.int/medicinedocs/en/d/Jwhozip56e/ onde se referem algumas orinetações no âmbito da formação em acupunctura (consultado em 20 de Dezembro de 2013) • http://www.dgaep.gov.pt/upload/Legis/2010_acordao_3_02_02.pdf (consultado em 25 de Dezembro de 2013) • http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/8216f9d8077a72a580257a2100318e 69?OpenDocument (consultado em 25 de Dezembro de 2013) • Diário da República, 2.ª série , N.º 137 , de 19 de Julho de 2011, pág. 30037 http://dre.pt/pdf2sdip/2011/07/137000000/3003730040.pdf (consultado em 25 de Dezembro de 2013) • Parecer da Procuradoria Geral da República nº PGRP00000610; Parecer: P00062199 PPA19940114006200 http://www.dgsi.pt/pgrp.nsf/0/6205e0adf0e5847c80256617004206c4?OpenDocument (consultado em 25 de Dezembro de 2013) 1 Optou-se, neste texto, excecionalmente e por ser o primeiro número da revista, a fazer uma citação formal tradicionalmente usada, na área jurídica e não aquela que foi sugerida, pela revista, nas normas de publicação. 2 Este artigo inclui, de forma aleatória, parte do parecer entregue à Comissão de Saúde e ao Grupo de Trabalho que foi constituído, no âmbito das TNC, para discussão da Proposta de Lei nº 111 e que abordava a omissão da Proposta sobre o tratamento legal a dar às atuais instituições de formação. 16 Scientific Journal of Natural Medicine | Vol. 1 o papel da ACUPUNTURA no tratamento da artrite reumatóide Uma Revisão Bibliográfica Rui M. Gonçalves* [email protected] Resumo: A artrite reumatoide (AR) é uma doença inflamatória crónica e progressiva com um componente auto-imune marcado caracterizada por dor poliarticular e incapacidade funcional. Dada a complexidade do arsenal terapêutico utilizado na AR, a utilização de terapias não-farmacológicas incluindo a acupuntura apresenta-se como bastante atraente. Ainda que existam bastantes estudos relativos à utilização da acupuntura no tratamento de patologia osteo-articular, os seus efeitos em patologias inflamatórias são ainda pouco caracterizados. Neste trabalho foi realizada uma pesquisa abrangente em bases de investigação científica modo a atualizar a evidência clínica sobre os efeitos da acupuntura na artrite reumatóide. Concluiu-se a existência de resultados promissores no que diz respeito à eficácia da acupuntura no tratamento desta doença utilizando quer instrumentos objetivos quer subjetivos de medição. Foi comparada a eficácia da acupuntura clássica e da eletroacupuntura com ligeiro benefício para a última. Ainda assim, alguns estudos mostraram resultados contraditórios que levam a que no geral se possa considerar as evidências ainda escassas e os benefícios a longo prazo incertos. Não obstante, acredita-se que a ausência de demonstração sólida seja resultado de inconsistência metodológica entre estudos resultante da própria especificidade do tratamento com acupuntura e são apontadas formas de mitigar estas limitações. * Síntese curricular: Licenciado em Bioquímica pela Faculdade de Ciências da Universidade do Porto. Mestre em Tecnologia Ciência e Segurança Alimentar pela Escola de Engenharia da Universidade do Minho e pela Faculdade de Ciências da Universidade do Porto. Doutor em Química pela Faculdade de Ciências da Universidade do Porto. Investigador na área da Química de Compostos Fenólicos e seu efeito nutricional. Licenciado em Ciências Básicas da Medicina pela Escola de Ciências da Saúde da Universidade do Minho. Diplomado em Medicina Chinesa pelo Instituto Português de Naturologia. Formador na área da Medicina Chinesa. Scientific Journal of Natural Medicine | Vol. 1 17 Artrite reumatoide e o seu impacto social A dor e a incapacidade funcional são sintomas característicos da artrite reumatóide (AR), uma doença inflamatória crónica e progressiva. A AR é caracterizada por inflamação sinovial que leva à destruição das articulações, resultando em substanciais deformações a longo prazo bem como numa redução quer da esperança quer da qualidade de vida. (Epstein e Harris 1990; Testa e Simonson 1996). As causas são ainda desconhecidas mas existe um componente genético predisponente que gera doença na presença de factores ambientais. A artrite reumatóide é considerada uma doença auto-imune resultando sobretudo da ação de IgG auto-reactivas. A exposição prolongada a um antigénio produz auto-anticorpos que atacam tecido sinovial formando-se complexos imunes que perpetuam a inflamação. (Majithia e Geraci 2007) Para além dos custos em morbilidade e mortalidade, o custo financeiro da AR não é desprezável. Esta patologia importa à sociedade um marcado custo económico que foi estimado em quase 6000 dólares americanos por ano distribuídos por custos com medicação, visitas médica e uma parte maioritária resultante da necessidade de internamento. Este custo social é ainda incrementado pelas ausências laborais dos doentes com AR que se cifram entre 2,3 e 3 dias/ano. (Cooper 2000) Os fármacos de primeira escolha para o tratamento da AR são os antirreumáticos modificadores da doença (disease-modifying antirheumatic drugs -DMARDs), um grupo de heterogéneo de fármacos agrupados por conveniência. Os principais agentes usados são o metotrexato, a sulfasalazina, a leflunomida, o aurotiomalato de sódio e a ciclosporina. Todos apresentam efeitos laterais não desprezáveis e em alguns doentes a resposta ao tratamento é reduzida. Uma outra categoria de fármacos com elevada eficácia é a dos agentes biológicos como os bloqueadores do fa- 18 tor de necrose tumoral, o infliximab, rituximab ou o abatacept; estes ainda que eficazes apresentam custos financeiros marcados limitando a sua aplicação em larga escala. No caso específico de Portugal, a diminuição geral da atividade do sistema imunitário predispondo a tuberculose pulmonar pode limitar a sua aplicação. Uma vez que a inflamação é um fator central na evolução da AR os anti-inflamatórios, AINES, inibidores da COX-2 e o glucocorticoides também têm um papel na gestão da patologia. A cirurgia é reservada, em centros diferenciados, para articulações severamente danificadas. (Scott, Wolfe et al. 2010) Dada a complexidade do arsenal terapêutico utilizado na AR, a utilização de terapias não-farmacológicas apresenta-se como bastante atraente. Na verdade um número marcado de doentes recorre, por indicação própria, a terapêuticas complementares como a acupuntura e homeopatia. (Struthers, Scott et al. 1983) A AR não é caso único uma vez que recentemente, as terapias complementares e alternativas, destacando-se a acupuntura, têm recebido forte publicidade no tratamento da AR e de outras patologias em que a dor é um factor central. A acupuntura e o controlo da patologia Músculo-Esquelética Nos últimos anos, têm vindo a aumentar o número de estudos que pretendem reinterpretar a acupuntura tradicional, integrada no quadro conceptual da Medicina Tradicional Chinesa, no âmbito da medicina científica ocidental. A acupunctura é frequentemente utilizada para o tratamento de condições associadas com dor e é apoiada por indícios dos seus mecanismos biológicos (Han e Terenius 1982; Pariente, White et al. 2005). Atualmente acredita-se que a acupuntura modula a transmissão da dor e da resposta à dor por ativação do sistema nociceptivo endógeno. Foi já demonstrado que a puntura com agulha de acupuntura modula a libertação de endorfinas, encefalinas e vários outros neuropeptídeos. Scientific Journal of Natural Medicine | Vol. 1 O modelo científico ocidental para a explicação dos efeitos da acupunctura é baseado na teoria de gate control em que acupunctura atua estimulando a libertação de neurotransmissores que agem na região dorsal do encéfalo bloqueando de forma direta a entrada de estímulos dolorosos através das fibras C pela libertação de encefalinas (Efthimiou e Kukar 2010). Estas substâncias provocam analgesia por diminuição direta da dor e por modulação do stress. Estudos em humanos e em animais demonstraram que o efeito da acupuntura na analgesia é reversível pela naloxona. (Han e Terenius 1982) A reversibilidade do efeito da acupuntura por este antagonista dos opióides faz supor que os peptídeos opióides endógeno têm um papel fundamental no efeito analgésico demonstrado para a acupuntura. Os ensaios clínicos randomizados demonstraram que a acupuntura é significativamente melhor do que o tratamento controlo para a osteoartrose do joelho. (Christensen, Iuhl et al. 1992; Berman, Lao et al. 1995) Verificou-se ainda que a acupuntura é tão eficaz como os esteróides intra-articulares na osteoartose da anca. (McIndoe, Young et al. 1995) Em revisões sistemáticas foi possível demonstrar a eficácia da acupuntura no tratamento de cefaleias e cervicalgias generalizadas quando comparada com o placebo. (Patel, Gutzwiller et al. 1989). Assim, pode constatar-se que para estas patologias associadas a dor não inflamatória existem marcadas evidências da eficácia da acupuntura (Ernst e White 1998). Assim, e apesar de a acupunctura ser amplamente utilizada para o alívio da dor em várias patologias comuns, incluindo a osteo-artrite do joelho (Williamson, Wyatt et al. 2007); dor aguda pós-operatória(Sun, Gan et al. 2008); distúrbios músculo-esqueléticos degenerativos váriso (Bullock, Pheley et al. 1999); as evidências do seu efeito no tratamento da doença inflamatória, em particular da artrite reumatóide são ainda escassas. Tendo em conta as dificuldades de aceitação da acupunctura como uma parte integrante dos siste- mas de saúde ocidentais têm vindo a ser realizados estudos acerca da sua aplicabilidade no tratamento da artrite reumatóide um dos casos estudados. A acupuntura e a Reumatologia Uma revisão bibliográfica mostra que foram publicados na última década cerca de 30 estudos de revisão sistemática referentes à utilização de acupunctura no tratamento de condições reumáticas. (Linde, Vickers et al. 2001) Enquanto, para a maioria das condições reumáticas os estudos parecem ser conclusivos e robustos no caso da artrite reumatóide ainda não é possível, com confiança substancial, dizer o mesmo. (Ernst e Lee 2010) Assim torna-se premente a realização de estudos sobre o tema. Avaliação Laboratorial e Clínica da Artrite Reumatóide Diversos estudos foram já realizados relativamente à aplicação de acupunctura como um tratamento viável para a artrite reumatóide sobretudo quando conjugado com a abordagem convencional da Medicina Alopática. Assim existem três grupos de critérios que são normalmente estudados nesta patologia: a) Parâmetros analíticos: o diagnóstico e o acompanhamento da evolução da progressão da Artrite Reumatóide fazem uso de análises à bioquímica serológica dos pacientes. Os testes mais comuns são à proteína C reactiva (pCr); factor reumatóide (FR); velocidade de sedimentação eritrocitária e os anticorpos antinucleares. Diversos estudos demonstram a sua eficácia como elementos preditivos de Artrite Reumatóide o que os torna largamente utilizados e recomendados (Meyer, Combe et al. 1997; Emery, Gabay et al. 2007; de Malmanche e Reeves 2008). Scientific Journal of Natural Medicine | Vol. 1 19 b) Avaliações médicas de progressão: contagem de articulações dolorosas, contagem de articulações edemaciadas, avaliação da rigidez matinal, contagem da actividade de doença (Disease Activity Score). c) Avaliação da qualidade de vida: em regime de auto-avaliação guiada re d) correndo a versões locais e traduzidas do SF 36, ou de outros questionários. Com base nestes parâmetros tem vindo a ser possível de momento chegar a algumas conclusões acerca quer da aplicabilidade quer dos mecanismos de ação da acupunctura. Revisão de Trabalhos Científicos Foi realizada uma pesquisa abrangente em bases de dados de artigos científicos de modo a actualizar a evidência a evidência clínica atual sobre os efeitos da acupuntura na artrite reumatóide. A revisão incluiu ensaios clínicos nos quais a dor, o número de articulações dolorosas ou uma escala analógica de dor eram as variáveis principais em estudo. Também foram avaliados os efeitos da acupuntura sobre a rigidez matinal, velocidade de sedimentação eritrocitária e a proteína C-reativa. Nove estudos apresentaram qualidade científica superior num total de 597 indivíduos estudados. Quatro destes ensaios apresentavam um controlo com placebo enquanto os outros cinco foram conduzidos por comparação ativa. A duração média de estudo foi de 11 semanas. A média (e o desvio padrão) de pontes de acupuntura e de sessões de tratamento foram 11 (8) e 42 (62), respetivamente. O tempo médio de retenção de agulha de acupuntura foi de 24 minutos. Oito ensaios recorreram a acupuntura clássica (AC) (David, Townsend et al. 1999; Zhou e Zhu 2000; Cui, Guo et al. 2001; Jiang e Fan 2003; Liu, Liu et al. 2003; Tam, Leung et al. 2007; Wang, de Pablo et al. 2008; Zanette, Born et al. 2008); dois fizeram uso de eletroacu- 20 puntura (EAC) (Man e Baragar 1974; Tam, Leung et al. 2007) e um dos estudos recorreu a ambas as técnicas de acupuntura (Tam, Leung et al. 2007) Quatro ensaios fizeram tentativas de utilização de acupuntura placebo, recorrendo a acupuntura “simulada” com agulhas de acupuntura colocadas de forma incorreta (puntura fora dos pontos clássicos de acupuntura e/ou em profundidades inadequadas). (Man e Baragar 1974; David, Townsend et al. 1999; Tam, Leung et al. 2007; Zanette, Born et al. 2008) Os outros cinco, curiosamente todos publicados na China, usaram uma variedade de intervenções ativas nos grupos de controlo, incluindo o metotrexato, tópica pomada Votalin, e as drogas anti-inflamatórias não-esteróides. Ensaios com controlo por placebo Os quatro estudos controlados com placebo envolveram 160 participantes. Desses, dois têm qualidade superior e os outros dois são de qualidade razoável e todos utilizam a acupuntura simulada como termo de comparação com a acupuntura clássica ou a eletro-acupuntura. De notar desde logo que a utilização de acupuntura “simulada” é ainda controversa uma vez que não foram ainda determinadas quais as mais adequadas condições para avaliar o efeito placebo da acupuntura. (Vincent e Lewith 1995) O primeiro estudo foi um ensaio duplamente cego randomizado utilizando um desenho paralelo com 20 participantes com AR seropositiva. (Man e Baragar 1974) Os pacientes foram divididos aleatoriamente em grupos de eletroacupuntura ou controlo. A dor foi avaliada com uma escala de dor às 0, 4 e 24 horas após o tratamento. Os autores relataram que a EA teve uma diminuição significativa moderada ou acentuada na dor no joelho em 80% dos participantes (60% e 20%, respetivamente) em comparação com nenhuma redução da dor