Unidade 1 Introdução e Noções Históricas A primeira separação da Química em Inorgânica e Orgânica ocorreu por volta de 1777 e foi proposta pelo químico alemão Torbern Olof Bergman (1735 - 1784): Química Inorgânica é a parte da Química que estuda os compostos extraídos dos minerais. Química Orgânica é a parte da Química que estuda os compostos extraídos dos organismos vivos. Com base nessa definição, Jons Jakob Berzelius (1779-1848) formulou a Teoria da Força Vital, ou vitalismo, segundo a qual os compostos orgânicos necessitavam de uma força maior, a vida (força vital), para serem sintetizados. Essa teoria era um empecilho para o desenvolvimento da Química Orgânica, pois acreditava-se que somente a partir de organismos vivos seria possível extrair substâncias orgânicas. Em 1828, um aluno de Berzelius, Friedrich Wöhler (1800-1882) sintetizou, de forma acidental, um composto orgânico chamado uréia, comumente encontrado no suor, sangue e urina dos animais. A reação feita por Wöhler pode ser representada pela equação química abaixo, na qual o cianato de amônio é aquecido: NH2 (NH4)OCN cianato de amônio calor O C NH2 ureia Apesar de o vitalismo não ter sido derrubado de imediato após a síntese de Wöhler, os cientistas perceberam que a definição de Bergman para Química Orgânica não era adequada. Devido à presença constante do carbono nos compostos orgânicos conhecidos na época, como a uréia, o ácido tartárico, C4H6O6(s), a glicerina, C3H8O3(l), o ácido cítrico, C6H8O6(s), e o ácido lático, C3H6O3(l), dentre outros, o químico alemão Friedrich August Kekulé (1829-1896) propôs em 1858 a definição aceita atualmente: Química Orgânica é a parte da Química que estuda praticamente todos os compostos do elemento carbono. Desse modo, Química Inorgânica é a parte da Química que estuda os compostos dos demais elementos e alguns poucos compostos do elemento carbono, que são denominados compostos de transição, ou seja, compostos que possuem o carbono, mas tem propriedades semelhantes às dos compostos inorgânicos. Dentre eles podemos citar o gás carbônico, CO2(g), o monóxido de carbono, CO(g), o cianeto de hidrogênio, HCN(g) entre outros. Com a síntese da ureia, Wöhler deu início a um grande campo de pesquisa, o das sínteses orgânicas. Hoje são conhecidos mais de 19 milhões de compostos orgânicos presentes em inúmeros produtos que utilizamos diariamente, como gasolina, querosene, álcoois, plásticos, borrachas, tintas, remédios, fibras têxteis, papéis, produtos de limpeza, cosméticos, produtos de higiene, pesticidas e fertilizantes agrícolas. Isso ocorre em razão da versatilidade única do elemento carbono que, por ser tetravalente e ter um raio atômico relativamente pequeno é capaz de formar compostos que contêm milhares de átomos ligados, arranjados das mais diferentes maneiras. Além do carbono, o hidrogênio, o oxigênio e o nitrogênio – denominados elementos organógenos – formam a maioria dos compostos orgânicos conhecidos. Postulados de Kekulé 1º) Postulado O carbono é tetravalente: faz 4 ligações covalentes que podem ser estabelecidas de uma das seguintes formas esquematizadas a seguir: C C 4 ligações simples (4 ligações sigma, ) 2 ligações simples (2 ) 1 ligação dupla (1 e 1 ) C C 2 ligações duplas (2 e 2 ) 1 ligação simples (1 ) 1 ligação tripla (1 e 2 ) 2º) Postulado As quatro ligações simples do carbono são iguais em comprimento e energia. Assim, por exemplo, as quatro fórmulas exemplificadas a seguir representam, na realidade, um único composto, de fórmula molecular CH3Cl. H Cl C H H H H C H Cl H H C H Cl Cl H C H H 3º ) Postulado Átomos de carbono ligam-se diretamente entre si ou com outros elementos, formando estruturas denominadas cadeias carbônicas. As cadeias carbônicas podem conter milhares de átomos de carbono ligados sucessivamente formando compostos estáveis. É o que justifica o grande número