CONCURSO DE PROVAS PÚBLICAS PARA ATRIBUIÇÃO DO TÍTULO DE NOTÁRIO (aviso n.º 1582-A/2006, publicado no Diário da República, n.º 29, II série, 1.º suplemento, de 9 de Fevereiro) I – Enunciados e grelhas de correcção das provas escritas realizadas em Coimbra, nos dias 15 e 16 de Julho de 2006: 1. Enunciado da prova de: Direito Privado “Concurso para Atribuição do Título de Notário Prova de Direito Privado (15-07-06) Duração da prova: 2 horas. I Através de contrato escrito, António, casado em regime de comunhão de adquiridos com Berta, prometeu vender a Carlos determinado prédio rústico pertencente aos seus bens próprios. António, porém, recusou-se a outorgar na escritura de compra e venda e Carlos demandou-o judicialmente, pedindo que seja decretada a execução específica do contrato-promessa. a) Se tivesse de julgar a acção, que sentença proferia? 1 b) E como decidiria o pleito se a acção de execução específica, tendo falecido o promitente-vendedor, fosse intentada contra os seus herdeiros (a viúva e os filhos do casal)? [Cotação: 6,5 valores] II Manuel, casado com Carla, desde Janeiro 1978, no regime de bens supletivo, pretende contrair um empréstimo junto de um Banco, oferecendo, como garantia, os seguintes direitos: ─ um direito de arrendamento de que é titular, na qualidade de arrendatário, desde 1992; ─ um direito de usufruto sobre um prédio rústico e um direito de usufruto sobre um quadro, ambos adquiridos por doação; ─ um direito real de habitação, adquirido por testamento. Diga se estes direitos podem ser dados em garantia por Manuel e, na hipótese afirmativa, de que garantia se trata e por que forma pode ser constituída. [Cotação: 7 valores] III João faleceu, em 12 de Dezembro de 2005, no estado de solteiro. Sobreviveram-lhe as irmãs Ana e Beatriz, a avó Catarina e o primo Daniel. O de cuius fez, em 2000, um testamento, segundo o qual deixou: ─ metade da quota disponível à irmã Ana; ─ a sua biblioteca, no valor de 20.000 Euros, à irmã Beatriz, com excepção de uma colecção de livros de determinado autor, que deveria ser entregue a Daniel. Sabendo que o valor total da massa da herança de João ascende a 90.000 Euros e que Daniel repudiou a deixa testamentária, faça a partilha da herança, referindo-se aos sucessíveis chamados, às figuras, institutos e princípios pertinentes, justificando sempre a resposta. [Cotação: 6,5 valores] 2 Direito Público “CONCURSO DE PROVAS PÚBLICAS PARA ATRIBUIÇÃO DO TÍTULO DE NOTÁRIO PROVA DE DIREITO PÚBLICO 15 de Julho de 2006 Duração da prova: 1 hora I Imagine que o Senhor António pretende doar, em partes iguais, aos seus dois filhos, um terreno de que é proprietário, inserido em perímetro urbano, como tal delimitado no PDM em vigor, que classifica aquela área como destinada a habitação unifamiliar. a) Na escritura pública de doação não foi mencionada a existência de prévio alvará de loteamento. Padecerá este acto de qualquer vício? b) Supondo que, na escritura pública, as partes afirmaram não pretender utilizar as parcelas resultantes da doação para edificação, poderia o notário dispensar a apresentação de alvará de loteamento? Cotação das questões: a) – 5 valores; b) – 5 valores II 1. À luz do disposto no Código do Imposto de Selo e respectiva Tabela Geral, proceda ao enquadramento tributário das seguintes situações: a) Doação, por escritura pública, por um avô a um neto órfão e filho único, de um prédio urbano situado em Olivença. 3 b) Trespasse de um estabelecimento comercial situado na Baixa Pombalina, pelo valor de 25.000 euros. c) Realização de um testamento público. 