16
Dor e Distúrbios do Sono
Gilles J. Lavigne
Takafumi Kato
Pierre Mayer
Sono é o processo natural que desliga o nosso
consciente do meio ambiente por um período de 6
a 9 horas (em bebês, crianças e adolescentes esse
período é maior).1 Normalmente, estímulos sensoriais que fazem parte do meio ambiente, como
ruídos de fundo ou toque suave, não interrompem
o sono.2 No entanto, é a entrada de informações
significativas ou repentinas (como um despertador), que normalmente aciona o alerta (ativação
transitória do cérebro, coração e músculo [<10 s],
sem consciência) ou promove um despertar (ativação cerebral mais longa, com consciência do meio
ambiente).
Os clínicos devem saber que os pacientes com
dor orofacial correm o risco de ter um sono de baixa qualidade (i.e., dificuldade de pegar no sono
ou dormir que é interrompido por um início súbito de dor). Sono é essencial à saúde e extensos
períodos de privação do sono aumentam o risco
de desordens cardiovasculares, distúrbios mentais
ou queixas relacionadas à dor.3 Pacientes com dor
crônica normalmente não acordam descansados4-8
e frequentemente relatam demora para pegar no
sono. Insônia é uma queixa comum, assim como
a fadiga.4 As consequências da falta de sono ou
da baixa qualidade de sono incluem a sonolência
diurna, a baixa produtividade e o aumento do risco
de acidentes de trabalho ou automobilísticos.4 Este
capítulo focalizará a relação entre dor crônica e os
mecanismos que mantêm ou interrompem o sono.
Ferramentas e questões metodológicas relevantes a
este tópico podem ser revistas numa recente publicação do nosso grupo.9
Sono normal
Ao passar do estado de vigília para o de sono, há
uma mudança gradual do completo estado de alerta e consciência para sonolência e um desligamento quase completo do meio ambiente. Quando o
sono começa, muitas vezes experimenta-se uma
repentina contração muscular corpórea involuntária. Esse tipo de mioclonia, também chamada de
contração hipnagógica, que ocorre no início do
sono, é considerada normal a menos que ocorra
frequentemente durante sono. Cientistas dividem o
sono em vários estágios que são classificados como
estágio do sono REM (rapid eye movement, que
125
Dor Orofacial n Da Ciência Básica à Conduta Clínica
Estágio do sono
16
TM
VT
REM
1
2
3
4
00:00
01:00
02:00
03:00
04:00
05:00
06:00
07:00
08:00
Tempo (horas)
Estágio do sono
Fig. 16-1a Sono normal: dados de um indivíduo com 23 anos, que teve quatro ciclos de sono completos (I a IV). Somente 12
despertares (linhas finas verticais que estendem até VT) foram marcados (normal <30/noite); um dos despertares é representado
aqui, e na figura 16-1b, por um asterisco. A duração dos períodos de REM (corresponde às barras negras horizontais) foi mais
longa e a duração dos estágios 3 e 4 foi mais curta no final do período de sono. TM = tempo de movimento; VT = vigília.
TM
VT
REM
1
2
3
4
00:00
01:00
02:00
03:00
04:00
05:00
06:00
07:00
08:00
Tempo (horas)
Fig. 16-1b Sono deficiente: dados de um indivíduo de 28 anos cuja queixa era de sono não reparador. Embora ele apresentasse
os quatro ciclos de sono completos (I a IV), vários despertares (linhas finas verticais que estendem até VT) foram marcados (n=27)
e frequentes trocas de estágios do sono foram anotados (X). Períodos de REM correspondem às barras negras horizontais. TM
= tempo de movimento; VT = vigília.
significa movimento rápido dos olhos) e estágio do
sono NREM (non-rapid eye movement, que significa não movimento rápido dos olhos). O estágio do
sono NREM é dividido em sono superficial (estágios
1 e 2) e sono profundo (estágios 3 e 4, também
conhecidos como sono de ondas lentas ou sono
delta). Acredita-se que os estágios de sono 3 e 4 sejam do “sono restaurador”. O rompimento desses
estágios parece estar associado com um maior ris-
126
co de fadiga diurna e dor.4,7,9,10 Sono REM também
é conhecido como sono ativo ou sono paradoxal.