no grupo de controlo. Aos três meses, 70% dos participantes do grupo EA relataram uma diminuição mínima ou moderada significativa da dor Scientific Journal of Natural Medicine | Vol. 1 em comparação com nenhuma redução da dor no grupo de controlo. Um estudo controlado por placebo, duplamente-cego randomizado conduzido por David (David, Townsend et al. 1999) utilizou um desenho experimental cruzado de seis semanas comparando acupuntura tradicional com acupuntura simulada em 64 pacientes. Foi realizado um total de cinco sessões semanais, depois de seis semanas de washout, os pacientes foram cruzados para o outro grupo de intervenção (acupuntura ou controlo) por mais cinco semanas. A contagem de articulações dolorosas, escala de dor, avaliação global do médico e do doente, o DAS (Disease Activity Score - uma medida do estado da AR em fase ativa ou latente), e os parâmetros analíticos velocidade de sedimentação e proteína C reativa foram avaliados no inicio e no final das intervenções. Os autores não encontraram diferenças significativas entre o grupo intervencionado e o controlo no final dos tratamentos ou após o follow-up. Um primeiro estudo foi realizado em 36 pacientes para comparar o efeito de acupunctura (AC), electro acupunctura (EAC) e acupunctura simulada (SAC) em pacientes com artrite reumatoide (Tam, Leung et al. 2007). Após 10 semanas de estudo verificou-se que o score de dor (escala visual analógica) se mantinha inalterado em todos os três grupos. Existiu uma diminuição significativa no número de articulações para os grupos EAC (5.5 vs 0.5) e AC (4 vs 0,5) em relação ao controlo. A avaliação global pelo médico da atividade da doença diminui para o grupo EAC e a avaliação global pelo doente diminuiu para o grupo AC. Todos os parâmetros avaliados, exceto a avaliação global pelo doente permaneceram inalterados para o grupo SAC. Neste estudo foram ainda avaliados os efeitos de AC, EAC e SAC nos parâmetros analíticos dos doentes. Verificou-se uma variação significativa antes e após os tratamentos com AC e EAC na proteína C reativa, curiosamente este marcador inflamatório aumentou ainda que os pa- râmetros clínicos de inflamação com as articulações edemaciadas e o DAS28 tivessem diminuído. Uma possível explicação para este facto é a ação da acupunctura ao nível da porção basal do encéfalo anteriormente referida que bloqueia a dor de uma forma não local. No que se refere ao efeito de electro estimulação o grupo EAC atingiu os valores máximos de analgesia com menos número de sessões do que o grupo AC ainda que não houvesse diferenças estatisticamente significativas nos valores absolutos de analgesia. O estudo do efeito da punctura do Ponto Zu San Li (Estômago 36) na libertação de mediadores inflamatórios demonstrou que este ponto reduz significativamente a libertação de mediadores inflamatórios como IL-6, TNF-α, IFN-γ e os níveis de IgG e IgM, indicando uma redução global da resposta inflamatória (Yim 2007). Esta redução dos parâmetros inflamatórios ajuda ainda a explicar os resultados obtidos no estudo de Tam e colaboradores (Tam, Leung et al. 2007) anteriormente referido. Num outro estudo clinico recente de alta qualidade foi o conduzido por Zanette (Zanette, Born et al. 2008) Foi um estudo piloto, randomizado e duplamente cego com base em 40 pacientes. Estes foram recrutados com base no score da ACR, uma avaliação multiparamétrica recorrendo às varíáveis analíticas, à avaliação médica e do doente e à avaliação geral da qualidade de vida que descrevemos anteriormente (Felson, Anderson et al. 1995). Os doentes foram depois separados aleatoriamente em dois grupos que receberam tratamento por acupunctura (AC) segundo um protocolo padrão idêntico em todos os doentes, ou uma forma de acupunctura simulada (SAC). Todos os participantes receberam um total de 10 sessões, duas vezes por semana em cinco semanas consecutivas. O resultado primário foi a melhoria no número de articulações dolorosas em comparação com o grupo controlo (8.35 vs 2.45). Não existiu, durante a Scientific Journal of Natural Medicine | Vol. 1 21 intervenção (cinco e dez sessões), uma diferença significativa nos valores do score da ACR. Curiosamente existiu uma tendência (estatisticamente não significativa) para uma melhoria nos critérios da ACR quando comprados os grupos AC e SAC ao fim de um mês de follow up. Outros resultados relevantes foram uma melhoria significativa da avaliação global feita pelo médico e pelo doente no grupo AC em comparação com o grupo de controlo ainda que não existissem diferenças marcadas nos parâmetros laboratoriais ou clínicos. Por outro lado, apenas os pacientes do grupo AC apresentava melhorias nas variáveis do DAS, do Health Assessment Questionnaire (uma medida geral da qualidade de vida e da saúde do doente), da rigidez matinal e da avaliação global do médico e do doente quando comparado o pré e o pós tratamento. Ainda que não tenham existido marcadas diferenças entre os resultados obtidos para o número de doentes com diminuição dos critérios ACR entre os grupos AC e controlo, os autores atribuem este resultado a uma amostra de pequenas dimensões, a uma seleção de doentes que poderá ter erros, ao tipo de protocolo de acupuntura aplicado e a dificuldades em estabelecer um grupo placebo inócuo e de confiança para os estudos com acupuntura. Ensaios com controlo activo Desde 2000, cinco ensaios com controlo ativo utilizando fármacos foram realizados incluindo um total de 468 indivíduos. (Zhou e Zhu 2000; Cui, Guo et al. 2001; Wang 2002; Jiang e Fan 2003; Liu, Liu et al. 2003).A duração média de estudo foi de 7 semanas, com 14-180 sessões. O número de pontos de acupuntura foi de 8 a 24. Em dois estudos os grupos controlo foram tratados com indometacina (25 mg três vezes ao dia durante 4 semanas). (Zhou e Zhu 2000; Jiang e Fan 2003) (Jiang & Fan, 2003; Zhou e Zhu, 2000), um estudo utilizou a indometacina (50 mg três vezes ao dia) mais triptolida (20 mg três vezes ao dia) por três semanas (Wang 2002), um estudo utilizou me- 22 totrexato (5 mg/semana 1, 10 mg/semana 2, 15 mg/semana 3) e diclofenac (20 mg duas vezes por dia durante 3 meses) (Liu, Liu et al. 2003), e um estudo comparou a acupuntura com uma pomada tópica de diclofenac (Cui, Guo et al. 2001) Todas as cinco publicações relataram consistentemente que o tratamento com acupuntura foi associado a uma redução significativa da dor existindo uma diminuição média das articulações dolorosas de -3,9 em comparação com os controlos. Três estudos relataram uma redução significativa na rigidez matinal (variação média: - 29 minutos) em comparação com os controlos. (Zhou e Zhu 2000; Jiang e Fan 2003; Liu, Liu et al. 2003) Para além disso, três estudos constataram uma redução na velocidade de sedimentação eritrocitária (variação média: - 5.5 mm / hora) (Zhou e Zhu 2000; Jiang e Fan 2003; Liu, Liu et al. 2003) Dois relataram uma redução da proteína C reativa (: -3,0 mg / dl) (Zhou e Zhu 2000; Jiang e Fan 2003), mas apenas um mostrou uma diferença estatisticamente significativa para a VS e pCr em simultâneo (Jiang e Fan 2003) Conclusão Coletivamente, sete estudos relataram uma diminuição da dor nos doentes submetidos a tratamentos com acupuntura em comparação com os controles, e cinco apresentaram uma melhora estatisticamente significativa (Zhou e Zhu 2000; Cui, Guo et al. 2001; Jiang e Fan 2003; Liu, Liu et al. 2003; Tam, Leung et al. 2007) . As alterações no número médio (ou mediano) de articulações dolorosas nos doentes submetidos a acupuntura variaram entre 1,5 e 6,5. Além disso, quatro estudos relataram uma redução na rigidez matinal (diminuição média de 29 minutos), esta tendência, ainda que existente não foi considerada estatisticamente significativa pelos autores. (Zhou e Zhu 2000; Jiang e Fan 2003; Liu, Liu et al. 2003; Zanette, Born et al. 2008) No que diz respeito aos marcadores inflamatórios, cinco Scientific Journal of Natural Medicine | Vol. 1 estudos demonstraram uma redução na velocidade de sedimentação eritrocitária (média -3.9 mm/ hora) (Zhou e Zhu 2000; Jiang e Fan 2003; Liu, Liu et al. 2003; Tam, Leung et al. 2007; Zanette, Born et al. 2008) e três identificaram uma redução proteína C-reactiva (média de -2,9 mg / dl) (Zhou e Zhu 2000; Jiang e Fan 2003; Zanette, Born et al. 2008) , um dos estudos demonstrou uma diferença estatisticamente significativa tanto para velocidade de sedimentação eritrócitária e proteína C-reativa. (Jiang e Fan 2003). Foram avaliados estudos realizados na últimas três décadas sobre a acupuntura aplicada ao tratamento da AR quer em população ocidental quer em população chinesa. Ainda que a maioria dos estudos apresentem de forma marcada resultados favoráveis (5 ensaios com controlo ativo em um controlo por placebo) ainda restam algumas dúvidas acerca da eficácia da acupuntura no tratamento da AR sobretudo nos ensaios controlados por placebo. Apesar de um ensaio clínico randomizado inicial ter relatado que, em comparação com a acupuntura simulada, uma única sessão de tratamento com electroacupuntura melhora a significativamente a dor do joelho em 20 pacientes com artrite reumatoide seropositiva (Man e Baragar 1974), um outro estudo randomizado cruzado realizado posteriormente com 56 pacientes não detetou alterações significativas entre a acupuntura clássica e a acupuntura simulada quer no que diz respeito à dor quer à inflamação. (David, Townsend et al. 1999). Uma revisão sistemática recente que analisou em profundida e estes dois ensaios concluiu que a evidência de ambos foi limitada por considerações metodológicas, como o tipo de acupuntura (acupuntura versus eletroacupuntura), o local da intervenção e o pequeno tamanho da amostra dos estudos incluídos. (Casimiro, Barnsley et al. 2005) Todos os cinco ensaios com comparação ativa concluíram que o tratamento com acupuntura foi associado a uma diminuição significativa na contagem de articulações dolorosas e foi eficaz no alívio de outros sintomas da AR em comparação com os controlos. No entanto, as limitações metodológicas destes estudos incluem intervenções de controlo inadequadas (não comparáveis), sem intervenções duplamente-cegas, descrição inadequada do processo de randomização, e escasso uso de medidas estatísticas de validação de resultados. Estimativas quantitativas precisas dos efeitos do tratamento não foram obtidos como resultado da heterogeneidade dos estudos, bem como pelas diferenças nas intervenções de acupuntura, incluindo dose / intensidade e duração do tratamento. Por exemplo, o número de pontos de acupuntura variou de 1 a 24, o tempo de inserção da agulha variou entre 4 e 40 minutos, e o número de sessões variou de 1 a 180. Por todas estas razões, as evidências relativas à eficácia da acupuntura para alívio da dor na AR é são ainda modestas e incertas, e os seus benefícios a longo prazo permanecem envoltos em dúvida. Uma vez que é difícil comparar ensaios divergentes e há uma falta de protocolos de tratamento padronizados, estudos futuros devem tentar determinar qual a quantidade ideal de acupuntura para o tratamento de pessoas com AR. Os seus objetivos deverão ser a objetivação de um efeito resposta-intensidade assim como tornar claro qual o número ideal de pontos de acupuntura, qual a frequência e de sessões de acupuntura e qual a duração da intervenção. É possível que alguns estudos, ainda que projetados corretamente de um ponto de vista da abordagem científica ocidental, não tenham levado em linha de conta a abordagem médica chinesa mais correta. Estes terão sido afetados negativamente por um errada definição da dose/intensidade do estímulo aplicado, perícia insuficiente do acupun- Scientific Journal of Natural Medicine | Vol. 1 23 tor levando a inserções inadequadas e manipulações incorretas, ou ainda a seleção inadequada de pontos de acupuntura pelo recurso a um protocolo padronizado que pode negligenciar o diagnóstico médico chinês individualizado). Estas razões podem explicar os modestos e inespecíficos efeitos observados em estudos ocidentais. Esta avaliação abrangente da acupuntura para a artrite reumatoide ilustra a necessidade de projetos de estudo de acupuntura metodologicamente rigorosos que adiram simultaneamente quer aos elevados padrões metodológicos dos ensaios randomizados científicos ocidentais quer a uma abordagem médica chinesa correta. Mais investigação é assim necessária para entender os efeitos da acupuntura na AR, para definir qual o melhor tratamento com acupuntura para a AR e para caracterizar quais os pacientes que podem beneficiar de sua inclusão no seu tratamento. • • • • • • PALAVRAS-CHAVE: Reumatologia, Acupuntura, Artrite Reumatóide, Efeitos Fisiológicos da Acupuntura, Medicina Tradicional Chinesa • • • REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS: • Berman, B. M., Lao, L., Greene, M., Anderson, R. W., Wong, R. H., Langenberg, P., Hochberg, M. C. (1995). “Efficacy of traditional Chinese acupuncture in the treatment of symptomatic knee osteoarthritis: a pilot study.” Osteoarthritis Cartilage. 3 (2): 139-142. 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Médico por opção, e consciente das dificuldades que a referida opção postula, mais do que uma obrigação, faz dela uma missão – manifestação positiva do homem enquanto ser social, garantindo, simultaneamente, a afirmação individual. “A ter de ser qualquer coisa na vida além de artista, foi realmente bom lembrar-me da profissão de médico” (Torga 1999, p. 443) Quando afirma, no Diário, que a medicina foi para si uma obrigação, Miguel Torga levanta problemas de ordem vária para os quais, ao longo da obra, vai adiantando respostas nem sempre conclusivas. Se postula a medicina como um dever imposto, essa imposição advém de condicionalismos intrínsecos e extrínsecos. Intrinsecamente, assume-a como um incumbência, que em nada se relaciona com imposições legais ou vínculos jurídicos, outrossim se torna numa obrigação natural adstrita àqueles que, naturalmente, se reivindicam “os serviçais da vida e os fiadores da esperança” (Torga 1999, p. 1594). Sujeito activo, reconhece na medicina essa obrigação natural, cumulativa, facultativa e indivisível que, não sendo passível de ser exigida, deve, necessariamente, ser saldada. Trata-se pois de algo intrínseco ao seu carácter, ao seu humanismo, à sua forma solidária de estar no mundo, aos parâmetros que impõe a si próprio e pelos quais se rege. * Síntese curricular: Isabel Ponce de Leão, Professora Catedrática da Universidade Fernando Pessoa. Membro integrado do CLEPUL a cuja direcção pertence, colaboradora do CIEC, sócia fundadora e elemento da direcção do Circulo Literário Agustina Bessa-Luís, coordenadora responsável do projecto e-médico+. Áreas de investigação: Literatura Portuguesa Contemporânea, Interacção das Artes, Arte e Ciência em diálogo: medicina e literatura. 