A investigação e a formação avançada em
Educação: perspectiva histórico-educacional
Justino Magalhães
fevereiro de 2012
e-working paper Nº. 1, 2012
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A investigação e a formação avançada em
Educação: perspectiva histórico-educacional
Justino Magalhães
fevereiro de 2012
resumo
As Ciências da Educação constituem uma constelação autónoma no quadro
das Ciências Sociais e Humanas, e aliam cientificidade, normatividade,
performatividade. O campo das Ciências da Educação congrega diferentes
cartografias: a teleológica, a escolar, a curricular, a orgânico-administrativa, a
normativa, a sociocomunitária, a tecnológica, a do sujeito. As Ciências da
Educação fizeram o seu caminho e desde as últimas décadas de Novecentos
que se observa uma convergência em torno das ideias de reforma;
transversalidade dos métodos, meios e instrumentos de ciência;
verificabilidade da acção (submetida a racionalidades de programa e de
projecto); flexibilidade do campo e do discurso científicos. A evolução das
Ciências da Educação tem permanecido intrinsecamente ligada à formação de
agentes educativos, particularmente à Formação de Professores. Todavia, a
cientificidade não serenou o mal-estar subjacente à realidade educativa e
escolar. Submetida à maior crise de sempre, a escola, desautorizada nas suas
práticas e formas de organização, desacreditada nos seus produtos e sujeita a
uma instabilidade discursiva, arrasta no seu inconformismo e no seu
descrédito as Ciências da Educação.
A formação em Ciências da Educação é hoje constituída por três ciclos, a que
acresce o pós-doutoramento. A licenciatura confere a (in)formação e a
habilitação de base. O mestrado profissionaliza, modela, especializa. O
doutoramento autonomiza, autoriza, transversaliza; é aqui que a ciência se
torna conhecimento e que o conhecimento educacional se torna director da
acção educativa. Revisitar este percurso e repensar a cientificidade, com suas
implicações performativas e estruturantes da realidade educativa, é o que me
proponho neste pequeno ensaio.
palavras- chave
Ciências da Educação; Programas Doutorais
i
sobre o autor
Justino Magalhães, Instituto de Educação da Universidade de Lisboa,
justinomagalhaes @ ie.ul.pt
como referenciar este e- working paper
MAGALHÃES, Justino (2012). A investigação e a formação avançada em
Educação: perspectiva histórico-educacional. e-working paper Nº. 1.
Consultado em [mês, ano] em http://www.ie.ul.pt
ii
Research and advanced training in education:
historico-educational perspective
Justino Magalhães
February, 2012
abstrat
The Educational Sciences represent an autonomous group within the Social
and Human Sciences and combine scientificity, normativity and
performativity. The field of Educational Sciences gathers together different
cartographies: teleological, scholastic, curricular, organic-administrative,
normative, socio-communitarian, technological, and the individual. The
Educational Sciences have paved their way and since the last decades of the
20th century there has been a convergence around the ideas of reform,
transversal scientific instruments, means and methods, verifiability of action
(submitted to programme and project rationale); flexibility of the scientific
field and discourse. The evolution of the Educational Sciences has remained
intrinsically linked to the training of education agents, especially to Teacher
Education. However, scientificity has not assuaged the malaise underlying the
educational and school reality. Submitted to the biggest crisis ever, the
school, whose practices and organization forms have been undermined, its
products discredited and subjected to a discursive instability, in its
nonconformity and discredit has brought Educational Sciences down with it.
Educational Sciences programmes are today made up of three cycles, besides
the post-doctorate. The ‘Licenciatura’ confers training and basic qualification.
The master’s professionalizes, models, specializes. The doctorate
autonomizes, authorises, mainstreams; this is when science becomes
knowledge and educational knowledge becomes director of educational
action. To revisit this route and rethink scientificity, with its performative
implications and structuring impact on the educational reality is what I
propose to do in this short essay.
key words
Educational Sciences; Doctorate Programmes
iii
About the author
Justino Magalhães, Instituto de Educação da Universidade de Lisboa,
justinomagalhaes @ ie.ul.pt
Reference
MAGALHÃES, Justino (2012). A investigação e a formação avançada em
Educação: perspectiva histórico-educacional. e-working paper Nº. 1. Retrieved
[month, year] em http://www.ie.ul.pt
iv
1. Da inclusão das ciências da
educação no ensino superior
1.1. Décadas de 60/ 70 do século XX: a
cientificidade aplicada à investigação e à
formação profissional
Foi aquém da década de 60 do século XX, com a inclusão no Ensino Superior,
que as Ciências da Educação, verdadeiramente, se constituíram. Tal processo
acompanhou um período crítico, assinalado por sintomas e transformações
de sinal contrário:
a) mal acabadas de obter a extensão e a universalização do modelo escolar,
logo rebentou a primeira crise da escola e da cultura escolar;
b) por contraste com a unidimensionalidade escolar, os movimentos críticos
não mais deixaram de acentuar a pluridimensionalidade do humano e a
multipolaridade do social;
c) desde então que o principal desafio colocado ao pedagógico-escolar foi o
de como massificar e universalizar um quadro cultural e um modelo
formativo em descrédito.