No período do sono, passamos do sono superficial
para o sono profundo e depois para o sono REM,
três a seis vezes (ciclos ultradianos) durante a noite.
Cada um desses ciclos dura aproximadamente 90
minutos (Fig. 16-1a). Na primeira metade da noite,
predominam os estágios 3 e 4. Na segunda metade, predomina o sono REM.
Dor e Distúrbios do Sono
Tabela 16-1 Despertar e reconhecimento das fases do sono*
Estágio
Tempo de
sono (%)
Atividade
cerebral/EMG
Atividade
EMG
Movimento de
olhos/EOG
Batimento
cardíaco/ECG
Probabilidade
de despertar
Vigília
–
Baixa amplitude e
alta frequência β (1330 Hz) e α (8-12 Hz)
Alta
Intenso
Variável
–
NREM
Sono Leve
Estágio 1
10
Baixa amplitude –
frequência alta e
mista rápida e não
sincronizada α (1012 Hz) e θ (4-7,5Hz)
Alta para
moderada*
Rotação lenta
Mais lento que
quando acordado
Muito alta
Estágio 2
50
Amplitude média
mais lenta α (8-10Hz)
e θ (4-7,5Hz) com
presença de complexo Kł e eixosb
Moderada*
Lento
Mais lento que
quando acordado
Alta
NREM
Sono
Profundo
Estágios
3e4
10-20
Alta amplitude e
baixa frequência
δ (0,5-3,5 Hz)
Moderada
para baixa
Ausente
Mais lento
e regular
Baixa
REM/sono
ativo
20-25
Padrão de frequência
alta e mista não
sincronizada (ausencia de ondas δ)
Muito baixa/
hipotonia
Rápido e fásico
Variável
Baixa
* Estágios com presença de bruxismo noturno e movimento periódico de membros.
† Complexo K no EEG são ondas bitrifásicas de alta amplitude (>75 μv) durando > 0,5 s (veja C3A2 localizado na Fig. 16-2).
‡ Fusos no EEG são ondas rápidas (12-14 Hz), sinusoides e fusiformes (veja no final do traçado de C3A2 na Fig. 16-2).
Fig. 16-2 Estágio 2 do sono em um indivíduo sem dor. Os traçados representam um período de 20 segundos. Os
dois traçados superiores são movimentos
oculares esquerdo e direito (OCE e OCD).
O traçado do meio representa a atividade
de EMG do queixo. Os dois traçados inferiores são atividades EEG registradas na
posição central com referência no lóbulo
da orelha direita (C3A2) e outra na posição occipital com referência no lóbulo da
orelha esquerda (O2A1). Note a presença
do evento K-EEG (onda de longa amplitude) no meio do traçado de C3A2 seguido por um fuso do sono (rápido e denso
no EEG) na parte final.