26 Scientific Journal of Natural Medicine | Vol. 1 Scientific Journal of Natural Medicine | Vol. 1 27 A atenção ao semelhante é uma referência constante da sua de mentir persuasivamente quando a verdade é o oposto da esperança” (Torga 1999, p. 1616). Assim assume com rigor e convicção, a mesma por que pautou todos os seus actos e opções, “a alegria de ser médico” (Torga, 1999, p. 1198), insurgindo-se mesmo contra quem põe em causa aquilo que ele próprio considera uma apetência natural: – A medicina, uma actividade secundária na minha vida! Engana-se redondamente. Sempre que visto esta bata sinto-me paramentado, investido numa ordem iniciática de que o primeiro troglodita que exorcizou com rezas os males do vizinho foi fundador. [...] a forma suprema de dar solidariedade a alguém é valer-lhe na doença quando, indefeso, luta com a dor e a morte. (Torga 1999, pp. 1378-1379) Destarte encontra na sua profissão uma “justificação humana” (Torga 1999, p. 443) e moral e considera que “o grande momento humano do acto clínico” (Torga 1999, p. 970) está na anamnese ou seja no “relato dos padecimentos feito pelo doente à cordialidade inquisidora do médico” (Torga 1999, p. 970), essa espécie de confissão propiciadora da solidariedade. Já os condicionalismos de natureza extrínseca estão plasmados na sua história de vida de que dá conta quer o Diário quer a autoficção A Criação do Mundo. Nascido no seio de uma família com parcos recursos económicos, o que o impeliu a viver a experiência, pouco grata, do seminário e, mais grata, mas mesmo assim dolorosa, da emigração, Miguel Torga aplicará o exíguo capital aforrado enquanto emigrante, na sua formação académica. É quando regressa da sua estada no Brasil que conclui o curso dos liceus em três anos, e se matricula na Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra, que frequenta entre 1928 e 1933, habitando uma 28 república de estudantes, a “Estrela do Norte”. Assim se forma em medicina, na consciência plena de que “Um médico nem sequer pode chorar” (Torga 1999, p. 34), mas não deixando de assinalar o acontecimento numa entrada do Diário datada de 8 de Dezembro de 1933, em que alude a uma tradição académica coimbrã: “Médico. Conforme a tradição, mal o bedel disse que sim, que os lentes consentiam que eu receitasse clisteres à humanidade, conhecidos e desconhecidos rasgaram-me da cabeça aos pés.” (Torga 1999, p. 32). De facto, “em Portugal nunca ninguém viveu da pena” (Torga 1999, p. 396), logo um curso poder-se-ia tornar no garante do necessário conforto material. Curiosamente, a independência económica, que leva Adolfo Rocha a fazer esta escolha profissional, é mais que isso, é a demanda dum desafogo, sobretudo mental, para o acto criador, mas também material, para pagar a edição das suas obras, colaborando, assim, o médico com o poeta. De facto, não foi pela medicina que enriqueceu. João Semana em Trás-os-Montes, em Leiria, ou em Coimbra, conserva o sentido de uma responsabilidade social que o leva a abrir as portas do seu consultório mesmo àqueles que sabe destituídos de posses para pagarem a consulta. Se é inegável que à opção pela medicina convém também uma certa segurança económica que a produção literária poderia não propiciar, também é verdade que se sobrelevam princípios e propósitos de honestidade e independência mantidos pela vida fora e sistematicamente reiterados. A própria optação pela otorrinolaringologia remete para essa independência e individualização, uma vez que se trata de uma especialidade médica capaz de prescindir do trabalho em equipa, e que não força longas conversas com os pacientes. Por outro lado, dificilmente o otorrino assistirá a grandes sofrimentos ou a fases terminais de doenças, assaz incompatíveis com a sensibilidade de alguém que sempre lutou ao lado da vida, e nunca suportou a derrota imposta pela morte. Scientific Journal of Natural Medicine | Vol. 1 Exerce, como referi, a sua profissão em Trás-os-Montes sempre atento às carências e necessidades do povo, o que o leva, bastas vezes, a ter posturas críticas: “Ou se lavram estes montes a instrução e a higiene, ou então não vale a pena um médico perder a vida aqui” (Torga 1999, p. 47). É já como otorrinolaringologista que vai para Leiria “a braços com as afonias histéricas, as otites, o ranho” (Torga 1999, p. 523), até que decide instalar-se em Coimbra por estar mais perto de fontes e movimentos literários e culturais. Aberto o consultório no Largo da Portagem, n.º 45, hoje sede de um banco, aí exerce a sua profissão – não só de otorrinolaringologista mas, conforme as necessidades, de pediatra, ortopedista, psiquiatra... –, escreve e recebe amigos e intelectuais durante mais de cinquenta anos. Frio e austero, o seu local de trabalho possui uma janela com vista sobre a cidade e o Mondego, numa fraternidade com o mundo. A ele se dirige, quotidianamente, utilizando os transportes colectivos, não sem antes aproveitar para entrar nas principais livrarias da Baixa. São várias as referências a este microcosmos ao longo do Diário. Por um lado, é o local onde desempenha a profissão e ganha o seu sustento e o da família, porque “se alguém bater à porta paga a consulta” (Torga 1999, p. 166); por outro, é o sítio onde não se respira “senão desgraças” (Torga 1999, p. 465) porque “Quem vem, ou é doente, ou traz doentes, ou vem tratar de doentes” (Torga 1999, p. 191). Mas é mais, é o espaço onde “vivem sepultados” (Torga 1999, p. 744) infindáveis segredos, o confessionário de dores, intimidades e dúvidas aos quais prescreveu “remédios milagrosos, optimismo, fé, ilusões” (Torga 1999, p. 744), naquele espírito de missão com que sempre encarou o seu ofício / missão. Não admira, pois, que este espaço ficasse, de igual modo, ligado à sua obra, já que as pausas davam, naturalmente, lugar à meditação e à criação. São recorrentes as passagens do Diário em que ele se refere, findas as consultas ou no tempo que as antecede, a esse microcosmos, propício à reflexividade, onde o médico ia, paulatinamente, cedendo o seu lugar ao pensador da vida. Em muitas entradas, anuncia mesmo esse ambiente envolvente, noutras, ele é depreendido. Aí reflecte sobre a repugnância que sente pelo mecenato da medicina (Torga 1999, p. 166), sobre a sua condição de poeta e médico (Torga 1999, pp. 395 e 676), sobre as misérias da humanidade (Torga 1999, p. 464), sobre o futuro sem esperança da juventude (Torga 1999, p. 501), ou sobre a falta de saúde e a morte (Torga 1999, p. 864). Ligada a esta última reflexão surge o lamento pela escassez progressiva de doentes sem que isso o faça ausentar-se deste espaço íntimo, como salienta: O dia inteiro refugiado no consultório [...]. A vida começa a despedir-se de mim [...]. E agradeço-lhe intimamente que me conceda o lenitivo de ir morrendo neste fojo, que começou por ser inequívoco lugar profissional, e, agora, visitado apenas de vez em quando por alguns fiéis, lembra aqueles centros de espionagem que ostentam uma tabuleta comercial na fachada, para disfarçar. (Torga 1999, p. 1289) É tudo isto e ainda mais que o consultório configura – “caixa de surpresas” (Torga 1999, p. 1722) e de segredos de situações insólitas, antro de desabafos descomedidos, de angústias controladas ou mesmo de muitas páginas escritas, cárcere do avatar médico / poeta / médico. Pedaço de si próprio, é com uma sensação de mutilação que se irá desfazer dele quando a sua actividade como médico, já quase no fim da vida, se torna praticamente inexistente. Dá conta da ocorrência do desaparecimento deste “velho refúgio” (Torga 1999, p. 1740), onde estão muradas a sua e “outras vidas” (Torga 1999, p. 1740), em duas entradas do décimo sexto volume do Diário. Scientific Journal of Natural Medicine | Vol. 1 29 A “visita fúnebre [...] do senhorio do consultório” (Torga 1999, p. 1740), configurado em administradores de um banco, anuncia o fim daquele espaço íntimo, do seu “velho reduto” (Torga 1999, p. 1742), e propicia reflexões magoadas e não menos revoltadas por se deparar com a sua “própria vida abolida no tempo” (Torga 1999, p. 1743) por um capitalismo que “não hesita, mesmo diante dum leito de sofrimento” (Torga 1999, p. 1740): mais válidas que escrevi sabem à terra nativa que trago agarrada aos pés” (Torga 1999, p. 810). Em termos psicossociológicos basta evocar a justificação que dá para o facto de haver tantos médicos escritores para se entender a afirmação de que o artista, tal como o médico, é “o mais receptivo e preceptivo dos mortais” (Torga 1999, p. 972). Em termos morais, reflicta-se no sentido geral da sua existência e nas suas palavras elucidativas: Desfiz-me do consultório. [...] Ofereci o material cirúrgico ao hospital da Misericórdia [...], o mobiliário à Junta de Freguesia de S. Martinho. E fiquei naquelas salas vazias vazio como elas. [...] Do lado de lá do fio pediam-me que juntasse aos despojos a tabuleta. Respondi que iria ser arrancada e seguiria. E perguntei, de voz estrangulada, se queriam que mandasse também o cadáver. É bom isto de ser médico e poeta. São dois a dar. Os jovens vêm-me pedir ajuda, porque faço versos; os velhos, porque os posso medicar. E lucramos todos. Eles por sentirem que não estão sós no mundo; e eu, afinal, também. Vou-me cumprindo assim, numa acção quotidiana sem clarões de heroísmo, mas útil e modesta, como convém à minha natureza de tímido, camuflada de violências intelectuais e físicas de compensação. A sua existência profissional passou muito por este espaço. Se o suportou para poder ser poeta, fê-lo sem nunca descurar o juramento de Hipócrates usando da intransigência que sempre teve consigo próprio. Nele, o médico colhia matéria para o poeta e dava-lhe uma feição pedagógica que pugnava pelos valores cívicos, éticos e morais. Tentou entender o sofrimento alheio mesmo quando injustificado, e arriscou a mentira piedosa, numa humanização da profissão, como panaceia para o sofrimento, uma vez que “Não há maior crédulo que um desesperado. Mentir-lhe, iludi-lo, é quase uma obrigação moral” (Torga 1999, p. 1627). Ser médico era, de facto, um acto de amor mas também uma exposição social, consequência do controlo ideológico. Ao desenvolver a sua profissão, Torga trabalhava na construção de uma sociedade livre e humanitária, dando como exemplo a sua abnegação e o seu desprendimento. Se, como poeta, era conhecido o seu temperamento sociofóbico, já o médico, apesar de um peculiar tom agreste, sentia a obrigação de intervir, e mostrava-se cordial com os doentes, saindo do seu conhecido intimismo. (Torga 1999, pp. 1742-1743) A opção pela medicina mostra ainda uma consciência aguda das circunstâncias e uma vontade de nelas intervir, também enquanto forma de ultrapassar uma sensação de imperfeição rumo a uma realização. Em termos ideológicos, realiza-se como poeta e como homem; usando o dinheiro da burguesia que lhe paga os serviços, não se importa de a desprezar, afirmando: “foi na clínica rural que me senti médico a sério, e cuido que as coisas 30 (Torga 1999, p. 676-677) Dessa cordialidade dão conta inúmeras páginas do Diário onde anota conversas tidas com os pacientes. É o Fonseca que lhe faz confidências sobre a sua vida passada (Torga 1999, p. 80); o David Simões que traz “tontices de gente fraca do miolo” (Torga 1999, p. 191); o rapaz que o capitão não deixa “ir a verde” (Torga 1999, p. 210); a transmontana que carrega um tumor (Torga 1999, p. 221); o homem que duvida da sua capacidade prescritiva (Torga 1999, p. 402); a “rapariga de má nota” que o entreteve mais que qualquer senhora Scientific Journal of Natural Medicine | Vol. 1 honrada (Torga 1999, p. 403); a jovem que entrou “desvairada pelo consultório dentro a odiar o pai e a mãe” (Torga 1999, p. 1100); uma outra que não se conformava “com um destino fora do seu meio” (Torga 1999, p. 1127) que era o mar – a esta, o poeta prescreveu, para além dos medicamentos, “um volume do Mar” (Torga 1999, p. 1128); a mulher que adivinha o fim da vida e a quem dá alento (Torga 1999, p. 1156); uma outra que tinha o marido “na reanimação” (Torga 1999, p. 1417); a anciã que “andava a preparar-se para morrer e vinha liquidar uma consulta que tinha em débito há mais de quarenta anos” (Torga 1999, p. 1430); “um rústico serrano” que resume “filosofias inteiras” (Torga 1999, p. 1628); ou mesmo aquela cigana que “entrou pela porta dentro a queixar-se do nariz, a regatear o preço da consulta”, (Torga 1999, p. 1722) e que acabou por lhe contar uma espantosa e pitoresca história de vida. Tudo isto e muitas outras histórias que o enriqueceram como médico, como homem e como poeta, e a que soma alguns êxitos profissionais em que a vida se sobrepõe à morte, fez com que “o exercício da medicina” (Torga 1999, p. 1628) se convertesse para ele numa escola. De facto, Adolfo Rocha / Miguel Torga fez da sua profissão um ritual, cumprindo-a de forma persistente e coerente quase até ao fim dos seus dias. Alguma tristeza o assolou quando viu que os doentes escasseavam mas a amargura foi ainda maior quando o seu consultório – camarim de Hipócrates e Orpheu –, lá num 1.º andar do Largo da Portagem, em Coimbra se converteu, como já referi, numa instituição bancária. Foram muitos os momentos de desânimo que atravessaram a sua vida profissional, chegando a confessar que cada consulta se tornava numa “iniciação de caloiro, um martírio de expressão serena” (Torga 1999, p. 662). Tudo porque nem sempre conseguindo êxito com os seus doentes, o incomodava esse “pacto sacrílego” (Torga 1999, p. 662) de confiança cega inerente à condição de mé- dico. Cai, então, em desabafos que, apenas aparentemente, mostravam o profissional contrariado, para realmente deixarem antever o ser escrupuloso e perfeccionista envolvido numa recuperação da condição humana: “Vinte anos de pão ganho assim, a fazer de médico à força. A bata, como uma sobrepeliz, a cobrir-me duma brancura de levita. E eu, no íntimo, céptico, céptico, céptico como um ateu que estivesse a rezar missa.” (Torga 1999, p. 662) Trata-se de uma luta consigo próprio, com os seus limites, com tudo o que dificilmente pode explicar e que lhe cria momentos de perplexidade. “Cada vez compreendo menos a doença” (Torga 1999, p. 1431), adianta o médico sempre e quando vê partir o doente que a todo o custo tentou salvar. Se, por um lado, pretende racionalizar a situação, intimamente, nem o homem nem o poeta convivem cordatamente com a morte. Talvez por isso, esta temática, mais que recorrente, seja obsessiva no Diário e, porventura, agravada pela sua condição de médico, que lhe impõe a lucidez da sua inevitabilidade. Consciente das limitações a que está sujeito, desabafa: O homem ainda está muito longe da sabedoria. [...] Na medicina, por exemplo. [...] Andei durante anos a aprender a observar e a tratar doentes. E aprendi a observá-los e a tratá-los por fora. Havia ferida – desinfecção e penso; havia nervoso – calmantes; havia sezão – quinina. [...] E, embora a sentir-me eficiente, sinto-me frustrado. Tenho a plena consciência de que nado em seco à beira dum grande oceano. Vejo perfeitamente que aplico regras lógicas a um jogo ilógico Scientific Journal of Natural Medicine | Vol. 1 (Torga 1999, p. 1046). 