Fato: Maria, Pedra e Paulo mantinham um orfanato na cidade de Porto União, SC, localizada na fronteira com a cidade de União da Vitória, PR, cidades separadas por uma linha da estrada de ferro. No orfanato havia trinta crianças internadas, todas órfãs. Elas eram cuidadas pelos três, que lhes alimentavam e educavam. As crianças não tinham outra opção de vida. O orfanato era mantido por donativos e por verbas vindas da prefeitura local. Por questões políticas, o prefeito cortou as verbas do orfanato e as doações privadas não eram suficientes nem sequer para alimentar as crianças, que já estavam passando fome. Diante dessa realidade, e sem alternativa para arrumar dinheiro, Maria, Pedra e Paulo souberam que na cidade vizinha havia um armazém com comedia apodrecendo, pois o proprietário, um rico empresário, dissera publicamente que iria deixar os alimentos apodrecerem se os preços não aumentassem. Os três foram ao armazém, por volta das três horas da madrugada, arrebentaram a corrente do portão e quebraram a porta, colocaram vários sacos de alimentos em uma camionete que estava no local e seguiram para o orfanato. Chegando ao local, fizeram comida e alimentaram as crianças, principalmente aquelas que já estavam subnutridas. Dois dias após os três foram presos e o Ministério Público ofereceu denuncia contra eles acusandoos da prática do crime previsto no art. 155, § 4º, I e IV, pelo furto dos alimentos, e art. 155, § 5º, pelo furto do veículo, em concurso material, art. 69, todos do Código penal, pleiteando, para cada um, a pena de cinco anos de reclusão. A defesa argumenta em favor dos acusados o estado de necessidade, art. 23 e 24, do CP, tendo o MP argumento que não cabe essa excludente de criminalidade, pois é pacífico na doutrina e na jurisprudência que o estado de necessidade só se caracteriza quando não há outro meio de defender a vida, o que não é o caso. Art. 155 - Subtrair, para si ou para outrem, coisa alheia móvel: Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa. § 1º - A pena aumenta-se de um terço, se o crime é praticado durante o repouso noturno. § 2º - Se o criminoso é primário, e é de pequeno valor a coisa furtada, o juiz pode substituir a pena de reclusão pela de detenção, diminuí-la de um a dois terços, ou aplicar somente a pena de multa. § 3º - Equipara-se à coisa móvel a energia elétrica ou qualquer outra que tenha valor econômico. Furto qualificado § 4º - A pena é de reclusão de dois a oito anos, e multa, se o crime é cometido: I - com destruição ou rompimento de obstáculo à subtração da coisa; II - com abuso de confiança, ou mediante fraude, escalada ou destreza; III - com emprego de chave falsa; IV - mediante concurso de duas ou mais pessoas. § 5º - A pena é de reclusão de três a oito anos, se a subtração for de veículo automotor que venha a ser transportado para outro Estado ou para o exterior. (Incluído pela Lei nº 9.426, de 1996) Art. 23 - Não há crime quando o agente pratica o fato: (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984) I - em estado de necessidade; (Incluído pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984) Estado de necessidade Art. 24 - Considera-se em estado de necessidade quem pratica o fato para salvar de perigo atual, que não provocou por sua vontade, nem podia de outro modo evitar, direito próprio ou alheio, cujo sacrifício, nas circunstâncias, não era razoável exigir-se. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984) § 1º - Não pode alegar estado de necessidade quem tinha o dever legal de enfrentar o perigo. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984) § 2º - Embora seja razoável exigir-se o sacrifício do direito ameaçado, a pena poderá ser reduzida de um a dois terços. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984) Decida o caso, usando um dos métodos de interpretação da lei.