Esta conscientização crítica foi acompanhada de um alargamento das
cartografias do eu e do social, em boa parte resultante do reforço das
Ciências Humanas, e teve repercussões na (re)institucionalização da formação
e da mobilização educativas. A introdução das Ciências da Educação na esfera
universitária foi correlativa da transferência da Formação de Professores para
o Ensino Superior. O ensino manteve-se como principal foco de investigação,
em cuja abordagem o paradigma presságio-produto dava lugar ao paradigma
processo-produto. A formação de professores, como lembra Maria Teresa
Estrela, regia-se por programas caracterizados por Competency-Based
Teacher Education, que alicerçavam a formação na investigação quaseexperimental, com recurso a inquéritos, descritiva e explicativa (Estrela, 2007:
20). A massificação e a reprodução do modelo em breve geraram uma
estilização psico-socio-pedagógica. Este primeiro ciclo de integração das
Ciências da Educação no Ensino Superior em pouco contribuiu para dissipar a
constatação de que a verdadeira educação se centre ou se reduza à educação
formal/ escolar.
A avalização da cientificidade das Ciências da Educação, em sede de Ensino
Superior, nas décadas de 60 e 70 não contraditou a nuclearização psico-sociopedagógica e veio reforçar o paradigma positivista, designadamente através
da aplicação à educação dos quadros teórico-práticos e dos pressupostos
1
orgânico-pedagógicos das ciências humanas e sociais. Esta cientificação vinha
associada ao método experimental e com ele ao numérico e à quantificação.
A cientificidade da educação incorporou o mensurável, o quantificável, o
verificável e o transformativo como factores e indicadores de
representatividade, significado e prova de verdade. Os dados eram
convertidos em variáveis e estas deveriam permitir aplicações estatísticas e
modelações comprováveis através de cálculos matemáticos. A pedagogia por
objectivos, com todo o aparato de avaliação suportada na mensuração e na
inscrição estatística, foi a principal aplicação deste ciclo.
Ainda que com aplicação básica em quadros e contextos não escolares (mas
especificamente associados ao educacional, por contraponto ao paradigma
positivista que havia surgido como extensão-aplicação às Ciências Humanas e
Sociais dos pressupostos das Ciências Exactas), ganhavam consistência o
paradigma mediacional e o paradigma ecológico. O primeiro emergia
fortalecido pelo articulado psicopedagógico; o segundo dava curso à espiral
psico-social, centrada no local.
Particularmente fecundo nas ciências humanas, nas ciências sociais e nas
ciências organizacionais – posto que, para além de recuperar a perspectiva
holística dos fenómenos e dos factos humanos e sociais, permitia a
observação e a narratividade –, o paradigma sistémico foi um importante
meio de cognição e cientificidade, com aplicação transversal às diferentes
constelações científicas. De facto, um dos aspectos mais críticos do
positivismo e do experimentalismo era a impossibilidade de uso da narrativa
para representar a idiossincrasia entre ciência e realidade. Mesmo que
apresentado sob a forma de relato, o discurso científico que traduz o
experimental diz basicamente respeito ao experimento e não à genealogia, à
evolução e à comprovação do argumento central da tese. A expansão e o
aprofundamento do paradigma sistémico tornaram possível o regresso da
narrativa e a substituição do experimento pelo modelo.
1.2. Década de 80: sob o signo da
transversalidade e da especialização
A década de 80 iniciou sob o signo da transversalidade do sistémico, do
mensurável e do narrativo, cruzando as ciências exactas, as ciências humanas,
as ciências sociais. Desse cruzamento resultaram aplicações curriculares na
educação escolar e nas Ciências da Educação. Tais incursões ficaram a dever,
designadamente, à ousadia de cientistas como o físico Ilya Prigogine, que fez
aplicar à categoria tempo o genealógico e a narratividade do humano, e à
perspicácia de filósofos, como Edgar Morin, que tornou o radical «re» e a
complexidade como centros da cientificidade. Tais aplicações traziam no
horizonte um novo paradigma igualmente fértil para as Ciências Humanas e
Sociais e de que as Ciências da Educação vieram a beneficiar: o paradigma
auto-organizacional.
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O paradigma sistémico teve aplicação no quadro curricular e na orgânica das
Reformas Educativas. De idêntico modo, ao permitir a abordagem da
realidade educativa como uma totalidade multidimensional, inteligível,
racionalizável e orgânica, o paradigma sistémico trouxe uma revisão das
diferentes sistemáticas das Ciências Pedagógicas. De entre as sistemáticas
então revistas ressalta, por ter sido publicada através da UNESCO e por ter
tido efectiva aplicação na organização das Secções e das Faculdades de
Ciências da Educação, a proposta apresentada pela equipa de investigadores
coordenados por Gaston Mialaret no livro Introduction aux Sciences de
l’Education (1985). Trata-se de uma estrutura hierárquica orientada desde o
quadro macro, exterior à escola, ao micro, e interno à sala de aula, passando
pelo sócio-comunitário e pelo orgânico-escolar de natureza meso.
