EPISTEMOLOGIA NATURALIZADA: UMA REORIENTAÇÃO EPISTEMOLÓGICA
NO PENSAMENTO DE QUINE
Rafael Silva Sousa (Aluno em Iniciação Científica/PIBIC - CPNQ), Maria Cristina De Távora
Sparano (Orientador, Depto de Filosofia – UFPI)
1. Introdução:
Os empiristas lógicos (Carnap, Schlick e outros), Popper, Lakatos e Fraassen envolvidos no
debate em torno do realismo científico, em sua maioria compreendem que a filosofia da ciência seja
apenas uma teoria da justificação, que se restringe ao domínio do contexto de justificação, deixando
para a psicologia empírica as questões do contexto de descoberta. Esse contexto da descoberta
ocorre com autores naturalistas como Quine, Richard Boyd e kuhn. A principal tarefa do epistemólogo
é a de investigar as relações entre nosso discurso e a realidade, entre palavra e objeto, tal análise
permitirá Quine dar conta de seu projeto epistemológico: saber como construímos um discurso que
diz muito mais do que seria possível se estivéssemos apenas ao nível das certezas fornecidas pela
evidência sensível. A opção de atacar questões epistemológicas através da análise do discurso
deriva da crença de Quine do paralelismo linguagem, considerando que as teorias são subconjuntos
contidos no universo da linguagem. As teorias são, portanto, um conjunto de sentenças organizadas
segundo certas regras e inseridas na totalidade do sistema linguístico que as torna significativas.
A investigação sobre o fundamento das crenças da humanidade e das crenças dos indivíduos deve
permitir que se distinga entre as que são objetivas e as que derivam das teorias que os homens
produziram par conhecer o mundo. Pois é tarefa dos epistemólogos distinguir os enunciados que
correspondem a constatação objetivas daqueles que são ‘’invenção’’, isto é, produzidos pelo homem
em seu esforço de conhecimento, os quais ultrapassam o nível de evidência sensível. Quine vai
propor uma conjugação de esforços entre epistemólogos, psicólogos, biólogos, para compreender o
processo pelo qual o homem é excitado pelas estimulações físicas que agem sobre suas
transmissões nervosas, às quais responde sob a forma de discurso, o qual o ultrapassa infinitamente
as estimulações recebidas. O locutor pronuncia, assim, frases irredutíveis a simples enunciados de
observação. Portanto, esse é um projeto interdisciplinar de Quine que visa explicar empírica e
naturalmente a relação palavra – objeto, discurso – realidade, um projeto de naturalização da
epistemologia. Essa proposta de reorientação da epistemologia propõe que ela seja substituída por
uma nova forma de investigação. Para Quine, a epistemologia não deveria ser uma pura análise
lógica
de
enunciados
e
suas
implicações,
independente
de
processos
psicológicos
e
psicolinguísticos, por meio dos quais, a partir de determinada estimulação sensorial, chegamos a
descrever determinados estados de coisas e as relacionamos. A epistemologia seria, então, um
capítulo das ciências da natureza, posto que estuda um fenômeno natural: o homem – um objeto
físico em meio a outros objetos físicos que estimulam suas transmissões nervosas, ao que ele
responde com um discurso que é também um objeto físico. Portanto, Quine vai sugerir aos
epistemólogos que utilize métodos empiristas, pragmáticos, pois os considera os únicos capazes de
conduzir a resultados confiáveis.
2. METODOLOGIA
Esta pesquisa foi realizada através da análise de textos de apoio, ou seja, de especialistas
em Quine e no ensaio ‘’Epistemologia Naturalizada’’ (1969) de Willard Van Quine onde ele propõe
uma nova epistemologia em oposição às teorias fundacionalistas tradicionais. Nesse ensaio, Quine
vai alegar que a epistemologia tradicional só é viável se for naturalizada, ou seja, desde que se
coloque no mesmo plano das demais ciências empíricas, para as quais ela não se preocupa mais em
ser seu fundamento.
