Certificados de aforro: alterações recentes e impacto nos juros
da dívida pública
Os Certificados de Aforro (CA) são um instrumento de financiamento do Estado dirigido para a captação
directa da poupança dos particulares. Por isso, são considerados como um produto de retalho e
especialmente vocacionado para a aplicação da pequena poupança das famílias.
O número 5 do preâmbulo do Decreto-Lei nº43454, de 30 de Dezembro de 1960, que criou a primeira
série dos CA, referia, aliás, que “Pretende-se assim beneficiar as pequenas economias e por isso não se
permite por ora que sejam emitidos a favor de uma mesma pessoa certificados de aforro cujo valor facial,
na sua totalidade, exceda 50.000$00”.
Uma nova série de CA (Série B) foi criada em 1986 - Decreto-Lei nº 172-B/86, de 30 de Junho, após o que
foi cancelada a emissão da Série A. Por sua vez, em Janeiro de 2008, foi introduzida a série C (Portaria n.º
73-A/2008, de 23 de Janeiro), com o consequente fecho a novas subscrições da série B. Existem, assim,
actualmente 3 séries com contas vivas, embora apenas a série C esteja aberta a novas subscrições.
Cada nova série trouxe alterações às características dos CA, com o objectivo de adequar o produto à
realidade de cada momento, nomeadamente no que diz respeito ao enquadramento financeiro global,
como, por exemplo, o nível prevalecente das taxas de juro. As séries B e C, mantiveram, no entanto, o
espírito inicial de serem vocacionadas para as pequenas economias, limitando o valor máximo de
subscrição individual.
No final de Janeiro de 2008, o stock de CA ascendia a EUR 18 186 mil milhões, valor que estava repartido
por cerca de 720 mil contas, resultando daqui um valor médio para a carteira deste instrumento de EUR
25 mil (valor que inclui a capitalização acumulada desde o momento da subscrição).
Quando analisada a distribuição do saldo de CA por escalões de valor das contas, verificava-se, naquela
mesma data, um elevado grau de concentração do stock, já que, por exemplo, 50 por cento do montante
global era detido por apenas 7 por cento do número total de aforristas, sendo que o peso das contas de
maior dimensão tinha vindo a aumentar ao longo do tempo. No que diz respeito à antiguidade, mais de
50 por cento do stock respeitava a unidades subscritas há mais de 5 anos.
Em termos de regime de remuneração, a taxa base dos CA - série B - é calculada de acordo com uma
média de taxas Euribor (DL 11/99, de 11 de Janeiro), sobre a qual incide um factor multiplicativo
(Portaria n.º 73-B/2008, de 23 de Janeiro), acrescida de um prémio de permanência, determinado, por
sua vez, pela antiguidade da subscrição, indo até um máximo de 2 por cento (para CA com mais de 4
anos). Sucede que esta estrutura de prémios foi fixada em valor absoluto, num período em que as taxas
de juro eram da ordem de 16 por cento, sem que existisse um mecanismo de ajustamento automático ao
nível das taxas de mercado de cada momento.
O regime de remuneração associado à série B até ao início de 2008, implicava duas distorções: a primeira,
em termos de subsidiação cruzada em favor dos aforristas com maiores níveis de rendimento e, a
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segunda, ao nível do custo relativo dos diferentes instrumentos que o Estado tem ao seu dispor para se
financiar.
No final de 2007, a taxa de juro Euribor a 6 meses, um dos principais indexantes de mercado em Portugal,
quer em relação a empréstimos como a aplicações, encontrava-se em 4,71 por cento. Por sua vez, nessa
mesma data, a taxa base para as novas subscrições de CA foi fixada em 3,72 por cento. Sucede que, como
uma percentagem significativa do stock registava uma antiguidade elevada, a taxa a que a carteira
média de CA estava a ser remunerada era de 5,32 por cento, depois de levar em conta o prémio de
permanência médio dos certificados vivos. A taxa de rendimento atingia, assim, um máximo de 5,72 por
cento para certificados detidos há mais de 4 anos.