As pedagogias cognitivistas, conciliando informação, compreensão e
inventividade, e pondo em prática diversas formas de organização dos grupos
aprendentes, foram a principal inovação dos anos 80. Rapidamente, porém,
tais pedagogias foram denunciadas como onerosas, exigentes em termos de
acompanhamento progressivo dos alunos, ambiciosas em termos de
abrangência, difíceis de cumprir em termos de interdependência e de
coerência curriculares. Foram tomadas como perdulárias face ao dirigismo e
ao minimalismo escolares, herdados do objectivismo.
Ensaiado em contextos experimentais e alternativos, o paradigma autoorganizacional, explorando as analogias e as idiossincrasias entre o
empresarial e o antropológico, e com aplicação a várias outras constelações
científicas, teve uma primeira aplicação na (re)institucionalização e na
programática estratificada da cartografia do sujeito educativo. A
pluridimensionalidade analítica e configurativa evoluiu para dispositivos
estruturados sob a forma de currículos inter e transdisciplinares,
reconstitutivos da pessoa humana e articulando, sob uma lógica curricular,
diferentes domínios científicos. Abrindo para o criticismo e o revisionismo,
foram ganhando consistência os paradigmas racionalista, hermenêutico,
sócio-crítico. No entanto, a sua implementação ficou-se pelo carácter
ilustrativo e experiencial, ensaiado sobretudo em contextos investigativos. De
confluência interdisciplinar, tais paradigmas revelaram-se passíveis de
aplicação à educação, inclusive à realidade e à cultura escolar, permitindo
trabalhar objectos epistémicos de grandezas e naturezas variadas, com
abertura à comparação, à circulação de modelos, práticas e representações.
Foi num quadro duplo, constituído, a um lado, por políticas e directivas duras,
normalizadas e mensuradas, minimalistas, graduadas e orientadas pelo vector
aprendente, radicadas no objectivismo, e, a outro lado, pela inconsistência
dos modelos e pela efemeridade das pedagogias alternativas, que a formação
de Professores passou a incluir o grau de mestre. No contraponto deste
binómio, não deixaram de proliferar e ganhar ressonância acrescida vozes
críticas, oriundas de diversos quadrantes, inclusive no interior das Ciências da
Educação. Uma outra bipolaridade, sucessivamente retomada, foi a que
opunha Modernidade e Pós-Modernidade.
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1.3. Década de 90: constelações disciplinares
e Áreas de Mestrado
Com a década de 90 reacendeu uma polémica que teve reflexos nas Ciências
da Educação. Tratou-se do retorno da distinção entre os mundos humanista e
científico, tendo, em alguns momentos, cientistas e humanistas chegado a
caminhar em sentido contrário. Com efeito, reportando-se de actualidade e
de implicações transformativas, sob uma lógica de economicismo (nos meios
e nos recursos) e de eficácia (nos resultados), os cientistas chamaram a si a
primazia da programação e da acção. Este foi o contexto em que, ancoradas
no primado tecnocientífico, imbuídas de uma nova capacidade orgânica e
instituinte, e pondo em prática instrumentos e aparelhos processuais, as
Ciências da Educação tomaram como centro as Metodologias e assumiram
propriedade discursiva e especificidade científica nos domínios das
Didácticas, das Políticas Educativas, da Avaliação. Mas o diagnóstico, a
conceptualização e a meta-educação continuaram sediados nas Ciências
Humanas e nas Ciências Sociais.
No desdobramento programático e projectual, as Ciências da Educação
desenvolveram teorias assentes em discursos e formas de dizer confinadas à
realização e ao diálogo normativos, plasmados pela internalidade hierárquica
e burocrática, avalizadores da acção e dos seus resultados junto da tutela e
dos públicos utentes, mas aquém das grandes teorizações geradoras de
princípios fundantes. A multiplicidade dos dizeres e a transmissão dos
pressupostos e dos modelos organizadores, bem assim como a multiplicidade
de indicadores de planeamento, agenciamento e avaliação, designadamente
junto dos aspirantes à docência e dos gestores educativos, deram origem a
sub-constelações de natureza transdisciplinar e assentes em discursos metaorganizativos. Foi este o contexto em que disciplinas como a Teoria Curricular
ganharam densidade e hegemonia. Foram ciclos de duração efémera;
todavia, saldaram-se de forma quase definitiva na secundarização e no
esvaziamento de disciplinas como a Teleologia e a Filosofia da Educação.
No trânsito da década 80 e ao longo da década de 90, as diferentes
subconstelações que compunham a sistemática das Ciências da Educação
deram origem às Áreas de Especialização e estas a Mestrados. Esta foi a
segunda incursão das Ciências da Educação no Ensino Superior.
Reagindo, a perspectiva humanista deu lugar à procura de alternativas,
agudizando a visão decadentista em que mergulhavam a escola e a educação
formal. Mas o radicalismo da crítica gerou um radicalismo nas alternativas.
