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INTRODUÇÃO
Graciliano Ramos foi, mesmo sem querer, um escritor que teve sorte em ter suas
obras adaptadas para o cinema. Vidas Secas (1963, por Nelson Pereira dos Santos), São
Bernardo (1971, por Leon Hirzman) e Memórias do Cárcere (1985, novamente por Nelson
Pereira dos Santos) são três exemplos disso. O caso de Vidas Secas é bem particular e é sobre
ele, e, mais particularmente, sobre os aspectos de sua personagem feminina, Sinhá Vitória,
que nos debruçamos.
O objetivo geral da pesquisa é estudar a relação cinema e literatura, tendo como
foco o romance Vidas Secas, de Graciliano Ramos, e sua adaptação cinematográfica, dirigida
por Nelson Pereira dos Santos. Como objetivos específicos, temos o propósito de
contextualizar a produção de Graciliano Ramos e Nelson Pereira dos Santos e o seu papel nas
respectivas “escolas estéticas” e suas épocas, bem como demonstrar a importância de Vidas
Secas em suas obras; investigar a construção da personagem feminina de Vidas Secas,
considerando aspectos, tais como comportamento, fala, discurso etc. no romance e em sua
tradução para o cinema; e analisar aspectos da construção de Sinhá Vitória e suas implicações
como sujeito social, considerando o texto literário e o texto cinematográfico.
A análise comparada da obra literária de Graciliano Ramos com a obra
cinematográfica traduzida por Nelson Pereira dos Santos justifica-se pela contribuição que se
propõe a dar aos estudos de tradução e aos estudos fílmicos, dando também espaço aos
estudos sociológicos, quando se destacar a produção de discursos sobre o papel da mulher em
uma sociedade machista de uma referida época e lugar.
Antes de partir para uma apresentação teórica, iniciamos nosso estudo destacando
os criadores das referidas obras, trazendo à tona as suas respectivas “escolas” (o Romance de
30 e o Cinema Novo) e suas principais características. Ao vermos os autores sob uma
perspectiva social e histórica, solidificamos o terreno para melhor estudarmos seus trabalhos.
A apresentação teórica levará em consideração o trabalho de Roman Jakobson
(1973), Julio Plaza (2001), André Lefevere (2007), Gideon Toury (1980), todos de uma
maneira ou de outra ligados à tradução intersemiótica, e Robert Stam (2000), mais associado
aos estudos fílmicos. No estudo sobre a personagem, o texto “A personagem
cinematográfica”, de Paulo Emilio Salles Gomes, que compõe a antologia A personagem de
ficção (1971), é de extrema valia para ajudar a completar a nossa base teórica.
A análise partirá de passagens descritivas da personagem Sinhá Vitória no
romance de Graciliano Ramos para identificarmos as estratégias de tradução utilizadas por
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Nelson Pereira dos Santos para compor a sua obra que reescreve o universo literário. Tal obra
marcou época em 1963 e continua a ser um exemplar inesgotável, tanto de apreciação
estética, quanto como objeto de estudo.
O texto está divido em três capítulos. O primeiro trata dos dois criadores das obras
literária e cinematográfica, seus respectivos lugares de destaque e contextualização histórica e
termina com uma justificativa do trabalho, que apresenta três estudos comparados de Vidas
Secas (livro e filme). O segundo capítulo aponta os teóricos da tradução e estudiosos de
cinema e o terceiro finaliza com as análises preliminares da tradução de Vidas Secas para as
telas.
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1. VIDAS SECAS, O ROMANCE, E SUA TRADUÇÃO PARA O CINEMA
1.1. O romance de 30
José Lins do Rego, José Américo de Almeida, Rachel de Queiroz, Érico
Veríssimo, Jorge Amado e Graciliano Ramos são escritores que fazem parte do cânone de
nossa literatura, tendo conquistado seu espaço graças a um estilo novo, moderno,
incorporando a linguagem regional, a gíria local, à narrativa. Em alguns livros didáticos
(NICOLA, 1999, p. 353; COUTINHO, 1997, p.337), costuma-se convencionar o marco
inicial do Romance de 30 (também conhecido como “romance neorrealista” ou “romance
regionalista moderno”) com A Bagaceira (1928), de José Américo de Almeida.
As obras desses autores caracterizaram-se por darem uma forte importância às
questões sociais, que estavam em pauta naquele momento conturbado. Vale lembrar que a
década de 1930 foi um período bem propício para que questões políticas fossem levantadas.
No Brasil, Getúlio Vargas inaugurava o “Estado Novo” e o mundo assistia ao crescimento do
socialismo na União Soviética, no período entre guerras. Os romances tiveram, dentre outras
funções, a de denunciar as desigualdades e as injustiças sociais, através de relatos
emocionantes e particulares de cada autor.
Praticamente todos os autores supracitados se envolveram de uma forma ou de
outra com a política do país. José Américo de Almeida, por exemplo, chegou a candidatar-se
a Presidente da República em 1937, mas as eleições foram canceladas pelo Estado Novo.
Vingou-se de Getúlio Vargas prestando um depoimento para Carlos Lacerda, que ajudaria a
acabar com a ditadura do Presidente.
Rachel de Queiroz, por sua vez, converteu-se ao Marxismo, aderiu ao PCB por
aproximadamente dois anos, de 1931-32 até 1933. Entretanto, quando dirigentes do partido
criticaram os originais de seu segundo romance, João Miguel (1932), tentando impedir o
lançamento, “por conta de uma passagem onde um operário mata outro” (GASPAR, 2010,
p.1), ela entrou em choque com o partido e passou a morar em São Paulo com os trotskistas,
uma espécie de “fração rebelde, expulsa, traidora” (QUEIROZ, 1989, p. 1) do Partido
Comunista. Nos anos 60, passou a se dedicar mais a traduções e terminou a carreira aderindo
ao conservadorismo e se tornando fiel apoiadora do regime militar (1964-1985), tornando-se
alvo de críticas por parte de muitos. Questionada por Caio Fernando Abreu no programa Roda
Viva porque ela apoiou o regime, ela respondeu:
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“Eu abominava o janguismo e ainda hoje abomino o Brizola, que representa o
janguismo, o Getúlio. Era uma expressão disso tudo”. Sobre as torturas do regime
militar, ela se manifesta contra: “A revolução que apoiei foi enquanto Castelo
Branco era presidente, e ele não fez tortura nenhuma, a intenção dele era fazer
eleições para um presidente civil” (LIMA, 2010, p.1).
Jorge Amado também foi filiado ao Partido Comunista e chegou a ser preso por
suspeita de participar da Intentona Comunista de Luís Carlos Prestes. Durante o Estado Novo,
foi preso inúmeras vezes e teve seu livro Capitães de Areia proibido. Ganhou fama mundial e
viajou diversas vezes com o poeta chileno Pablo Neruda, outro militante de esquerda.
“Durante o Estado Novo, seus livros circulavam clandestinamente” (SALEM, 1996, p. 47).
Érico Veríssimo, logo em seu primeiro romance, Caminhos Cruzados (1935), foi
questionado pela polícia sobre sua orientação política. Como não simpatizava com a política
de Getúlio Vargas, aceitou a proposta do Departamento de Estado americano e passou uma
temporada nos Estados Unidos ministrando aulas de Literatura Brasileira na Universidade da
Califórnia, em Berkeley.
Quanto a Graciliano Ramos, sua relação com a política já começou antes mesmo
de ele ganhar fama como escritor. Em 1927, ele foi eleito prefeito de Palmeira dos Índios,
interior de Alagoas, renunciando ao cargo em 1930. Foi um dos suspeitos de participar do
Partido Comunista, o que o levou a ser preso por alguns meses, sendo solto por falta de
provas. Ingressou no Partido Comunista em 1945.
Como consequência de tanta militância política, pressupõe-se que os romances
publicados nesse período tivessem uma natureza antifascita e anticapitalista.
Quanto à relação dos escritores da geração de 30 com os modernistas de 1922,
segundo Bosi (1988, p.221), “o Modernismo fora apenas uma porta aberta.” Bosi, inclusive,
faz uma distinção entre escritores modernistas (os da geração de 22) e modernos (da geração
de 30).
E ainda que o romance de 30 seja mais conhecido por ser ambientado em áreas
rurais e apresentarem caráter de denúncia, havia também naquela época romances intimistas,
cujos principais representantes eram José Geraldo Vieira, Lúcio Cardoso, Cornélio Penna e
Octávio de Faria. Tais autores são pouco conhecidos do grande público e ficaram eclipsados
pelos demais. Segundo Bueno, os escritores ditos intimistas eram, “de maneira geral,
considerados alheios aos problemas locais, brasileiros, absortos que estavam por sua ânsia de
espiritualidade” (2009, p.1). É importante notar, portanto, que, dentro daquele cenário de
militância política, havia escritores que andavam na direção contrária e abraçavam uma
espécie de neorromantismo, ainda que o tempo tenha feito o favor de torná-los esquecidos.