Atendendo a que, por um lado, estas taxas de remuneração se encontravam acima da Euribor e, por
outro, que o saldo das carteiras com um valor superior a EUR 100 mil representava 50 por cento do total
de CA, concluiu-se que o Estado não só estava a remunerar os certificados muito acima das taxas de
mercado, como a incentivar uma distribuição regressiva dos rendimentos. Registava-se, portanto, uma
situação anómala em termos de mercados financeiros, com o Estado a financiar-se a custos superiores
aos de outros operadores financeiros. Por outro lado estava-se a favorecer, à custa da generalidade dos
contribuintes, os estratos da população de rendimentos/poupanças mais elevadas.
Apesar da injustiça social acima identificada, poderia suceder que o custo de financiamento para o
Estado da emissão de CA fosse inferior ao de outros instrumentos de dívida pública. Tal não era o caso.
Estimou-se que, para as condições prevalecentes no início de 2008, a taxa de remuneração dos CA estava
140 pontos base acima da taxa dos bilhetes do Tesouro (BT) a 3 meses e 110 pontos base acima da taxa
das obrigações do Tesouro (OT) a 10 anos2.
Note-se que, na prática, os CA têm características que os assemelham aos BT, como, por exemplo, terem
um período de refixação de cupão relativamente curto, mas também às OT de médio e longo prazo, por
terem uma maturidade média elevada. Pode, por isso, concluir-se que na relação entre custo e risco dos
diversos instrumentos de financiamento do Estado os CA apresentavam uma relação desfavorável.
A alteração do regime de CA verificada em Janeiro de 2008 incluiu dois elementos: a criação da série C e a
alteração do coeficiente multiplicativo da série B, de 80 para 60 por cento.
Em relação à série C, o elemento de maior destaque nas condições financeiras deste novo produto foi a
definição de uma estrutura de prémios de permanência que incentivasse, e premiasse de forma
significativa, a poupança de médio e longo prazo. Assim, o prémio máximo foi aumentado, podendo
atingir agora um máximo de 2,5 pontos percentuais sobre a taxa base, quando o CA é mantido até à
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Comparando com o custo marginal na altura da emissão.
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maturidade. Deve ainda ser destacado o facto da criação da série C estar associada à modernização deste
produto financeiro, tendo em vista, nomeadamente, a simplificação administrativa e operacional das
transacções, por um lado, e o alargamento e a melhoria dos serviços prestados aos aforristas, por outro.
Com a introdução da série C, estimou-se que o custo acumulado ao final de 10 anos associado a este
instrumento se encontra entre o custo dos BT e das OT. As alterações na remuneração da série C
introduzidas em Março de 2009 não vieram alterar esta situação.
A alteração do coeficiente multiplicativo da série B teve com objectivo alinhar o custo de financiamento
do Estado com a taxa a que a capitalização do stock existente se vai efectuar no futuro, terminando
assim, e simultaneamente, com o elemento de subsidiação cruzada até então existente.
A alteração da estrutura financeira dos CA teve impacto na procura líquida deste produto, já que a sua
atractividade “excessiva” foi eliminada. Verificou-se, com efeito, um aumento do volume de resgates da
série B, face ao que era o padrão histórico, tendência que se manifestou sobretudo nos certificados com
maturidade mais reduzida, com mais de 50 por cento dos resgates a ocorrerem em certificados com
menos de 4 anos de vida. Por outro lado, há a registar que cerca de 50 por cento do volume total
resgatado correspondeu a carteiras de valor superior a EUR 25 mil.
Este comportamento, em grande medida já antecipado, não teve impacto na gestão do financiamento
do Estado uma vez que, atempadamente, se encontraram fontes de financiamento noutros
instrumentos de dívida de forma a cobrir o acréscimo de necessidades, de uma forma financeiramente
menos onerosa para o Estado.
Porém, é de notar que, caso a poupança que estava a ser canalizada para CA tenha sido redireccionada
para outros produtos existentes no mercado, como indicia o crescimento dos depósitos a prazo, o efeito
desta medida em termos de poupança nacional e de receita fiscal é nulo.
No entanto verificou-se uma redução significativa dos encargos em CA. Estima-se que o impacto
favorável nos juros da dívida pública decorrente desta alteração tenha sido superior a EUR 100 milhões
em 2008.
Os CA continuam a ser um produto com risco Estado e, como tal, inferior ao risco da generalidade dos
instrumentos financeiros emitidos no mercado nacional. Além disso o seu capital é garantido, podendo o
certificado ser resgatado em qualquer momento (após os 3 meses iniciais) sem risco de preço e sem
penalizações.
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