31 Assim se acentua o drama de questionar o absurdo da morte, já que o seu agnosticismo não lhe oferece a panaceia de uma outra vida, contributo a um eventual apaziguamento. Este questionar surge quer em relação a si próprio quer em relação aos outros, sobrelevando-se sempre a frustração do médico, a quem era devido encontrar soluções. É, todavia, contrariando este pavor do acabamento que vivencia desde jovem, que a sua profissão ganha sentido. A vida torna-se assim numa luta sistemática balizada no nascimento e na morte – algo intransponível e redutor. Por isso reage mal à morte da mãe em 1946. É um misto de pasmo e revolta pela ausência e pela degradação, que se manifesta através de “Canção para a minha Mãe” (Torga 1999, p. 354); aí faz um apelo à vida, quase patético, nem que esta venha através da memória. Esta mágoa e a referida perplexidade prolongar-se-ão noutros poemas escritos posteriormente. Mãe: Que desgraça na vida aconteceu, Que ficaste insensível e gelada? Que todo o teu perfil se endureceu Numa linha severa desenhada? Como as estátuas, que são gente nossa Cansada de palavras de ternura, Assim tu me pareces no teu leito. Presença cinzelada em pedra dura, Que não tem coração dentro do peito. Chamo aos gritos por ti – não me respondes. Beijo-te as mãos e o rosto – sinto frio. Ou és outra, ou me enganas, ou te escondes Por detrás do terror deste vazio. Mãe: Abre os olhos ao menos, diz que sim! Diz que me vês ainda, que me queres. Que és a eterna mulher entre as mulheres. Que nem a morte te afastou de mim! (Torga 1999, p. 418) 32 É uma voz inconformada e desesperada, expressa nos vocativos e no tom apelativo, que reage, numa postura que raia a incredulidade, ao pavor da morte, pavor esse que continuará a manifestar, passados três anos sobre a morte da Mãe, em “Negativo duma canção de embalar” (Torga 1999, p. 476). Com ela se foi a sua felicidade, só recuperada num processo de retorno às origens, agora inviabilizado. A sensação de orfandade, a incapacidade de intervenção do filho e do médico acentuam a revolta, aqui exorcizada pela palavra poética. A opção feita por esta forma, para dar voz à sua dor, gera uma concentração de forças que enformam uma angústia desesperada. Já a morte do pai configura a perda definitiva da infância, o crescimento brusco, o assumir de responsabilidades para as quais não queria estar preparado. Depois de, como médico, tentar salvar a “última raiz que resta” (Torga 1999, p. 736) – “Que há-de fazer um filho, senão ser fiel à cepa, e um médico, senão medicar?” (Torga 1999, p. 737) –, assiste àquele “dia terrível de apocalipse” (Torga 1999, p. 821) em que partia a única pessoa que podia responder pelos seus actos com a “responsabilidade de progenitor” (Torga 1999, p. 821). É a mágoa da ausência e o peso da responsabilidade, que gera o desabafo quase aterrador: “Acabou definitivamente a minha infância, e olho com terror este insólito fantasma adulto em que subitamente me transformei” (Torga 1999, p. 821). O último vínculo às origens desfaz-se com a morte da irmã – “Morte da minha irmã. E não há palavras para o desespero em que estou” (Torga 1999, p. 1480) – e nele vê a abertura de caminho para a sua própria morte, obsessão que sempre o perseguirá. Ao longo do Diário a morte configura-se como algo inevitável; a sua data está marcada, de forma irreversível, e, como médico, vislumbra-a “no rosto de cada doente” (Torga 1999, p. 733) e mesmo no seu. A vida deixa de fazer sentido porque nela Scientific Journal of Natural Medicine | Vol. 1 há “um cais de morte sempre adivinhado” (Torga 1999, p. 1237). Todavia prossegue a sua luta sem tréguas ainda que, olhando para si e para os demais, reconheça: “Vivi duas vidas. Uma, desalentado, a ver-me morrer; a outra, a lutar inconformado contra todas as mortes”. (Torga 1999, p. 1654) Apesar de tudo, e como constante da sua voz poética, surge a valorização da vida, essa “coisa imensa” (Torga 1999,p. 153) por que pugna: como médico, a tratar os seus doentes, incutindo-lhes alento e esperança, como poeta, a salvar-se pela poesia através de hinos apologéticos, e como homem, a pôr-se nas mãos da medicina quando a doença o começa a corroer – “Quimioterapia. [...] O homem tem o triste vezo de, quanto mais a sente fugir, mais se agarrar à vida” (Torga 1999, p. 1701). Por tudo, quando lhe dizem que a vida não tem sentido, responde prontamente: “Ela, em si, não... [...] Mas tem o sentido que lhe damos” (Torga 1999, p. 1265). Esse sentido está, de facto, na coragem para desistir ou continuar. A palavra poética torna-se em arma contra a morte a que, aliás, alude no oitavo volume do Diário quando se refere aos “vocábulos exangues, inertes, cadavéricos” que revitaliza e torna “seiva [...] da própria Criação” (Torga 1999, p. 814). O poeta sente que, através da palavra, a vida ganha sentido e, consciente do seu dom de criador, tenta por ela a eternização, tentando sempre minimizar o sofrimento do médico que também é. ta nele a convicção de que o contrário se passa com o homem em quem não há renovação mas degradação conducente à morte; por isso, em plena consciência afirma: “Perde-se a vida, sem haver remédio / Rói-nos o tempo como um cancro oculto” (Torga 1999, p. 685), convertendo, assim, o tempo em elemento corrosivo e inexorável. Contudo, com o decorrer dos anos, pensa na serenidade com que o pai encarava a morte – “O corpo farta-se de tudo, filho. Até de viver.” (Torga 1999, p. 188) –, colhendo da sua atitude o ensinamento. Atenua-se o desespero, e encara “o apodrecimento progressivo com a calma de quem vê um belo e irremediável pôr-do-sol.” (Torga 1999, p. 188), ou, até, como única panaceia para os seus males, chegando, por vezes a desejá-lo com o frenesim de quem procura a paz: “Quando virás, dia do meu sossego, / [...] / Quando virás / Hora feliz do meu esquecimento?” (Torga 1999, p. 559). A evocação da infância se, por um lado, é, não raramente, forma de se evadir dessa dor que o atormenta – “Brinca instintivamente / [...] / Desafronta / O adulto que hás-de ser” (Torga 1999, p. 951) – por outro, imerge-o na plena consciência da irreversibilidade do tempo. Perdidas as ilusões, sente-se nos antípodas da meninice – “Sou agora o inverso de menino” (Torga 1999, p. 1110) –, e é em “Pânico” que olha o destino: “E o tempo passa, / E a morte ameaça, / E eu neste crescente desespero” (Torga 1999, p. 1105). É logo no primeiro volume da obra (Torga 1999, p. 129) que manifesta aquele misto de preocupação e curiosidade sobre o seu legado aos vindouros reconhecendo embora que “A arte não morre. Nós é que morremos”. (Torga 1999, p. 465). Assim, morre o poeta mas a obra perpetuar-se-á. Olhando a natureza, admira a sua capacidade de renovação, o “regresso da vida na primavera” (Torga 1999, p. 203) e a partilha que ela faz com o homem, integrando-o naquele todo harmónico “onde cresce ternura” (Torga 1999, p. 468). Por vezes, e em oposição a esta renovação, aumen- Há, todavia, alguma serenidade na forma como prepara o último combate; trata-se de uma preparação lenta – “morrer sim, mas devagar” (Torga 1999, p. 1683) – calma, que passa por uma mentalização paulatina para aguardar o inevitável. Se já no décimo volume do Diário, em 1968, inicia essa despedida – “Longo vai o meu canto, / [...] / Nele me despeço / Lentamente da vida.” (Torga 1999, p. 1125) – é, todavia, a partir do décimo terceiro, nas décadas de oitenta e noventa, que a preocupação com a fase final da caminhada, se torna obsessiva. Curiosamente, quanto mais pensa na morte, mais Scientific Journal of Natural Medicine | Vol. 1 33 se agarra à vida, por ela lutando, já não de forma desesperada, outrossim com a serenidade de quem se sente cumprido. Será, porventura, o envelhecimento e a doença que o levam a criar algum distanciamento de si próprio e a aceitar, quando se vê ao “Espelho”, com os “olhos da velhice” (Torga 1999, p. 1387), o seu corpo “Ora a estuar de vida, ora doente.” (Torga 1999, p. 1605). No avanço da velhice, que se acentua, resta-lhe a lembrança do passado que, ora o apazigua – “foi bonita a festa / Da Mocidade” (Torga 1999, p. 1442) –, ora acentua o sofrimento, porque “não há presente, nem futuro” para a “maldição dos velhos” (Torga 1999, p. 1515). Todavia, o retrato mais lucidamente cruel da velhice é dado em “Solidão”: Pouco a pouco, vamos ficando sós, Esquecidos ou lembrados Como nomes de ruas secundárias Que a custo recordamos Para subscritar A urgência dum beijo epistolar Ainda inutilmente apetecido. Mortos sem ter morrido, Lúcidos defundos, Vemos a vida pertencer aos outros E descobrimos, na maneira deles, Que nada somos Para além do seu dissimulado Enfado Paciente. E que lá fora, diariamente, Conforme arde no céu, O sol aquece Ou arrefece Os versáteis e alheios sentimentos. E que fomos riscados No rol da humanidade A que já não pertencemos De maneira nenhuma. E que tudo o que em nós é claridade Se transforma em bruma. Perante tudo isto, só a palavra poética e a cumplicidade de quem a lê o podem resgatar do esquecimento. Por isso faz um último esforço, uma tentativa estóica, no sentido dos seus versos não o acompanharem nesta fase de envelhecimento – “Falta-me ainda um verso. / [...] / que na sua brevidade / Iluminada / Seja a eterna alvorada / Da minha humanidade” (Torga 1999, p. 1459) A partir do décimo terceiro volume do Diário, Torga começa a despedir-se dos leitores. Acontece com “Viático” (Torga 1999, p. 1456), onde o poema que leva na bagagem será a sua eternização, em “Estuário” (Torga 1999, p. 1568), onde o rio a desaguar no mar é metáfora do seu próprio fim, e mesmo em “Pórtico” (Torga 1999,p. 1675), poema com que inicia o último volume e onde deixa patente o seu receio de o deixar inacabado. De facto, a sua obra é, antes de mais, o documento de uma agonia, perseguidora da dialéctica vida / morte, que enforma a sua textura. Sobretudo o último volume do Diário é o relato, íntimo e sofrido, de quem deixou de viajar pelo mundo, porque ficou fisicamente circunscrito a quartos de hospitais. Por tal, a melancolia é seu rito, mas uma melancolia estóica e intrépida, em que o médico vem, assazmente, auxiliar o poeta. Não se alienando de tudo quanto o circunda, concebe a vida como “irremediavelmente um dom provisório” (Torga 1999, p. 1777), e ainda que afirme “Nasci para cantar a glória da vida e não para cronista da humilhação da morte” (Torga 1999, p. 1733), adianta também “Penso e repenso dia e noite na morte” (Torga 1999, p. 1777), assumindo, assim, a sua condição humana, humanizadora, esta, ainda mais, se possível, das suas derradeiras páginas, em que confessa que “Toda a vida humana é uma breve ou demorada despedida, que começa, de facto, logo à nascença, e acaba aparentemente no dia da morte” (Torga 1999, p. 1765). (Torga 1999, p. 1746) 34 Scientific Journal of Natural Medicine | Vol. 1 O poeta distancia-se e observa a sua decrepitude física, mantendo um belíssimo diálogo com a angústia da morte que, paradoxalmente, enquanto ateu, sacraliza. Grande parte da sua obra dá conta desse belíssimo diálogo sem olvidar o mundo circundante. Através dela, Torga diz da aprendizagem da morte numa toada dionisíaca da vida, em que a luta e a paixão pela arte e pela ética se sobrepõem à tragicidade dos últimos momentos, já que sabe que tem uma missão a cumprir porque “os poetas mostram-se sempre como são. Não por serem mais sinceros, mas por imposição da própria poesia” (Torga 1999, p. 1766). vem à poesia, parece que a profissão de médico se sobrepõe caindo em comparações valorativas: Esta forma de encarar a morte, a bipolarização sentimental com que a enfrenta, configura o poeta mas, sobretudo e muito mais a racionalidade do médico conhecedor dos limites que a doença impõe, contra os quais luta uma precária ciência humana. Por tal, o tema da morte, sendo obsessivamente recorrente, deve ser ponderado, atendendo, muito particularmente, às perspectivas impostas pelos ditames de Hipócrates. O médico sobrepõe-se, então, sempre que, para enfrentar os revezes da vida, Torga tenta o racionalismo. Por isso, o diálogo que se estabelece entre certos poemas do último volume do Diário revela uma consciência lúcida da aproximação da morte que aguarda com resignação e, ao mesmo tempo, com esperança no alívio do seu sofrimento. Trata-se de uma “nova caminhada” (Torga 1999, p. 1675) que, cuidadosamente, prepara. Assim, espera que a “boa morte” (Torga 1999, p. 1717) se compadeça dele, pedindo à imaginação que cesse o seu labor porque “Não há mais aventura, nem poesia” (Torga 1999, p. 1780) e, apesar da degradação física, que lamenta, é nela que pensa encontrar a serenidade desejada através da união e da harmonia cósmica, a que se reporta o poema com que encerra a obra (Torga 1999, p. 1786). Há, de facto, uma paulatina transparência, concomitantemente atroz e pungente, na forma como se vai despedindo da vida. A lucidez e a coragem são seu rito, adivinhando-se, por detrás delas, o profissional da medicina, a encarar o seu destino com racionalidade. Demiurgo e Homem, sabe que “A hora é de finados” (Torga 1999, p. 1780) e, corajosamente, a ela se entrega, procurando uma reconciliação com o destino e com a morte, através de uma ética só possível a quem, como ele, entendeu a dimensão da vida e da arte. Essa coragem não está, todavia, isenta de uma revolta contida perante as limitações humanas. Por isso, como homem, é recorrente a sensação de imperfeição, o mesmo ocorrendo como poeta. Quando, por vezes, em momentos mais arrebatados, fruto da consciência das suas fraquezas, a musa não Se na vida profissional procurei sempre ser honesto e capaz, porque não hei-de fazer o mesmo como escritor? Ora