Ameaçada pelo interior, desacreditada na relação com a sociedade e instável
na cientificidade, a norma escolar entrou numa crise generalizada.
Desacreditada junto dos segmentos esclarecidos da sociedade, em colapso e
abandono junto dos segmentos mais debilitados, deixou de oferecer uma
garantia de correspondência entre habilitação/ creditação escolar, ascensão
social e melhoria económica. Nesta contingência, a formação escolar tinha
deixado de garantir acesso directo à profissão. O percurso nuclear humanista,
assegurado pelo tradicional trivium (que tomava a Língua Materna com
4
matriz do saber informar-se, saber pensar e saber comunicar com rigor)
deixou de ser a marca por excelência de todo o escolar e, como tal, deixou de
ser o eixo estruturante do percurso e da cultura escolar.
Correlativamente, à perda de relevância das Humanidades enquanto
habilitação qualificada no mercado de trabalho, a formação científica, obtida
com economia e actualidade, por meios, modelos e métodos que não
necessariamente o escolar, e prosseguindo lógicas cumulativas adequáveis
aos ciclos de renovação técnica e instrumental, revelou-se mais atractiva por
parte dos decisores políticos e dos gestores da formação. Com efeito, a
formação humanista é integrativa, sequenciada e progressiva nos planos
informativo e cognoscente, ou seja ela é sumativa, abstrata, generalizável por
convenção, transferência e deferimento. Diferentemente, a formação
científico-técnica é fragmentada, atomizada, conformativa, somativa,
aplicável por duplicação e mecanização. Na formação humanista, os suportes
de cálculo (mensuráveis, aritméticos, concretáveis) cedem lugar ao analógico,
à estimativa, ao geométrico, ao escalar, ao idiossincrático. Esta quaseoposição entre formação humanista e formação científica, que lançou a
polémica no interior das Ciências da Educação e pôs, uma vez mais, em
questão os currículos formais, vinha, no entanto, inserida num contexto mais
amplo: o regresso da bipolaridade científica.
1.4. Transição do milénio, sob o signo da
complexidade e do relativismo
A transição de milénio ficou assinalada, entre outros aspectos, pela oposição
e «guerra» da ciência. Esta oposição foi levada a tal extremo, que
sistemáticas generalizáveis (como a noção de paradigma, estruturada, entre
outros, por Thomas Kuhn) deram lugar a bipolaridades, como seja a de
Richard Lee – quando este pensador visualizava o que designou de «duas
culturas», uma em que o critério de verdade radica no objecto (objectivação),
na razão, na etnografia, normativa e cívica ocidental, e outra, em que o
critério radica na relevância dos valores, no relativismo e na
multiculturalidade (Lee, 2003).
O construtivismo e o relativismo do conhecimento científico foram
particularmente estimulados por abordagens como as da Sociologia do
Conhecimento Científico, que pretendeu reduzir a ciência a um minimum de
regras aceite e praticado pelos cientistas de uma determinada época e de
uma determinada formação sócio-política (Santos, 2003: 84). Às questões
estruturais da cientificidade vinham juntar-se as questões de identidade. No
debate, que ficou célebre em Portugal, entre António Manuel Baptista e
Boaventura Sousa Santos, ocorrido na viragem do milénio, aquele
sistematizou em determinada fase:
Nunca uma verdade sociológica pode ter (por definição) a robustez de uma
verdade científica. Nunca uma verdade científica pode afectar tanto os
valores e comportamento de indivíduos e de comunidades como uma verdade
5
sociológica, ainda que muito menos robusta, e ainda mais incompleta do que
a científica (apud Santos, 2003: 94).
Mais que uma oposição de culturas estava-se face a uma questão centrada no
estatuto epistemológico das ciências, sustentando Boaventura Sousa Santos a
legitimação de um conhecimento científico reflexivo das condições de
possibilidade. Não bastava a ultrapassagem dos dilemas tradicionais, como os
que opunham natureza e cultura; mente e matéria; observador e observado;
objectivo e subjectivo. Tratava-se, sim, de superar tais dualismos e introduzir
a complexidade e o relativismo na própria noção de ciência – «estudos da
complexidade». Em síntese, parafraseando Richard Lee, não se estava mais
perante uma guerra de culturas e da sua importação para o mundo científico;
tratava-se, antes, de encarar um futuro em aberto, reintegrando os factos e
os valores na construção do conhecimento autorizado. Uma consequência
decorrente dos «estudos da complexidade» é o «imperativo ético dos
humanistas em imaginar e trazer à existência, no quadro contingente das
condições de possibilidade (…), uma reorganização das estruturas do
conhecimento que conduza a um mundo substantivamente mais racional»
(Lee, 2003: 96).
