Por que eles não queriam
onstjtuinte. congressuai
fão logo o Congresso Nacional rejeitou a tese da
Constituinte "autónoma", diferentes secções regionais
da Ordem dos Advogados do Brasil reagiram indignadas. A secção paulista da OAB garantiu que "resistirá à
tentativa de burla". Assegurou também que os advogados rejeitam "uma Constituinte viciada na origem e que
acabará por constituir verdadeira farsa". Naturalmente
— e ninguém perde por esperar —, manifestações semelhantes virão da ABI, da CNBB, da COT.^a Conclat as
mesmas "panelinhas" de sempre.
3 vMJ WB5
Todas essas entidades arvoram-se em representantes e porta-vozes da sociedade civil, um conceito incorporado como moda ao vocabulário político brasileiro a
partir dos anos 70. Grosso modo, as OABs, ABIs e
CNBBs da vida pretendem representar a parcela da
população brasileira que não pertença ao estamento
militar nem à burocracia estatal. Ora, numa sociedade
democrática, os canais normais de participação política
e representação popular são os partidos políticos.
Em épocas de anormalidade institucional é compreensível e até necessário que essas entidades civis
ocupem espaços políticos. Quando os partidos políticos,
como aconteceu no Brasil nos últimos 20 anos, estiveram com suas atividades amplamente cerceadas, era
realmente necessária a ação de entidades civis, que
normalmente não devem ter nenhum papel no jogo
político. Esse é o caso dos sindicatos, da Igreja, da OAB,
das universidades.
A situação do País hoje, porém, é outra. A liberdade
de associação e manifestação política não sofre nenhum
tipo de restrição; é ampla, total e irrestrita. Os partidos
políticos instalam-se normalmente — mais de 25 estão
registrados no Tribunal Superior Eleitoral e os há para
todos os gostos e tendências. Não existe mais nada que
justifique a insistência dessas entidades civis em continuar atuando como frentes políticas. Hoje, quem quiser
atuar politicamente que se inscreva num dos partidos
existentes.
Esses grupos corporativo-ideológicos, no entanto,
não só têm a pretensão de falar em nome do povo como
não sentem o menor pudor em pretender interpretar
exatamente o que o povo está pensando. Acreditam
esses senhores que o povo ficou profundamente decepcionado com a derrota da tese da Constituinte pura. O
que é uma deslavada inverdade. Como já demonstraram várias sondagens junto à população, das quais a
OAB tem pleno conhecimento, a imensa maioria do
povo brasileiro tem uma vaga, mas muito vaga mesmo,
noção do que seja uma Constituição e uma Constituinte. Se as pessoas não sabem nem o que representa uma
Constituinte, como irão distinguir uma Constituinte
congressuai de uma Constituinte autónoma?
Na verdade, queira ou não essa gente, preparar uma
nova Constituição será uma tarefa extremamente elitista, no bom sentido da palavra. Naturalmente, o tom
político-ideológico do texto constitucional será dado
pelo povo, ao escolher os constituintes de acordo com as
suas propostas e tendências. E quem tem um pouco de
informação neste país e procurar analisar com isenção
os resultados de todos os pleitos realizados no Brasil nos
últimos anos percebe, sem muita dificuldade, quais os
balizamentos políticos e ideológicos que a população
brasileira imporá à nova Carta Magna. Ó futuro Congresso Constituinte, todos sabem disso, em sua composição ideológica, não será muito diferente do atual Legislativo.
E é exatamente por temerem a livre manifestação
dos eleitores que esses grupelhos corporativos, associados aos totalitários do PT e do PDT e a parcelas da
esquerda dò PMDB e da direita do PDS, tentam turvar
o debate e confundir os eleitores com a tese de que só
uma Constituinte pura é legítima. Em defesa de sua
proposição arrolam argumentos pueris e falaciosos,
cuja única real intenção é impedir que as verdadeiras
tendências ideológicas do eleitorado se reflitam fielmente na composição da Constituinte.
Começam por exibir um completo desconhecimento
da história do constitucionalismo no Brasil: nossas duas
Constituintes mais democráticas — a de 1891 e a de 1946
— foram congressuais. Entre outras objeções, alegam
que os parlamentares, com o trabalho de, ao mesmo
tempo, elaborar a nova Constituição e atuar como legislativo comum, ficarão muito assoberbados e acabarão
não fazendo nada com perfeição. Pura fantasia. O que
não falta aos congressistas é tempo ocioso, como bem o
comprovam as constantes ausências de deputados e
senadores de Brasília e os longos períodos de férias que
eles se reservam.
Além do mais, todo mundo sabe que os trabalhos de
preparação da Constituição não irão envolver o tempo
todo todos os constituintes. Inicialmente, será formada
uma comissão, de acordo com a proporcionalidade da
representação dos partidos, para preparar um anteprojeto de Constituição. Só aí todos os constituintes irão
apresentar suas propostas de modificação do texto original e os pontos polémicos serão discutidos e votados.
E esses pontos polémicos resumem-se, na realidade, a
10%, no máximo 20% do que a Constituição conterá.
Todas as Cartas Magnas do mundo, até a da União
Soviética — suprema ironia! —, falam em liberdade,
garantia dos direitos do cidadão, eleições, divisão dos
poderes etc. Quanto a isso, não há divergências profundas.
A única questão realmente controversa é o capítulo
da ordem económica e social, especialmente no item
que diz respeito ao direito da propriedade. Nossa atual
Constituição já deixa aberta uma brecha para discussão
caso por caso desse direito quando afirma que a propriedade deve ter função social. A não ser que se queira
fazer uma Constituição socialista — suprimindo a propriedade privada dos meios de produção —, o que contraria frontalmente as aspirações da sociedade brasileira, constantemente manifestadas nas urnas com a recusa do eleitorado em respaldar os grupos e os candidatos
radicais.
Os argumentos pretensamente técnicos e falsamente históricos dos defensores da Constituinte pura não
conseguem esconder suas verdadeiras intenções. O que
eles pretendem é radicalizar e confundir o debate em
torno da eleição dos constituintes para tentar eleger o
maior número possível de correligionários ideológicos.
Eles querem duas eleições — uma para o Congresso e
outra para a Constituinte — para tentar iludir o eleitorado. É a confusão de dois pleitos que os radicais pretendem usar para tentar conquistar espaços que normalmente não lhes cabem no espectro político nacional.
Depois, o funcionamento simultâneo de duas Câmaras
só iria favorecer a criação desse caos que os inimigos
da democracia aspiram para atingir seus propósitos
totalitários.
O resto é falsidade. A sociedade civil somos nós
todos, cidadãos, honestos pagadores de impostos, empresários e trabalhadores, professores e estudantes,
atletas e torcedores, artistas e espectadores. A ninguém
foi dado o monopólio de falar e decidir em nosso nome.
Muito menos quem nunca passou pelo teste da urna,
disputou o voto que consagra mas também cria a responsabilidade.
ANC88
Pasta 10/85-2
142/1985
Download

Por que eles não queriam onstjtuinte. congressuai