Como faz falta lean em bancos Júlio César Paneguini Corrêa Diretor Grupo 2 Irmãos Entrei em uma agência de um banco estatal as 10h20, ou seja, 20 minutos após aberta. Fazia alguns anos que eu não entrava em uma agência bancária. Com a evolução tecnológica das agências, ficou tudo mais fácil, e praticamente não há a necessidade de se deslocar até lá para boa parte das operações, como, depósitos, saques e pagamentos. Até o relacionamento com o gerente hoje é por e-mail. Mas como meu caso era um tanto “complicado”, pois eu precisava fazer uma operação com base em minha aposentadoria, documentos, declarações, assinaturas, etc., tive que ir pessoalmente. Fui, então, encarar e relembrar um pouco meus tempos de office-boy. Comecei a trabalhar muito cedo, com 12 anos, por uma necessidade imposta por uma dessas tragédias do destino, pois perdera meu pai muito jovem e “fui à luta” para ajudar minha mãe a cuidar de meus outros quatro irmãos. Eu conhecia cada canto de cada agência bancária da cidade onde morava. Tinha amizades com os guardas, que me deixavam entrar às vezes depois do horário e “me quebravam um galhão”. Eu me lembro de sair da empresa em torno das 10h e voltar só às 14h ou 15h, dependendo do dia do mês. O final do mês era terrível, com filas enormes, devido ao pagamento a aposentados e funcionalismo público. E ia se complicando quando o final do mês ia chegando. Mas eu não me importava, pois só fazia isso. Era a minha praia. A evolução tecnológica trouxe muitas mudanças visíveis para nós. Agora há senhas para tudo: para o caixa, para o caixa expresso, para o pagamento de tributos, para o FGTS, para os financiamentos e até para falar com o gerente. Os serviços poderiam ser muito mais rápidos e a quantidade de erros menor. Voltando ao meu dia recente, cheguei as 10h20 (guardei este horário, pois constava do papelzinho amarelo que tinha em mãos, a senha). Meu número era o 914 e tinha umas letras antes, FCA acredito eu. Como eu tinha tempo, fiquei tentando decifrar o que significava. O “F” deveria ser de fundo, mas não consegui entender o restante. Deixa para lá, pois o assunto aqui é outro. Meu número foi chamado pelo monitor exatamente às 13h, ou seja, quase três horas de espera! O atendimento durou pouco mais de 10 minutos, talvez nem isso. Praticamente, lá se foi o meu dia. Além da chateação toda. Durante quase 3 horas, então, fiquei imaginando o que tinha mudado desde minha época de office-boy, desde 1978, mais precisamente. A começar da população do Brasil que quase dobrou, chegando a pouco mais de 200 milhões. E a melhoria tecnológica dos bancos aumentou exponencialmente com a profusão de sistemas de informática cada vez mais poderosos e caros. Nesse período, os bancos foram de longe a atividade econômica mais rentável do país, e, ano após ano, vêm lucrando milhões. Porém, creio que as melhorias nas operações tenham mais servido para simplesmente suprir esse crescimento do que para melhorar a qualidade dos serviços. As filas ainda existem e são muitas, acontece que a grande maioria da população que opina, escreve e “faz barulho” não está lá, operam quase tudo via internet pelo bankline. Além dessas constatações, pude perceber também o quanto seria interessante uma filosofia lean em instituições financeiras. E como a aplicação de técnicas lean muito simples poderia ser extremamente útil. As senhas são distribuídas na entrada da agência por assunto. Havia apenas um colaborador para atender aos clientes com o mesmo assunto que o meu. Mesmo com todas as dificuldades, ele conseguiu atender quinze pessoas em quase três horas. Uns atendimentos eram mais demorados que outros. Logo após a segunda hora que eu estava lá, percebi que vários outros guichês estavam tranquilos, sem filas e atendimentos. Então, existia um desbalanceamento e gargalo sério nessa área. Fiquei na dúvida: será que era só aquele colaborador que tinha o conhecimento para realizar aquela operação. Então pensei sobre o conceito de fluxo contínuo, nivelamento e multiqualificação. Ou seja, poderia haver uma senha definida apenas pela ordem de chegada, e todos os colaboradores aptos a atender todas as demandas. Tão simples. O atendimento seria muito mais rápido e os colaboradores mais motivados, pois teriam mais conhecimento, uma maior variedade de trabalho e teriam uma carga de trabalho mais equilibrada. Pensei comigo mesmo: nada mudou desde 1978. Até acredito, de forma um tanto exagerada de minha parte, que naquela época era melhor, pois eu conseguia fazer tudo com um só atendente. Até cafezinho eu tomava com o caixa. Os bancos ganham tanto dinheiro, estão sentados em bilhões, e somos nós, os clientes, que possibilitamos isso. Como não conseguem resolver problemas tão simples que nos incomodam tanto?