1.5. Especifidade das Ciências da Educação e
formação doutoral (3ª inclusão das Ciências
da Educação no Ensino Superior)
Face à situação herdada da década de 90, e após três décadas em que haviam
procurado dirimir e comandar a crise, funcionando num plano remediativo e
abrindo em diferentes direcções, as Ciências da Educação tinham vindo a
fazer o seu caminho, ensaiando incursões programáticas que permitissem
caminhar do diagnóstico à solução (apresentando discurso, meios e soluções
próprias). A instabilidade tinha vindo a legitimar a busca de alternativas;
multiplicaram-se os expedientes assentes em pequenas racionalidades,
centradas na curricularização da cartografia do eu, na territorialização das
políticas e das concertações sócio-comunitárias, na recuperação escolar e
formal das concepções alternativas, na associação entre portfólio e afirmação
da identidade. Mas, reitere-se, era a racionalidade de projecto associada ao
paradigma de investigação-acção que vinha permitindo uma transversalidade
científica, constitutiva de um quadro de relevância, eficácia e sociabilidade
das Ciências da Educação.
A racionalidade de projecto, com as componentes de diagnóstico, protocolo/
negociação, implementação, avaliação, e a combinação criteriosa entre
observador, mediador e avaliador, conferiram, por um tempo, serenidade e
alguma novidade às Ciências da Educação. A implementação territorial (de
projectos e programas educativos) revitalizou o diálogo interno dentro das
instituições, imbuídas de um espírito instituinte, e conferiu uma
representação positiva à relação entre as instituições, o território e os
públicos de inserção, animados por uma estratégia construtivista. Conferiu
também autonomia e capacidade de projecção e decisão. As categorias
6
temporais, espaciais, organizacionais, bem assim como as de produto e de
decisão estratégica trouxeram um novo alento à enciclopédia, à
conceptualização e à discursividade educacional e formativa.
A viragem de milénio tinha no entanto no horizonte um desafio bem mais
radical e de consequências imprevisíveis. Por um lado, impunha-se a
inevitabilidade de reformulação do modelo escolar, dada a impossibilidade de
substituir o lugar, o estatuto e a função da cultura escolar. Da escola
continuava a depender a garantia do terceiro instruído – essa figura de
referência da democratização e do progresso humano na busca da sabedoria
(como sustentou, de forma ímpar, Michel Serres). A escola era,
complementarmente, o meio de inclusão, regulação e normalização, como
alertou, entre outros, para continuarmos com personalidades francófonas,
Philippe Meirieu, quando proclamou “a escola ou a guerra civil”. Mas já não
se tratava da mesma “escola”: associada às questões da desactualização
curricular, do multiculturalismo, da reprodução, que haviam continuado a
marcar a agenda crítica do período anterior, estava na linha do horizonte um
novo totalitarismo, o das novas Tecnologias da Informação e da
Comunicação, trazendo consigo, de forma irreversível, a destruição do ofício
de aluno.
Assim, enquanto, por um lado, a construção do progresso e da democracia,
num quadro de bem-estar e de justiça social, exigia uma conciliação entre a
subjectivação e a institucionalização (implicando disciplina e regras), por
outro lado, o império da Informação e a vulgarização cognoscente tornavam
mais crítica e vulnerável a instituição escolar. No entanto, nunca como no
passado recente o funcionamento da Sociedade, porque assente na
Informação, no Conhecimento e na Comunicação, se havia revelado
impensável fora do quadro curricular, metódico e regulador da escolarização.
Como se referiu, conciliando norma e circunstância, e operacionalizando um
saber contingental, a década de 90 terminou deixando em marcha uma das
soluções epistémicas mais fecundas da cientificidade educativa – a
investigação-acção. O paradigma da investigação-acção foi aplicado aos mais
diversos temas e objectos, desde a gestão curricular ao projecto individual de
formação, desde o pensamento do professor ao organizacional escolar. A
transição do milénio foi de procura de alternativas e de (re)construção, nos
planos metódico-epistémico e no plano de formação e de acção. Estavam
postas em questão as sistemáticas, as modalidades de associação e
mobilização, as áreas e os domínios científicos. Com três décadas de
experiência, as Faculdades de Ciências da Educação, que tinham vindo a
reorganizar, década a década, os seus departamentos, agrupamentos e
currículos, viram reduzido o espectro dos domínios científicos, em torno de
dois grandes campos: o da escola e formação de professores; a formação ao
longo da vida. Esta redução aconteceu em consentâneo com uma estilização,
sempre recorrente, da formação de professores, actualizada através de
acções de formação e com a aplicação massiva das Novas Tecnologias de
Informação e Comunicação na cultura e nas práticas escolares.
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Tal desafio acontecia quando, formalmente, estava em curso a terceira
inclusão das Ciências da Educação no Ensino Superior, estruturando e
oferecendo Formação ao nível de Doutoramento. Como referido, a formação
em Ciências da Educação, designadamente a Formação de Professores e de
Formadores, tinha já passado a incluir obrigatoriamente dois níveis de
Formação. À habilitação de base, sob um tirocínio de oficialato e de aplicação,
tinha passado a suceder um mestrado, científico ou profissional, com base na
mestria e na modelação. Portador de uma pesada carga simbólica, ainda que
tendo vindo a sofrer e a reflectir significativas mutações semânticas, o
conceito de mestre chegou às Ciências da Educação numa combinação entre
formador e tecnólogo, havendo perdido boa parte da criatividade e do poder
simbólico assente na sabedoria e no exemplo. Dando sequência ao primeiro
ciclo da formação e assumindo funções formativas, funções de governação
das instituições e da organização curricular, a mestria ganhou novos campos
de acção, mas despiu-se da singularidade e da soberania que a tinham
caracterizado e com que, de novo, poderia ter sido resgatada.
