AVALIAÇÃO DO POTENCIAL DE FORMAÇÃO DE SUBPRODUTOS ORGÂNICOS HALOGENADOS COM USO DE CLORO E DIÓXIDO DE CLORO APLICADO EM ÁGUA CONTENDO SUBSTÂNCIAS HÚMICAS Cristina F. P. Rosa Paschoalato(*) Engenheira Química pela Universidade de Mogi da Cruzes. Mestre em Hidráulica e Saneamento pela Escola de Engenharia de São Carlos (EESC/USP). Professora da Universidade da Associação de Ensino de Ribeirão Preto (UNAERP). Doutoranda em Hidráulica e Saneamento na EESC/USP. Jacob Fernando Ferreira Professor Adjunto da Universidade da Associação de Ensino de Ribeirão Preto (UNAERP) SPBrasil. Júlio Trofino Químico, Técnico do Laboratório de Saneamento da Escola de Engenharia de São Carlos – Universidade de São Paulo (EESC – USP). Rodrigo Latanze Professor Adjunto da Universidade da Associação de Ensino de Ribeirão Preto (UNAERP) SP-Brasil. Mauricio de Oliveira Júnior Aluno de iniciação cientifica do curso de Eng. Química da Universidade da Associação de Ensino de Ribeirão Preto (UNAERP) SP-Brasil. Luiz Di Bernardo Professor Titular do Departamento de Hidráulica e Saneamento da Escola de Engenharia de São Carlos – Universidade de São Paulo (EESC-USP). (*) Endereço: Rua Argeu Fuliotto, 419, Bairro Ribeirânia CEP:14096-520 Ribeirão Preto- SP Brasil. E-mail: [email protected] telefone: 0xx (16) 624 07 32 ou 0xx (16) 603 67 18 RESUMO Em estudos realizados na década de 70, pesquisadores encontraram a presença de trialometanos em águas destinadas ao abastecimento publico. A formação desses compostos pode ocorrer pela reação entre o cloro e a presença de substâncias húmicas nas águas dos mananciais de abastecimento. A prática da pré-oxidação da água bruta nas estações de tratamento de água para abastecimento público é comum e a utilização do cloro como agente pré-oxidante pode proporcionar a formação de subprodutos indesejáveis. Diversos estudos vem sendo realizados com o objetivo de minimizar ou remover a formação de subprodutos, dentre eles a utilização de oxidantes alternativos proporcionando a redução da formação de compostos orgânicos halogenados. O presente trabalho teve como objetivo principal avaliar o potencial de formação dos seguintes subprodutos: trialometanos, ácidos haloacéticos, halocetonas e cloropicrina por cromatografia gasosa com detetor de captura de elétrons em uma água preparada com adição de substância húmica extraída de solo turfoso e pré-oxidada com cloro e dióxido de cloro. Foi utilizada uma água de poço sem cloração com adição de extrato de substância húmica extraída de solo turfoso para obtenção de uma água de estudo com cor 200uH. Um volume 4 litros de amostra da água de estudo foi oxidada com 15mg/L Cl2 de solução de cloro (hipoclorito de cálcio) e 1,4 mg/L ClO2 de solução de dióxido de cloro. Adicionouse um tampão de fosfato para manutenção do pH em 7,0, a seguir as amostras foram mantidas à temperatura de 25°C por 7 dias. Em diferentes tempos de contado foram retiradas alíquotas que foram descloradas e extraídas por adição de MTBE e o extrato orgânico obtido foi injetado em um cromatografo de fase gasosa com detetor de captura de elétrons. Pelos resultados obtidos o dióxido de cloro apresentou um potencial de formação significativamente inferior ao cloro, podendo ser recomendado em sistemas que utilizam a pré-oxidação nas estações de tratamento de água para o abastecimento público. Palavras Chave: pré-oxidação, substâncias húmicas, potencial de formação de trialometanos, cromatografia gasosa. 1 INTRODUÇÃO A presença de substâncias húmicas em águas de abastecimento tem ocasionado diversos problemas na qualidade da água distribuída para o consumo humano, sendo um desses problemas a formação de subprodutos, tais como os compostos orgânicos halogenados quando se emprega o processo de pré-oxidação com cloro. Estudos realizados em animais comprovaram que a presença desses subprodutos em água pode causar o câncer (CANTOR et al.1978). O cloro pode reagir com as substâncias húmicas e produzir principalmente os trialometanos (TAM), ácidos haloacéticos (AHA), haloacetonitrilas (HAN), haloacetonas (HC) e cloropicrinas (CP). Segundo RECKHOWM e SINGER (1990) a cloração ou pré-oxidação de águas brutas levam a uma maior formação de TAM, variando de 191 a 1280 µg.L-1 e que o processo de tratamento convencional com uso de coagulantes e sedimentação chega a reduzir 60% dos precursores de TAM. Os fatores que influenciam na formação desses subprodutos são: pH, tempo de contato, temperatura, natureza e concentração de matéria orgânica natural (MON), dosagem de cloro aplicada, residual de cloro livre e concentração de brometos (SINGER, 1994). A velocidade da reação de formação de TAM é lenta, podendo levar de uma hora a vários dias até atingir a produção máxima de subprodutos. Como a estrutura dos precursores é complexa e pouco conhecida, de modo geral, o tempo de contato entre o oxidante (cloro) e os precursores (MON) tem um aumento proporcional à formação de TAM. Em uma pesquisa realizada por STEVENS et al. (1976), onde estudaram o efeito da temperatura e do tempo de contato em uma água clorada, foi concluído que a concentração de clorofórmio aumenta consideravelmente. Segundo ROOK (1976), a formação de TAM aumenta com o aumento do pH. A aplicação de um pré-oxidante alternativo tem sido uma das medidas utilizadas visando à redução de formação de TAM, o dióxido de cloro, como pré-oxidante, tem demonstrado eficiência na remoção de matéria orgânica e minimização da formação de trialometanos. A determinação do potencial de formação de subprodutos pode ser aplicada para vários tipos de oxidantes e auxilia na elaboração de modelos que permitem estimar ou calcular a formação de TAM. 2 OBJETIVO O presente trabalho teve como objetivo principal avaliar o potencial de formação dos seguintes subprodutos: trialometanos, ácidos haloacéticos, halocetonas e cloropicrina por cromatografia gasosa com detetor de captura de elétrons em uma água preparada com adição de substância húmica extraída de solo turfoso e pré-oxidada com cloro e dióxido de cloro. 3 METODOLOGIA A água utilizada nos ensaios era proveniente de um poço artesiano sem cloração e foi preparada para obtenção de cor aparente 200uH com a adição de um volume de extrato de substância húmica obtido por extração alcalina a partir de solo turfoso. Os pré-oxidantes utilizados foram: o cloro utilizando hipoclorito de cálcio e o dióxido de cloro. O método utilizado para a avaliação do potencial de formação de trialometanos (∆ PF TTAM) é proposto pela APHA 5710-B (1998), sendo a diferença entre o total de trialometanos formados durante 7 dias (TTAM7) e o total de trialometanos formados num período inicial (TTAM0). ∆ PF TTAM = TTAM 7 – TTAM 0 (1) Foi utilizado como pré-oxidante o cloro obtido a partir de hipoclorito de cálcio com dosagem de 15 mg/L Cl2 e o dióxido de cloro gerado em um sistema com solução de ácido clorídrico e clorito de sódio com dosagem de 1,4 mg/L ClO2. Para cada pré-oxidante utilizou-se como reator um frasco de 4L de amostra de água com cor 200 uH, com o auxilio de uma solução tampão de fosfato, ajustou-se o pH em 7,0. Em seguida os pré-oxidantes foram adicionados nos respectivos frascos, lacrou-se e acondicionou-se a 25°C. Durante intervalos de tempo de contato de: 2, 6, 12, 24, 48 e 168 h, retirou-se de cada frasco uma alíquota de 100 mL de amostra e adicionou-se um agente desclorante (sulfito de sódio). 2 3.1 Extração de subprodutos e Condições cromatográficas Em uma alíquota de exatamente 10 mL de amostra desclorada foi adicionado 4mL de Metil-Terc-ButiricoEter (MTBE), J.T. Baker de grau CG e aproximadamente 1g de sulfato de sódio anidro como agente secante, agitouse vigorosamente por 1 min seguido de repouso por 2 min a 4°C. A seguir 1µL do extrato da fase orgânica de MTBE foi injetado no cromatógrafo. Utilizou-se um Cromatógrafo Gasoso (CG) Varian 3600CX com detetor de captura de elétrons (DCE), coluna J&W-DB-1,30m x 0,32mm ID e 5µm filme. Gás de arraste nitrogênio 5,0 ECD com fluxo de 3,6 mL/min com pressão de 15 psi, temperatura inicial isoterma de 40°C por 1 min, rampa de aquecimento até 125°C numa razão de 5°C/min por 2min, seguido de aquecimento a 150°C, numa razão de 35°C/min por 5 min. Os padrões utilizados foram mistos de halogenados voláteis (EPA 551.1 A e B) Supelco 48140-U e 4-8046 em meio acetona, o padrão interno (PI) diclorometano grau cromatográfico, J.T. Baker, foi adicionado nos padrões, branco e amostras. Foi traçada uma curva de calibração aquosa de 25, 50, 75, 100, 150 e 200 µg.L-1. Por este método foi possível investigar a presença dos seguintes compostos: (i) clorofórmio, bromodiclorometano, dibromoclorometano, bromofórmio; (ii) dicloroacetonitrila, tricloroacetonitrila, dibromoacetonitrila, bromocloroacetonitrila; (iii) cloropicrina; (iiii)1,1-dicloropropanona, 1,1,1-tricloropropanona. A Tabela 3.1 apresenta a