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Desse grupo de escritores da geração que cobre o período de 1930 a 1945,
provavelmente o que mais se destacou foi Graciliano Ramos, que estreou em livro com
Caetés (1933), mas que se tornaria mais conhecido como o autor de São Bernardo (1934) e
Vidas Secas (1938). A experiência na prisão o levou a escrever o livro Memórias do Cárcere,
lançado postumamente em 1953.
1.2. Graciliano Ramos
Nascido em Quebrângulo, Alagoas, em 27 de outubro de 1892, aproximou-se cedo
da política, chegando a prefeito da cidade de Palmeira dos Índios. Quando partiu para Maceió,
manteve contato com outros romancistas importantes da época, como José Lins do Rego,
Rachel de Queiroz e Jorge Amado. Entre eles havia em comum o fato de não estarem
satisfeitos com os rumos do governo do Presidente Getúlio Vargas.
Sua prisão em 1936 por ser considerado subversivo foi impactante o suficiente
para ser transformada em livro (Memórias do Cárcere, lançado postumamente em 1953). Só
com a queda de Getúlio Vargas em 1945 – coincidentemente também o ano do fim da
Segunda Guerra Mundial, o que apontava para novos rumos mundiais -, é que Graciliano
pôde ingressar abertamente no Partido Comunista, até então uma organização clandestina.
Porém, não duraria dois anos para que o partido se tornasse novamente ilegal.
Sua obra pode ser dividida, conforme a classifica Antonio Candido (apud
NICOLA, 1998, p. 363), da seguinte forma: a) romances narrados em primeira pessoa
(Caetés, São Bernardo e Angústia); b) romance narrado em terceira pessoa (Vidas Secas); e c)
autobiografias (Infância e Memórias do Cárcere). No entanto, ainda que narrado em terceira
pessoa, Vidas Secas apresenta uma particularidade: a voz do narrador se mistura com a voz do
personagem, assimilando o registro linguístico local. E, por voz do personagem, refiro-me a
seus pensamentos, como nas várias vezes em que o autor apresenta a narrativa do ponto de
vista de uma cadela, a cachorra Baleia.
1.3. Vidas Secas, o romance
Vidas Secas é um romance que até hoje é tido como um dos mais importantes da
literatura brasileira. Isto se deve não por se tratar apenas de uma obra forte do ponto de vista
social, por mostrar a difícil vida dos sertanejos que sofrem com a seca; mas também pela sua
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elaboração do ponto de vista estético, por transpor o aspecto seco da ambientação da caatinga
para a linguagem, também seca, despida de floreios, do autor.
Sobre o destaque aos aspectos sociais da obra de Graciliano Ramos e da geração
de 30, Rossi explica:
As transformações sociais advindas das mudanças no contexto mundial e
nacional fazem com que os autores da 2ª fase do Modernismo se
concentrem na descrição do homem brasileiro, fazendo com que o
regionalismo seja uma constante nas obras do período, havendo uma
configuração de sua atuação no meio natural e social, assumindo uma
relação de denúncia em relação à vida (...) (2008, p.5).
O texto de Graciliano Ramos, ainda que enxuto, não seria desprovido de um tom
poético, como pode ser observado no fragmento abaixo, protagonizado pela cachorra Baleia e
Sinhá Vitória:
Sentindo a deslocação do ar e a crepitação dos gravetos, Baleia despertou,
retirou-se prudentemente, receosa de sapecar o pêlo, e ficou observando
maravilhada as estrelinhas vermelhas que se apagavam antes de tocar o
chão. Aprovou com um movimento de cauda aquele fenômeno e desejou
expressar a sua admiração à dona. Chegou-se a ela em saltos curtos,
ofegando, erguendo-se nas pernas traseiras, imitando gente. Mas Sinhá
Vitória não queria saber de elogios (2008, pp.39-40).
Nesse trecho, nota-se o carinho com que Graciliano Ramos trata Baleia e o modo
um tanto ríspido como pinta Sinhá Vitória, ainda que neste capítulo em particular ele mescle
dois pontos de vista: o da cadela e o de sua dona.
Não é à toa que a obra foi construída inicialmente a partir de um conto chamado
“Baleia”, que depois se tornou capítulo do livro (RUGGERO, s/d, p.2). E o capítulo não é
apenas uma cruel execução de uma cachorrinha que, no meio do livro, já se tinha se tornado
quase gente, parte da família e digna de ter os seus próprios pensamentos descritos pelo
narrador, tanto quanto também tinham Fabiano, Sinhá Vitória e seus dois filhos.
Não se deve deixar de lado a ideia de que os personagens de Graciliano Ramos são
considerados por alguns teóricos e críticos como representações de si mesmo. Álvaro Lins,
em seu posfácio para a 45ª edição de Vidas Secas, menciona o fato de que os personagens de
todos os romances do autor são “em geral desgraçados, criaturas em desencontro com o
destino, humilhadas e destroçadas” (p. 79). E acrescenta que “os personagens estão entregues
aos seus próprios destinos. E não contam sequer com a piedade do romancista” (p. 79). Lins
ainda afirma que só a um de seus personagens Graciliano Ramos trata com simpatia, e “este
não é gente, mas um cachorro” (p. 79), referindo-se à cachorra Baleia. O crítico ainda afirma
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que Graciliano “não tem pena dos seus personagens, porque está projetado neles, e dispõe de
forças suficientes para de si mesmo não ter pena nenhuma” (p. 80).
Outra perspectiva observada na obra do autor é o regionalismo. Segundo Rossi:
Graciliano Ramos, desde o início de sua vida literária, em 1933, valorizou
aspectos relativos ao regionalismo, sobretudo dos resultados advindos da
seca nordestina, como as desigualdades sociais, a desvalorização do ser
humano no aspecto social e econômico, a miséria e a fome (2008, p.6).
Esse aspecto pode ser observado no romance, dentre outras formas, por meio de
passagens que ilustram a vegetação seca do sertão nordestino, como na passagem abaixo:
Encolhido no banco do copiar, Fabiano espiava a catinga amarela, onde as
folhas secas se pulverizavam, trituradas pelos redemoinhos, e os garranchos
se torciam, negros, torrados. No céu azul as últimas arribações tinham
desaparecido. Pouco a pouco os bichos se finavam, devorados pelo
carrapato. E Fabiano resistia, pedindo a Deus um milagre (RAMOS, 2008,
p.117).
Esse trecho se encontra no capítulo final do livro e denota um círculo, o retorno da
família ao ponto de partida. Esse trecho destaca com palavras fortes uma visualização da seca
no Nordeste e o seu efeito na vida de Fabiano e sua família.
1.4. Nelson Pereira dos Santos
Cerca de 25 anos depois da publicação de Vidas Secas, outro artista, também
interessado em problemas sociais e também bastante engajado politicamente, traduziu o então
já clássico romance de Graciliano Ramos, em uma outra forma de arte, o cinema. Nelson
Pereira dos Santos, nascido em 22 de outubro de 1928 na capital paulista, tem uma história de
vida com muitos pontos de contato com a história de Graciliano Ramos.
É interessante notar que tanto o escritor quanto o cineasta tiveram em comum o
fato de aderirem ao comunismo em tempos em que ser comunista era proibido e perigoso.
Ambos eram antidogmáticos e questionadores e tanto Graciliano quanto Nelson tiveram em
comum a experiência do cárcere, como reforça Salem.
Em 1945 (...), noite de 1º de outubro, depois de uma festa familiar, ele foi
pichar muros com o amigo Popov. O motivo: a campanha pela Constituinte.
“A polícia me disse para parar, eu disse que ia continuar pichando,
acabaram prendendo a gente”, lembra Nelson (1987, p.45).
Foram quase dois dias preso e Nelson voltou para casa com o ar abatido e dizendo
para a mãe, d. Angelina, que viu certas coisas lá que nunca iria esquecer, e que jamais
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contaria. Mas o jovem Nelson permaneceria forte em suas convicções políticas, até porque o
PCB, com a liberdade que havia conquistado, cresceu como nunca. Os intelectuais e artistas,
em sua maioria, apoiavam o partido. O próprio Luis Carlos Prestes, secretário-geral do partido
e eleito senador, lembra que entre os intelectuais que estavam presentes numa solenidade
especial na rua da Assembleia, no Rio, estavam “Graciliano Ramos, Jorge Amado, Álvaro
Moreyra, Portinari, Oscar Niemeyer, Mignone, José Siqueira e vários outros” (idem, p.47).
Quanto ao cinema, nas décadas de 30 e 40, a produção no Brasil ainda era bem
incipiente. Em 1930, Adhemar Gonzaga fundou a Cinédia, mas com “a Segunda Guerra
Mundial e as dificuldades para importar equipamentos (quando tudo era estrangeiro), a
produção da Cinédia cai a zero” (ibidem, p. 58). No Rio, em 1941, surgiu a Atlântida, que foi
se especializando em comédias, as chamadas chanchadas, que não eram valorizadas pelos
críticos, mas que obtinham sucesso de público. São Paulo ofereceu a sua resposta com a
fundação da Vera Cruz em 1949, que tinha pretensões de ser a Hollywood brasileira, com
técnicos estrangeiros sendo contratados.