2. Suponha agora que, em 30 de Junho de 2006, o Governo, por Decreto-Lei, criou um adicional de 0,1 à colecta do Imposto do Selo incidente sobre as entradas de capital (verba 26 da Tabela Geral do Imposto do Selo), aplicável a todas as operações realizadas desde 1 de Janeiro de 2006. Quid iuris? Cotação das questões: 1,a) – 3 valores; 1,b) – 1,5 valores; 1,c) – 1,5 valores 2 - 4 valores” Direito Notarial “CONCURSO DE PROVAS PÚBLICAS PARA ATRIBUIÇÃO DO TÍTULO DE NOTÁRIO DIREITO NOTARIAL – 16 DE JULHO DE 2006 Duração: 3 horas I a) Como se deverão entender os deveres de imparcialidade e independência do notário? Valorização: 1 valor b) Que posição deverá o notário tomar relativamente aos outorgantes de um determinado contrato em que se deduz, claramente, que uma das partes é entidade dotada de elevado poder económico que lhe permite fazer – se acompanhar de dois advogados e a outra é uma pessoa economicamente muito desfavorecida e sem meios para obter o mesmo tipo de apoio jurídico? 4 Justifique, sucintamente, à luz do disposto no Decreto – lei 26/2004, de 4 de Fevereiro, que aprovou o Estatuto do Notariado, mas também à luz dos princípios do notariado dos países com sistemas jurídicos oriundos da família romano – germânica, ditos de notariado latino. Valorização: 1 valor II Suponha que o testador A, viúvo, com dois filhos, outorgou testamento público no qual legou ao seu sobrinho B o usufruto de uma de três fracções autónomas, aí identificadas, à escolha deste, mas estipulando a incomunicabilidade do legado relativamente à mulher deste, C, com quem o legatário é casado no regime da comunhão geral. Instituiu, ainda, o filho D como seu único herdeiro, deserdando o restante filho E, com a justificação de que este, há mais de meio ano, sem qualquer causa que o legitimasse, havia deixado de lhe pagar a quantia que o testador, por considerar não dispor de rendimentos suficientes à sua subsistência condigna, unilateralmente havia estipulado aos dois filhos. Estabeleceu, também, que D conservasse os bens que dele herdasse para, por sua morte, reverterem para os seus netos F (filho de D) e G (filho de E) e, por morte destes, para os respectivos filhos, seus bisnetos, H e I. Tendo falecido A e não tendo E efectuado o pagamento de qualquer outra quantia a A, dirigiu – se D a um notário solicitando – lhe a celebração de uma escritura de habilitação de herdeiros, a fim de ser declarado como herdeiro do autor da sucessão, poder transferir para seu nome todos os depósitos bancários existentes em nome deste e requisitar, a seu favor, o registo predial de dois edifícios sitos na freguesia de Cedofeita, concelho do Porto. Foi celebrada a seguinte escritura de habilitação de herdeiros: No dia cinco de Maio de dois mil e seis, no Cartório Notarial sito à Rua dezassete, nº 25, na cidade e concelho do Porto, perante o respectivo notário José da Silva, compareceram os declarantes João, seu filho Maurício e a mulher deste Antónia, residentes na Rua das Amoras, 12 e 15, respectivamente, na mesma cidade, naturais da freguesia de Massarelos, concelho do Porto, cuja identidade foi verificada pela exibição dos seus bilhetes de identidade números 0000001 de 15.01.05, 000002 e 000010, estes de 05.01.2003, todos dos Serviços de Identificação Civil de Lisboa. Por eles foi declarado: 5 Que no dia dez de Março do ano corrente faleceu A, viúvo, nascido na freguesia de Cedofeita, concelho do Porto, com última residência habitual na Rua de Portugal, 22, na cidade do Porto. Que o falecido deixou um testamento público celebrado em doze de Fevereiro de dois mil e dois, a folhas 17 do livro de notas para testamentos públicos 3 – A, deste cartório, no qual instituiu um legado, designou como seu único herdeiro o filho D, deserdando o seu filho E, já que este, à data do testamento, não lhe pagava há mais de meio ano a quantia que o falecido havia estipulado e era, por isso, devida a título de alimentos. Que, contudo, o autor da sucessão estabeleceu que D conservasse os bens que dele herdasse para que, por sua morte, revertessem para os seus netos F (filho de D) e G (filho de E)e, por morte destes para os respectivos filhos, H e I. Deste modo, são herdeiros do falecido o referido D, natural da freguesia de Campanhã, concelho do Porto, casado, residente no Bairro da Conceição, casa 23, no Porto e, ainda, os