de compostos orgânicos conhecidos. H H H C C H H H C H H H H C C O C H C H H H H C N C H H H H C H H C H C C C OH C H C H Elementos Organógenos Os elementos organógenos são os quatro elementos que formam praticamente todos os compostos orgânicos. Além do carbono que é tetravalente, temos: Hidrogênio monovalente. (H): faz 1 ligação H 1 ligação simples covalente, é Oxigênio (O): faz 2 ligações covalentes, é bivalente. O 2 ligações simples O 1 ligação dupla Nitrogênio (N): faz 3 ligações covalentes, é trivalente. N 3 ligações simples N 1 ligação simples e 1 ligação dupla N 1 ligação tripla Eventualmente outros elementos também podem formar compostos orgânicos, só que em menor número – por exemplo, o enxofre (bivalente), o fósforo (trivalente) e os halogênios, como cloro, o bromo, o iodo e o iodo (monovalentes). Até metais como magnésio e sódio podem fazer parte da estrutura de compostos orgânicos específicos, denominados compostos organometálicos. Como representar uma estrutura orgânica Estrutura I: mostra todas as ligações, inclusive a geometria tetraédrica do carbono. Essa estrutura tenta passar uma idéia tridimensional da molécula. H H C H C H C C HH HH H H grupamentos a frente do plano grupamentos estão atrás do plano Estrutura II: É uma simplificação da primeira representação; mostra todas as ligações, mas omite o caráter tetraédrico do carbono dando a impressão de que a cadeia é plana. H H H H H C C C C H H H H H formula estrutural de traços Estrutura III: Informa a sequência da cadeia, porém deve-se estar familiarizado com o número máximo de ligações que cada elemento pode fazer. CH3 CH3 CH2 CH2 (CH2)2 CH3 CH3 formula estrutural condensada Estrutura IV: É a forma mais simplificada, mas nos permite obter todas as informações a respeito da cadeia, desde que saibamos de antemão, as regras. Estrutura V: É a fórmula molecular. Mostra somente a quantidade de cada elemento na formação da molécula. fórmula em linhas, bastão (bond line) C4H10 fórmula molecular Observações Todas as representações dizem respeito ao mesmo composto, o butano, porém, o nível de informação é diferente em cada caso. A escolha da foram como será feita a representação dependerá muito do interesse envolvido. É comum misturarem-se diferentes representação de uma estrutura orgânica. formas de Classificação dos átomos de carbono Primário Ligado diretamente a, no máximo, um átomo de carbono. Secundário Ligado diretamente carbono. a dois átomos de Terciário Ligado diretamente carbono. a três átomos de Quaternário Ligado diretamente a quatro átomos de carbono. Exemplos p CH3 p CH3 O CH2 p s CH3 q p CH CH2 C CH3 t CH3 p p s s H2C CH CH2 p s H3C CH2 s t p CH CH3 CH3 p p C C OH p p H3C CH3 Ct Cl s CH2 p CH3 Classificação das cadeias carbônicas 1ª ) Quanto ao fechamento da cadeia Cadeia aberta, acíclica ou alifática: quando o encadeamento dos átomos não sofre nenhum fechamento. H 2C CH CH3 H3C CH CH3 CH2 CH3 Cadeia fechada ou cíclica: quando há fechamento na cadeia, formando-se um ciclo, núcleo ou anel. Mista: os átomos de carbono se ligam entre si de modo a terem extremos livres e também formarem ciclo. CH H2C CH H2C CH2 H2C CH2 H2C CH2 H 2C CH2 H 2C CH CH2 CH3 2ª) Quanto a disposição dos átomos Cadeia normal: apresenta uma cadeia com duas extremidades de carbono. HC CH H3C CH2 CH2 CH3 carbono terciário Cadeia ramificada: quando a sequência carbônica apresenta mais que duas extremidades. Em geral com carbonos terciários e/ou quaternários. H2C CH CH3 CH3 H3C C CH3 CH CH3 carbono quaternário CH3 3ª) Quanto aos tipos de ligação Cadeia saturada: quando só existem ligações simples entre os átomos de carbono. Cadeia insaturada: quando, além de ligações simples, aparecem ligações duplas ou triplas entre os átomos de carbono. O H3C CH2 HC C CH3 CH3 CH H 2C H 2C CH CH2 4ª) Quanto à natureza dos átomos Cadeia homogênea: não H3C possui