um escritor honesto é capaz de escrever bem. Por isso, pego na pena com o escrúpulo com que pego no bisturi. O canhestro manuseamento deste pode matar o doente; a má utilização daquela pode perverter o gosto e torcer a consciência do leitor. Ambos, portanto, exigem igual precisão e honradez. (Torga 1999, p. 860) Porque médico, vive a angústia da morte desde a juventude, acentuando-se, esta, à medida que o tempo passa; sendo obrigado a lutar contra ela, sabe da sua inevitabilidade e afirma: “Não ter futuro. Nem sequer o do dia de amanhã. Viver indiferente à vida, de mão no pulso à espera do dobre da última pancada do coração.” (Torga 1999, p. 1723) Contudo a sua atitude flutua entre a revolta e a aceitação; por isso, pugna pela vida até ao fim, pela sua e pela dos seus doentes, em oscilações perma- Scientific Journal of Natural Medicine | Vol. 1 35 nentes entre o pessimismo e o optimismo, sendo este visível sempre que alcança um êxito profissional, ou aquando dos momentos de convalescença da doença que o minava. Porém, a degradação física e a velhice, levam-no a reflectir nesta problemática com mais acuidade, começando a preparação para o confronto com ela num misto de aceitação e resistência. Reconhece então que “A morte é a renúncia definitiva do corpo e a expectação eterna da alma.” (Torga 1999, p. 1712) e aguarda-a, pacientemente, apesar do sofrimento que, a dado passo, o leva a exclamar: “Estou morto por morrer!” (Moreiro 2001, p. 280). Malgrado esta tentativa de racionalização é recorrente uma sensação de incapacidade e de impotência que estará, também, na génese do seu desespero humanista. Contactando, em termos profissionais, com o sofrimento humano, agudiza-se a consciência do sentido trágico da sua condição, tragicidade. O sentido trágico da existência aproxima-o de Unamuno, Miguel também, cuja obra e personalidade constituem um verdadeiro problema filosófico. Unamuno centra toda a sua actividade intelectual naquilo a que chama “a única questão” e que visa a imortalidade do homem enquanto ser concreto, logo vulnerável à vida e à morte, sem querer aceitar esta última. A religião, tal como em Torga, é agónica e não o satisfaz, surgindo, a par do problema da imortalidade, a revolta perante os limites da condição humana. Porque o racionalismo nem sempre lhe dá respostas, tenta a fuga pela imaginação, com o fito de apreender a realidade vital ao viver e pre-viver a morte, numa tentativa de apreensão da metafísica humana. vencer; ainda como ele, para além de muitas outras afinidades, vive o terror da morte, tornada em inevitável obsessão, e tenta a eternização pela palavra poética. Há contudo, uma diferença de atitudes no grau de obstinação. Como atrás ficou dito, Torga, no final da vida, adopta uma postura mais resignada e, já que não pode combater a morte, depois de inúmeras tentativas para o conseguir, segue os conselhos do médico que também é, e prepara-se para a receber. De facto, em Miguel Torga, o médico e o poeta são indissociáveis. Uma leitura de toda a sua obra literária deixa, persistentemente, vislumbrar o clínico atento, íntegro, austero, que, tal como o poeta, assume responsabilidades e se constitui como elemento interventor. Por vezes, medem forças, e o poeta sobrepõe-se ao médico – “Porque eu sou artista, não sou médico” (Torga 1999, p. 395) – ou o médico ao poeta – “O poeta que imagina e sonha dentro de mim teve sempre de esperar pelo médico concreto e prático que mora a seu lado” (Torga 1999, p. 1066) –, mas o fim é a reconciliação, porque é manifesta a consciência da sua plena complementaridade, ostentada em vários passos do Diário: Dizia-me hoje alguém: – Homem, se você pudesse ser na vida literária o que é na vida clínica – conciliante, passa-culpas carregado de perdão –, que maravilha! Sem se lembrar, o pobre, da diferença que há entre essas duas vidas, ambas sagradas para mim. Como médico, trato irmãos doentes que me batem à porta, e a quem só devo amor e amparo; como escritor, reajo contra tartufos sãos e gordos que fazem da arte um meio para atingirem fins inconfessados. É o “sentimento trágico da vida” de igual modo recorrente em Miguel Torga, que faz do seu homónimo um padrão de referência. Como ele, converte a vida numa luta, consciente de que a não vai 36 Scientific Journal of Natural Medicine | Vol. 1 (Torga 1999, pp. 163-164). Um poeta operador! Numa pessoa só, um homem que mutila e um homem que cria. Mas, afinal, a mesma graça que colabora com a vida e, se preciso for, a emenda. (Torga 1999, p. 559) Chego às vezes a perguntar se eu poderia ser apenas um escritor de banca, um homem sem actuação em carne e osso, sem esta comunhão de lágrimas e pus, que os versos tentam sublimar. Quando pela manhã abro a porta da tenda, há sempre dois sujeitos dentro de mim a dialogar. Um a dizer mal do destino e outro a dizer bem. Mas se consigo, como hoje, dar realmente um empurrão à vida, fecham-se ambos, à noite, reconciliados. (Torga 1999, p. 677) Pego na pena com o escrúpulo com que pego no bisturi” (Torga 1999, p. 860) Destarte, são recorrentes na obra literária de Miguel Torga vocábulos, metáforas, olhares e atitudes que pertencem ao mundo da medicina. Daí o paralelo entre os dois ofícios, bem esclarecido pelo poeta em entrevista dada ao jornal francês Libération em 11 de Fevereiro de 1988, decorridos mais de cinquenta anos sobre o início do sua actividade como médico: J’aime la médecine. J’aime ce qu’il a d’absolu dans chaque vie. La maladie, c’est un état absolu. Tout près de la mort. C’est à chaque fois un défi d’arracher le malade à la souffrance, à la mort. C’est la même chose avec la littérature. Je lutte avec les mots comme je lutte avec la mort. De facto, sendo a medicina uma luta contra a morte, o poeta, cônscio, embora, de uma desaire final, não se lhe escusa, o mesmo ocorrendo com a literatura, particularmente com a poesia, posto que uma vida inteira a ela devotada, não viabilize o absoluto poético. Nas duas artes ou, se se preferir, nas duas profissões, Sísifo comparece teimosamente, enformando a vanidade de um labor, pelo poeta transformado em apostolado. Não se intente, contudo, que Torga se serviu da medicina para ser escritor. Como atrás referi, ele encarou a sua profissão com espírito de missão. Por um lado, respeitou o juramento de Hipócrates e, se combateu um surto de febre tifóide, considerou isso mero fruto do acaso, ou se fez de obstetra no difícil parto de Deolinda, de A Criação do Mundo, mais não significou do que tentar a vitória da vida sobre a morte. Como otorrino, afirmam testemunhos vivos, foi empenhado e disponível, atendendo com devoção todos os pacientes, mesmo aqueles que, por razões várias, lhe poderiam merecer menos consideração. Por outro lado, a profissão de médico propiciava-lhe, pela observação da dor humana, temáticas várias e mesmo um muito alargado leque de opções metafóricas. O exercício da sua profissão aponta, antes de mais, para um sentido pedagógico, respeitador dos valores morais e éticos que fazem admirar Adolfo Rocha, mesmo se este não alcançou a fama de Miguel Torga porque, assim o dizia: “A caneta que escreve e a que prescreve revezam-se harmoniosamente na mesma mão” (Torga 1999, p. 972). Mas se, como médico, revela enorme altruísmo, talvez porque a sua competência não precisasse de ser reconhecida através de honorários, já a sua insatisfação como poeta pedia o esforço da compra das obras em jeito de autenticação do seu valor. A coexistência destas duas profissões era em Torga, como atrás referi, uma necessidade. Uma dava-lhe o equilíbrio material e a autoconfiança porque “em Portugal nunca ninguém viveu da pena” (Torga 1999, p. 396), outra alimentava-lhe o espírito. Esta coexistência está plasmada na sua obra e, muito singularmente, no romance autobiográfico A Criação do Mundo. Aqui se dá conta de todos os passos que conduziram à formação do médico e do escritor, e também dos seus êxitos e fracassos, e é, de igual modo, insistentemente evidenciada ao longo do Diário, ainda que conservando aquele traço de de- Scientific Journal of Natural Medicine | Vol. 1 37 sespero, caracterizador da sua poética, que o leva a afirmar: “Médico e poeta, em nenhuma das peles me sinto justificado” (Torga 1999, p. 733) Contrariamente ao que afirma, parece-me que como homem, como médico, como escritor conservou uma fidelidade intransigente à norma preceptiva da sua conduta de vida: “Ser idêntico em todos os momentos e situações. Recusar-me a ver o mundo pelos olhos dos outros e nunca pactuar com o lugar comum.” (Torga 1999, p. 1686). Assumiu o sentido do dever como condição e como compromisso na tríade – “medicina, literatura e política”; fez, dessa incumbência avocada, uma manifestação construtiva do homem, eu individual e eu social. Deveu-se a Hipócrates e a Orpheu. Mais a este, arrisco, que àquele. Mas sem as vivências de Hipócrates, Orpheu não teria alcançado a sensibilidade que o eternizou. Uma vida simples, com dois ofícios implicados um no outro, é o que o seu Diário descobre. Salvo momentos pontuais de conflitualidade entre o médico e o escritor – normalmente gerados pela escassez de tempo para se consagrar à literatura –, a escrita torguiana vive largamente da prática médica, da mesma forma que nesta se vestigia o criador e o poeta. Sobre esta interacção, e à pergunta que lhe é feita acerca do facto de a medicina dar muitos escritores, responde da seguinte forma: Não é ela que os dá. Limita-se, simplesmente, a preservar esse dom aos que nasceram com ele, o que já não é pouco. Ao invés doutras profissões que estrangulam no indivíduo o espírito de aceitação e compreensão do semelhante, esta faz o contrário. O médico, como tal, nem pode fechar as portas da alma, nem apagar a luz do entendimento. É todo o humano que o solicita a todas as horas: o que sofre, o que simula, o que teme e o que desvaria. E só a graça de uma certa dimensão afectiva e mental permite corres- 38 ponder eficientemente a tantos e tão diversos apelos. Ora, essa dimensão está implícita na condição do artista, o mais receptivo e preceptivo dos mortais. (Torga 1999, p. 971). O certo é que como homem, como médico e como escritor nunca abdicou de ser “defensor incansável do amor, da verdade e da liberdade, a tríade bendita que justifica a passagem de qualquer homem pelo mundo” (Torga 1999, p. 1786). Se mais não fora, que seguramente é, Miguel Torga cumpriu-se enquanto zelador de corpos e almas de um povo. Tudo o que observei sobre o médico que coabita com o poeta me leva a questionar o epíteto que Torga reclama para a sua faceta profissional – “a obrigação” (Torga 1999, p. 1054). Numa primeira acepção, ao conceito de obrigação anda associado o de dever em sentido absoluto e formal; trata-se de uma necessidade moral que se impõe à liberdade e que assume distintivos categóricos e absolutos. Atinge o livre arbítrio e prescreve uma definição do bem e do mal. Tendo carácter vinculativo, presume a existência dum ser, fazendo, através dele, a lei que se lhe impõe em absoluto. Ora a obrigação, neste caso, parece-me, antes de mais, uma opção, uma condição e uma manifestação positiva do homem enquanto ser social, garantindo, simultaneamente, a sua afirmação individual. Parece-me ainda uma manifestação de solidariedade, bem como a justificação da sua existência, alijando-se, assim, a carga negativa que a palavra muitas vezes carreia. Médico por opção, e consciente das dificuldades que a referida opção postula, mais do que uma obrigação, faz dela uma missão. A leitura do Diário dá conta da sua vocação profissional – não podia ter sido outra –, e do muito em que ela colaborou com o poeta; esclarece a importância que lhe conferiu – “Medicina, literatura e política, por ordem descendente” (Torga Scientific Journal of Natural Medicine | Vol. 1 1999, p. 1054) –; refere a sua, ainda que parcial, realização pessoal, enquanto pilar de angústias e dores; finalmente mostra que a obrigação e a devoção alternam e assistem ao médico e ao poeta, empenhando-se em as servir até ao fim. Ao pôr a Medicina em primeiro lugar comprova, fundamentalmente, a sua dimensão humana, sistematicamente alertada pelo sofrimento alheio e, apostando no valor transcendental do ímpeto humano, tenta soluções porque ser médico é “gravar a imagem da esperança na massa encefálica da desilusão” (Torga 1999, p. 1024). Claro que o próprio afirma que o exercício da medicina foi a luta pela sobrevivência em termos materiais, e que fez de “médico à força” (Torga 1999, p. 662) mas, à medida que a obra avança, nota-se que se alguma vez foi só isso, depressa se reconverteu num apostolado, que muito mais que uma obrigação foi uma devoção, estabelecendo-se assim o binómio, igualmente aplicável à sua faceta de escritor. PALAVRAS-CHAVE: Miguel Torga, medicina, literatura, diário. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS • • • Moreiro, J. (2001). Eu, Miguel Torga. Lisboa, Difel. Ponce de Leão, I. (2005). A obrigação, a devoção e a maceração (O Diário de Miguel Torga). Lisboa, Imprensa Nacional-Casa da Moeda. Torga, M. (1999). Diário. Lisboa, Publicações Dom Quixote. Scientific Journal of Natural Medicine | Vol. 1 39 Da perceção do risco ao exercício da atividade nas terapêuticas não - convencionais Miguel F. Tato Diogo,* [email protected] Resumo: O risco constitui uma variável intrínseca ao exercício de uma atividade económica. A prática das terapêuticas não convencionais (TNC) e os seus profissionais configuram trabalhadores expostos a um conjunto diversificado de riscos ocupacionais. A perceção do risco em contexto laboral, cuidados de saúde, compreende a dimensão humana, a presença do utente. Num sistema de gestão, a informação constitui uma medida preventiva estruturante para uma eficaz abordagem à perceção do risco. Tem esta breve revisão como objetivo identificar nas diversas dimensões da perceção do risco a valência ocupacional no contexto da atividade económica dos trabalhadores - os profissionais que se dediquem ao exercício das TNC, bem como a perceção do risco de terceiros – os utilizadores. INTRODUÇÃO Risco tem sido definido de diversos modos, mas é frequentemente entendido como a combinação da probabilidade da ocorrência de um evento perigoso e a severidade da lesão ou do dano para a saúde das pessoas causados por este evento (ILO, 2001) O conceito de risco encerra diversas dimensões. A dimensão técnica, desde logo tomando risco como: ”Risco: combinação da ocorrência de um evento perigoso ou exposição(ões) e a severida- de ou lesão ou doença profissional que pode ser causada pelo evento ou exposição(ões)” (OHSAS 18001:2007). A dimensão organizacional, no contexto da gestão, no âmbito dos sistemas de gestão conforme estabelecido na norma ISO 31000:2009, Gestão do risco – princípios e diretrizes, que providenciam princípios, enquadramento e um processo de gestão do risco. * Síntese curricular: Licenciado em Engenharia de Minas pela Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto e Doutorado em Gestão de Recursos Naturais com apoio em Sistemas de Informação Geográfica pela Universidade de Vigo, Espanha. Professor da Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto. Membro (Investigador) do CIGAR – Centro de Investigação em Geo-Ambiente e Recursos e do CERENA – Centro de Recuros Naturais e Ambiente. Membro da Comissão Científica do Programa de Formação Contínua da FEUP. Membro (Vogal) da Comissão Diretiva do Centro de Competências em Envelhecimento Ativo e Saudável (UPorto Ageing Network) da Universidade do Porto, no grupo de trabalho, “Fostering Innovation for Age-friendly Buildings, Cities & Environments. 