indicados F, G, H e I, todos naturais da freguesia de Massarelos, do mesmo concelho e residentes na Rua da Morgadinha, 35, no Porto, não havendo quem lhes prefira ou com eles possa concorrer na sucessão à respectiva herança. ARQUIVA – se uma certidão de óbito. A escritura foi lida e o seu conteúdo explicado aos declarantes. Seguem – se as assinaturas de dois dos declarantes, a do notário e, na margem interior, a impressão digital do dedo indicador direito do referido João já que este declarou não saber assinar. A) Aprecie a factualidade descrita no que respeita aos conteúdos do testamento e da habilitação de herdeiros, quer do ponto de vista do direito substantivo, quer dos pontos de vista do direito notarial e fiscal. Justifique sempre com a indicação das normas legais adequadas. Valorização: 7 valores III O senhor A, que é surdo – mudo, mas sabe ler e escrever, casado sob o regime da separação com a senhora B, interveio em escritura pública pela qual hipotecou a fracção autónoma correspondente ao primeiro andar de um prédio sito na Rua X, nº 27, no Porto, onde reside com sua mulher e de que é dono exclusivo, bem como o respectivo recheio, em garantia do pagamento da quantia de trinta mil euros, a pagar em seis anos, que lhe foi emprestada pelo seu amigo C, dos juros à taxa de 4,5 %, e demais acessórios. 6 Dessa escritura ficou a constar, para o hipotecante, a proibição de transmitir o bem hipotecado durante o prazo de 5 anos. O senhor A ainda não dispunha do registo de aquisição da casa a seu favor, mas o mesmo foi solicitado nesse mesmo dia na Conservatória competente, tendo sido apresentado ao notário o comprovativo da requisição desse mesmo registo. No final da escritura constam as assinaturas do outorgante e a do notário, únicos intervenientes na mesma. a) Aprecie a factualidade descrita dos pontos de vista notarial, registal e fiscal, sempre com indicação das normas legais necessárias. Valorização: 4 valores b) Suponha que para além da garantia hipotecária prestada, devedor e credor acordaram na necessidade de prestação de uma fiança por parte de D, casado sob o regime de comunhão geral com E, que se havia disponibilizado para o efeito. D apresentou – se para afiançar as obrigações do devedor, mas o notário recusou a celebração da fiança em consequência do regime de bens de D, caso a garantia não fosse prestada pelo casal. Será fundamentada esta recusa? Justifique com indicação das normas legais aplicáveis. Valorização: 2 valores IV Imagine que elaborou uma escritura de justificação notarial para primeira inscrição de prédio urbano, a qual foi assinada pelos interessados, pelas testemunhas e por si, notário. No dia seguinte reparou que não foi consignada na escritura a indicação de que o prédio dispunha de licença de utilização, em cumprimento do disposto no artigo 4º do Decreto – lei 281/99 de 26 de Julho, sendo certo que a licença lhe foi exibida e que ainda dispunha de uma cópia simples no cartório. a) O que deverá fazer numa situação destas? Justifique com a lei. Valorização: 2 valores b) Será admissível a justificação notarial de um imóvel baseada na usucapião por parte de quem adquiriu a posse do anterior possuidor, o qual consta, ainda, da inscrição matricial como titular do direito? Valorização: 3 valores” 7 2. Grelha de correcção da prova de: Direito Privado “Concurso para Atribuição do Título de Notário” «Grelha» de Correcção da Prova de Direito Privado I a) O contrato-promessa através do qual António prometeu vender a Carlos determinado prédio rústico é válido, porque qualquer dos cônjuges tem legitimidade para contrair obrigações sem o consentimento do outro (art. 1690.º, n.º 1, do Cód. Civil) e de um contrato-promessa resulta apenas, para os promitentes (ou para o promitente), a obrigação de realizar o contrato prometido. Apesar, porém, de o contrato ser válido, o tribunal não podia decretar a execução específica, porque Berta não prometeu vender e, no regime da comunhão de adquiridos, a venda de imóveis carece do consentimento de ambos os cônjuges (art. 1682.