heteroátomo (átomo diferente de carbonos entre dois carbonos). Cadeia heterogênea: possuem heteroátomo. CH2 CH3 CH2 H 2C H 2C H3C O OH CH CH2 H 2C CH2 H 2C NH CH3 heteroátomos cadeia heterogêneas Observações 1ª) É importante entender que as quatro classificações anteriores são independentes, isto é, uma não exclui a outra. CH3 H 2C CH O CH CH2 H3C C CH3 éter divinílico cadeia aberta, normal, insaturada e heterogênea CH3 dimetilpropano cadeia aberta, ramificada, saturada e homogênea Exemplos CH H 2C H 2C CH CH2 cadeia cíclica, normal, insaturada, homocíclica H3C H 2C CH2 H 2C NH cadeia cíclica, normal saturada, heterocíclica O cadeia cíclica, ramificada, saturada e homocíclica 2ª) Compostos Aromáticos Dentre as numerosas cadeias cíclicas na Química Orgânica, uma das mais importantes é a que se denomina núcleo (ou anel) benzênico, nome proveniente do composto mais simples que apresenta esse anel – o benzeno (C6H6). H H C H C C C H C H C H representado por ou O anel benzênico forma os denominados compostos aromáticos, que se subdividem em: a) compostos aromáticos mononucleares ou mononucleados, quando contém um único anel benzênico. H3C CH2CH3 b) compostos aromáticos polinucleares ou polinucleados, quando contém vários anéis benzênicos. Se subdividem em: polinucleares isolados anéis não possuem átomos carbono em comum. de polinucleares condensados quando os anéis possuem átomos de carbono em comum. CH2 CH2 O número de compostos aromáticos conhecido é tão grande que praticamente determinou, dentro da Química Orgânica, uma nova divisão, denominada Química dos Aromáticos. Disso resulta outra classificação muito comum, que divide os compostos orgânicos em: Compostos alifáticos (os que têm cadeia aberta) Compostos alicíclicos (os que têm cadeias cíclicas que não sejam anéis benzênicos) Compostos aromáticos (os que têm anéis benzênicos) Evidentemente, são ainda muito comuns os compostos mistos, como, por exemplo: H CH2 CH2 CH3 C CH2 CH2 CH2 Esta cadeia corresponde a um composto aromático com ramificação alifática. Esta cadeia representa um composto em parte aromático em parte alicíclico. Resumo ABERTAS, ALIFÁTICAS ACÍCLICAS CADEIAS CARBÔNICAS NORMAIS ou RAMIFICADAS HOMOGÊNEAS ou HETEROGÊNEAS SATURADAS ou INSATURADAS ALICÍCLICAS FECHADAS CÍCLICAS NORMAIS ou RAMIFICADAS HOMOCÍCLICAS ou HETEROCÍCLICAS SATURADAS ou INSATURADAS MONONUCLEARES AROMÁTICAS POLINUCLEARES ISOLADA CONDENSADA Benzeno e compostos aromáticos Quando vestimos jeans ou uma roupa de poliéster, quando nos sentamos em um estofado de espuma ou se ingerimos certos alimentos industrializados, estamos tomando contato com corantes, fibras têxteis, materiais sintéticos, conservantes de alimentos e outras substâncias que podem ter vindo indiretamente do benzeno. H H C H C C C H C H C H ou Ressonância no benzeno Vamos colocar em cada carbono do benzeno um número, de 1 a 6. Mudando apenas a posição das ligações duplas, sem alterar a posição dos carbonos e hidrogênios, podemos escrever outra fórmula estrutural para o benzeno. Essa situação é denominada de ressonância. H H 6 H C H C 5 C 1 2 C H 3 C4 C H 6 H C H C 5 C 1 2 C H 3 C4 C H H H Estrutura A Estrutura B Ressonância é o termo usado para descrever uma situação na qual, sem mudar a posição dos átomos, podemos escrever mais de uma fórmula estrutural diferente, mudando apenas a posição de alguns elétrons. As estruturas A e B são chamadas de estruturas de ressonância. Nenhuma delas isoladamente representa bem o benzeno. Os elétrons das ligações duplas não se localizam nem como está mostrado em A nem como em B. Dizemos que os elétrons das ligações duplas estão delocalizados (ou deslocalizados) e que o benzeno é um híbrido de ressonância. ESTRUTURAS DE RESSONÂNCIA Por causa da ressonância, a maneira mais usada para representar o benzeno é: Benzeno Em que o círculo central indica a ressonância.