O que nos espera em 2014?
No ano que vem há uma combinação incomum de questões globais e do Brasil que
deve nos afetar. Quais são esses temas relevantes que merecem nossa atenção? Há
vários, todos interligados. Abaixo, listo oito desses temas:
1. Recuperação global ou estagnação secular? Há uma dúvida no ar. Imagina-se
que 2014 seja o ano da recuperação do crescimento no mundo. Se isso não ocorrer,
voltará à tona a ideia de que o mundo não consegue sair da estagnação. Os
economistas nos EUA voltarão com a tese de que estão diante da “japoneização” de
sua economia, num processo de estagnação secular. Prosperarão as teses de que o
crescimento anterior era fruto de bolhas e que atualmente a economia encontra
dificuldades estruturais para crescer, dentre elas o limite de zero para a queda de
juros. Acredito na recuperação da economia dos EUA (e global), o que dará a
tranquilidade para a volta do pleno emprego e crescimento maior (embora
provavelmente menor do que o período de boom excepcional dos anos 2000).
2. Ocorrerá o início da normalização da política monetária nos EUA? Em 2014, o
Fed (banco central norte-americano) provavelmente começará a remover os
estímulos excepcionais introduzidos para lidar com as consequências da crise
financeira de 2007/8. Hoje em dia o Fed injeta 85 bilhões de dólares mensalmente
na economia, através da compra de diferentes títulos no mercado, o que tende a
exercer pressão para manter baixas as taxas de juros mais longos. À medida que a
crise financeira fica distante, há a pressão para normalizar a política monetária,
injetar menos recursos na economia, evitar a formação de bolhas (subidas artificiais
de preços de ativos de risco). A ideia do Fed nos últimos tempos tem sido
comprometer-se a não subir os juros por um longo período de tempo, mesmo após a
retirada das injeções monetárias, para ancorar as taxas de juros longos e evitar
abortar a recuperação ainda frágil. Tarefa difícil de realizar caso a economia de fato
se recupere, o que naturalmente trará expectativas de continuidade da normalização
da política monetária nos EUA e a provável subida dos juros nos EUA e no mundo.
3. O dólar ganhará força? Haverá overshooting do real? A normalização da política
monetária nos EUA leva a um fortalecimento do dólar. A mesma pressão para
subida de juros provoca também a volta dos fluxos de capitais para lá e a compra de
dólar, o que eleva sua cotação. Foi o que observamos ao longo de 2013, só com a
expectativa da mudança na política monetária nos EUA. Podemos dizer que o dólar
já reagiu antecipadamente à normalização da política monetária norte-americana.
Mas ainda deve sofrer algum impacto adicional, quando (e se) ocorrer de fato a
redução dos estímulos no país. O real deve sofrer algum impacto adicional da
valorização do dólar, mas sua extensão vai ser determinada por fatores locais como
a situação fiscal e a possibilidade de downgrade.
4. Ano que vem será o ano do downgrade? A política fiscal reagirá? Há uma
ameaça de rebaixamento (downgrade) do grau de classificação das agências de
risco, em função da queda continuada do superávit primário, da expansão (para)
fiscal via capitalização dos bancos públicos e, de forma geral, de um crescimento
baixo. O superávit primário tem declinado gradativamente, atingindo um valor abaixo
de 2% em 2013 (estimamos 1,7%) e em direção para menos de 1,5% no ano que
vem. Por um lado, os Estados e municípios devem gastar as suas economias em
ano eleitoral; por outro, o governo federal tem que lidar com o impacto sobre a
receita das desonerações efetuadas nos últimos anos (para estimular a economia),
enquanto os gastos públicos continuam crescendo forte. Na ausência de uma
mudança de direção, o downgrade de uma agência pode ocorrer sem a perda do
grau de investimento, mas o suficiente para assustar antecipadamente aqueles
investidores que dependem do grau de investimento para aplicar no Brasil. A política
fiscal tem que reagir, os estímulos via bancos públicos já parecem caminhar nesta
direção. Mas um choque, como a aceitação das indenizações bilionárias dos planos
econômicos, pode levar a um ou mais downgrade.
5. A inflação no Brasil vai se estabilizar em torno de 6%? O objetivo do governo é
levar a inflação a um processo de (lento) declínio em direção à meta, evitando o
risco de um choque inflacionário desencadear uma espiral inflacionária para o outro
lado. Mas há o problema da necessidade de reajustar vários preços administrados
que estão defasados (como gasolina, diesel, energia elétrica) num ambiente em que
os preços livres ainda sofrem de uma inflação elevada. Em 2013 a inflação dos
preços livres ainda está em torno de 7-8%, enquanto a dos preços administrados
caiu para 1,5%, mas precisando de reajustes. Mais um ano de inflação elevada
pode cristalizar as expectativas e aumentar o peso da inércia na economia
brasileira.
6. As taxas de juros continuarão subindo? O Banco Central do Brasil sinalizou no
seu comunicado que o ciclo de alta da Selic não será muito mais prolongado. Mas a
normalização dos juros nos EUA e no mundo pode ainda exercer pressão altista
sobre as outras taxas de juros no Brasil, principalmente se as questões fiscal e
inflacionária não forem bem encaminhadas no ano que vem.
7. O programa de concessões de infraestrutura será bem-sucedido? O programa
de concessões é importante para aumentar os investimentos no Brasil. Como
acontece com a maioria dos programas, será menor que o planejado inicialmente,
mas importante para atacar um dos principais gargalos da economia brasileira. O
esforço em 2014 terá que ser seguido nos próximos anos.
8. Quais serão os resultados das eleições presidenciais e da Copa do Mundo no
Brasil? Difícil prever, mas são temas que estarão na cabeça de todos no ano que
vem. Mas, certamente, esperamos que o Brasil ganhe a Copa!
Ilan Goldfajn é economista-chefe e sócio do Itaú Unibanco.
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