º-A, n.º 1, al. a)). O tribunal não podia decretar, em relação a Berta, o cumprimento coercivo, mediante execução específica, de uma obrigação que ela não assumiu. [Cotação: 4 valores] b) Mas o tribunal já poderia decretar a execução específica se, tendo falecido o promitente-vendedor, a acção fosse intentada contra os seus herdeiros. Razões: ― A morte de António fez cessar as relações pessoais e patrimoniais entre os cônjuges (art. 1688.º), recebendo os herdeiros daquele os bens próprios e a meação nos bens comuns do dissolvido casal (art. 1689.º, n.º 1); ― A obrigação de realizar o contrato prometido transmitiu-se também para os herdeiros do promitente-vendedor (art. 412.º, n.º 1); ― Se os herdeiros não se dispusessem a cumprir esta obrigação, o promissário poderia obter o cumprimento pela via da execução específica, nos termos do art. 830.º. [Cotação: 2,5 valores] 8 II Só podem ser dados em garantia bens ou direitos livremente transmissíveis (ver, por exemplo, quanto ao penhor, o art. 680.º), uma vez que o direito real de garantia pode envolver a penhora e futura venda judicial do respectivo objecto e só são penhoráveis os bens susceptíveis de alienação. a) O direito de arrendamento só pode ser transmitido com o consentimento do senhorio (arts. 1038.º, al. f), e 1059.º, n.º 2) e, portanto, não pode constituir objecto de uma garantia real. [Cotação: 1,75 valores] b) O direito de usufruto sobre um prédio rústico pode ser dado em garantia (art. 1444.º). Porque se trata de um direito inerente a um imóvel, está sujeito ao regime das coisas imóveis (art. 204.º, n.º 1, al. d)) e, por conseguinte, a sua oneração é admissível pela via da constituição de uma hipoteca, que tem de ser reduzida a escritura pública, para a qual se torna necessário o consentimento de Carla (art. 1682.º-A, n.º 1, al. a)). Caso Carla não preste o seu consentimento para a constituição da hipoteca, o negócio será anulável (cfr. art. 1687.º). [Cotação: 1,75 valores] Um direito de usufruto sobre um quadro integra-se na categoria das coisas móveis (art. 205.º, n.º 1). Porque foi adquirido através de uma liberalidade, pertence aos bens próprios de António (art. 1722.º, n.º 1, als. a) e b)), que tem a respectiva administração (art. 1678.º, n.º 1) e que o pode alienar ou onerar (mediante penhor — art. 680.º—, não sujeito a qualquer forma legal) sem necessidade do consentimento da mulher (art. 1682.º, n.º 2). [Cotação: 1,75 valores] c) Um direito real de habitação é intransmissível (art. 1488.º) e, por conseguinte, não pode constituir objecto de uma garantia. [Cotação: 1,75 valores] III Os sucessíveis de João são: - A avó Catarina, como herdeira legitimária (cfr. art. 2157.º do Código Civil) e como herdeira legítima da primeira classe (arts. 2131.º; 2133.º e 2134.º, todos do Código Civil); - A irmã Ana, como herdeira testamentária de 1/2 da quota disponível (cfr. art. 2179.º do Código Civil); 9 - A irmã Beatriz, como legatária testamentária da sua biblioteca, no valor de 20.000 Euros, incluindo a colecção de livros que deveriam ser entregues a Daniel, uma vez que este repudiou. (cfr. arts. 2249.º e ss. e 2303.º) Como existe uma herdeira legitimária, torna-se necessário calcular a massa da herança, a quota indisponível e a quota disponível. No caso concreto, o valor da massa da herança já se encontra determinado (90.000 Euros). Segundo o art. 2161.º, n.º 2, a quota indisponível é, neste caso, de 1/3 da massa da herança, o que corresponde a 30.000 €. A quota disponível corresponde à diferença entre a massa da herança e a quota indisponível. Assim, neste caso, a quota disponível é de 60.000 €. À custa dos bens deixados, 90.000 €, deve começar-se por entregar à avó, enquanto herdeira legitimária, a quantia de 30.000 €. Com os restantes 60.000 € cumprem-se os legados, no valor global de 20.000€. Como Daniel repudiou a deixa testamentária e o objecto do legado, que lhe deveria ser entregue, se encontra genericamente compreendido no legado deixado a Beatriz, deve entregar-se a esta a Biblioteca, na totalidade (cfr. art. 2303.