Foi nesse cenário mais diversificado que Nelson Pereira dos Santos, aos 20 anos,
cinéfilo inveterado e apreciador dos romances da geração de 30, obteve a formação inicial
para se tornar, no futuro, um dos cineastas mais importantes da cinematografia brasileira.
Estreou em longa-metragem com Rio 40 Graus (1956), um filme-painel em que se
vê histórias de vendedores de amendoins e de pessoas pobres do morro, num formato que se
diferenciava das chanchadas. Para Salem, “em termos de cinema brasileiro, essa era uma
postura absolutamente subversiva para os anos 50: mostrar o favelado, o povo de pé no chão,
sem preconceito, vivendo os seus dramas reais, falando a língua do seu próprio jeito (com
erros, gírias), o negro com alma de negro e na luta diária pela sobrevivência” (1987, pp. 112113). Assim, Nelson fez algo inédito. Nem a Vera Cruz, que mostrava apenas brancos de
classe média alta, nem a Atlântida, que mostrava só chanchadas, trazia essa postura de
denúncia social.
Um fato interessante é que o Partido Comunista se opunha ao lançamento do
filme. Eles preferiam que uma obra de caráter popular como essa fosse lançada apenas após a
revolução – havia, de fato, uma conspiração para mudar radicalmente o sistema político
brasileiro. Nelson não quis saber e foi rebaixado de seu cargo no partido. Ainda houve
problemas com a censura, que dizia que a visão do Brasil que o cineasta mostrava era
ofensiva. “Por outro lado, a campanha pra [sic] liberar o filme se constituiu talvez num dos
mais amplos e importantes movimentos da intelectualidade já realizados no país (idem, 2008,
17
p.117)”. O filme foi, portanto, o grande precursor do Cinema Novo, espaço em que Vidas
Secas (1963) se insere.
1.5. O cinema novo
Não há um consenso quanto ao filme considerado de fundação do Cinema Novo.1
O crítico e professor de cinema Jean-Claude Bernadet afirma que o movimento não se iniciou
na década de 1950, por questões estéticas:
No cinema novo passa-se para o plano longo, para a câmera na mão, para
uma certa dissolução do enredo, ambiguidade de personagem etc.. (...)
deixa-se de lado a representação do cotidiano, muito presente ainda nos
filmes de Nelson Pereira dos Santos (apud DIAS, 2010, p.56).
No entanto, a revista francesa Cahiers du Cinéma, traçando uma cronologia do
Cinema Novo, inclui a obra de estreia de Nelson Pereira dos Santos como parte da préhistória do movimento, junto com Agulha no Palheiro, de Alex Viany. Segundo a conceituada
revista, o nascimento dar-se-ia em 1959 com dois curtas-metragens: Arraial do Cabo, de
Paulo César Saraceni, e Couro de Gato, de Joaquim Pedro de Andrade. Os longas-metragens
que abriram o movimento seriam, segundo a revista, Os Cafajestes, de Ruy Guerra; Cinco
Vezes Favela (produção coletiva); Barravento, de Glauber Rocha; e Porto das Caixas, de
Paulo César Saraceni. Três filmes foram considerados pela revista como produções da
maturidade do movimento, todas de 1963: Vidas Secas, de Nelson Pereira dos Santos; Deus e
o Diabo na Terra do Sol, de Glauber Rocha; e Os Fuzis, de Ruy Guerra.
Nota-se que os três últimos se passam no sertão nordestino e seus diretores
mostraram a concentração de renda dos ricos e, principalmente, a fome e miséria dos pobres.
Independente de qual filme inicia o movimento – A Grande Feira, de Roberto Pires, é outro
filme que reinvindica o título –, o que não se pode negar é o grande destaque que Vidas Secas
teve dentro dele.
1.6. Vidas Secas, o filme
1
O Cinema Novo foi um movimento surgido na década de 1960 que teve como principais representantes
Glauber Rocha, Nelson Pereira dos Santos, Paulo César Saraceni, Cacá Diegues, Joaquim Pedro de Andrade,
entre outros. Segundo Simonard (2006, p. 118), “o Cinema Novo caracterizou-se como um movimento cultural
em que se destacava uma postura de grupo. Os realizadores cinemanovistas reuniam-se com constância para
discutir cinema, escrever manifestos, discutir política, produção cultural e a conjuntura econômica e social do
país. Estabeleciam princípios de produção de cinema de acordo com uma política de resistência ao cinema
comercial. Havia um projeto ideológico de esquerda e nacionalista fortemente influenciado pelas propostas
isebianas. Reuniões frequentes criavam um sentimento de grupo muito presente e permitia a troca de
informações técnicas e experiências”.
18
A realização de Vidas Secas era um sonho antigo de Nelson Pereira dos Santos.
Um sonho que teve que demorar um pouco para que finalmente fosse concretizado. Antes de
adaptar esse romance, sua intenção era adaptar outra obra de Graciliano Ramos: São
Bernardo. No entanto, algo impediu que o filme saísse do papel: Nelson se apaixonou por
uma das personagens do romance, Madalena, e não queria matá-la, como acontece no livro.
Pediu autorização a Graciliano, que não admitiu a modificação. Dizia que “não escrevera São
Bernardo daquela forma por prazer literário, mas para reproduzir fielmente aquela realidade”
(SALEM, 1987, p.150). Resultado: o projeto foi abortado. O que não o impediu de pensar
agora em levar em frente o seu projeto de adaptar Vidas Secas.
Partiu, então, em 1960, para Juazeiro, no sertão da Bahia. E o que ele não esperava
aconteceu: começou a chover muito no lugar. Choveu por dias, a ponto de o rio São Francisco
transbordar e inundar a cidade. Para não perder tempo e manter os ânimos da equipe, Nelson
resolve rodar outro filme utilizando aquela locação: Mandacaru Vermelho. A história foi
criada de improviso.
Completamente falido após a produção de Mandacaru Vermelho, Nelson iniciou
um vínculo maior com Glauber Rocha, até hoje considerado o grande mentor do Cinema
Novo. Auxiliou Glauber como montador de Barravento, cujo copião havia sido jogado fora
pelo próprio diretor em uma de suas explosões de dramaticidade. O envolvimento com os
cineastas do Cinema Novo deu fôlego novo a Nelson, que aceitou trabalhar como diretor
contratado na primeira adaptação de Nelson Rodrigues para o cinema, Boca de Ouro. Só
depois desse filme é que Nelson Pereira dos Santos voltaria para o Nordeste, dessa vez para
Palmeira dos Índios, interior de Alagoas, para, naquele momento, começar as filmagens de
Vidas Secas.
Quando Vidas Secas estreou em 1963 nos cinemas brasileiros causou grande
repercussão na mídia e boa aceitação crítica. Boa parte dos críticos via o cinema brasileiro
como sinônimo de comédias musicais carnavalescas. O crítico Paulo Emílio Salles Gomes
tratava esse tipo de filme como “comédia popularesca, vulgar e frequentemente musical”
(apud PAMPLONA, 2008, p. 9). Moniz Vianna era ainda mais agressivo:
Não é difícil avaliar o mal que tem feito ao cinema nacional o
comportamento de certos indivíduos que se intitulam diretores e encontram
quem lhes financie os golpes. Cada filme que eles produzem lança uma
onda de descrédito, quando não de verdadeira repulsa, sobre uma
cinematografia que titubeia e muito débil se encontra ainda para suportar
qualquer afronta (idem, p.4).
19
De acordo com o que conta Salem sobre o posicionamento da crítica nacional
sobre o filme:
Para Cláudio Mello e Souza, do Estado de Minas (20/10/1963), o filme era
“algo mais do que o melhor filme nacional”. É o fundador de uma
linguagem brasileira de cinema (...). Com Vidas Secas passamos a ter um
verdadeiro, e por isso mesmo novo, cinema nacional” (1987, p. 185).
Outro crítico, Ely Azeredo, que desgostara de Rio, Zona Norte, também enalteceu
Vidas Secas, tendo escrito quatro artigos sobre o filme na Tribuna da Imprensa. No primeiro
afirmava: “Vidas Secas nos toma de assalto como uma força nova contra a qual se mostram
inertes as resistências formadas ao longo de nossa experiência de consumidores estrangeiros
(idem, p. 186)”. Em outro de seus textos o crítico chegou a afirmar: “O tempo talvez consagre
como a primeira obra-prima do cinema brasileiro” (ibidem, p.186).
Vidas Secas supriu o vácuo em nossa indústria gerado pelo desaparecimento das
chanchadas e foi motivo de celebração pela crítica e boa parte do público, tendo também uma
boa repercussão internacional. O público do Festival de Cannes, por exemplo, acreditou que a
cena da morte da cachorra Baleia havia sido real. A produção teve que levar a cachorrinha
para a França, a fim de provar o contrário (ibidem, p. 190).