40 Scientific Journal of Natural Medicine | Vol. 1 O conceito, mais abrangente: “risco: efeito da incerteza nos objetivos (ISO Guide 73:2009). A norma define; efeito entendido como um desvio, positivo ou negativo do esperado/previsto; incerteza é um estado, mesmo que parcial, de deficiência de informação relacionada com o conhecimento ou compreensão de um evento, as suas consequências ou probabilidade; e objetivos podem compreender diferentes aspetos; (financeiros, segurança e saúde e metas ambientais) e podem aplicar-se a diferentes níveis de gestão (estratégica, transversal à organização, em projeto, no produto ou no processo). E a dimensão jurídica, tal como vertida na Directiva 89/391/CEE do Conselho, de 12 de Junho de 1989, relativa à aplicação de medidas destinadas a promover a melhoria da segurança e da saúde dos trabalhadores no trabalho. O conceito de risco associado ao contexto laboral, risco profissional integrado numa cultura organizacional de prevenção, cf. art. 3.º, al. d): “Prevenção, o conjunto das disposições ou medidas tomadas ou previstas em todas as fases da atividade da empresa, tendo em vista evitar ou diminuir os riscos profissionais”. Contudo é na dimensão social do conceito “risco” que se identifica a complexidade da relação multivariável que a sua gestão implica. Risco é sempre o risco de alguma coisa (falha técnica, perigo natural) sobre alguém (indivíduo, um grupo de pessoas, a sociedade ou toda a humanidade). Acresce que o risco é percecionado, sentido, não apenas pelos parâmetros técnicos e números probabilísticos, mas sobretudo no contexto psicológico, social e cultural de cada indivíduo exposto. Características individuais e sociais modelam a nossa perceção do risco e influenciam o modo como reagimos em relação ao risco (Schmidt M., 2004). Quando discutido, parece consensual que a essência do risco como sendo a probabilidade de evento adverso combinado com a magnitude das suas consequências (Rayner & Cantor, 1987). Ainda de acordo com os autores esta definição pode ser adequada para cálculos de engenharia, mas deveras enganadora num contexto de gestão de risco de grande-escala, de maior interação e de espectro mais alargado. Todos os conceitos/definições de risco partilham um elemento comum: a distinção entre possibilidade e realidade (Sjöberg, L. et al, 2004). Como variável organizacional risco é intrínseco ao exercício de uma atividade económica. O regime jurídico da promoção da segurança e saúde no trabalho, publicado na Lei n.º 102/2009, de 10 de setembro, alterada pelas Lei n.º 42/2012, de 28 de agosto e Lei n.º 3/2014 de 28 de janeiro, estabelece no seu artigo 12.º relativo ao licenciamento e autorização de laboração: “A legislação sobre licenciamento e autorização de laboração contém as especificações adequadas à prevenção de riscos profissionais e à proteção da saúde”. Nesta relação tal premissa está refletida no regime que estabelece o enquadramento da atividade e do exercício dos profissionais que aplicam as medicinas não convencionais1 , tal como são definidas pela Organização Mundial de Saúde, publicado na Lei n.º 45/2003 de 22 de Agosto. Os princípios orientadores das terapêuticas não convencionais (TNC) estão consagrados no artigo 4.º: “ o direito individual de opção pelo método terapêutico, baseado numa escolha informada, sobre a inocuidade, qualidade, eficácia e eventuais riscos, (…) e a promoção da investigação científica nas diferentes áreas das terapêuticas não convencionais, visando alcançar elevados padrões de qualidade, eficácia e efetividade.”. 1 Lei n.º 45/2003 de 22 de Agosto, artigo 2.º Âmbito de aplicação - a presente lei aplica -se a todos os profissionais que se dediquem ao exercício das seguintes terapêuticas não convencionais: a) Acupuntura; b) Fitoterapia; c) Homeopatia; d) Medicina tradicional chinesa; e) Naturopatia; f) Osteopatia e g) Quiropráxia. Scientific Journal of Natural Medicine | Vol. 1 41 Num contexto ocupacional do exercício da atividade económica a dimensão humana compreende e identifica na exposição dois grupos: os trabalhadores e terceiros. Esta envolvente está prevista no regime jurídico da promoção da segurança e saúde no trabalho2, que estabelece no art. 15.º, n.º 7: “O empregador deve ter em conta, na organização dos meios de prevenção, não só o trabalhador como também terceiros susceptíveis de serem abrangidos pelos riscos da realização dos trabalhos, quer nas instalações quer no exterior.” A presente revisão bibliográfica tem como objetivo identificar nas diversas dimensões da perceção do risco a valência ocupacional no contexto da atividade económica dos trabalhadores - os profissionais que se dediquem ao exercício das terapêuticas não convencionais (TNC), bem como a perceção do risco de terceiros – os utilizadores. Metodologia de Trabalho A presente breve revisão bibliográfica, abrange os principais riscos ao que estão expostos os profissionais das terapêuticas não convencionais (TNC) e qual o enquadramento da perceção do risco destes profissionais na sua relação com os utentes. Conceitos “Medicina Tradicional” tal como definida pela Organização Mundial de Saúde (OMS) 3 (WHO, 2000): “É a soma total de conhecimento, qualificações, competências e práticas baseadas em teorias, crenças e experiências nativas de diferentes culturas, quer sejam explicáveis ou não, utilizadas na manutenção da saúde, bem como na sua prevenção, diagnóstico, melhoria ou tratamento de doença física ou psíquica.” As designações complementar/alternativa/medicina não-convencional (CAM) são utilizadas de modo interligado com a designação medicina tradicional (MT) em alguns países; (referem-se a um conjunto alargado de práticas de cuidados de saúde que não são parte integrante do sistema de cuidados de saúde dominante) e em acrescento às terapêuticas não convencionais (TNC). Ainda de acordo com o mesmo estudo, a designação “Medicina Tradicional” é usada para se referir a Africa, América Latina, à região Sudeste Asiática e/ou à região do Pacífico. Por outro lado a designação “Medicina Alternativa e Complementar” é utilizado quando se refere a Europa e/ou América do Norte e a Austrália. O estudo da OMS sobre uma Estratégia para as Medicinas Tradicionais para 2002-2005, aborda o estado-da-arte das MT/CAM de um modo global e delineia o papel da OMS neste domínio. Mas talvez mais relevante, estabelece uma estratégia no sentido de proporcionar às MT/CAM um papel estratégico na redução das elevadas taxas de mortalidade e de morbilidade, especialmente no seio de populações empobrecidas. Esta estratégia assenta em quatro objetivos: definição de políticas de integração de MT/CAM nos sistemas de saúde nacionais; promoção da segurança, eficácia e qualidade; aumentar a disponibilidade e tornar acessível e a promoção do uso adequado das MT/CAM/TNC, (WHO, 2002). 2 O regime jurídico da promoção da segurança e saúde no trabalho, publicado na Lei n.º 102/2009, de 10 de setembro, alterada pelas Lei n.º 42/2012, de 28 de agosto e Lei n.º 3/2014 de 28 de janeiro. 3 World Health Organization [Em linha]. Disponível em http://www. who.int/topics/traditional_medicine/en/index.html [Consultado em 06/12/2013] 42 Scientific Journal of Natural Medicine | Vol. 1 A Tabela 1 apresenta um quadro das terapias e das técnicas terapêuticas TM/CAM comummente utilizadas (WHO, 2002, pág. 8) Medicina Chinesa Ayurveda Unani Naturopatia Osteopatia Homeopatia Ervas Medicinais 1 1 1 1 2 1 Acupuntura/Acupressão 1 Terapias Manuais Tuina (c) 1 1 3 Terapias Espirituais 1 1 1 1 Exercícios Qigong (e) Yoga Quiropráxia 1 (a) 2 1 Outros 2 (b) 1 Shiatsu (d) Hipnose meditação Relaxação 1 – utiliza comummente esta terapia/técnica terapêutica. 2 – utiliza algumas vezes esta terapia/técnica terapêuica. 3 – utiliza teraupêtica de “toque”. (a) – por exemplo, muitos sistemas informais de MT em Africa en a América Latina utilizam “plantas medicinais”. (b) – por exemplo, na Tailândia, algumas terapias MT de uso comum incorporam acupuntura e acupressão. (c) – tipo de terapia manual utilizada na Medicina Tradicional Chinesa. (d) – refere-se a uma terapia manual de origem Japonesa na qual a pressão é aplicada com os polegares, palmas de mão, etc., em determinados pontos do corpo. (e) – componente da Medicina Tradicional chinesa que combina movimento, meditação e regulação da respiração para promover um fluxo de energia vital (qi) no corpo para melhorar a circulação e activar a função imunidade. De acordo com o European Information Centre for Complementary & Alternative Medicine – EICCAM4 , o uso mundial das MT/CAM/TNC cresceu de modo significativo nos últimos 20 anos. Os níveis de utilização das MT/CAM/TNC nos Estados-Membros variam entre 20% a 70% da população em 1998. A análise de inquéritos realizados nos últimos 10 anos mostra que: a) 20% dos cidadãos Europeus tem uma clara preferência pelos cuidados de saúde com recurso às TNC; b) outros 20% são utilizadores regulares e finalmente c) 20% indicam uma utilização ocasional. Significa esta amostra que mais de 100 milhões de Europeus recorrem ao uso de MT/CAM/ TNC. As práticas mais comuns na Europa são: Homeopatia, Acupuntura, Fitoterapia, Medicina Antroposófica, Naturopatia, Medicina Tradicional Chinesa, Osteopatia e Quiropráxia. A popularidade das diferentes terapias, contudo, é extremamente variável de país para país. São diversos os campos de atuação e de prática das medicinas complementares e alternativas (CAM). Acresce que algumas componentes podem sobrepor-se entre si; caso da acupuntura que também é utilizada na Medicina Convencional, conforme classificação dos tipos de Medicina Complementar e Alternativa (CAM) constante na Tabela 25 4 European Information Centre for Complementary & Alternative Medicine [Em linha]. Disponível em http://www.eiccam.eu/home.php [Consultado em 06/12/2013]. 5 University of Rochester, Medical Center, Health Encyclopedia [Em linha]. Disponível em: http://www.urmc.rochester.edu/Encyclopedia/ Content.aspx?ContentTypeID=85&ContentID=P00189 Scientific Journal of Natural Medicine | Vol. 1 43 Tabela 2 – Tipos de Medicina Complementar e Alternativa Traditional alternative medicine This field includes the more mainstream and accepted forms of therapy, such as acupuncture, homeopathy, and Oriental practices. Traditional alternative medicine has been practiced for centuries worldwide. Traditional alternative medicine may include: Acupuncture Ayurveda Homeopathy Naturopathy Chinese or Oriental medicine Body Touch has been used in medicine since the early days of medical care. Healing by touch is based on the idea that illness or injury located in one area of the body can affect all parts of the body. If, with manual manipulation, the other parts can be brought back to optimum health, the body can concentrate on healing at the site of injury or illness without distraction. Examples of body therapies include: Chiropractic and osteopathy Massage Body movement therapies Tai chi Yoga Diet and herbs Over the centuries, man has gone from a simple diet consisting of meats, fruits, vegetables, and grains, to a diet that often consists of foods rich in fats, oils, and complex carbohydrates. Nutritional excess and nutritional deficiency have become problems in today’s society, both leading to certain chronic diseases. Many dietary and herbal approaches attempt to balance the body’s nutritional well-being. Dietary and herbal approaches may include: External energy Some people believe external forces (energies) from objects or other sources directly affect a person’s health. An example of external energy therapy is: Dietary supplements Herbal medicine Electromagnetic therapy Kinesiology Reiki Qigong Mind Even standard or conventional medicine recognizes the power of the connection between mind and body. Studies have found that people heal better if they have good emotional and mental health. Therapies using the mind may include: Electromagnetic therapy Kinesiology Reiki Qigong Senses Some people believe the senses (touch, sight, hearing, smell, and taste) can affect overall health: Art, dance, and music Visualization and guided imagery 44 Scientific Journal of Natural Medicine | Vol. 1 O enquadramento legal reflete os princípios da perceção do risco. A Resolução sobre o estatuto das medicinas não convencionais do Parlamento Europeu, em 1997, no ponto 2: “Solicita à Comissão que realize um estude minucioso sobre a inocuidade, a eficácia, o âmbito de aplicação e a natureza complementar ou alternativa de cada medicina não convencional, assim como um estudo comparativo entre os modelos jurídicos nacionais vigentes a que estão sujeitos os praticantes de medicinas não convencionais”. Enquadramento Legal O enquadramento da atividade e do exercício dos profissionais que aplicam as terapêuticas não convencionais (TNC) estabelecidas no quadro legal português, identifica um conjunto de prescrições relacionadas com a perceção do risco. A Lei n.º 45/2003 de 22 de Agosto, consigna no artigo 4.º - Princípios: “São princípios orientadores das terapêuticas não convencionais: 1 — O direito individual de opção pelo método terapêutico, baseado numa escolha informada, sobre a inocuidade, qualidade, eficácia e eventuais riscos; (…)”. No mesmo quadro de gestão o artigo 11.º relativo aos locais de prestação de cuidados de saúde prescreve que “n.º 1 — As instalações e outros locais onde sejam prestados cuidados na área das terapêuticas não convencionais só podem funcionar sob a responsabilidade de profissionais devidamente certificados.” Remete e equipara os estabelecimentos para a prática das TNC com as unidades privadas de saúde: “n.