OCE
OCD
EMG
C3A2
O2A1
127
16
Dor Orofacial n Da Ciência Básica à Conduta Clínica
Critérios específicos são utilizados para analisar os vários estágios do sono na polissonografia,
que são registrados com o auxílio de um software específico (Tab. 16-1 e Fig. 16-2). São utilizados
os seguintes registros: atividade elétrica cerebral
(eletroencefalograma [EEG]), atividade muscular
(eletromiografia [EMG]), movimentos dos olhos
(eletro-oculograma [EOG]), frequência cardíaca
(eletrocardiograma [ECG]), e respiração (movimentos abdominal e torácico e fluxos aéreos nasal e
oral).4,9-13 Mensurações da temperatura retal e dos
níveis de melatonina salivar são obtidos para avaliar
ritmos cronobiológicos. Outras medidas incluem
acidez esofágica por refluxo gástrico e níveis sanguíneos da secreção das glândulas endócrinas. Gravações de vídeos e sons são também utilizadas para
identificar movimentos do corpo que acontecem
durante o sono, incluindo bruxismo, movimento
periódico de membros, sonambulismo, ronco, fala
e desordens comportamentais do sono REM (ausência de paralisia do corpo durante sono).9
Muitos neurotransmissores e peptídeos que
têm sido associados com o sono (p.ex., serotonina
[5-HT], ácido γ-aminobutírico [GABA], acetilcolina
[Ach], noradrenalina, colecistocinina [CCK], opióideos, prostaglandina, hormônios do crescimento,
prolactina e melatonina) também estão envolvidos
na percepção ou modulação da dor.5,9
Sono de baixa qualidade
A avaliação da qualidade do sono é igual à de
dor – altamente subjetiva e dependente de experiência passada e estado psicossocial atual.9
Na ausência de medidas diretas, avaliação da
qualidade do sono frequentemente é mal interpretada. Embora a qualidade do sono varie
de indivíduo para indivíduo, ela pode ser estimada através de uma combinação de registros,
incluindo a sensação de sono não descansado,
sono não suficiente, frequentes despertares durante o sono e sensação de não ter dormido
profundamente. Condições que favorecem o
sono de boa qualidade incluem ambiente seguro, quieto e confortável. Nessas condições,
estímulos de baixo nível apresentam pouca ou
128
nenhuma influência na qualidade do sono de
uma pessoa saudável. Porém, um som alto ou
um ataque de dor inesperado durante o sono,
como dor de dente ou dor nas costas, pode iniciar uma resposta de despertar que desencadeia
ansiedade e, assim, impede o sono subsequente.
Fazem parte dos fatores que influenciam a qualidade do sono a presença da dor, a experiência passada de dor, ansiedade ou relevância da
dor (p.ex., dor recorrente em um paciente cujo
câncer está em remissão), depressão concomitante e outras perturbações de humor ou excesso de fadiga.4,6,9 A idade também pode ser
considerada um fator que influencia a qualidade do sono, pois as queixas de sono leve são
mais frequentes com o passar dos anos.
Sono anormal
Muitas variáveis são usadas para descrever o
sono.4,6,9 A sua eficiência é a medida do tempo total do sono sobre o tempo total na cama, desde o
início até o despertar. Normalmente, atinge 90%
em pessoas que dormem bem e é mais baixo que
80% em pessoas que dormem mal. Redução do
tempo em alguns estágios do sono e a frequente
alternância de estágios (de um estágio mais profundo para um mais superficial) também é indicativo de um distúrbio do sono (ver Fig. 16-1b). Além
disso, microdespertares frequentes, despertares,
movimentos de corpo ou apneia e hipopneia do
sono (redução de 50% no esforço respiratório por
mais de 10 segundos) também caracterizam sono
deficiente. Finalmente, a intrusão de ondas EEG rápidas (alpha) durante os estágios 3 e 4 é um sinal
de sono leve, mas isto não é causa de dor durante
o sono.3-6,9 Vários distúrbios do sono – desde dissonias (p.ex., insônia, apneia) até parassonias (p.ex.,
enurese, sonambulismo, pesadelos, distúrbios do
comer relacionado ao sono), para desordens do
sono relacionados ao movimento (p.ex., bruxismo do sono, movimento periódico de membros,
câimbras nas pernas) – e concomitante desordens
médico/psiquiátrica (p.ex., fibromialgia/dor difusa,
doença de Parkinson, alcoolismo), são associados a
uma estrutura de sono anormal11 (Quadro 16-1).