º), com o valor de 20.000 €. De seguida, entregam-se 30.000 € à irmã Ana, como herdeira testamentária. Por fim, os 10.000 € restantes são entregues à avó enquanto herdeira legítima. [Cotação: 6,50 valores]” Direito Público “Concurso para Atribuição do Título de Notário” «Grelha» de Correcção da Prova de Direito Público I O Senhor António pretende doar, em partes iguais aos seus dois filhos um terreno de que é proprietário, inserido em perímetro urbano, como tal delimitado no PDM em vigor que classifica aquela área como destinada a habitação unifamiliar. 10 a) Na escritura pública de doação não foi mencionada a existência de prévio alvará de loteamento. Padecerá este acto de qualquer vício? A doação configura um negócio jurídico que terá, no caso em apreço, como efeito, a divisão do prédio do senhor António em duas unidades prediais distintas. Tratase, assim, de um acto voluntário (do senhor António) que terá como efeito a divisão do prédio em lotes que podem ser destinados para construção urbana, nos termos do PDM em vigor. A operação em causa integra, assim, a noção de operação de loteamento para efeito do Regime Jurídico de Urbanização e Edificação [alínea i) do artigo 2.º], encontrando-se, por isso, como condição prévia para a celebração da escritura, sujeita a um procedimento administrativo de controlo prévio, que no caso configura um procedimento de licenciamento, que será, in fine de ser titulado por alvará [cfr. artigos 4.º, n.º 2, alínea a), 18.º e ss. e 74.º do Regime Jurídico de Urbanização e Edificação]. Estando perante uma operação de loteamento, determina o n.º 1 do artigo 49.º que: “…nos instrumentos notariais relativos a actos ou negócios jurídicos de que resulte, directa ou indirectamente, a constituição de lotes nos termos da alínea i) do artigo 2.º, sem prejuízo do disposto nos artigos 6.º e 7.º, deve constar o número do alvará, a data da sua emissão pela câmara municipal e a certidão do registo predial”. No entendimento veiculado pela Direcção-Geral de Registos e Notariado, embora a actual lei não qualifique a consequência da omissão da referência ao alvará na escritura pública, tal não significa alteração do regime anteriormente vigente. Assim, caso a falta de referência ao alvará resulte do facto de este inexistir, há manifesto incumprimento de disposições legais de carácter imperativo, o que, nos termos do estatuído no artigo 294º do Código Civil, determinará a nulidade substantiva do negócio, que impede que o mesmo seja admitido a registo. Por seu lado, a simples ausência de identificação do alvará de loteamento, existindo este, contudo, dado a inexistência de uma disposição expressa indicativa da nulidade do negócio jurídico, não poderá ser geradora desta forma de invalidade, que apenas está reservada para a própria inexistência de alvará: o título (a escritura) permanece válido se efectivamente o alvará existir e apenas tiver acontecido que, por alguma circunstância ele não tenha sido mencionado. 11 Tal apenas assim não seria caso estivessem presentes os pressupostos constantes do n.º 4 do artigo 6.º do Regime Jurídico de Urbanização e Edificação, situação em que a mencionada divisão estaria isenta de um procedimento de licenciamento, bastando ao notário(a), para a celebração da escritura, a apresentação de uma certidão emitida pela câmara nos termos do n.