º 3 — As condições de funcionamento e licenciamento dos locais onde se exercem as terapêuticas não convencionais regem-se de acordo com o estabelecido pelo Decreto-Lei (n.º 279/2009, de 6 de outubro), que regula a criação e fiscalização das unidades privadas de saúde, com as devidas adaptações.” O referido regime jurídico estabelece ainda no artigo 18.º. relativo às infrações: “Aos profissionais abrangidos por esta lei que lesem a saúde dos utilizadores ou realizem intervenções sem o respectivo consentimento informado é aplicável o disposto nos artigos 150.º, 156.º e 157.º do Código Penal, em igualdade de circunstâncias com os demais profissionais de saúde.”. O Decreto-Lei n.º 279/2009 de 6 de Outubro define que o funcionamento das unidades privadas de serviços de saúde, os requisitos de funcionamento no artigo 9.º: “n.º 1 - O funcionamento das unidades privadas de serviços de saúde deve cumprir requisitos de higiene, segurança e salvaguarda da saúde pública; n.º 2 - As unidades privadas de serviços de saúde devem funcionar de acordo com as regras de qualidade e segurança definidas pelos códigos científicos e técnicos aplicáveis.”. Riscos Ocupacionais Estes profissionais das terapêuticas não convencionais estão expostos a um conjunto abrangente de riscos ocupacionais. A Organização Mundial de Saúde (OMS), apresenta para a saúde ocupacional dos trabalhadores da saúde um conjunto de riscos ocupacionais a que estão expostos6. Os estabelecimentos de cuidados de saúde em todo o mundo empregam mais de 59 milhões trabalhadores que estão expostos diariamente a uma variedade complexa de perigos para a segurança e saúde, que incluem: agentes biológicos, tais como tuberculose, hepatite, HIV/sida e síndroma Respiratória Aguda Severa (SARS); agentes químicos, tais como o glutaraldeído e o óxido de etileno; riscos físicos, tais como ruído, radiação, quedas e lesões músculo-esqueléticas; riscos psicossociais, tais como trabalho em turnos, violência e stress; risco de incêndio e explosão, tais como relacionados com o uso de oxigénio, solução antissética de base alcoólica e ainda riscos elétricos. Neste contexto, os profissionais de saúde carecem de proteção para os riscos ocupacionais tal como os mineiros ou os trabalhadores da construção. No entanto, 6 World Health Organization [Em linha]. Disponível em: http://www. who.int/occupational_health/topics/hcworkers/en/ [Consultado em 06/12/2013]. Scientific Journal of Natural Medicine | Vol. 1 45 como o seu trabalho é cuidar dos doentes, estes profissionais são vistos como imunes a doenças e acidentes ocupacionais; os seus doentes estão em primeiro lugar. A OMS define a lesão músculo-esquelética relacionada com o trabalho (LMERT) como a que resulta de fatores múltiplos, e onde o ambiente laboral e o desempenho profissional, contribuem de modo significativo, mas em escalas variáveis, para a ocorrência da doença7. A designação “lesão músculo-esquelética incorpora problemas de saúde do aparelho locomotor, i.e. músculos, tendões, o esqueleto, o sistema vascular, ligamentos e nervos. As LMERT incluem todas as lesões músculo-esqueléticas que são induzidas ou agravadas pelo trabalho e pelas circunstâncias do seu desempenho. Um estudo Europeu, (EASHW, 2010), mostra que, de acordo com o inquérito de 1999 relacionado com os acidentes de trabalho e as doenças profissionais, o “European Union Labour Force Survey”, módulo ad-hoc EU-LFS (1999), as maiores taxas de incidência das LMERT foram identificadas junto dos trabalhadores dos cuidados de saúde e ação social, transportes, armazenagem e comunicação, construção e agricultura, com taxas 1,2 a 1,6 superiores à média. A Figura 1, relaciona as taxas de prevalência padronizadas (per 100.000,0 trabalhadores) das LMERT por sector de atividade. Figura 1 – Taxa de prevalência padronizada (100 000 trabalhadores) das LMERT, por sector (ad hoc LFS(1999)). 7 World Health Organization, Protecting Workers’ Health Series No. 5, Preventing musculoskeletal disorders in the workplace, 2003, [Em linha]. Disponível em: http://www.who.int/occupational_health/publications/ muscdisorders/en/. [Consultado em 06/12/2013]. Figura 1 Um estudo desenvolvido por Fakhri, (2011) no âmbito da OMS, mostra que a avaliação da exposição aos agentes biológicos no local de trabalho, tem sido concentrada em trabalhadores rurais, profissionais de saúde e pessoal de laboratórios, que apresentam maior risco de efeitos adversos de saúde ocupacional. Uma compilação detalhada de riscos biológicos elaborada por Dutkiewicz et al. (1988) apud Fakhri, (2011) mostra a dispersão do risco biológico para outros tipos de exposição ocupacional, nomeadamente agricultura e produtos agrícolas, cuidados de saúde, produtos farmacêuticos, cabeleireiros, laboratórios clínicos e de investigação, unidades de biotecnologia e centros de dia. O quadro legal europeu relativo aos agentes biológicos, a Directiva 2000/54/CE, de 18 de Setembro, relativa à proteção dos trabalhadores contra riscos ligados à exposição a agentes biológicos durante o trabalho, e neste contexto a transposição para o direito português, Decreto-Lei n.º 84/97, de 16 de Abril, que elenca no respetivo Anexo I o trabalho em unidades de saúde como atividade preferencial de exposição dos trabalhadores a agentes biológicos.. De realçar neste âmbito, a prescrição de um conjunto de medidas especiais para os estabelecimentos médicos; cf. artigo 14.º do referido diploma “os estabelecimentos médicos de saúde (…) devem tomar medidas apropriadas para proteger a segurança e a saúde dos trabalhadores. (…)”. Merece destaque o reforço dos mecanismos de consulta e participação dos trabalhadores na gestão da prevenção. A perceção encontra em determinados contextos um enquadramento legal decorrente de claras preocupações técnicas e sociais. A Directiva 2010/32/UE do Conselho de 10 de Maio de 2010 que executa o Acordo-Quadro relativo à prevenção de ferimentos provocados por objetos cortantes nos sectores hospitalar e da saúde refere nas suas considerações iniciais que “A saúde e a segurança de trabalhadores são primordiais e estão estreitamente ligadas à saúde dos pacientes, forman- 46 Scientific Journal of Natural Medicine | Vol. 1 do a base da qualidade dos serviços prestados” e reforça afirmando que “O processo de elaboração e aplicação de políticas relativas ao material médico cortante deveria resultar do diálogo social”. Factores socioculturais podem influenciar o risco percecionado a partir do stress ocupacional, (Daniels, 2004). O estudo publicado conclui que seja possível que tais fatores socioculturais, que configuram a questão dos riscos psicossociais, influenciem o alcance da capacidade dos sistemas de monitorização detetarem de modo eficaz o dano psicossocial resultante do trabalho, assim como até que ponto os trabalhadores e os gestores atuam com base em aconselhamento dos decisores das políticas. Neste contexto, a questão organizacional ganha relevo; procedimentos de comunicação de risco eficazes podem atuar no sentido de minimizar a influência dos factos psicossociais; contudo uma comunicação de risco inapropriada pode acentuar qualquer problema. A perceção do risco é de difícil entendimento (Sjöberg, 2000). Vários são os factores propostos para uma explicação do risco percepcionado. Um primeiro fator, quase natural, é o próprio risco. Alguns modelos baseados na percepção do risco como somatório de dieffentes factores desse memso risco. Uma abordagem de cariz organizacional, baseado em modelos culturais, no entanto, defende a perceopção do risco como resultante do contexto social e organizacional em que o indviduo se encontra inserido, sendo a “atitude” um factor crucial. Comunicação requer assim cuidados específicos na construção das soluções para as consequências emergentes. Scientific Journal of Natural Medicine | Vol. 1 47 Considerações Finais A atividade MT/CAM/TNC é uma atividade económica relevante. No seio das Nações Unidas8, no âmbito do Conselho Social e Económico, uma sessão de 2009, relativa à promoção e defesa do potencial da MT/CAM/TNC, é referido o receio do uso indevido das MT/CAM e dos recursos em função do aumento da procura. Os peritos apelaram à preservação do conhecimento tradicional e aos direitos de proteção da propriedade intelectual. Evidências apontam para o uso da MT por mais de 50% da população em determinados países, incluindo Uganda, Tanzânia, Ruanda, Mali e Etiópia. As vendas totais de “ervas medicinais” na Europa, em 2003 foram de 3,7 mil milhões de Euros. Na China, em 2005, o valor das vendas relacionadas com a Medicina Tradicional Chinesa totalizou 14,0 mil milhões de Dólares (US$), registando um aumento de 23,8% em relação ao ano anterior. A evolução em termos políticos no campo da MT/CAM/TNC é significativa; até 1990, apenas 5 Estados Membros (ONU) tinham uma política para a MT, um valor que cresceu para 48 em 2007. Do mesmo modo, em 1970, apenas 12 países tinham um instituto nacional de investigação para a MT; em 2007, o número tinha crescido exponencialmente para 62 países. Neste contexto de uma atividade económica emergente, no âmbito da prestação de cuidados de saúde, os seus profissionais estão expostos a múltiplos riscos ocupacionais; exposição quer a riscos específicos/intrínsecos da atividade TNC, quer a riscos emergentes, como os psicossociais. Acresce na sua relação com os utentes, a necessidade de uma deontologia profissional relevante e estruturante. Importa assim capacitar estes trabalhadores, no entendimento do enquadramento regulamentar em publicação. Projecto de I&D, tal como o desenvolvimento de um questionário internacional para aferir o uso de MT/CAM/TNC, designado por (I-CAM-Q) é um exemplo completo de oportunidade (Quandt, A. et al, 2009). As questões nucleares estão elaboradas no sentido de aferir a frequência de utilização, objetivo (tratamento de condições crónicas ou agudas; acompanhamento do estado de saúde) e o grau de satisfação como utilizador. Estes exemplos evidenciam a pertinência da necessidade de um maior conhecimento no alinhamento das recomendações de 1997 da EU. Os mecanismos de participação e consulta dos trabalhadores, neste contexto dos profissionais das terapêuticas não convencionais, constituem uma abordagem estruturante na prevenção da exposição ao risco ocupacional. A conceção, validação e disseminação de boas práticas, integrando procedimentos de gestão, assim como prescrições legais em matéria de segurança e saúde, reunidos num documento de cariz profissional, “Manual de Boas Práticas em Segurança e Saúde Ocupacional no exercício das Terapêuticas Não Convencionais”, configura um instrumento de trabalho oportuno, seguro, eficaz e fiável, na linha dos princípios orientadores do exercício das TNC, (cf. artigo 4.º da Lei n.º 45/2003, de 22 de Agosto: “(…) A promoção da investigação científica nas diferentes áreas das terapêuticas não convencionais, visando alcançar elevados padrões de qualidade, eficácia e efectividade.”. 8 United Nations, Economic and Social Council, ECOSOC/6385, Organizational Session, Panel Discussion (PM), 12 February 2009 [Em linha]. Disponível em: http://www.un.org/News/Press/docs/2009/ecosoc6385.doc.htm- [Consultado em 06/12/2013]. 48 Scientific Journal of Natural Medicine | Vol. 1 PALAVRAS-CHAVE: Risco, Perceção do Risco, Terapêuticas Não-Convencionais (TNC) REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS: • Daniels. K. (2004) Perceived risk from occupational stress: a survey of 15 European countries. In: Occupational Environmental Medicine, 2004, N.º 61, pp. 467-470, doi:10.1136/oem.2003.009142. • Diário da República, 1.ª série, N.º 176, 10 de Setembro de 2009, Assembleia da República, Lei n.º 102/2009 de 10 de Setembro, que publica o Regime jurídico da promoção da segurança e saúde no trabalho. • Diário da República, 1.ª série-A, N.º 193, 22 de Agosto de 2003, Assembleia da República, Lei n.º 45/2003 de 22 de Agosto que publica a Lei do enquadramento base das terapêuticas não convencionais • Directiva 89/391/CEE do Conselho, de 12 de Junho de 1989, relativa à aplicação de medidas destinadas a promover a melhoria da segurança e da saúde dos trabalhadores no trabalho. • Directiva 2000/54/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 18 de Setembro de 2000, relativa à proteção dos trabalhadores contra riscos ligados à exposição a agentes biológicos durante o trabalho. • EASHW, (2010). OSH in figures: Work-related musculoskeletal disorders in the EU — Facts and figures. European Agency for Safety and Health at Work, Luxembourg: Publications Office of the European Union, 2010, 179 pp., ISBN 978-92-9191-261-2. • European Parliament resolution on the status of non-conventional medicine (A4-0075/97), OJ C 182/67 [1997] • Fakhri, Z. (2011). Workplace Biohazards, in 38. Biological Hazards, Fakhri, Zuheir Ibrahim, Editor, Encyclopedia of Occupational Health and Safety, Jeanne Mager Stellman, Editor-in-Chief. International Labor Organization, Geneva. 2011. • ILO, (2001). Guidelines on occupational safety and health management systems, ILO-OSH 2001. Geneva, International Labour Office, ISBN 92-2-111634-4. • ISO, (2009). ISO Guide 73:2009, Risk management – Vocabulary. International Standard Organization. • OHSAS, (18001:2007). Occupational health and safety management systems – Requirements. Occupational Health and Safety Assessment Series. OHSAS Project Group 2007, ISBN 978 0 580 50802 8. • Quandt, S. et al (2009). Development of an International Questionnaire to Measure Use of Complementary and Alternative Medicine (I-CAM-Q). In: The Journal of Alternative and Complementary Medicine. April 2009, Vol. 15(4): pp. 331-339. doi:10.1089/acm.2008.0521. • (Rayner & Cantor, 1987). • Schmidt, M. (2004). Investigating risk perception: a short introduction - Chapter 3. In: Schmidt, M. 2004. Loss of agro-biodiversity in Vavilov centers, with a special focus on the risks of genetically modified organisms (GMOs). PhD Thesis, Vienna, Austria • Sjöberg, L., Moen, B., Rundmo, T. (2004). Explaining risk perception. An evaluation of the psychometric paradigm in risk perception research. Norwegian University of Science and Technology, Department of Psychology, 7491 Trondheim, Norway, ISBN 82-7892-024 • Sjöberg, L. (2000). Factors in risk perception. In: Risk Analysis, Vol. 20, N.º 01, 2000 • WHO, (2000). General Guidelines for Methodologies on Research and Evaluation of Traditional Medicine. 