Dor e Distúrbios do Sono
Quadro 16-1 Exemplos de desordens de sono baseados na classificação Internacional dos Distúrbios do Sono2-11
Insônia
(frequente em pacientes com dor crônica)
•Demora para adormecer ou dificuldade para retomar o sono quando despertado
Distúrbios respiratórios relacionados ao sono
(risco de doenças cardiovasculares e acidentes automobilísticos)
•Síndrome da apneia-hipopneia do sono (obstrutivo e/ou central)
•Síndrome de Cheyne-Stokes (respiração crescente e decrescente com doença neurológica e cardíaca)
•Hipoventilação/hipoxemia relacionadas ao sono com sonolência (também conhecida como a síndrome de resistência das
via aéreas superiores (SRVAS)
•Ronco (1 em cada 5 pacientes com ronco pode ter alguma forma de distúrbio respiratório)
Hipersonia
•Narcolepsia
•Hipersonia relacionada à menstruação
Distúrbios do ritmo circadiano do sono
•“Jet lag”, troca de turnos de trabalho que interrompe o ritmo circadiano
Parassonias
(distúrbios que se manifestam durante o sono/um intruso do sono; frequente em crianças)
•Sonambulismo
•Terror noturno
•Enurese do sono
•Pesadelos
•Distúrbio comportamental do sono REM/ausência de hipotonia muscular durante o sono REM (equivalente ao alto risco de
doença de Parkinson em adultos)
Distúrbios do movimento relacionados ao sono
•Bruxismo noturno
•Movimento periódico das pernas
•Câimbras das pernas relacionadas ao sono
Distúrbios do sono associados a outras desordens
•Fibromialgia (também descrita como dor difusa)
•Doença de Parkinson
•Dores de cabeça relacionadas ao sono (desordem respiratória precisa ser primeiramente excluída)
•Refluxo gastroesofágico
•Deglutição anormal, sufocamento e laringoespasmo relacionados ao sono
129
16
Dor Orofacial n Da Ciência Básica à Conduta Clínica
Anormalidades do sono em
pacientes com dor
Os profissionais precisam observar que pacientes
com dor orofacial devem ser considerados do grupo
de risco para desenvolver um sono deficiente.4,5,14
Pacientes com dor parecem demorar mais a pegar
no sono, ter frequentes despertares, várias trocas
de estágios do sono e movimentos de corpo durante sono.3,4,6,9 Alguns podem apresentar flutuações cíclicas do EEG durante o sono.3,6,7 Embora
isto não seja específico para pacientes com dor
crônica; eles frequentemente são observados conjuntamente com outras condições de alterações
do sono.3,4,9 Recentemente, uma forma sutil de
disfunção cardíaca autonômica foi observada em
insones e em pacientes de dor crônica com fibromialgia. Normalmente, a frequência cardíaca diminui da vigília para o sono superficial, alcançando
seu nível mais baixo durante sono profundo (Fases
3 e 4), mas essa diminuição não acontece em tais
pacientes.9,12,13 Resta determinar se essa diferença
é a causa primária do sono não restaurador nesses
pacientes ou se é secundária a outros distúrbios
crônicos de saúde.
Dor e sono deficiente são influenciados por experiências passadas, crenças pessoais, estado de saúde
e estilo de vida, entre outros fatores. Cada um desses itens deve ser investigado para identificar a causa do sono deficiente em relação à dor persistente.
Dor e sono deficiente são queixas concomitantes em
pacientes que apresentam certas condições, como
dor miofacial, artrite reumatoide, dor lombar crônica e condições com dor difusa, como fibromialgia.3-8
Num estudo comparativo multicêntrico,8 pacientes
com fibromialgia informaram 2,4 vezes mais distúrbios de sono que no grupo-controle. Distúrbios do
sono também foram relatados por 50% dos pacientes com dor nos músculos mandibulares e por 90%
dos pacientes com fibromialgia.14 Alguns dados
epidemiológicos sugerem que existe uma relação
gradual (dose-resposta) entre dor mandibular e
baixa qualidade do sono: considerando que 20%
dos pacientes com queixa de dor leve reclamaram
de sono deficiente e 59% com dor mandibular intensa tiveram sono deficiente.15 Mais inter-relações
130
foram encontradas entre os relatos dos pacientes
com queixa de dor aumentada e sono deficiente,
tais como levar mais tempo para dormir, despertar
frequentemente durante o sono e tempo total do
sono reduzido.4-6 Também existe alguma evidência
de uma relação circular (ciclo vicioso) entre sono
e dor: um dia com dor intensa, frequentemente é
seguido de uma noite de sono deficiente, e uma
noite de sono deficiente frequentemente é seguida
por um dia com dor mais intensa e variável.4,5,9
Um sono deficiente causa dor crônica?