O filme utiliza uma iluminação natural, sem filtros, para transpor a claridade e o
calor da região assolada pela seca. Para reproduzir o espírito do livro, “a única música do
filme é o som do carro de boi” (ibidem, p. 181). Há também uma concisão característica da
obra de Graciliano Ramos e o uso de poucas falas, já que há um bloqueio de comunicação
entre aqueles seres viventes. Quem ainda se comunica melhor durante toda a narrativa é a
personagem Sinhá Vitória, principal objeto de nosso estudo.
Diante desse universo árido e de difícil criação, tanto no terreno da literatura como
no cinema, perguntamos como se dá essa tradução entre uma forma de arte e outra. Como a
direção lida com a construção desse universo literário, considerando seu contexto de criação?
Como a personagem Sinhá Vitória é reescrita na tela?
Se considerarmos os estudos acerca do assunto, podemos destacar alguns que
tratam da tradução do universo literário de Vidas Secas para as telas, levando em consideração
os mais diversos aspectos. Boa parte dos trabalhos costuma destacar a figura de Fabiano, o
protagonista.
20
Rasch e Ribeiro (2007, p.3), por exemplo, descrevem Fabiano como o “herói
problemático”, acentuando em sua análise suas angústias e sua condição miserável e ignorante
perante os homens de poder (Tomás da Bolandeira e o patrão). Para os autores,
“Graciliano faz isso através de técnicas literárias tais como o discurso livre
e o monólogo interior. [...] Trabalhando no campo específico da imagem,
Nelson precisa mostrar objetivamente o drama do sertanejo em sua relação
problemática com o mundo. Para isso faz uso de alguns procedimentos
cinematográficos [...] (2007, p. 3).”
Os autores concluem que entre esses procedimentos estão a montagem e o
enquadramento ideológico, que, propositalmente, dispõe de modo desigual Fabiano e seu
patrão, enfatizando as relações de poder naquele universo (idem, p.3).
Mendes (2009) traça uma análise comparativa mais abrangente entre as duas
obras, não se atendo a nenhum personagem em particular, mas especificando as inteligentes
soluções que Nelson Pereira dos Santos teve para lidar com os dilemas da adaptação de uma
obra povoada de pensamentos e com poucos diálogos. A autora ressalta que:
No cinema o espectador sempre vê o que acontece através de um
personagem, sem que o narrador possa intervir com suas observações ou
opiniões. Deste modo, tudo tem que estar incorporado à ação e ao visual,
formando um campo simbólico distinto, no qual os dados que trazem o
significado devem ser reconstruídos por outros mecanismos de percepção
(2009, p. 4).
Se observarmos a estrutura narrativa do romance, percebemos que é dividido em
capítulos “destacáveis” e alguns deles trazem nomes e pontos de vistas de personagens,
inclusive um dedicado à cachorra Baleia. A estrutura narrativa do filme, de outra forma,
procurou ordenar os episódios de modo a tornar a narrativa mais linear (idem, p.5). No
cinema, o espaço é limitado, mas recursos como planos gerais de paisagens naturais oferecem
uma boa alternativa para dar a ilusão da vastidão da seca, dentro daquele pequeno perímetro
(ibidem, p.5). Outro problema resolvido por Nelson Pereira dos Santos, segundo Mendes, foi
o do tempo: “Em qualquer arte ligada à visão, só existe um tempo possível: o presente”
(ibidem, p. 5). Deste modo, as soluções cinematográficas para tornar os elementos do passado
e todos os sonhos e monólogos interiores em ações se deram de diferentes maneiras. O
encontro com o dono da fazenda, a venda do porco, a morte do papagaio são exemplos de
transformação de passado em presente (ibidem, p. 6). A exceção é a apresentação do
personagem Seu Tomás da Bolandeira, que continua sendo passado também no filme. Há
21
também a questão da cor, que é citada no livro descrevendo a paisagem, enquanto o filme foi
realizado em preto e branco. A fotografia utiliza a luz quente da caatinga para criar um clima
de insolação, deixando de lado detalhes como as manchas verdes do juazeiro descritas por
Graciliano. No caso do monólogo interior de Fabiano na cadeia, quando ele chega a pensar
em aderir ao cangaço para se vingar do Soldado Amarelo, a opção encontrada foi a inclusão
de um personagem que não existia no romance, um cangaceiro que convida Fabiano a
ingressar no seu bando (ibidem, p. 9).
Para sistematizar sua análise, a autora elaborou uma tabela de equivalências entre
o romance e o filme. Se o livro é “composto de 13 capítulos que funcionam como narrativas
autônomas” (ibidem, p. 5), o filme “é formado por 652 planos agrupados em 69 sequências,
das quais seis sequências foram eliminadas em alguma fase do processo fílmico” (ibidem,
p.5). Eis um fragmento do modelo final da tabela para sistematização de dados apresentada
por Mendes no anexo de seu trabalho (ibidem, pp 14-15):
SEQUÊNCIA Nº
CAPÍTULO DO ROMANCE
1, 2 e 3
1 (Mudança)
4, 6, 7 e 8
2 (Fabiano)
5
7 (Inverno)
9, 10, 11, 12, 13 e 14
5 (Menino mais novo)
15, 16, 17, 18, 19 e 20
10 (Contas)
21, 22, 23, 24, 25, 26 e 27
8 (Festa)
28, 29 e 30
3 (Cadeia)
Observamos que o quadro funciona como um guia, que mostra quais as soluções
encontradas por Nelson Pereira dos Santos para transformar um romance “destacável” em
uma narrativa fílmica de aspecto mais linear. Seu trabalho serve como uma importante
contribuição para o estudo comparativo entre as duas obras.
Ribeiro (2008), por sua vez, foca seu estudo na humanização da cachorra baleia e
na animalização de Fabiano, tanto na obra literária quanto em sua tradução cinematográfica,
utilizando alguns termos do meio cinematográfico – plano geral, primeiro plano,
campo/contracampo, close-up, etc.
Antes de dar início à análise da humanização, Ribeiro analisa o ambiente físico
animalizador (2008, p. 5). Só então, ele passa a estudar a animalização de Fabiano. No
22
capítulo “Fabiano”, do livro de Graciliano, o protagonista diz em voz alta: “Fabiano, você é
um homem” (RAMOS, 2008, p.18). Em seguida, temendo ser ouvido por alguém, corrige a
frase e diz “Você é um bicho, Fabiano” (idem, p. 19). Ribeiro destaca que “o personagem
sente vergonha de se considerar ou de querer ser um homem” (2008, p.7). Sinhá Vitória, em
outra ocasião, também lembra a condição de bichos da família, quando diz no filme: “Vamos
dormir em cama de couro, vamos ser gente”. Como que para destacar essa condição
animalesca não só de Fabiano, mas também de Sinhá Vitória, em certo momento do filme, o
protagonista diz: “Sapato caro pra quê? Pra andar que nem papagaio?” (idem, p.8).
Quanto à cachorra Baleia, ela “diferentemente de seus donos, assume, de certa
forma, o papel de um humano no enredo” (ibidem, p.9). No capítulo “Baleia”, a cachorra é
descrita por Graciliano como “uma pessoa da família” (RAMOS, 2008, p.86), brincando com
os dois meninos. No dramático momento da morte da cadela, depois de levar um tiro, ela anda
“como gente, em dois pés, arrastando com dificuldade a parte posterior do corpo” (idem, p.
88). No filme, ela é a primeira personagem a aparecer diante da câmera, como se estivesse
guiando os personagens. Ribeiro também destaca o fato de que “a cachorra tem um nome,
enquanto os filhos de Fabiano não” (p. 10). O uso do campo/contracampo na sequência em
que a cadela está agonizando, mostrando ora o seu ponto de vista, ora a visão de quem está
olhando para ela, “permite ao narrador inventar a interioridade do animal, próxima à da
criança rústica, próxima por sua vez à do adulto esmagado e sem horizonte” (CÂNDIDO,
1992, p.106 apud RIBEIRO, 2008, p. 10).
Reconhecemos
a
importância da personagem
cachorra
Baleia
para
o
desenvolvimento da narrativa de Graciliano Ramos, mas o nosso foco é a Sinhá Vitória.
Balogh, ao discutir a construção dessa personagem, faz as seguintes considerações:
Sinhá Vitória tem uma capacidade de abstração muito maior que Fabiano
para estabelecer associações (o raciocínio sobre as aves de arribação), ou
para fazer contas. Como, no entanto, sua competência só se manifesta no
âmbito doméstico, carece de maior valor, ainda que receba sanção positiva
atualizada na admiração de Fabiano pela esperteza da mulher. As
qualidades de Sinhá Vitória carecem, assim, de capacidade de mudar a
trajetória da família, de subverter a ordem de valores do microuniverso
narrativo (1996, p.62).
Assim, apesar de ter importância dentro do universo da obra, Sinhá Vitória não
recebe a mesma consideração por parte dos demais personagens do universo ficcional de
Vidas Secas. Isto pode ser representado como um reflexo da realidade daquela época e lugar.
O mundo machista em que os personagens estão ambientados faz com que uma mulher que
23
dispõe de mais inteligência e sabedoria em comparação com seu marido, mais parecido com
um bicho, não ganhe o devido respeito. Desse modo, pouco adianta ter apenas a admiração de
Fabiano a seu favor.