Pelas circunstâncias profissionais e políticas em que ocorreu, designadamente
num quadro de universalização escolar, correlativo da internacionalização e
da economia de recurso e de meios, da descrição dos produtos em termos de
metas, a vulgarização e a formalização da mestria trouxeram um regresso do
positivismo, a revitalização da dedução e a aplicação. Tal movimento de
cientificidade foi acompanhado da transversalização dos programas,
instrumentos e bases de dados da Estatística e da Informática, que vieram a
culminar em programas como o SPSS. A contra-marcha deste modelo
científico e a busca da especificidade e da interdisciplinaridade do
educacional e do formativo fizeram emergir uma cientificidade que combina a
investigação-acção com a racionalidade de projecto. Todavia, em regra, a
investigação-acção tem ficado fora da formulação escolar em sentido
estreito.
2. A performatividade das
Ciências da Educação
Informação, investigação, ciência, conhecimento são os conceitos que
alimentaram a constelação das Ciências da Educação. A História das Ciências
da Educação permanece difícil de pensar e expressar fora da
performatividade e da Formação de Professores.
Desde a década de 80 que se tinha vindo a tornar claro que a cientificidade
subjacente à noção de paradigma (em boa parte, associada à objectividade,
assente na diferenciação entre o sujeito do conhecimento e o objecto
construído/ investigado) não estava inteiramente adequada ao quadro das
Ciências da Educação e menos ainda à Formação do Profissional em
Educação, Professor ou Formador. A objectividade que serviu à formação de
algumas gerações de mestres saldou-se numa tecnologia e na habilitação de
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um profissional modelado e reprodutivo de políticas e de soluções didácticas,
parte das quais importadas e de difícil ajuste à complexidade e à diversidade
culturais e escolares. A implementação de estratégias de investigação-acção
revelou-se onerosa e em contra-marcha da universalização e da vulgarização
escolar. Ao cabo de duas gerações, os mestrados em educação converteramse em uma de duas modalidades: mestrados profissionais; mestrados de
especialização para assegurar a hierarquia e a complementaridade básicas ao
funcionamento do grosso sistémico. Certo que há um terceiro tipo de
mestrado, inserido na carreira científica, mas também ele se tem vindo a
subsumir como especialização da formação de base.
Caracterizando a evolução científica das últimas quatro décadas, Teresa
Estrela salienta a polissemia e o reflexo do exterior, sobretudo do que se
passou no mundo anglófono, e sintetiza que tal investigação
(…) comporta sentidos tão diferentes como os de investigação científica no
seu sentido canónico; estudos reflexivos apoiados em pressupostos
ideológicos, na autoridade de teorias científicas ou na de outros autores, mas
onde a reflexão filosófica se faz rara; investigação-acção que envolve
metodologias rigorosas de investigação; investigação-acção como descrição
e/ ou análise escrita ou oral de uma prática; reflexão espontânea ou
orientada sobre uma prática; investigação bibliográfica ou documental
orientada para a divulgação de correntes, de teorias, de autores (Estrela,
2007: 32)
A pós-graduação em Ciências da Educação teve, por consequência, desde a
origem, dificuldade em afirmar-se como autónoma e instituinte. A
combinação entre cientificidade, performatividade e transformação tem
reflexo na oscilação entre paradigma e programa, como modalidades
epistémicas privilegiadas no interior das Ciências da Educação. A
investigação-acção afigura-se como método que combina cientificidade e
transformação, e que envolvendo de forma directa o educador/ professor (no
duplo papel de investigador e agente) o converte em sujeito educacional,
beneficiário de mutações, como reflexo das próprias observações, acções,
atitudes críticas. Como se referiu, esta estratégia investigativa tem merecido
um acolhimento privilegiado e tem sido interpretada como adequada à
especificidade da Ciências da Educação. Está, todavia, inteiramente
desadaptada ao I Ciclo da Formação e dificilmente se ajusta a mestrados préformalizados como são os actuais mestrados em ensino. Para que a
investigação-acção seja consequente necessita de enquadramento mais
amplo, com implicações transformativas e significativas, não apenas nos
sujeitos envolvidos e na matéria-objecto, mas também na realidade- contexto
e no reconhecimento institucional. Ou seja, a investigação-acção para ser
consequente deve estar integrada num quadro programático.
A história das Ciências da Educação é impensável, reitero-o, na ausência de
performatividade e da Formação dos Professores. Esta combinatória,
assegurando uma formação crítica e com efeito transformativo, inovador,
que preserve e estimule a componentes autoral (nas dimensões de
9
autonomia, responsabilidade, reflectividade), podendo constituir um ou
diferentes quadros alternativos à realidade, é hoje um, senão mesmo o
principal desafio dos Doutoramentos em Educação.