º 9 daquele artigo. b) Supondo que na escritura pública as partes afirmaram não pretender utilizar as parcelas resultantes da doação para edificação, poderia o notário dispensar a apresentação do alvará de loteamento? Devendo pelo menos um dos lotes resultante do loteamento destinar-se, imediata ou sucessivamente, a edificação urbana, este elemento (o destino) deve ser aferido objectivamente (em face das circunstancias concretas existentes nesse momento) e não subjectivamente (em face de uma declarada intenção dos interessados). Assim, determinante é aferir se é possível, em face dos normativos em vigor, designadamente dos instrumentos de gestão territorial, utilizar a parcela assim criada para fins de edificação. No caso em apreço, não obstante o que alegam os interessados, os lotes constituídos podem ser utilizados, de acordo com as regras urbanísticas aplicáveis, para uma utilização urbanística, configurando, por isso, esta operação uma verdadeira operação de loteamento na medida em que se cumprem todos os elementos constitutivos desta figura, em especial a atinente ao destino. II – DIREITO FISCAL 1.a) - Incidência objectiva: art. 1, n.º 1, e n.º 3, al. a) e 22.º n.º 1 e 4 do CIS e verbas 15.1 (escritura) e 1.1 e 1.2 (doação) da TGIS – (0,5 v.) - Valor tributável e taxas: 9.º, n.º 1 CSI + 15.1 TGIS (escritura); art. 13.º do CIS + 1.1 e 1.2 da TGIS (imóvel doado) (0,5 v.) 12 - Incidência subjectiva: art.2.º, n.º 1, al. a) e art.º 3.º, n.ºs 1 e 3, al. s) do CIS (escritura – sujeito passivo: notário/encargo: requerente) e arts. 2.º, n.º 2, al. b) e 3.º, n.º 3, al. a) do CIS (doação – beneficiário) – 0,5 v) - Territorialidade: art.4.º, n.º 3 do CIS (0,5 v) - Isenção: art. 6.º alínea e) conjugado com o art. 3.º, n.º 3. alínea a) in fine do CIS (0,5 v) - Liquidação: 23.º, n.º 1 e 2.º, n.º 1, al. a) do CIS (escritura: notário); arts. 25.º ss do CIS (doação: DGCI) – (0,5 v) 1.b) - Incidência objectiva/valor tributável/taxa: art.1.º, n.º 1 e 16.º do CIS e verba 27.1 da TGIS (se por escritura: acresce o selo da escritura, em termos semelhantes aos da alínea anterior)–(0,75 v) - Incidência subjectiva: art. 2.º, n.º 1, al. a) e 3.º, n.º 3 al. a) in fine (sujeito passivo: notário (se por escritura) / encargo: adquirente) (0,5 v) - Territorialidade: art. 4.º, 1 (0,25 v) 1.c) - Incidência objectiva/taxa/facto gerador: art.º 1.º, n.º 1 de 9.º, n.º 1 o CIS; verba 15.1 da TGIS (verba 15.6 apenas quando tenha de produzir efeitos); art. 22.º e 5.º, alínea i) do CIS – (1 v.) - Incidência subjectiva: art. 2.º, n.º 1, al. a) e 3.º, n.º 3 al. s) (0,5 v) 2. - O adicional é um imposto. Como tal só pode ser criado pelo Governo precedendo autorização legislativa da Assembleia da República sob pena de inconstitucionalidade orgânica - art. 165.º, n.º 1, al. i) e 103.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa: (2 v) -Irretroactividade da lei fiscal – art. 103.º, n.º 3 da CRP; art. 12.º, n.º 1 e n.º 2 da Lei Geral Tributária: (2 v) 13 Direito Notarial “Concurso para Atribuição do Título de Notário” «Grelha» de Correcção da Prova de Direito Notarial I a) O artigo 13º do Estatuto do Notariado, sob a epígrafe Princípio da Imparcialidade, dispõe, de forma genérica, que o notário deve manter equidistância relativamente a interesses particulares susceptíveis de conflituar, abstendo-se, designadamente, de assessorar apenas um dos interessados num negócio (nº1) - 0,1 v Estabelece, depois, no nº2, algumas situações em que nenhum notário pode praticar actos notariais, situações estas baseadas no interesse pessoal do notário, na relação de parentesco e na união de facto - 0,1 v Estes princípios são extensivos aos seus trabalhadores por força do artigo 14º do Estatuto. - 0,1 v Por outro lado o artigo 11º do mesmo Estatuto estabelece que o notário deve apreciar a viabilidade de todos os actos cuja prática lhe é requerida, em face das disposições legais aplicáveis e dos documentos apresentados ou exibidos, verificando especialmente a legitimidade dos interessados, a regularidade formal e substancial dos documentos e a legalidade substancial do acto solicitado - 0,1 v Deve, por isso, recusar a prática de actos nulos, ou que não sejam da sua competência, ou, ainda, que esteja pessoalmente impedido de praticar, bem como aqueles em que tenha dúvidas acerca da integridade das faculdades mentais dos participantes - 0,1 v Estas