curva de calibração obtida. Tabela 3.1 Curva de calibração para trialometanos, haloacetonitrilas, halocetonas e cloropicrina em µg/L. COMPOSTOS Tempo (min) Ponto 1 (µg/L) Ponto 2 (µg/L) Ponto 3 (µg/L) Ponto 4 (µg/L) Ponto 5 (µg/L) Padrão Interno (PI) Clorofórmio Tricloroacetonitrila Dicloroacetonitrila Bromodiclorometano 1,1-Dicloropropanona Cloropicrina Dibromoclorometano 1,1,1-Tricloropropanona Bromocloroacetonitrila Dibromoacetonitrila Bromofórmio 4,316 6,783 8,927 9,394 9,915 10,847 13,080 13,045 14,415 15,473 16,946 17,115 20µL 50 25 25 25 25 25 25 25 25 25 25 20µL 75 50 50 50 50 50 50 50 50 50 50 20µL 100 75 75 75 75 75 75 75 75 75 75 20µL 150 100 100 100 100 100 100 100 100 100 100 20µL 200 150 150 150 150 150 150 150 150 150 150 Calibração* Ponto 3 (µg/L) ---110 76,74 78,17 77,34 78,29 77,28 77,22 78,58 73,29 65,58 68,23 Desvio Padrão (%) 0 10,2 2,3 4,2 3,1 4,4 3,0 3,0 4,8 2,3 12,6 9,0 Figura 1: Cromatograma obtido pela calibração do ponto 3 (THMACET007.rum) 4 RESULTADOS E CONCLUSÕES Os resultados obtidos das análises cromatográficas realizadas nos extratos de água com substância húmica pré-oxidada com cloro e dióxido de cloro estão apresentados nas Tabelas 4.1 e 4.2. A Tabela 4.3 apresenta os 3 resultados obtidos por calculo do potencial de formação das taxas. A Figura 2 apresenta a formação total de subprodutos em função do tempo de contato e a Figura 3 apresenta o cromatograma de uma amostra. Tabela 4.1 Resultados de subprodutos, potencial de formação e taxa média em água pré-oxidada com dosagem de 1,4 mg/L ClO2, em pH 7, incubada a 25°C, expressos em concentração. Tempo de contato (h) Compostos Branco 2 6 12 24 48 168 168 h Clorofórmio (µg/L) <1 6,62 <1 8,00 11,80 <1 20,93 Bromodiclorometano (µg/L) <1 2,36 <1 2,27 1,92 <1 5,29 Total TAM (µg/L) <1 8,98 <1 10,27 13,72 <1 26,22 Tabela 4.2 Resultados de subprodutos, potencial de formação e taxa média em água pré-oxidada com dosagem de 15 mg/L Cl2, em pH 7,0, incubada a 25°C, expressos em concentração. Tempo de contato (h) Compostos Branco 2 6 12 24 48 168 168 h Clorofórmio (µg/L) <1 43,66 58,98 108,63 86,00 183,87 193,00 Bromodiclorometano (µg/L) <1 4,20 2,52 11,08 6,45 16,35 12,52 Total TAM (µg/L) <1 47,86 67,5 131,71 92,45 248,22 205,52 Tabela 4.3 Resultado do calculo do potencial das taxas de formação para cloro e dióxido de cloro Pré-oxidante Potencial de Formação Taxa de formação (µg/L) (µg/L.h) Cloro 157,66 0,950 Dióxido de cloro 17,32 0,104 300 cloro dioxido de cloro TTAM ug/L 250 200 150 100 50 0 2 6 12 24 Tempo (h) 48 168 FIGURA 2 Gráfico representativo da formação de total de subprodutos em função do tempo de contato 4 Figura 3 Cromatograma obtido da a mostra pré-oxidada com 15mg/L de cloro após 168h Pelo ensaio realizado e dentre os subprodutos investigados, ocorreu à formação apenas de clorofórmio e bromodiclorometano. Para as dosagens aplicadas, o potencial de formação de subprodutos e a taxa ou a velocidade média de formação utilizando o cloro (hipoclorito de cálcio) como pré-oxidante, apresentou-se superior comparada ao dióxido de cloro. Observou-se um aumento na formação de subprodutos em função do tempo de contato. Comparando-se a formação de clorofórmio e o total de TTAM, observa-se uma diferença considerável quando se utilizou o cloro como pré-oxidante. Com base nos resultados obtidos pode-se afirmar que o dióxido de cloro é um produto adequado para uso em pré-oxidação em tratamento de água para abastecimento. 5 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS AMERICAM PUBLIC HEALTH ASSOCIATION (APHA). Standard Methods for the Examination of Water and Wastewater. Formation of trihalomethanes and other disinfection by-products, 5710-A e B, pg 5-50, 20ª ed. AWWA USA, 1998. RECKHOWM, D. A., SINGER, P. C.. Chlorination by-products in drinking waters: from formation potentials to finished water concentrations. Journal American Water Works Association -AWWA, p. 173-180, April 1990. ROOK, J., EVANS, S.. Renoval of trihalometanos precursors from surface waters using weak resins. Journal American Water Works Association -AWWA, v.9, n.p520-524. 1979. UNITED STATES ENVIRONMENTAL PROTECTION AGENCY (USEPA). Method 551.1. Determination of chlorination disinfection byproducts, chlorinated solvents, and halogenated pesticides/herbicides in drinking water by liquid-liquid extracion and gas chromatografhy with electron-capture detection. CD-ROM Revisão 1. Set.1995, Ohio, USA. 5