As Universidades, designadamente as Universidades Norte-Americanas
ligadas à formação de professores e à inovação educativa, têm vindo a actuar
sob uma lógica de programa, particularmente quando passaram a equacionar
uma formação ao nível do Doutoramento. Observe-se, ainda que de forma
resumida e como ilustração deste processo, a implementação na
Universidade de Columbia do Programa patrocinado pela Carnegie
Foundation. Trata-se do programa CID, Carnegie Initiative on the Doctorate,
que, entre outras Áreas, integra a Formação de Professores. A educação
doutoral é ali assumida como um complexo processo de formação, que
reequaciona as aprendizagens da formação graduada e que incide não apenas
no desenvolvimento da competência intelectual, mas também no
crescimento da personalidade, do carácter, da consciencialização e da mente
(Walker, 2008: 8-9). O centro desta formação é o formando, e os corolários
básicos da formação residem nos seguintes temas:

a integração escolar, traduzido numa participação activa e consequente
de todos os formandos – esta componente tem merecido particular
atenção por parte da Carnegie Foundation;

a comunidade intelectual – a formação doutoral é, entre os diferentes
ciclos universitários, a que apresenta uma série de metas (milestones)
mais organizada (frequência do curso, exames, aprovação do projecto de
tese, investigação e escrita da tese, defesa oral da tese). Mas a cultura da
comunidade intelectual não se restringe à matéria, ela é uma boa parte o
currículo oculto, the hidden curriculum (o poder das mensagens, os
papéis, a criatividade, o risco intelectual, a maturação);

the stewardship – a pró-visão (administração) – preservar o melhor do
passado com visão de futuro, que possa ser seguido no futuro; prover o
encorajamento, a renovação e a criatividade. No contexto do programa
em análise, trata-se de conciliar os conceitos gerar (conhecimento
crítico); conservar o legado válido; entender como o conhecimento é
transformativo, na vida, na comunicação, na responsabilidade com os
outros. Neste plano, o impulso da carreira e da acção individual cruzam
em sentido mais amplo com a disciplina.
Nesta formação doutoral há, por consequência, uma componente intelectual,
uma componente técnica, uma componente moral, uma componente ética.
Há no Programa Doutoral do Instituto de Educação, particularmente através
de iniciativas como o Fórum de Jovens Investigadores e os Seminários
Transdisciplinares, que aliam mobilização, participação crítica, discussão do
quadro formativo e científico, incluindo os projectos, os produtos finais/ teses
e, em síntese o perfil doutoral. É esta uma séria réplica, ainda que ensaística,
ao desafio assumido pela Fundação Carnegie. É uma dinâmica que encontrei
bem enraizada em algumas Áreas da EHESS (École des Hauites Études en
Sciences Sociales) de Paris. Certo que em algum momento me interrogo se
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esta atmosfera outra (rica, fértil, recriativa) que é o Doutoramento será
suficientemente representativa para funcionar como locus alternativo à
realidade formal e profissional. Que pontes estabelece com a realidade, o que
comporta de realm?
3. Concluindo: I must; I can; I will,
formação em educação/ ciências
da educação
Desde Locke que a formação educativa integra de forma progressiva os
processos subjacentes às formulações verbais I must, I can, I will. Pela
prevalência informativa, provativa, capacitadora e de habilitação, a
Licenciatura, correspondendo hoje ao I Ciclo de Formação em Educação (tal
como sucede, de forma geral, nas Ciências e nas Humanidades), recai no
quadro da formulação I must.
O mestrado que, constituiu para gerações anteriores uma dupla orientação
científica e profissional, está hoje formalmente integrado na formação de
base a que acrescenta a componente profissionalizante e de especialização,
consignando as dimensões de competência (informativa e técnica),
experimentação, modelação, legitimação como agente – ou seja, o Mestrado
perfaz o essencial da formulação verbal I can. É um cenário que contém uma
identidade profissional de agenciamento, de forte interdependência e
articulação com a realidade, logo, teve de despir-se da inventividade e da
autonomia projectivas. Creio que um excelente exemplo do primado do to
can é a Declaração de Association of Teacher Education in Europe, emitida
em Dezembro de 2007, em resposta a Public Consultation on Schools for the
21st Century. Este Inquérito continha oito questões, sete das quais se
iniciavam da mesma forma: “How can school…?”. Nas respostas, a
Association of Teacher Education in Europe sustentou explicitamente o can,
mas fazendo depender o cumprimento de metas da supressão de carências e
da adequada satisfação de necessidades, sem o que as escolas serão
incapazes de satisfazer tais expectativas.