A intenção deste trabalho é dar um enfoque a Sinhá Vitória, como uma maneira de
valorizar uma personagem que tem uma forte importância no livro e que ganha mais
visibilidade no espaço visual do filme. Trata-se de uma personagem rica e interessante para se
criar uma abordagem de análise que pode trazer grandes contribuições para campos de
conhecimento, como a crítica literária ou os estudos sociológicos e para os estudos de
adaptação fílmica. Sinhá Vitória pode ser interpretada como um exemplo típico da mulher do
sertão nordestino, endurecida por suas condições socioambientais e cuja inteligência e
conhecimento são eclipsados diante dos costumes moralistas e machistas dessa região na
primeira metade do século XX.
24
2. AS TEORIAS LIGADAS À TRADUÇÃO INTERSEMIÓTICA
2.1. A tradução de linguagens
Geralmente a tradução entre duas formas de arte costuma ser vista como um caso à
parte nos estudos tradutológicos. O primeiro teórico que definiu esse tipo de tradução, a
tradução intersemiótica, foi o linguista e semioticista Roman Jakobson (1896-1982). De
acordo com Jakobson, há três tipos de tradução: a interlingual, a intralingual e a
intersemiótica (1973, pp. 64-65). Esta última é a modalidade de tradução de nosso estudo, a
que liga a literatura ao cinema, consistindo “na interpretação dos signos verbais por meio de
sistemas de signos não-verbais” (idem, p.65). No caso da tradução de Vidas Secas, é também
intralingual, pois as duas formas de arte são apresentadas na mesma língua.
Jakobson enfatizou a relevância da tradução intersemiótica através dos exemplos a
seguir:
Podemos reportar-nos à possibilidade de converter O Morro dos Ventos
Uivantes em filme, as lendas medievais em afrescos e miniaturas, ou
L’apres-midi d’um faune em música, balé, ou arte gráfica. Por mais irrisória
que possa parecer a ideia da Ilíada e da Odisseia transformadas em histórias
em quadrinhos, certos traços estruturais de seu enredo são preservados,
malgrado o desaparecimento de sua configuração verbal (apud
HIRASHIMA, 2010, p.84).
Como se pode notar nesse curto trecho, Jakobson apresenta vários exemplos de
como se pode traduzir uma obra literária para qualquer outra forma de linguagem.
Porém, ainda que Jakobson tenha sua importância dentro do estudo das traduções
intersemióticas, foi Charles S. Peirce quem fundamentou e deu maior profundidade e análise
ao assunto. Plaza, ao aprofundar e sistematizar a tradução intersemiótica em seus estudos, tem
como base Peirce, afirmando que “todo pensamento é tradução de outro pensamento para o
qual ele funciona como interpretante” (PLAZA, 2001, p. 18).
Plaza, inclusive, chega a afirmar que “numa tradução intersemiótica, os signos
empregados têm tendência a formar novos objetos imediatos, novos sentidos e novas
estruturas que, pela sua própria característica diferencial, tendem a se desvincular do original”
(2001, p.30).
Assim, no caso de uma tradução de uma obra literária para o cinema, essa
desvinculação com o original é muito comum, levando em consideração que o cineasta possui
seu estilo próprio, sua autoria, tornando a obra de partida em algo próprio e pessoal, o que nos
leva a questionar a noção de fidelidade.
25
Lefevere, outro teórico importante para o embasamento de nosso trabalho, ao
mesmo tempo que “sugere a revisão da noção de fidelidade”, “restringe seu uso para se referir
à dicotomia ‘fiel’ x ‘livre’” (apud RODRIGUES, p.130). A questão da fidelidade da obra
adaptada é uma das mais mencionadas, não apenas por estudiosos, mas também pelo público
em geral, que costuma dizer que tal filme não foi fiel à obra original. O que leva a outra
pergunta: o que é ser fiel à obra original?
Lefevere diz que “quando leitores não-profissionais de literatura [...] dizem que
“leram” um livro, o que eles querem dizer é que eles têm uma certa imagem, um certo
constructo daquele livro em suas cabeças (2007, p.20)”.
Sobre essas frustrações que ocorrem com frequência, Stam esclarece:
Lemos um romance através de nossos desejos, utopias e esperanças
introjetadas, e enquanto lemos fantasiamos nossa própria mise-en-scène do
romance no interior de nossa mente. Quando somos confrontados com a
fantasia de outra pessoa [...], sentimos a perda de nossa própria relação
fantasmática com o romance. Assim, a adaptação em si se torna uma
espécie de “objeto ruim” (2000, pp. 54-55).2
Logo, o que acontece na prática é um pouco de indignação, ou mesmo revolta, por
parte de alguns leitores quando se deparam com “a sua obra preferida” transformada em um
filme, game ou história em quadrinhos que está longe de parecer com aquilo que eles
imaginavam que seria quando transmutado.
Assim
como
Lefevere,
Gideon
Toury
(1980)
também
amplia
esses
questionamentos em seus chamados estudos descritivos da tradução. Há, entretanto, na visão
de Rodrigues, a ideia de que, “enquanto Toury considera o estudo da tradução literária como
parte de um campo que estudaria todos os tipos de tradução, o enfoque dado por Lefevere
acaba por remeter a dois campos distintos, um que incluiria a Literatura Comparada e outro
que se dedicaria aos estudos de traduções não-literárias” (1999, pp. 160-161).
Outra semelhança entre os estudos de Lefevere e Toury está no fato de ambos se
deterem no “comportamento regular dos tradutores” (idem, p. 161). Toury, para isso,
estabeleceu um conceito de normas, que, segundo ele, são “operativas em cada estágio do
2
Todas as traduções sem referência são do autor.
We read a novel through our introjected desires, hopes, and utopias, and as we read we fashion our own
imaginary mise-em-scène of the novel on the private stages of our minds. When we are confronted with someone
else’s phantasy (…), we feel the loss of our own phantasmatic relation to the novel, with the result that the
adaptation itself becomes a kind of “bad object”.
26
processo de tradução e em cada nível de seu produto, que é a tradução em si”3 (TOURY,
1980, p.53).
Toury traz uma visão mais abrangente dos estudos tradutórios. Ele acredita que a
cultura de chegada da obra traduzida influencia bastante o produto. Para embasar suas
pesquisas, ele levou em consideração os estudos dos formalistas de Leningrado, o
Estruturalismo de Praga e a semiótica russa (SILVA, 2007, p. 21) e foi elaborada com base na
teoria dos polissistemas desenvolvida por Itamar Even-Zohar, da escola de Telavive (idem, p.
21).
Segundo Silva:
A teoria dos polissistemas pressupõe que as normas sociais e as convenções
literárias na cultura de chegada ditam as pressuposições estéticas dos
tradutores e, como consequência, afetam suas decisões no momento da
tradução (idem, p. 21).
Desse modo, o comportamento e a cultura do país influenciam, direta ou
indiretamente, o produto final da tradução. E levando em consideração que estamos lidando
com uma tradução entre dois signos diferentes, essa influência se torna ainda mais relevante.
Em relação a esse tipo de tradução, Balogh afirma que o problema “desemboca
sempre no plano da expressão como o elemento diferenciador mais óbvio do processo, tanto
na tradução interlingual como na intersemiótica” (1996, pp. 40-41).
No caso da adaptação de Vidas Secas, o diretor Nelson Pereira dos Santos tinha
nas mãos uma obra contendo muitos pensamentos dos personagens e pouquíssimos diálogos,
tornando-a, em princípio, de difícil tradução. Outro elemento complicado é a diferença entre o
tempo mostrado no cinema (um tempo sempre presente, por mais que se utilize de flashbacks
e recursos dessa natureza) e o tempo da obra literária, que vai e vem, de acordo com o tempo
verbal utilizado. Segundo Pellegrini,
Trata-se do tempo entendido como duração, o “tempo da mente”, que não
coincide com as medidas temporais objetivas e é simbolicamente
representado como um rio formado por uma corrente de memórias e visões
oníricas. A radicalização desse aspecto vai desembocar no fluxo de
consciência, espécie de transcrição direta dos pensamentos, durante um
espaço de tempo, de que Virginia Woolf e James Joyce fizeram
originalíssimo uso e que, mais tarde, no Brasil, impregnou inclusive a
introspecção de Clarice Lispector com nuances especiais (2003, p.21).
3
Norms are operative at every stage in the translating process and at every level in its product, the translation
itself.
27
No cinema, para se traduzir esse fluxo de consciência, esse aspecto tão próprio da
literatura moderna, o diretor e o roteirista têm que elaborar mecanismos criativos para
transformar o pensamento em imagem. E é isso que faz Nelson Pereira dos Santos, ao utilizar
a linguagem cinematográfica de maneira criativa, de modo que o resultado seja um produto
diferente da obra adaptada, mas que traduz à sua maneira o universo da narrativa de
Graciliano Ramos, com seus personagens, sua psicologia e sua geografia.