imparcialidade e independência são pressuposto da função, já que ele não é o representante de uma das partes, antes o conselheiro imparcial e independente de todas (nº 2 do artigo 1º do Estatuto) - 0,1 v A sua independência resulta, também, do facto de exercer a função como um profissional liberal e de não ser um servidor da administração. Ninguém, a não ser em sede de recurso, lhe pode impor a prática de um acto (artigo 12º do Estatuto) 0,1 Não se pode esquecer que o notário é responsável civil e disciplinarmente pelos danos e prejuízos que causar no exercício da sua profissão. - 0,1 v 14 A consequência destas duas características é a de que o notário é um meio de garantir a segurança no tráfico jurídico não contencioso entre os particulares, por isso evitando ou diminuindo os litígios - 0,2 v b) A imparcialidade e a independência do notário são um pressuposto, uma exigência da própria função, da sua missão de evitar ou diminuir conflitos. O notário assessora as partes, explica-lhes a situação existente, adverte-as das consequências dos actos que pretendem praticar e aconselha-lhes o que achar mais justo e apropriado aos seus objectivos. Por isso, na situação em causa e já que a imparcialidade é jurídica deve o notário com a sua actuação tentar corrigir a actuação do contratante fraco, não para fazer vencer os seus interesses (aí já teríamos uma parcialidade), mas para o colocar em igual posição de os poder defender. Só assim se realiza o Direito, a Justiça e a Paz (nº 2 do artigo 1º, 10º, 11º, 12º, 13º, 15º, 23º,nº 1, alíneas a), b) e c) do Estatuto - 1 v II No que respeita ao TESTAMENTO: A alusão à incomunicabilidade do usufruto em que B foi instituído, relativamente à sua mulher C, não tem cabimento, já que sendo um direito pessoal não se comunica ao cônjuge (alínea c) do artigo 1733 do CC) - 0,5 v A instituição de D como herdeiro único e a deserdação do filho E pelos motivos adiantados no enunciado, tendo, especialmente atenção ao facto de os alimentos terem sido não só unilateralmente fixados pelo seu credor, quer quanto à necessidade como ao montante, colide frontalmente com o disposto nos artigos 2133, nº 1, alínea a), 2136, 2156, 2157, 2159, 2166, nº 1, alínea c) e 2003, 2004, 2006 e 2014 do CC, já que estes 15 deverão ser fixados judicialmente ou por acordo. Não estávamos, assim, perante uma situação em que os alimentos fossem, no dizer da lei, “devidos”, pelo que não seria possível a deserdação, atendendo, além do mais, ao património do testador - 0,5 v Foi imposto um fideicomisso de segundo grau, proibido pelo artigo 2288 do CC, sendo a respectiva disposição nula, tendo-se por não escrita – artigo 2289 CC -, mantendo-se o fideicomisso quanto aos netos F e G. - 0,5 v Por outro lado o fideicomisso no primeiro grau, em face do disposto no artigo 2163 do CC, não pode senão considerar-se restringido à quota disponível do testador A. - 0,5 v No que respeita à HABILITAÇÃO: Do ponto de vista substantivo Herdeiros do falecido são D e E e não apenas D, apesar do constante do testamento (alínea a) do nº 1 do artigo 2133 e 2157 do CC - 0,5 v A substituição fideicomissária em mais de um grau, contrariando o disposto no artigo 2288 do CC, impediria que os netos H e I pudessem ser beneficiários de qualquer disposição. - 0,5 v Por outro lado o fideicomisso no primeiro grau, em face do disposto no artigo 2163 do CC, não pode senão considerar-se restringido ao que restasse da quota disponível do testador A. - 0,5 v Assim da escritura deveria constar que herdeiros eram D e E, filhos do autor da herança, aludindo ao fideicomisso relativamente a D, em benefício de F e G, mas apenas relativamente ao que restasse da quota disponível - 0,5 v Não se deveria dizer que F e G eram herdeiros já que somente o serão com o falecimento de D (ou não podendo ou não querendo o fiduciário aceitar a 16 herança – artigo 2293 CC)), nessa altura devendo completar-se ou actualizar-se a habilitação de herdeiros - 0,5 v Do ponto de vista adjectivo A intervenção dos declarantes Maurício e mulher, Antónia, enquadra-se na previsão do artigo 84 e da alínea f) do nº 1 do artigo 68 do Código do Notariado, pelo que deveria ter sido recusada a sua intervenção, que é causa de nulidade (nº 2 do artigo 71 do CN) .