3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
Quine defende um holismo, característica central de um empirismo sem dogmas, que diz que
nossos enunciados correspondem a um tecido linguístico cujas fibras estão intrinsicamente
conectadas a dados empíricos e por estarem intrinsecamente conectadas, qualquer alteração em um
anunciado provocaria alterações em vários outros enunciados. A periferia deste tecido linguístico está
conectada diretamente com enunciados sujeitos à observação, enquanto o núcleo é composto por
enunciados teóricos e para Quine, o que há é uma diferença de graus; ou seja, uma diferença de
grau de proximidade à experiência, por um lado, e uma diferença de grau de vulnerabilidade dos
enunciados, por outro, e, provém de nossa inclinação pragmática ajustar uma fibra do tecido em um
outro, ao acomodar alguma experiência recalcitrante em particular. Com isso, Quine diz que a
totalidade de nossos conhecimentos e crenças, como as das mais casuais questões de geografia,
história, física, matemática e lógica, é um tecido feito pelo homem que encontra a experiência apenas
nas extremidades. ‘’A totalidade da ciência é como um campo de forças, cujas condições limítrofes
são a experiência. ’’ (QUINE, 2011, p. 66). E o conflito com a experiência na periferia ocasiona
reajuste no interior do campo; ou seja, reorganizando a teoria e modicando os aspectos centrais, no
intuito de torná-los mais coerentes com a observação.
4. CONCLUSÃO
Para Quine, deve haver uma mediação importante entre a entrada (input) e saída (output) de
dados sensoriais, o que, segundo ele, é uma descrição variada, detalhada e consistente de um
mundo composto de entidades relacionadas por processos diversos, em especial, as teorias
científicas. Para ele, há de se ter uma boa explicação para a diferença na relação da pobreza de
nossa entrada de dados e na riqueza da saída de dados sensoriais para o conhecimento humano. E,
segundo Quine, essa explicação deve decorrer de teorias sobre a constituição psicológica dos seres
humanos e das características essenciais da linguagem. Quine mostra que a epistemologia
naturalizada é a melhor maneira de estudar e explicar a relação entre aquela entrada, constituída de
estimulação sensorial, e a saída, que é nossa fala, contendo sistemas de enunciados, nossas teorias
sobre o mundo e o saber humano.
Deste modo, a proposta de Quine é que, embora mantendo que o significado relevante para a
ciência é o significado empírico, deve ser agora advogada a tese da indivisibilidade do significado
empírico de uma teoria. A proposta de Quine é que, contra a distinção analítico-sintético e o
reducionismo — os chamados dois dogmas do empirismo — seja advogada uma concepção holista
da ciência; contra o empirismo dogmático, um empirismo — e portanto uma ciência — sem dogmas.
Para ele, a visão holista de linguagem e de ciência desempenha um papel crucial no sistema.
REFERÊNCIAS
BULCÃO NASCIMENTO, Marcos. O Holismo Quineano e a Ciência Sem Dogmas.
Praxis Filosófica, núm. 28, enero-junio, 2009, pp. 99-116.
BULCÃO NASCIMENTO, M. [2008]: O Realismo Naturalista de Quine: Crença e
Conhecimento sem Dogmas, Campinas: Unicamp/Coleção CLE, v. 51.
CORNELIS, de Wall. Sobre Pragmatismo. Tradução de Cassiano Terra Rodrigues.
São Paulo: Loyola, 2007.
LOPES DOS SANTOS, L. H. [1995]: “Quine e os dogmas do empirismo”, in: Discurso
n. 6, São Paulo: Discurso Editorial.
PENCO, Carlo. Introdução à Filosofia da Linguagem. Trad. Ephraim F. Alves.
Petrópolis, RJ: Vozes, 2006.
QUINE, W. V. Relatividade Ontológica e outros ensaios. In: Ryle, Strawson, Austin,
Quine. São Paulo: Abril Cultural, 1985.
QUINE, W. De um Ponto de Vista Lógico. Tradução de Antonio Ianni Segatto. São
Paulo: Editora Unesp, 2011.
________. Palavra e Objeto. Trad. de Sofia Inês Albornoz Stein e Desidério Murcho.
Ver. téc. de Sofia Inês Albornoz Stein. Petrópolis, RJ: Vozes, 2010.
Palavras Chaves: Holismo, Linguagem, Quine.
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