Uma estratégia importante utilizada por Nelson Pereira dos Santos foi o uso da
montagem que constitui algo de fundamental importância, tanto para a construção da trama,
como para a afirmação de uma ideologia. Stam, ao falar sobre a montagem ideológica de
Sergei Eisenstein fez a seguinte afirmação:
Para o autor, um plano adquiria sentido principalmente em suas relações
com outros planos no interior de uma sequência de montagem. A montagem
era, pois, a chave tanto para o domínio estético como ideológico. Na
concepção eisensteiniana, o cinema era acima de tudo transformador,
catalisando, em sua forma ideal, não a contemplação estética, mas a prática
social, ao submeter o espectador a um choque de consciência com relação
aos problemas contemporâneos (2010, p.58).
Vemos que Eisenstein estava muito mais preocupado com o papel do filme como
agente social do que exatamente com o simples prazer estético. No caso de Vidas Secas,
Nelson Pereira dos Santos, assim como seus colegas do Cinema Novo, também tinha essa
intenção de unir a arte com a importância social e política e na influência que aquele trabalho
poderia exercer sobre no público. Não se trata de considerar a arte totalmente a serviço do
social, embora houvesse uma forte manifestação de engajamento, mas seria uma forma de
unir o útil ao agradável, pelo menos agradável enquanto apreciação estética.
2.2. A construção do personagem na literatura e no cinema
O cinema, desde o final do século XIX, tem-se mostrado devedor principalmente
de duas formas de arte: a literatura e o teatro. Sendo assim, o ator e o personagem são
elementos fundamentais em sua construção. Segundo Gomes, “podemos pois inicialmente, e
sem abuso excessivo, definir o cinema como teatro romanceado ou romance teatralizado”
(1971, p. 106).
Dessa forma, o diálogo passa a ser usado e, mesmo no cinema mudo, torna-se
elemento sempre presente, embora haja algumas exceções, como em A Última Gargalhada
(Der Letzte Mann 1924), de F. W. Murnau, em que o cineasta procura narrar o seu filme
28
exclusivamente com o uso das imagens. Se a palavra escrita aparece, ela aparece diretamente
na cena, como em manchetes de jornais. Mas esse é um caso raro. Principalmente quando o
cinema passou a ser falado, no ano de 1929, a teatralidade se tornou cada vez mais presente,
embora com o tempo, a arte cinematográfica tenha voltado a ganhar uma linguagem própria,
utilizando recursos próprios, tais como o campo/contracampo, o close-up, o travelling, os
planos gerais ou americanos, as panorâmicas, o zoom, a profundidade de campo, as lentes dos
mais variados tipos, os efeitos especiais e outros que estão à disposição do cineasta.
Quanto à personagem, ela entra em maior ou menor grau de importância no filme,
dependendo da proposta de criação. Algumas personagens, inclusive, sequer aparecem em
cena, mas são suficientemente fortes para deixar de forma subjacente sua presença. Um
exemplo clássico disso é a personagem Rebecca, no clássico homônimo de Alfred Hitchcock
(1940), em que a personagem nunca aparece efetivamente em cena, nem mesmo na forma de
flashbacks, mas o espectador sente a sua presença.
Com a transposição de um romance para o cinema, por exemplo, o leitor idealiza
um personagem a partir de pequenas observações dadas pelo autor. Observações que são
importantes, como a descrição dos olhos de ressaca de Capitu, em Dom Casmurro, de
Machado de Assis: “A Capitu de uma fita de cinema nunca seria essencialmente olhos e
cabelos, e nos imporia necessariamente tudo o mais, inclusive pés e cotovelos” (idem, p. 111).
Porém, uma das principais dificuldades na tradução de obras literárias para o
cinema está nos aspectos psicológicos. Alguns filmes utilizam a técnica do voice-over,
aproveitando-se da palavra e, dessa forma, ganhando uma maior aproximação com a
literatura, já que a técnica facilita a explicitação dos pensamentos e sentimentos do
personagem. Ela é utilizada de acordo com o grau de interesse ou necessidade do diretor,
roteirista ou produtor. De acordo com Harrington (1973, p. 38), “qualquer língua falada que
aparentemente não vem das imagens na tela é chamada de voice-over.”4
No caso de Vidas Secas, Nelson Pereira dos Santos poderia apropriar-se mais
desse recurso, mas preferiu abrir mão, sob o risco de sua obra ficar muito próxima da
linguagem literária. Desse modo, ele usou o som natural, que não deixa de ser coerente com
algumas onomatopeias encontradas na obra de Graciliano Ramos5.
Segundo Gomes,
4
“Any spoken language not seeming to come from images on the screen is called voice-over.”
Como exemplo de onomatopeias, podemos destacar o trecho: “Chape-chape. Os três pares de alpercatas batiam
na lama rachada, seca e branca por cima, preta e mole por baixo” (RAMOS, 2008, p.18).
5
29
“a estrutura do filme frequentemente baseia-se na disposição do narrador em
assumir sucessivamente o ponto de vista (aí, não físico, mas intelectual) de
sucessivas personagens. Um dos exemplos célebres é Cidadão Kane, de
Orson Welles. A personalidade central nos é apresentada através de
testemunhos de seus antigos amigos e colaboradores, de sua ex-mulher e de
outros comparsas menos importantes.” (1971, p.107).
Em Vidas Secas, tanto Graciliano Ramos quanto Nelson Pereira dos Santos “dão
voz” a todos os personagens principais. Fabiano, Sinhá Vitória, os dois meninos e a cachorra
Baleia têm seus pontos de vista explicitados através de pensamentos próprios ou mixados com
o do narrador central, seja a escrita de Graciliano Ramos ou a câmera de Nelson Pereira dos
Santos.
No que se refere ao nosso objeto de estudo, a Sinhá Vitória de Nelson Pereira dos
Santos não é muito diferente da de Graciliano. Como o próprio romancista não deu muitos
detalhes da aparência física da personagem, a imagem de uma mulher sofrida da seca no
sertão nordestino bastaria como modelo. E a atriz Maria Ribeiro funcionou muito bem para
imprimir tal retrato.
30
3. VIDAS SECAS E O PROCESSO DE TRADUÇÃO
3.1. Constituição do corpus
O corpus é formado pelo romance Vidas Secas (1938) e o filme homônimo de
Nelson Pereira dos Santos (1963).
3.1.1. O livro
Vidas Secas (1938) é um dos romances mais estudados e apreciados do alagoano
Graciliano Ramos. Conta, através de uma narrativa circular, a história de uma família formada
por Fabiano, Sinhá Vitória, o filho mais velho, o filho mais novo e a cachorra Baleia. O livro
possui uma narrativa que emula o clima seco do sertão nordestino em época de seca. O livro
possui capítulos “destacáveis”, em que se observam pontos de vista de todos os personagens,
inclusive da cachorra. Fabiano, o líder da família, é a figura central, aquele que mais sofre,
tanto física quanto psicologicamente, comparando-se a um bicho e tendo complexos de
inferioridade em relação ao patrão e até mesmo à esposa, a quem ele considera bem mais
inteligente que ele. Graciliano Ramos utiliza uma linguagem que se aproxima da fala rude e
simples dos personagens.
3.1.2. O filme
A adaptação para o cinema da obra homônima de Graciliano Ramos foi dirigida
por Nelson Pereira dos Santos em 1963 e conta a mesma história do livro, mas não
necessariamente seguindo a mesma ordem dos acontecimentos. Filmado em preto e branco, a
narrativa destaca a luz excessiva do sol e a vegetação da caatinga. Quanto aos frequentes
pensamentos dos personagens, o cineasta utilizou criatividade para traduzir boa parte deles
para a linguagem cinematográfica. Ainda que não tenha sido um grande sucesso de bilheteria
na época da exibição, é considerado um dos marcos do chamado Cinema Novo.
3.2. A Sinhá Vitória de Graciliano Ramos
Em Vidas Secas, Graciliano Ramos nos apresenta, através de uma linguagem
objetiva, “seca”, como o chão sofrido do sertão nordestino em tempo de estiagem, o drama de
uma família formada por Fabiano, sua esposa Sinhá Vitória, seus dois filhos e a cachorra
31
Baleia, que é mostrada como se fosse membro da família, como gente. O autor evita excessos
ou floreios e utiliza com frequência o registro linguístico local para contar a história breve
mas intensa dessa família de retirantes.
No romance, apesar de parecer uma personagem coadjuvante na trama, já que
Graciliano Ramos destaca muito mais os pensamentos de Fabiano, quase sempre de forma
repetitiva e circular, como fantasmas que o atormentam, a Sinhá Vitória tem grande destaque
em Vidas Secas. Graciliano Ramos reserva um capítulo especial com o seu nome, da mesma
forma como também reserva capítulos especiais para Baleia e para cada um dos dois meninos.
A personagem Sinhá Vitória se diferencia de Fabiano por ser mais inteligente,
enquanto Fabiano, como ele próprio se descreve, é um “bruto”. Seu sonho é pequeno: ter uma
cama de lastro de couro para dormir e não uma cama de varas desconfortável como a que ela
e o marido têm, como o narrador descreve.