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Ana Cristina Esteves Licenciada e Biologia na Universidade de Aveiro (UA) em 1996 e doutorada em Biologia pela UA em colaboração com com o Centro de Neurociência e Biologia da Célula, da Universidade de Coimbra, em 2002. Professora Convidada do Departamento de Biologia da Universidade de Aveiro, bem como investigadora do CESAM-UA (Centre of Environmental and Marine Studies). A investigação é centrada na relação da interação dos micro organismos com outros organismos e a sua resposta às alterações do ambiente. Ana Cristina Estrela de Oliveira C. Cordeiro Bolseira de pós-doutoramento da FCT . Ligação à FMUP e ao IBMC. A área de investigação é a dor visceral crónica, à qual se encontram associadas patologias como o síndrome de cólon irritável, a cistite intersticial, entre outras doenças. Estudo sobre os mecanismos pato-fisiológicos destas doenças, bem como arranjar novos tratamentos e ferramentas de diagnóstico. Percurso escolar na Escola Superior de Biotecnologia da Universidade Católica Portuguesa para obtenção da licenciatura em Microbiologia. Passagem pelo IPATIMUP. Grau de mestre em Toxicologia pela Universidade de Aveiro. Grau de doutor em Biologia Humana, pela Faculdade de Medicina da Universidade do Porto. 50 António José Afonso Marcos Professor Universitário. Mestre em Medicina Natural e Especialista em Dietética e Nutrição pela Faculdade de Medicina da USC. Pós-graduado em Acupunctura e Moxibustão pela Associação Médica Chinesa. Diplomado em Acupunctura e em Naturopatia pela ESTP. Presidente do Instituto Português de Naturologia. Membro consultor em Comissões de elaboração de diplomas legais. Membro do Conselho Científico de várias revistas científicas. Diretor do CTEC e Presidente do Conselho Científico da Universidade. Arménio Jorge Moura Barbosa Licenciado em Bioquímica pela Universidade do Porto em 2006 tendo participado no programa Erasmus na Universidade de Modena e Reggio Emilia (Italia). Doutorado em 2010 pela Universidade de Modena e Reggio Emilia (Itália) em química computacional, sobre a interação de ligandos com o recetor de serotonina 5-HT3. Em 2010 iniciou o Pos-doutoramento na área da descoberta e desenvolvimento de fármacos anti-cancro, utilizando bases de dados de moléculas orgânicas de origem sintética e natural. Participa anualmente em congressos internacionais apresentando resultados para targets: epigeneticos, recetores GPCR, complexos proteína-RNA, recetores nucleares. Colabora com vários grupos de investigação nacionais e internacionais e tem varias publicações em revistas cientificas. Carlos Manuel Moreira Mota Cardoso Licenciatura em Medicina e Cirurgia, pela Faculdade de Medicina da Universidade do Porto. Título de Especialista em Psiquiatria pela Ordem dos Médicos. Bolseiro da Direcção Geral de Cuidados de Saúde Primários para efectuar um estágio em Trieste (Itália) no Hospital de S. Giovani (1985). Grau de Mestre em Psicopatologia pela Universidade do Porto (Dissertação: A Clínica Psiquiátrica de Urgência – 13 anos de experiência). Grau de doutor em Psicologia pela Universidade do Porto (Dissertação: Os Caminhos da Esquizofrenia). Scientific Journal of Natural Medicine | Vol. 1 membros do conselho científico (resumo curricular) Director do Hospital do Conde de Ferreira e Presidente do Conselho de Gerência, por vários mandatos. Director do Centro de Saúde Mental do Norte. Membro eleito do Colégio Português de Psiquiatria da Ordem dos Médicos. Coordenador da Ordem dos Médicos para o Serviço Nacional de Saúde. Mandato no Colégio de psiquiatria da Ordem dos Médicos. Nomeado pelo Conselho Científico da Faculdade de Direito da Universidade do Porto como docente convidado da Escola Superior de Criminologia. Foi-lhe atribuído o título académico de “Professor Afiliado”. Participação em diversos trabalhos de investigação e autor de várias publicações e artigos da especialidade. Jose Maria Robles Robles Licenciado em Fisioterapia pela Universidade Europeia de Madrid. Diplomado em Ciências da Saúde, Fisioterapia, da Universidade Alfonso X el Sabio, Madrid. Doutorado em Acupuntura pelo Comitê Internacional de Exames República Popular da China, pertencente ao Ministério da Saúde Pública. Formação em Terapias Alternativas: Acupuntura, Naturopatia, Osteopatia, Massagem. Formação em Medicinas Tradicionais pelas Universidades da China, Tailândia. Diretor da Academia de Ciências da Saúde, em Barcelona. João Paulo Ferreira Leal Consultor científico independente, tendo desempenhado funções docentes ao longo de duas décadas em instituições portuguesas de ensino superior nas áreas letivas de Antropologia, Bioética, Ética, Deontologia Profissional, e Política. É licenciado em Antropologia, pós-graduado e mestre em Relações Internacionais (Ética em RI), DEA em Antropologia Social e doutorado em Psicologia (Psicologia de Desenvolvimento Moral). Realizou pós-doutoramento em Antropologia Médica, com relatório de pesquisa orientado para os temas da Antropologia do Corpo, da Doença e da Saúde. Luis Alberto Coelho Rebelo Maia Editor-in-Chief da “Iberian Journal of Clinical & Forensic Neuroscience” (ISSN - 2182 - 0290) .Cédula Profissional da Ordem dos Psicólogos, n.º 102. Professor Auxiliar - Beira Interior University. Clinical Neuropsychologist, PhD (USAL - Spain). Neuroscientist, MsC (Medicine School of Lisbon - Portugal). Medico Legal Perit (Medicine Institute Abel Salazar - Oporto, Portugal). Graduation in Clinical Neuropsychology (USAL Spain). Graduation in Investigative Proficiency on Psychobiology (USAL-Spain).Clinical Psychologist (Minho University - Portugal). Associated Editor of “Revista Psicologia e Educação” UBI. Integrated Researcher in CIDESD - Center for Investigation in Sports, Education and Health- UBI Portugal. Maria Isabel do Amaral A. Vaz Ponce de Leão Licenciatura em Filologia Românica pela Universidade de Coimbra. 3.º Ciclo de Estudos em Teoria da Literatura e Literatura Comparada pela Faculdade de Filoloxia da Universidade de Santiago de Compostela. Doutoramento em Literaturas Hispânicas pela mesma Universidade (reconhecido pela Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, Portugal, com o n.º 1/98, com publicação no Diário da República n.º 188 de 17.08.98). Agregação em 2009. Estatuto de formadora na área e domínio C046 Português / Língua Portuguesa, concedido pelo Conselho Científico-Pedagógico da Formação Contínua, conforme registo CCPFC/RFO-02956/97. Professora Catedrática da Universidade Fernando Pessoa. Membro integrado do CLEPUL a cuja direcção pertence, e colaboradora do CIEC. Sócia fundadora e elemento da direcção do Circulo Literário Agustina Bessa-Luís. Coordenadora do projecto e-médico+. Áreas de Investigação: Literatura Portuguesa Contemporânea, Literatura / artes / ciências. Discurso de Imprensa. Autora de vários livros e artigos que incidem nas áreas acima referidas. Scientific Journal of Natural Medicine | Vol. 1 51 membros do conselho científico (resumo curricular) Maria Manuela Nunes da Costa Maia da Silva Licenciatura em Direito. 3.º Ciclo de Estudos Direito pela Faculdade de Direito da Universidade de Santiago de Compostela. Bolseira de Investigação da JNICT durante 4 anos, com estatuto de Investigadora. Doutoramento Europeu em Direito, pela Faculdade de Direito da Universidade de Santiago de Compostela, reconhecido pela Faculdade de Direito de Coimbra e publicado em Diário da República. Mestre em Medicina Natural e Aplicação em Atenção Primária, pela Faculdade de Medicina da Universidade Santiago Compostela. Pós-graduação em Acupunctura e Moxibustão pela Associação Médica Chinesa, Beijing, China. Diretora Geral do Instituto Português de Naturologia. Professora Universitária. Exercício de vários cargos de direção e reitoria em instituições de ensino superior. Presidente do Conselho Científico de uma das universidades. Membro integrado do CLEPUL. Membro consultor em Comissões de elaboração de diplomas legais. Membro de Conselho Científico de várias revistas científicas. Presidente da APSANA - Associação Europeia de Profissionais de Saúde Natural. Membro fundador de Rui Miguel Freitas Gonçalves Licenciado em Bioquímica com especialização em Indústrias Alimentares pela Faculdade de Ciências da Universidade do Porto. Mestre em Tecnologia Ciência e Segurança Alimentar pela Escola de Engenharia da Universidade do Minho e pela Faculdade de Ciências da Universidade do Porto. Doutor em Química pela Faculdade de Ciências da Universidade do Porto. Bolseiro do Instituto de Bebidas e Saúde – Unicer. Vencedor do Prémio de Excelência em Investigação Científica pelo Instituto de Bebidas e Saúde. Investigador na área da Química de Compostos Fenólicos e seu efeito nutricional com várias publicações em revistas internacionais e apresentações em congressos nacionais e internacionais. Licenciado em Ciências Básicas da Medicina pela Escola de Ciências da Saúde da Universidade do Minho. Diplomado em Medicina Chinesa pelo Instituto Português de Naturologia. Formação complementar em Shiatsu Namikoshi. Formador na área da Medicina Chinesa. Centros de Investigação e membro atual de alguns Centros de Investigação. Autora de várias publicações. Miguel F. Tato Diogo Licenciado em Engenharia de Minas pela Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto e Doutorado em Gestão de Recursos Naturais com apoio em Sistemas de Informação Geográfica pela Universidade de Vigo, Espanha. Professor da Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto. Membro (Investigador) do CIGAR – Centro de Investigação em Geo-Ambiente e Recursos e do CERENA – Centro de Recuros Naturais e Ambiente. Membro da Comissão Científica do Programa de Formação Contínua da FEUP. Membro (Vogal) da Comissão Diretiva do Centro de Competências em Envelhecimento Ativo e Saudável (UPorto Ageing Network) da Universidade do Porto, no grupo de trabalho, “Fostering Innovation for Age-friendly Buildings, Cities & Environments. 52 Scientific Journal of Natural Medicine | Vol. 1 normas para publicação 1. A Scientific Journal of Natural Medicine, pretende ser um espaço de reflexão e trabalho no âmbito da saúde e, em especial, na Medicina Natural, fundada na ética e no rigor científico. 2. Os autores interessados em submeter artigos para a publicação poderão contribuir com artigos de investigação, recensões, ou outro material de natureza e relevância científica. 3. Os interessados poderão, ainda, participar com trabalhos apresentados em encontros científicos, congressos, comentários, reflexões e outras actividades de relevância. É um espaço de divulgação científica para profissionais de saúde, terapeutas e cientistas com o objetivo de avaliar, validar, desenvolver e integrar as diversas áreas da Medicina Natural na sua vertente clínica e de conhecimento fundamental. 4. A revista apresenta investigação original com impacto direto nas terapias, protocolos terapêuticos, abordagem aos doentes, estratégias de ensino e de trabalho com o objetivo último de melhorar a qualidade do processo terapêutico. 5. O âmbito da Revista de Medicina Natural inclui: •Botânica Médica •Fitoterapia •Farmacologia e metodologia analítica •Naturopatia •Homeopatia •Nutrição e suplementação alimentar •Acupuntura e Medicina Tradicional Chinesa •Ayurveda •Yoga •Tai Chi •Qi Gong •Osteopatia •Massagem •Medicina Holística •Filosofia Médica •Ética Médica 6. As secções tipologias dos trabalhos na Revista de Medicina Natural são: •Trabalhos originais de Investigação Fundamental Clássica •Trabalhos originais de Investigação Fundamental Moderna •Trabalhos originais de Patologia e Metodologia Terapêutica Scientific Journal of Natural Medicine | Vol. 1 53 normas para publicação 7. Os textos propostos devem ser enviados para o e-mail para [email protected]. 8. Os artigos são da responsabilidade dos respectivos autores e não serão devolvidos, independentemente da sua publicação. 9. A seleção dos artigos de investigação, para publicação, será realizada por revisão anónima por pares, preferencialmente por três membros do Conselho Científico da revista. Os direitos autoriais são propriedade da revista. 10. Cada autor poderá submeter, como autor principal, um artigo por cada edição da revista. 11. Os trabalhos a publicar deverão: •Ser originais. A submissão de trabalhos à implica que o trabalho não tenha sido previamente publicado com exceção de comunicação oral ou poster em congresso, tese académica ou aula e que não se encontra de momento sob apreciação em nenhuma outra publicação. •Ser escritos em Português e/ou Inglês. A aceitação de outra língua estará sujeita a aprovação do editor. Não excedendo as 7000 palavras; •Conter um resumo em português e inglês, com cerca de 80 a 120 palavras (abstract); •Conter cinco palavras chave devidamente identificadas pelos autores, para fins de indexação; • Ser encabeçados pelo título, nome do autor, categoria profissional, instituição e contacto eletrónico, breve resumo curricular com máximo de 5 linhas; • Os artigos deverão ser divididos em secções claramente identificadas com conteúdo e sequência coerente; •Respeitar as regras da metodologia do trabalho científico, concernentes às formas de citar, organizar a bibliografia. 12. A publicação do trabalho é aprovada por todos os autores e, de forma tácita ou explícita pela autoridades ou instituições em que o trabalho foi realizado e não será publicada nesta, ou noutra forma, em qualquer idioma, sem o consentimento do editor da revista. 13. A submissão de material assume a ausência de qualquer tipo de conflito de interesse entre todos os autores e o trabalho realizado. Na sua presença, esta deverá ser declarada e caracterizada aquando da submissão inicial do trabalho e estará presente no final do manuscrito aquando da publicação. A título informativo: um conflito de interesse em trabalho científico existe quando um participante no processo de produção, revisão ou publicação (autor, revisor e/ou editor) tem ligações a atividade que poderiam, de forma inadequada, influenciar o seu julgamento, independentemente desse julgamento ser de facto afetado. As relações financeiras com a indústria (emprego, consultadoria, participação em sociedades financeiras, etc.) são consideradas as mais relevantes mas não devem ser excluídos o financiamento do trabalho de investigação as ligações pessoais e as de competição académica. 54 Scientific Journal of Natural Medicine | Vol. 1 SCIENTIFIC JOURNAL OF NATURAL MEDICINE REVISTA CIENTIFICA DE MEDICINA NATURAL Dezembro 2013 [email protected]