A possibilidade de um sono deficiente ser uma causa de dor foi testada experimentalmente no início
dos anos 1970. Estímulos auditivos foram usados
para privar jovens saudáveis, sem dor e queixas em
relação ao sono, dos chamados estágios de sono
restaurador (3 e 4). De maneira interessante, os
indivíduos relataram dor muscular aumentada no
dia seguinte, uma possível consequência de fadiga relacionada com a privação do sono.3,4,7,10 Por
não existir forte evidência de que o sono deficiente
seja a causa principal de dor, não podemos concluir
a presença de uma inter-relação entre sono deficiente e dor persistente. Entretanto, precisam ser
excluídos, como fatores de risco concomitantes, as
condições médicas com alterações no sono como:
insônia, desordens respiratórias do sono e movimentos periódicos de membros (ver Quadro 16-1).
A dor causa um sono deficiente?
O fato de a dor causar sono deficiente, ou vice-versa, seria fortalecido caso se pudesse demonstrar
que um precede o outro. Na realidade, 90% dos pacientes de dor crônica relataram que a dor ocorreu
antes ou no início do sono deficiente.4 Enquanto
isto sugere que dor tem influência direta na qualidade do sono, experimentos recentes evidenciam
que isto não é suportado. Dois estudos recentes utilizando estimulação nociceptiva experimental, “curto” térmico ou “longo” químico, mostraram apenas
distúrbios leves de sono em indivíduos normais.16,17
Além disso, nenhuma queixa significativa de baixa
qualidade de sono foi relatada ao despertar.
Dor e Distúrbios do Sono
Possíveis fatores que confundem a
interrelação entre dor e sono deficiente
É difícil separar a influência de distúrbios de saúde
crônicos associados com dor persistente. Variáveis
psicológicas, como catastrofização, estilo de vida e
estresse, fadiga, irritabilidade e hipervigilância em
relação à saúde, são frequentemente notadas em
pacientes com dor crônica.3,4,7,8,9 Além disso, angústia afetiva (p.ex., mudanças de humor, ansiedade,
depressão) parece explicar 25% das variáveis na interação entre dor e distúrbios do sono.4,5,9 As modificações nos processos fisiológicos vistos em insones
e em pacientes com dor crônica (fibromialgia)7,12,13
sugerem que os dados obtidos de estudos de privação de sono ou de estimulação nociceptiva em
indivíduos normais3,7,9,10,16,17 devem sempre ser interpretados com cautela. Na ausência de sintomas
persistentes, um indivíduo saudável pode reagir de
maneira diferente a uma agressão dolorosa súbita
do que em um paciente que sofre de dor crônica.
Revisão de estratégias de controle
para dor e sono deficiente
No desenvolvimento de estratégias de controle, é
importante primeiro determinar se um paciente
que se queixa inicialmente de sono deficiente tem
algum tipo de distúrbio do sono (ver Quadro 16.1)
ou condições médicas que poderiam alterar o sono.
Muitos fatores, incluindo o uso de certos medicamentos ou psicoestimulantes, pouco exercício físico, abuso de álcool e dieta pobre, podem alterar
o sono. Clínicos também devem estar atentos que
medicamentos antidepressivos, como inibidores da
recaptação seletiva de serotonina (fluoxetina, sertralina), podem exacerbar atividade motora como
o bruxismo (veja Lavigne et al.4,5,18 para mais informação).