- 0,5 v Não foram arquivadas as certidões de nascimento dos herdeiros (ao menos de D já que o E não foi considerado) – alínea b) do nº 1 do artigo 85 do CN, nem foi referido que o testamento se encontrava ou não selado (ver nº 4 do artigo 199 do CN – então ainda para o artigo 162 da antiga Tabela de Selo – actual artigo 15.6 TGIS e al. a) do nº 1 do artigo 2º do CISelo) - 0,5 v Um dos declarantes, João, não sabe assinar, pelo que não deveria ter sido aceite a sua intervenção, em face do que dispõe a alínea h) do nº 1 do artigo 68 do CN, determinando o nº 2 do artigo 71 do mesmo código a nulidade do acto - 0,5 v Após a assinatura do notário deveria constar o montante de imposto de selo liquidado por força das verbas 15.1 e 15.2 da TGIS (nº 4 do artigo 23 do CI Selo) . 0,5 v Valorização: A data da escritura não se encontra escrita por extenso (Artigo 40). Não se refere Falta o nome do cônjuge de D e seu regime de bens e, eventualmente, nomes de cônjuges e regimes de bens (nº 3 do artigo 83 e al. a) do nº 1 do artigo 47 do CN).- 0,5 v III a) O senhor A não poderia ter intervindo sozinho a hipotecar já que se tratava da casa de morada de família. Necessitava, por isso, do consentimento de sua mulher, 17 nos termos do nº 2 do artigo 1682-A do CC. Caso contrário, o acto seria anulável nos termos do nº 1 do artigo 1687 do CC - 0,5 v O recheio da casa não é hipotecável em face do que dispõe o artigo 688 do CC, dispondo a sua alínea f) que são hipotecáveis apenas as coisas móveis, que para esse efeito, sejam por lei equiparadas às imóveis - 0,5 v Excepção é a hipoteca de fábrica nos termos do nº 2 do artigo 691 do CC, em que a hipoteca abrange os maquinismos e demais móveis inventariados no título constitutivo. - 0,5 v A proibição da transmissão do bem hipotecado pelo prazo de 5 anos é nula, por violação do artigo 695 do CC. (não determinando, contudo, senão a nulidade da cláusula) -1 v O nº 2 do artigo 54 do CN impõe a inscrição prévia em nome de quem hipoteca, em consonância com o nº1 do artigo 9º do CRP. Aliás como a hipoteca, mesmo para produzir efeitos inter partes, necessita de estar registada (artigo 687 CC), teria o prédio de o estar também definitivamente a favor do hipotecante 1 Não foi feita qualquer referência à liquidação do imposto de selo correspondente (verbas 15.1 e 10 da Tabela Geral do Imposto de Selo e nº 4 do artigo 23 do CISelo) 0,5 v VALORIZAÇÃO: Sendo A surdo mudo e sabendo ler e escrever deveria ter constado do acto o cumprimento do disposto na 1ª parte do nº2 do artigo 66 do CN, sob pena de nulidade nos termos da alínea b) do nº 1 do artigo 70 do CN – 0,5 v b) Não é fundamentada a recusa do notário, que só o deve fazer nos casos previstos no nº 1 do artigo 173 do CN e nº 2 do artigo 11º do Estatuto do Notariado. A fiança é uma garantia pessoal (artº 627, nº 1 do CC), pelo que aceitando o credor a 18 garantia prestada apenas por D (artigo 633 CC), deveria o notário tê-la aceite (ver nº 1 do artigo 1690 do CC) .- 2 v IV a) Elaborar escritura de rectificação a fim de cumprir o preceituado no artigo 4º do decreto-lei 281/99 de 26 de Julho, já que tal rectificação não pode operar-se por averbamento – artigo 132 do CN. – 2 v b) É admissível já que o nº 2 do artigo 92 do CN dispõe que, para além do pretenso titular do direito, pode justificar quem demonstre ter legítimo interesse no registo do respectivo facto aquisitivo. Esta legitimidade pertence, seguramente, àquele que, cumprindo os requisitos de ordem substantiva, designadamente pelas características da sua posse, está em condições de invocar a aquisição do direito por usucapião, embora não seja o titular da inscrição matricial – 3 v 19