Campo dos Sonhos (um desabafo partilhado) Lourenço Leite (Direitos Reservados, 2002) Nem sempre é possível recuperar o que se viveu com Alfredo. Depois que ele voltou para a cidade, tudo passou a ter uma fisionomia enfastiosa e indiferente. Era preciso voltar ao campo, andar nu na relva e fazer amor sem boné... Mas ele só queria pescar na areia... Mas sempre que se tentava voltar à relva, ele se vestia e olhava como se quisesse voltar a estar nu. Tudo se repetia... Yoda, ao contrário de Alfredo, nunca queria sair da água nem se importava ficar no pier como se fosse sua poltrona. Mas tudo era daquele momento... Kyle, no entanto, surfava todas as tardes, mas logo lembrava de sua terra insensata. E, de súbito, vinha a idéia de um hamburguer em plena tarde de acarajé... E tudo voltava a ser como antes. Victor, por sua vez, estava sempre à espera de voltar à cama. Todavia, sua estréia no anonimato da alcova só lhe deixava mais romântico. Era tudo passageiro. Já não se podia mais falar em caso a dois por um... André, contudo, estava sempre deitado no assoalho da casa de praia. Ele costumava ficar olhando para a janela depois do filme que vira na tv. Mas seu olhar só se tornava penetrante quando ele queria fazer amor. Nunca era como antes... A gente já tinha falado a respeito de todas as possibilidades de retorno. Mas ele não conseguia entender que era preciso recomeçar de maneira renovada. O fato de haver nos dado o perdão para tantas mágoas, não era suficiente. Ninguém pode ter tudo ao mesmo tempo. Era preciso que ele fizesse, ao menos, uma escolha. Tudo em volta de nós adquiria uma cumplicidade sem precedentes. Nenhum de nós sabia dizer a primeira e única palavra que libertasse a ambos dessa infindável insegurança... Confesso que vivi, mas não poderia me deixar re-seduzir pelas coisas que vivemos. Era preciso algo fora do tempo vivido que viesse tomar assento em nosso meio. Não era necessário dizer mais nada. Era simplesmente imperioso deixar, talvez, tudo como estava... ... Talvez, quem sabe, um de nós tivesse a verdadeira coragem dos amantes intrépidos. O tempo precisa, às vezes, discorrer... Não sabia exatamente se era preciso ressuscitar um amor perdido ou nos ressuscitar a ambos para uma vida diferente da que vivemos... Em resposta ao tempo, um de nós viveria um tempo glacial. Quisera que não fosse eu. Já havia atravessado o estreito de Béring. Um de nós ficaria para sempre sem o outro. Até aquele momento, ainda era precipitado definir a próxima dor e quem iria partir primeiro. Havia um pressentimento no ar. As insônias haviam se reinstalado em nossas noites. Mas o sol das praias tropicais resistia em não querer partir. O prazer do verão estava querendo se colocar no varal. Cada um de nós precisava re-olhar o mar da teia das ilusões. Numa dessas brumas, quem sabe, um de nós sairia vitorioso. Mas, qual seria a vantagem disso? Restava-nos remergulhar no mar das desilusões e ser rebatizado pela força da renovação. O sal, oriundo do mar, certamente ficaria preso à nossa pele dando a impressão que o orgulho seria para sempre. Mas, no próximo instante, o banho doce retiraria tudo... Receio que apenas meu futuro companheiro seja minha solidão da espera. Numa dessas saídas, com certeza, alguém estará ao meu lado olhando o mesmo desejo. E, com isso, seremos invertidos de olhar. Mesmo à uma família causará admiração.