Não possuíam nada: se se retirassem, levariam a roupa, a espingarda, o baú
de folha e troços miúdos. Mas iam vivendo, na graça de Deus, o patrão
confiava neles – e eram quase felizes. Só faltava uma cama (RAMOS, 2008,
p.45).
Fabiano não dispõe de condições financeiras para satisfazer o seu desejo e o da
mulher. Os dois até tentam obter o que acham justo, depois de meses de economias, de acordo
com as contas feitas por Vitória, mas Fabiano logo se decepciona e ainda tem que aceitar os
juros e a perda do gado para o patrão:
Não se conformou: devia haver engano. Ele era bruto, sim senhor, via-se
perfeitamente que era bruto, mas a mulher tinha miolo. Com certeza havia
um erro no papel do branco. Não se descobriu o erro, e Fabiano perdeu os
estribos. Passar a vida inteira assim no toco, entregando o que era dele de
mão beijada! Estava direito aquilo? (idem, p.94).
No capítulo dedicado a Sinhá Vitória (ibidem, pp. 39-53), ela se debruça sobre
suas frustrações. Com a raiva que tem de Fabiano por ele ser incapaz de dar melhores
condições de vida para sua família, tenta descontar em Baleia, nos meninos e no próprio
marido que ali ronca, deitado numa rede:
Sinhá Vitória tinha amanhecido em seus azeites. Fora de propósito, dissera
ao marido umas inconveniências a respeito da cama de varas. Fabiano, que
não esperava semelhante desatino, apenas grunhira: - “Hum! Hum!” E
amunhecara, porque realmente mulher é bicho difícil de entender, deitara-se
na rede e pegara no sono (ibidem, p.40).
32
Outra situação que fala sobre a sua revolta é o momento em que se lembra do que
ele gastou com jogo e bebida noutro dia; de quando ele falou que ela parecia um papagaio,
andando com aquele sapato de meio salto. Essa série de pensamentos tolos acaba por afligi-la
ainda mais, levando à lembrança do papagaio de estimação que eles tiveram que matar para
aplacar a fome da família.
Pobre do papagaio. Viajara com ela, na gaiola que balançava em cima do
baú de folha. Gaguejava: - “Meu louro”. Era só o que sabia dizer. Fora isso,
aboiava arremedando Fabiano e latia como Baleia. Coitado. Sinhá Vitória
nem queria lembrar-se daquilo (ibidem, p.43).
A personagem se dá conta de que a cama, o marido, o papagaio, a baixa
autoestima ocasionada pelos comentários do marido, tudo isso contribui para que sua mente
se torne inundada de pensamentos negativos. Tais pensamentos se dissipam para outros
também negativos, quando ela percebe que uma raposa comeu a melhor galinha do poleiro.
Vejamos:
Nesse ponto as ideias de Sinhá Vitória seguiram outro caminho, que pouco
depois foi desembocar no primeiro. Não era que a raposa tinha passado no
rabo a galinha pedrês? Logo a pedrês, a mais gorda. Decidiu armar um
mundéu perto do poleiro. Encolerizou-se. A raposa pagaria a galinha
pedrês. (ibidem, p.45).
O capítulo “Sinhá Vitória” é o que mais adentra os pensamentos da personagem.
Em outros capítulos, ela aparece, ora como uma mulher sábia e inteligente, ora como uma
mulher grosseira, quando, por exemplo, o filho mais velho vai lhe perguntar o que é inferno e
recebe um “cascudo”. Ela não é capaz de compreender a inocência do garoto (ibidem, p.56).
Já no capítulo “Festa”, quando a família vai atravessar um riacho para ir até a pequena cidade,
ela se mostra afável ao marido, impaciente e grosseiro, auxiliando-lhe com o botão da camisa,
como pode ser observado no fragmento abaixo:
Fabiano soltou um suspiro largo de satisfação e de dor. Em seguida tentou
prender o colarinho duro ao pescoço, mas os dedos trêmulos não realizaram
a tarefa. Sinhá Vitória auxiliou-o: o botão entrou na casa estreita e a gravata
amarrou-se. As mãos sujas, suadas, deixaram no colarinho manchas escuras
(ibidem, p.73).
No dramático episódio “Baleia”, ela aquieta o desespero dos meninos, que
percebem que algo de muito grave está para acontecer com a cadela, o animal estava prestes a
ser executado por estar doente. Ela tapa-lhes os ouvidos e “também tinha o coração pesado,
33
mas resignava-se: naturalmente a decisão de Fabiano era necessária e justa” (ibidem, p.86).
Mostra-se, entretanto, mais frágil quando ouve o tiro e os latidos e os meninos chorando alto
debaixo da cama. Nesse momento, ela pega a estátua da Virgem Maria, como para receber
forças para aquele momento de dor. E, no último capítulo, ela demonstra com convicção de
que não quer que seus filhos sejam vaqueiros como o pai: “Sinhá Vitória, com uma careta
enjoada, balançou a cabeça negativamente, arriscando-se a derrubar o baú da folha. Nossa
Senhora os livrasse de semelhante desgraça. Vaquejar, que idéia! (ibidem, p.123).”
O que podemos notar é que a Sinhá Vitória é uma personagem que possui uma
dualidade. Quer dizer: tem seus momentos de fragilidade, como pode ser visto no capítulo da
morte de Baleia, mas também precisa se mostrar forte para os filhos. Ainda que não consiga
ser tão forte, no caso, quanto o marido Fabiano, que precisa ter ainda mais força para executar
o animal querido. Em outros momentos, porém, é Sinhá Vitória quem se mostra como o
alicerce daquela família, sendo mais inteligente para traçar planos para o futuro, ainda que
esses planos resultem frustrados ao final. Desse modo, a Sinhá Vitória de Graciliano Ramos,
é, ao mesmo tempo, frágil e forte; inteligente e desencantada; revoltada e triste com a vida
que leva. É por isso que consideramos que sua personagem é a mais rica de Vidas Secas. Não
tem uma faceta única, ganhando, assim, mais verossimilhança.
3.3. Nelson Pereira dos Santos e a política dos autores
Antes de entrarmos na discussão sobre o processo de tradução do romance Vidas
Secas, de Graciliano Ramos, por Nelson Pereira dos Santos, levamos em consideração a
chamada “política dos autores”, que apresenta o cinema, não como um produto fabricado
apenas para consumo e lucro, um produto industrial, mas também como uma forma de arte
que apresenta um ser pensante como autor de uma obra artística. Essa política dos autores
entrou em vigor a partir da influência dos chamados “Jovens Turcos”, um grupo de críticos da
revista de cinema francesa Cahiers du Cinéma nos anos 50. O grupo tratava de “ver o cineasta
como um escritor, e o filme como um livro, mais precisamente como um romance”
(BERNADET, 1994, p.14).
Assim, sendo o filme uma obra que traz a marca de seu autor, traz consigo também
a imagem que ele, no caso, Nelson Pereira dos Santos, carrega da mulher para formar as
personagens, especificamente, nesse sentido, Sinhá Vitória. Essa figura da mulher forte é,
segundo Salem, provavelmente inspirada na mãe do diretor. Sobre D. Angelina, mãe de
34
Nelson, a autora afirma: “Mas, d. Angelina lhe transmitiu ainda outros traços importantes: a
objetividade, o sentido de precisão. Econômica nas palavras, ela vai sempre direto ao assunto
na essência, e com o maior desprendimento (1996, p.37).
Pode-se dizer que essa economia de palavras que Nelson Pereira dos Santos
herdou da mãe – e de sua experiência anterior como jornalista acostumado a “aparar as
arestas” dos textos e a retirar adjetivos desnecessários – tenha caído como uma luva para a
adaptação cinematográfica da obra de Graciliano Ramos. Para Salem: “a figura superforte,
quase idealizada, de mulher, que mais tarde apareceria com tanta frequência nos filmes de
Nelson” (1996, p.30) transparece no modo como o diretor apresenta a personagem Sinhá
Vitória, interpretada no filme por Maria Ribeiro.
É importante destacar que não foi apenas nesse filme que o cineasta apresentou
uma mulher forte, sendo isto um elemento recorrente da obra do diretor, já que há também
outros exemplos, como “as personagens interpretadas por Leila Diniz em Fome de Amor
(1968), Isabel Ribeiro (Azyllo Muito Louco, 1970), de novo Maria Ribeiro (O amuleto de
Ogum, 1975) e até a de Glória Pires (em Memórias do Cárcere, 1983)” (idem, p.30).
3.4. Resultados preliminares
Como afirma Pinto (2007, p. 13), “palavras como ‘pensa’, ‘lembra’, ‘esquece,
‘sente’, ‘quer’ ou ‘percebe’, presentes em qualquer romance, são proibidas para o roteirista,
que só deve escrever o que é visível”. O cinema utiliza outra gramática, em que já a partir do
roteiro deve-se pensar em imagens, enquanto na literatura o autor tem uma maior liberdade
para dar vazão aos pensamentos, ao fluxo de consciência dos personagens. No filme de
Nelson Pereira dos Santos, tais pensamentos são apresentados de maneira criativa, com o uso
da sobreposição de falas de Fabiano e de Sinhá Vitória, com ambos os atores falando em
close-up para a câmera. Vejamos:
35
Figura 1: Falas sobrepostas de Sinhá Vitória e Fabiano em close-up
A utilização desse recurso tanto pode indicar uma falta de comunicação entre os
dois, como uma tentativa de representar na tela os pensamentos da obra de partida.
