5910170 – Física II – Ondas, Fluidos e Termodinâmica – USP – Prof. Antônio Roque Aula 1 Movimentos Periódicos Para estudar movimentos oscilatórios periódicos é conveniente ter algum modelo físico em mente. Por exemplo, um corpo de massa m preso a uma mola de massa desprezível. Neste caso, as oscilações podem ser descritas por apenas uma coordenada1: o deslocamento x − x0 do corpo em relação à posição de equilíbrio x0 (que será tomada como zero sem perda de generalidade). 1 Dizemos que o sistema tem apenas um grau de liberdade. 1 5910170 – Física II – Ondas, Fluidos e Termodinâmica – USP – Prof. Antônio Roque Aula 1 Quando o corpo está deslocado da posição de equilíbrio, ele está sob efeito de uma força restauradora F que pode ser escrita como F ( x ) = − k1 x − k 2 x 2 − k 3 x 3 − K onde k1, k2, k3, etc são constantes. Para pequenos valores do desvio |x| em relação à posição de equilíbrio, pode-se desprezar os termos de ordem quadrática, cúbica, etc em x de maneira que a força restauradora é aproximada por F ( x ) = − k1 x . Esta é a chamada lei de Hooke, nome dado em homenagem ao físico inglês Robert Hooke (1635-1703). Combinando a lei de Hooke com a segunda lei de Newton, temos a equação do movimento para o corpo de massa m d 2x m = − k1 x . dt 2 (1) Por razões que ficarão mais claras adiante, vamos reescrever a equação (1) como d 2x k = − 1 x = −ω 2 x 2 dt m (2) 2 5910170 – Física II – Ondas, Fluidos e Termodinâmica – USP – Prof. Antônio Roque Aula 1 onde ω ≡ k1 . m (3) A equação (2) descreve o que se chama de oscilador harmônico simples unidimensional. Qualquer sistema físico com um grau de liberdade que oscile com pequenos deslocamentos em relação uma posição de equilíbrio estável deve obedecer, aproximadamente, a equação (1). Quando os deslocamentos não são pequenos os termos não-lineares (de ordem superior a um em x) na força F(x) não são desprezíveis e o comportamento resultante é mais complicado. Não vamos considerar esses casos não-lineares aqui. A equação do movimento (1) é uma equação diferencial ordinária linear de 2a ordem. • Ela é ordinária porque não envolve derivadas parciais em x; a • Ela é de 2 ordem porque a derivada de ordem mais elevada que aparece é a de 2a; • Ela é linear porque não aparecem termos não lineares em x (como x2, x3, etc) e em dx/dt, d2x/dt2, etc (como (dx/dt)2, (dx/dt)3, (d2x/dt2)2, (d2x/dt2)3, etc). 3 5910170 – Física II – Ondas, Fluidos e Termodinâmica – USP – Prof. Antônio Roque Aula 1 Pode-se verificar por substituição que a equação (2) é satisfeita pelas funções trigonométricas sen(ct) e cos(ct) com a constante c igual a ω. Mostre isso como exercício. Portanto, as seguintes funções são soluções da equação (1): x1 ( t ) = sen (ω t ) x 2 ( t ) = cos( ω t ) Temos o seguinte resultado da teoria das equações diferenciais: qualquer equação diferencial linear de 2a ordem homogênea (como é o caso da equação 2) satisfaz as seguintes propriedades: 1. Se x1(t) e x2(t) são soluções, então x1(t) + x2(t) também é; 2. Se x(t) é solução, então ax(t) (onde a = constante) também é. Como consequência, a combinação linear x ( t ) = ax 1 ( t ) + bx 2 ( t ) também é solução. Este resultado (princípio da superposição) é uma consequência da linearidade da equação diferencial. Outro resultado da teoria das equações diferenciais é o de que a solução geral de uma equação diferencial ordinária de 2a ordem depende de duas constantes arbitrárias. 