É efectivamente em sede doutoral que a subjectivação, a autonomia, a
responsabilidade, se convertem numa performatividade autoral:
cognoscente, científica, técnica. É em sede autoral que a sagesse decartiana e
o knowledge lockiano se convertem em sabedoria; que a ousadia científica e
técnica se temperam na prudência e na responsabilidade, iluminadas pelo
jogo avisado de probalidades transformativas, geradas num processo
investigativo autonómico. É em sede doutoral, em suma, que os hipotéticos
não ou sim dão sentido à expressão I will.
Há pontos críticos nos Programas doutorais, quer enquanto percurso
performativo, quer como projectos científicos, fundamentados, inovadores e
consolidadores de uma autoria. Eis alguns: discurso argumentativo (e não
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relato de experimento); revisão crítica da bibliografia e do estado da arte (e
não enunciado proclamador de dependências e de enfileiramento intelectual
ou científico); perfeita distinção entre os relatórios de processo e a tese final
cujo discurso deve constituir a informação crítica e demonstrada da
construção de um novo ponto de vista. Há diferentes peças que vão
constituindo o processo, mas a tese não deveria deixar de conter uma
integração per se. A estrutura discursiva que a suporta não pode ser um
relato processual. A “metodologia”, que eu gostaria de ver simplesmente
enunciada como método, deve respeitar à ideia no seu todo e não apenas ao
trabalho de campo. Esta última circunstância é hoje aplicável à estrutura do
relato de estágio, ou de experimentação oficinal, que é uma das
possibilidades em sede de Mestrado.
Em doutoramento, o método é o modo de pensar o todo, desde a concepção
da ideia à inventividade das estratégias investigativas, passando pela leitura
crítica da bibliografia em face dessa projectividade. Um conjunto de fichas de
leitura sobre uma mesma “tribo” de autores, que se repete, a propósito ou a
despropósito, em teses que se propunham diferentes, não assegura nem
comprova autoria. Por outro lado, as teses que são uma vida, ou uma vida
que se pretende tese, estão hoje em total desuso, seja pela mudança das
circunstâncias e dos requisitos científicos e académicos, seja, no segundo
caso, por razões geracionais.
Enfim, há pontos críticos que não se comprazem com: uma introdução
afectiva; um enunciado de objectivos aos quais não se regressa; uma
“metodologia” em que só haja referência ao trabalho de campo; um relato do
trabalho de campo ou do experimento, com todos os detalhes de amarguras
e desaires – como se tal conscientização não seja, em boa parte, mais fruto
da ingenuidade do investigador que sintomática de alguma contradição entre
o teórico e o prático; uma prova de verdade, que, afinal, reside na transcrição
directa dos testemunhos, orais ou trasladados de fonte escrita; uma
conclusão que não o é, ou um resumo que reduz cada uma das secções a um
parágrafo.
Pelo contrário, a tese, entre outros aspectos, deverá ser um discurso maior,
integrado, inventivo, responsável e com uma forte componente autoral.
Assente numa rigorosa e exaustiva crítica bibliográfica, iluminada por um
marco conceptual desafiante, deverá ter por base um arquivo específico,
definido, construído e criteriosamente interpretado. Espera-se que os
resultados sejam enunciados através de um discurso que ilustre e comprove a
tese e não se quede por um relato do processo investigativo ou uma
composição de capítulos desconexos e variáveis na tónica e na natureza.
Estes últimos aspectos permitem conciliar a lógica paradigmática, que
legitima olhares integrados numa escola ou numa corrente de pensamento,
com a lógica programática, na acepção de Lakatos, que, de si, legitima uma
verdade científica contingental e mesmo convencional. A rentabilização da
comunidade científica de doutoramento é uma prerrogativa para que aquelas
lógicas ganhem maior coesão e profundidade. É, igualmente, um contexto
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para a formalização, assegurando que a componente científica (investigativa
e representativa de uma especialidade), a componente performativa (gerada
no crescimento pessoal, comunitário e institucional) e, por fim, a
componente autoral (símbolo da responsabilidade e da propriedade
intelectual), se articulem constituindo teses inovadoras.
O aprovisionamento (ter boas bibliotecas, fazer uma boa revisão do
conhecimento produzido) e a actualidade das teses são condição para que o
conhecimento se torne verdadeiramente transformativo da realidade. Os
doutoramentos são hoje a oportunidade privilegiada para olhar a realidade
educativa, a partir de um lugar e com uma base metódica e conceptual
críticos e inovadores. Assim saibamos capitalizar esta oportunidade e assim a
sociedade continue a permiti-lo.
referências bibliográficas
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Association for Teacher Education in Europe (ATES) to the Public Consultation
on School for the 21
st
century. Retirado em junho, 18, 2011 de
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Estrela, Maria Teresa (2007). Um Olhar sobre a Investigação Educacional a
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Lee, Richard (2003). O Destino das ‘Duas Culturas’: Mais uma Salva de Tiros
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Santos, Boaventura Sousa (2003). Conhecimento Prudente para uma Vida
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Walker, George E. et al. (2008). The Formation of Scholars. Rethinking
Doctoral Education for the Twenty-First Century (pref. de Lee S. Shulman). San
Francisco: Jossey-Bass.
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A investigação e a formação avançada em Educação: perspectiva