No caso de Vidas Secas, o romance que não contém muitos diálogos, quase tudo é
descritivo. A tradução para o cinema requer uma adaptação que acrescente diálogos que eram
originalmente apenas pensamentos até repetitivos, como, por exemplo, as várias vezes em que
se fala de Seu Tomás da Bolandeira e na tão sonhada cama de couro.
Um momento do filme em que Nelson Pereira dos Santos teve de se render ao
monólogo, em vez de usar um artifício mais criativo para demonstrar os pensamentos da
personagem e adaptar o capítulo “Sinhá Vitória”, foi na cena em que une esse capítulo àquele
reservado ao menino mais velho. O garoto havia levado um “cocorote” da mãe, depois que ele
lhe perguntara se ela já esteve no inferno. O garoto ficara curioso ao ouvir falar em inferno e
quisera saber como era o lugar. Enquanto isso, Sinhá Vitória fica se queixando em voz alta do
dinheiro que o marido perdeu no jogo e outras desgraças da vida. Esse momento pode ser
visto nos quadros abaixo:
Figura 2: As lamentações de Sinhá Vitória
36
Tal recurso pode ser visto como uma maneira de fazer com que o espectador sinta
um pouco do que o personagem está pensando numa cena que não possui diálogos. Isso
acontece com o uso da câmera subjetiva, ou seja, a câmera representando os olhos do
personagem. E, da mesma forma que existe a câmera subjetiva, existe a câmera como
personagem da trama. Sobre isso, discute Martin: “A câmara tornou-se móvel como olho
humano, como o olho do espectador ou como o olho do herói do filme. A câmera é então uma
criatura em movimento, ativa, uma personagem da trama” (2005, p. 38).
No filme, esta situação pode ser vista através do recurso da montagem, quando a
câmera focaliza Fabiano trabalhando, pela primeira vez como vaqueiro, assim que é aceito
pelo dono da fazenda. Logo em seguida, através de uma estrutura paralela, vemos o filho mais
novo seguindo os passos do pai, tangendo cabras. Esses dois momentos podem ser vistos
abaixo:
Figura 3: Paralelismo: pai e filho tangendo animais na fazenda.
Uma diferença que se pode notar em certo momento no filme é o fato de mostrar a
família rindo, feliz, quando encontra um lugar para ficar, ainda que temporariamente,
escutando o barulho da chuva sobre a caatinga. É um dos poucos e talvez o único momento
feliz do filme. Tal situação se mostra dissonante com o tom sempre sério e compenetrado da
obra de Graciliano e com o do próprio filme em geral. O quadro abaixo é representativo desse
aspecto:
37
Figura 4: A alegria temporária com a chegada da chuva e de um teto para se abrigar
Outro ponto importante é a interpretação dos atores. Como toda adaptação deve
muito ao desempenho de seus intérpretes, a personagem de Sinhá Vitória precisa de Maria
Ribeiro para materializar o que se existia, até então, apenas na mente de quem já havia
entrado em contato com a obra literária e já havia “criado” a sua própria Sinhá Vitória. No
filme, inclusive, o diretor pôde dispor de maneira ainda mais forte do aspecto de “bicho” da
personagem. Se, no romance, é Fabiano quem se vê a si mesmo como um bicho, no filme,
vemos Sinhá Vitória demonstrando extrema ansiedade quando vê que Baleia, tranquila e
elegantemente, traz-lhe um preá.
Figura 5: A fome e a avidez de ter em mãos um preá
E se Nelson não podia dispor tanto dos monólogos interiores do livro, sob o risco
de tornar a sua obra cansativa e “literária” demais na tela, faz uso de dois recursos
cinematográficos importantes: a montagem e o enquadramento ideológico. A montagem se dá
da seguinte forma: em certa altura do filme, por exemplo, o diretor coloca “planos de ferro do
patrão marcando os animais enquanto Fabiano, por um fugaz momento, tem a ilusão de
propriedade” (RASCH e RIBEIRO, 2007); no exemplo relativo ao enquadramento, podemos
38
ver a cena em que o diretor ressalta “as relações de poder no interior daquela sociedade”
(idem).
Figura 6: A ilusão de propriedade.
Desencantado com o pouco que o patrão lhe oferece pelo trabalho, Fabiano
consulta a esposa, que afasta as crianças do lugar para fazer as contas usando grãos e pedras.
Ela é otimista: acredita que, mesmo com o pouco que ganham, podem economizar para
comprar couro para a tão sonhada cama de couro. Para essa sequência, Nelson Pereira dos
Santos fez poucos cortes: close-up no rosto apreensivo de Fabiano, tomada com pouca luz dos
dois conversando, e mais dois close-ups: das mãos de Sinhá Vitória fazendo as contas e de seu
rosto, dando o diagnóstico da situação. Parte dessa sequência pode ser vista abaixo:
Figura 7: O orçamento familiar.
Mas se nessa sequência vemos uma Sinhá Vitória mais segura de si, no dramático
momento da morte de Baleia, a personagem esboça fragilidade, ainda que tente demonstrar
força para as crianças que gritam desesperadas, já sabendo do trágico destino da cadela. A
sequência de Sinhá Vitória com os meninos é vista no interior da casa, com pouca luz,
contrastando com a luz excessiva do exterior. Nesse momento, vemos a personagem não
39
conseguindo se conter ao ouvir o tiro que daria cabo de Baleia e levando a mão à boca.
Vejamos:
Figura 8: A morte de Baleia
Podemos dizer, então, a partir desses exemplos supracitados, que Nelson Pereira
dos Santos, ao adaptar a personagem para o cinema, a fez tão complexa e cheia de emoções
conflitantes quanto Graciliano Ramos. São duas linguagens diferentes, mas ambos os autores
lidaram com a personagem de modo que ela se mostrasse a mais interessante, tanto no
romance quanto no filme. E que deixa espaço para uma investigação mais profunda e mais
atenta, à luz da poética de Graciliano e da arte cinematográfica de Nelson.
40
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ao longo deste trabalho, pudemos ver o processo de tradução de uma obra escrita
para uma outra mídia, o cinema. O início da discussão se deu com o delineamento da escritura
e da publicação de Vidas Secas por Graciliano Ramos, que foi visto juntamente com os elos
de interseção entre o autor e seus contemporâneos do chamado Romance de 30, escritores que
tinham interesses políticos em comum, bem como vidas afetadas pela política, ao rejeitarem a
gestão de Getúlio Vargas e apoiarem o proibido caminho do comunismo.
Esse interesse por questões sociais pode ser sentido com força no romance mais
famoso de Graciliano Ramos. A história de uma família de retirantes em busca de uma vida
melhor numa terra desolada e marcada pela morte foi um marco na história da literatura
brasileira. Foi de tal importância que outra geração, a geração dos cinemanovistas da década
de 1960, grupo de cineastas que também traziam em suas obras, a maioria delas ambientadas
em regiões rurais como o sertão, algo como um grito de contestação. Por isso, um pouco da
história de Vidas Secas, o filme, dirigido por Nelson Pereira dos Santos, também pôde ser
visto no capítulo introdutório.
O destaque, no entanto, é dado à Sinhá Vitória, personagem-chave, tanto no
romance quanto na obra cinematográfica. Ela é dotada da força da mulher sertaneja e é vista
ainda com maior destaque na tradução do romance para as telas. Isto se verifica por meio de
alguns procedimentos em sua construção: a) a personagem, naturalmente, aparece mais tempo
em cena; b) ela apresenta dualidade em sua composição, o que lhe dá uma dimensão ao
mesmo tempo frágil e forte; e c) ela se diferencia ao ter mais consciência de seu estado e
querer ter mais vontade de mudar.
A fim de darmos embasamento teórico à análise da tradução cinematográfica da
obra em questão, procuramos teóricos que lidassem com essa modalidade de tradução, tais
como Jakobson (1973) e Plaza (2001). Lefevere (2007) entra na discussão como o teórico que
lida com o conceito de reescritura e questiona a noção de fidelidade e Toury (1980), com sua
visão mais abrangente dos estudos descritivos de tradução.
O estudo da tradução do filme e mais especificamente da personagem Sinhá
Vitória para o cinema foi visto essencialmente através de excertos do livro que enfatizaram a
retirante, bem como de sequências importantes do filme nas quais ela tem destaque. A partir
desse estudo, percebemos a complexidade da personagem e o deixamos em aberto, para uma
investigação mais aprofundada, que pode gerar frutos nos estudos fílmicos, literários e sociais.
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9 INTRODUÇÃO Graciliano Ramos foi, mesmo sem querer