4 5910170 – Física II – Ondas, Fluidos e Termodinâmica – USP – Prof. Antônio Roque Aula 1 Uma consequência dos resultados acima é que se x1(t) e x2(t) são soluções independentes, isto é, se x2(t) não é múltipla de x1(t), a combinação linear acima é a solução geral da equação diferencial (pois depende de duas constantes arbitrárias, a e b). Aplicando o que foi visto acima ao caso do oscilador harmônico simples unidimensional, temos que a solução geral da equação (2) é x ( t ) = a sen (ω t ) + b cos( ω t ) . Esta solução também pode ser escrita como x ( t ) = A sen (ω t + ϕ 0 ) (4) onde usou-se a identidade trigonométrica sen (ω t + ϕ 0 ) = sen (ω t )cos ϕ 0 + sen ϕ 0 cos( ω t ) . Mostre isso como exercício. Portanto, a solução geral do movimento harmônico simples é uma oscilação senoidal (ou cossenoidal). A representação gráfica dessa oscilação é dada abaixo. 5 5910170 – Física II – Ondas, Fluidos e Termodinâmica – USP – Prof. Antônio Roque Aula 1 A oscilação senoidal tem as seguintes propriedades: 1. Ela está confinada dentro dos limites x = ±A, onde A é a amplitude da oscilação; 2. Ela tem um período T dado pelo tempo entre, por exemplo, dois máximos sucessivos. Como o período da função seno corresponde a um incremento de 2π no seu argumento, temos que sen [ω ( t + T ) + ϕ 0 ) = sen (ω t + ϕ 0 + 2 π ) ⇒ ω T = 2 π ou T = 2π ω . (5) Note que o período das oscilações é independente da amplitude. Este é um resultado válido apenas para o movimento harmônico simples e deixa de valer para oscilações não-lineares. A frequência da oscilação f é definida como o inverso do período f = 1 ω = T 2π (6) e a sua unidade é o hertz (Hz) ou ciclos por segundo. A grandeza ω é denominada frequência angular e a sua unidade é o radiano por segundo (rad/s) ou simplesmente s-1. 6 5910170 – Física II – Ondas, Fluidos e Termodinâmica – USP – Prof. Antônio Roque Aula 1 O argumento da função seno, θ = ωt + ϕ0 (7) é chamado de fase do movimento e o seu valor para t = 0 é a constante de fase ou a fase inicial do movimento (φ0). A figura abaixo mostra o efeito de se variar a fase inicial mantendose constantes todos os demais parâmetros. A curva oscilatória é deslocada rigidamente ao longo do eixo t. As duas constantes arbitrárias A e φ0 da solução (4) podem ser determinadas a partir das condições iniciais x0 e v0 = (dx/dt)|0. Portanto, para t = 0 temos 7 5910170 – Física II – Ondas, Fluidos e Termodinâmica – USP – Prof. Antônio Roque Aula 1 x 0 = A sen ϕ 0 v 0 = ω A cos ϕ 0 de onde obtemos que (mostre como exercício) A= v 02 x + 2 w 2 0 ωx ϕ 0 = tan − 1 0 v0 . Até aqui, representamos o movimento harmônico simples por uma função seno. Porém, tudo também poderia ter sido feito representando-se o movimento harmônico simples por uma função cosseno: x ( t ) = A cos (ω t + α 0 ) . (8) As representações do movimento harmônico simples em termos de um seno ou de um cosseno são equivalentes. Para mostrar isto, basta lembrar que π cos θ = sen θ + 2 . Para que as equações (4) e (8) sejam idênticas devemos ter sen (ω t + ϕ 0 ) = cos (ω t + α 0 ) . Usando a identidade acima, 8 5910170 – Física II – Ondas, Fluidos e Termodinâmica – USP – Prof. Antônio Roque Aula 1 π sen (ω t + ϕ 0 ) = sen ω t + α 0 + . 2 Para que a igualdade seja satisfeita, basta que as constantes de fase sejam definidas de modo que ϕ0 = α 0 + π 2 , ou com o lado direito da expressão acima acrescido de qualquer múltiplo de 2π. Dependendo da circunstância, pode-se escolher representar o movimento harmônico simples em termos do seno ou do cosseno. 9