A seguir, boas estratégias para higiene do sono
devem ser revistas, inclusive horário regular e hábitos antes de dormir; relaxamento antes de dormir;
evitar tomar café, evitar refeições excessivas, álcool
ou fumo ao anoitecer; e o estabelecimento de um
ambiente silencioso e confortável para dormir. Técni-
cas comportamentais cognitivas, relaxamento, biofeedback ou auto-hipnose são considerados pouco
efetivos, embora mais estudos controlados sejam
necessários.
Medicamentos para reduzir a dor durante o
sono (p.ex., analgésicos, como anti-inflamatórios
não esteroides [NSAIDs]; ver Cap. 21), ou os que
reduzem ansiedade e/ou atividade muscular como
benzodiazepínicos (p.ex., valium, lorazepam, clonazepam), ou relaxantes musculares (p.ex., metacarbomol, ciclobenzaprina) podem ser usados por
curtos períodos. Para melhorar a continuidade e
a qualidade do sono, medicamentos hipnóticos
(p.ex., zolpidem, zopiclone) podem ser usados,
também por curtos períodos. Antidepressivo (p.ex.,
amitriptilina, trazodona) tem de baixa a morderada eficácia no controle das queixas de sono e dor,
mas seu uso é limitado devido aos efeitos colaterais
(p.ex., sonolência diurna, xerostomia).
Finalmente, aparelhos orais parecem ter alguma eficácia no bruxismo do sono e/ou dor orofacial
(p.ex., placa de mordidas, protetores bucais) ou
ronco e apneia do sono (p.ex., aparelho de avanço mandibular, pressão positiva contínua das vias
aéreas), como descrito brevemente no capítulo 26;
porém, nem todos os pacientes podem tolerar essas
técnicas por várias razões que incluem desconforto
físico, dor e hipersalivação.18 Pelo fato de o controle dos distúrbios respiratórios do sono (apneia) ser
uma área em crescente interesse na Odontologia,
os leitores devem aumentar seus conhecimentos
nesse campo.11,18
Resumo
Neste capítulo foi apresentado que os pacientes
com dor orofacial correm risco de ter sono deficiente (p.ex., demora para adormecer, frequente
despertares, frequentes trocas de estágios do sono
e movimentos de corpo durante o sono).
Existe boa evidência que um dia com mais dor
é seguido por uma noite de sono deficiente, e uma
noite de sono deficiente precede um dia com uma
variação maior de dor. Quando um paciente de
dor crônica informar problemas persistentes com o
sono, é recomendado o seguinte:
131
16
Dor Orofacial n Da Ciência Básica à Conduta Clínica
1. Cheque se o paciente tem higiene de sono boa
(i.e., horários regulares de sono e hábitos, relaxamento antes de dormir, evitar café, refeições
excessivas, álcool ou fumar pela noite).
2. Determine, se a queixa primária do paciente é
sono deficiente, se há algum tipo de distúrbio do
sono ou condição médica, ou se usa medicamentos que poderiam perturbar o sono. Pode ser então necessário indicar o paciente a um especialista
de sono para excluir possíveis distúrbios do sono.
3. Institua o uso de curtos períodos de medicamentos que podem melhorar a continuidade do sono
(ou seja, menos perturbação ou fragmentação do
sono).
4. Considere o uso de um aparelho oral para tratar
bruxismo do sono e/ou dor orofacial (p. ex., placa de mordida, protetores bucais) ou ronco e/ou
apneia do sono (i.e., aparelho de avanço mandibular, pressão positiva contínua das vias aéreas).
Porém, devemos reconhecer as limitações de tais
aparelhos.
Agradecimentos
A pesquisa do autor é apoiada pelo Canadian Institutes of Health Research and Fonds de Recherche
em Santé Du Quebec e pela Canada Research Chair
in Pain, Sleep and Trauma.
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