QUALIDADE DE VIDA NO TRABALHO COMO AGENTE DE MUDANÇA DENTRO
DE UMA ORGANIZAÇÃO PÚBLICA: o caso ITEP/RN
Luciano Galvão Freire Júnior
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Resumo: A complexidade da relação trabalho versus o homem é
evidente, pois ao mesmo tempo em que o trabalho é encarado como
uma tarefa penosa, se torna uma atividade vital para a sobrevivência
do ser humano. Entretanto, as conquistas sociais e políticas dos
trabalhadores têm levado os empresários a repensarem as relações
de trabalho. Nesse trabalho, procurou-se analisar a Qualidade de
Vida no Trabalho como agente sinérgico de mudança no mundo do
trabalho dentro de uma organização pública, o Instituto Técnico e
Científico de Polícia - ITEP/RN.
Palavras-chave: Motivação, qualidade de vida no trabalho, sinergia.
Absctract: The complexity of the relation work versus the man is
evident, therefore at the same time where the work is faced as a
penosa task, if becomes a vital activity for the survival of the human
being. However, the social conquests and politics of the workers have
taken the entrepreneurs to rethink the work relations. In this work, it
was looked to analyze the Quality of Life in the Work as synergic
agent of change in the world of the work inside of a public
organization, the Institute Scientific Technician and of Policy ITEP/RN.
Key words: Motivation, quality of Life in the work, sinergia.
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Docente. Universidade Federal Rural de Pernambuco - Unidade Acadêmica de Serra Talhada. Email: [email protected]
1. INTRODUÇÃO
As transformações no mundo do trabalho não estão limitadas somente ao ambiente
empresarial privado, estão, também, acontecendo no ambiente organizacional público. Gorz
(apud AGULLÓ-TOMÁZ 1997, p.106) enfatiza o surgimento de uma nova ideologia na qual o
trabalho é visto, numa organização, como atividade e como cooperação, tornando-se mais
satisfatório para o trabalhador, na medida em que se consiga reduzir o absenteísmo e
aumentar o rendimento individual. Essa ideologia ficou conhecida como Ideologia do
Recurso Humano. O trabalho, sob essa égide, deixa de ser mera força de trabalho ou
instrumento, passando a ser visto como o principal elemento, como recurso essencial que
visa o aparecimento de um novo trabalhador com uma ética profissional. Um trabalhador
cooperador e cooperativo, identificado com sua profissão, realizado e integrado em sua
empresa.
A melhoria da qualidade de vida no trabalho – QVT está inserida neste novo
enfoque, na busca de soluções conciliadoras que unam, ou pelo menos façam com que o
trabalhador e a direção da organização passem a desenvolver estratégias de ação que
possibilitem uma melhor interface e, conseqüentemente um melhor desempenho para a
empresa, levando em consideração as necessidades individuais.
Segundo Correa (1993), a melhoria da QVT reflete-se em fatores como higiene,
lazer, conforto, descanso, segurança, reconfiguração de cargos e estrutura organizacional,
melhor distribuição de trabalho, remuneração, garantia de desenvolvimento pessoal e
treinamento operacional.
Nesse trabalho, procurou-se analisar como o processo de melhoria da Qualidade de
Vida no Trabalho atua como um agente transformador do trabalho, dentro de uma empresa
pública que presta serviços especializados à sociedade, como análise de corpos, exames
corporais, entre outros, é constantemente utilizado por toda a sociedade, o Instituto Técnico
e Científico de Polícia – ITEP/RN.
2. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
2.1. O porquê do tema Qualidade de Vida no Trabalho - QVT
Cabe à Administração o papel de estabelecer condições que permitam a plena
realização do ser humano dentro da atividade que exerce. Dessa forma, busca-se
administrar de forma racional levando-se em consideração as necessidades e emoções dos
atores organizacionais: empregados, gerentes, clientes, proprietários, entre outros. Esse
papel se torna cada vez mais importante devido ao processo de globalização da economia
que se fortalece cada vez mais. A produtividade, juntamente com a melhoria nos serviços
prestados e na resolução das questões ou problemas que ocorrem diariamente em uma
organização se tornou uma questão crucial para a sobrevivência das empresas no mercado
onde atuam.
Essa
busca
pela
melhoria
dos
serviços
prestados
exige
mudanças
de
comportamento dos trabalhadores para se adequarem aos novos padrões de qualidade
exigidos pela sociedade. A questão, então, passa a ser: como estimular o trabalhador a
aumentar sua eficiência no desempenho de suas funções?
Segundo Pegado apud Alvarez (1995), as condições de trabalho incluem todos os
fatores que possam influenciar na performance e satisfação dos trabalhadores na
organização. Isso envolve o trabalho específico, o ambiente, a tarefa, a jornada de trabalho,
o horário de trabalho, salários, além de outros fatores cruciais relacionados com a qualidade
de vida no trabalho, tais como nutrição, nível de atividade física habitual e todas as
condições de saúde em geral.
Dejours (1996, p.160-61), salienta que o trabalho, apesar de propiciar sofrimento,
pode também se apresentar como fonte de prazer e saúde. O homem viveria assim, um
paradoxo no qual se beneficia da produção, mas ao mesmo tempo é vítima do trabalho.
Afirma, ainda, que divisão de tarefas impacta diretamente sobre o interesse e o tédio no
trabalho, a divisão dos homens passa a atingir as relações que eles constituem entre si no
ambiente de trabalho, pondo em risco o equilíbrio psíquico e a saúde mental dos
trabalhadores. Surgem, nesse contexto, as defesas estratégicas que seriam uma forma de
regulação elaborada pelos próprios seres humanos.
Para Lévy-Leboyer (1994, p.19),
“o trabalho está atualmente sendo rediscutido enquanto valor fundamental,
enquanto obrigação e enquanto fonte de satisfação pessoal. Ter uma atividade
remunerada, regular e definida não corresponde mais a um desejo unânime”.
Afirma, ainda, que está existindo uma crise de motivação, resultado do
enfraquecimento
do
valor
social
e
psicológico
da
atividade
profissional
desaparecimento progressivo da ética no trabalho e da consciência profissional.
e
do
Neste contexto, surgem as teorias motivacionais que servem de alicerce para a
busca de uma melhor qualidade de vida no trabalho.
Associada a essas teorias surge a tecnologia da qualidade de vida no trabalho que
envolve uma atitude pró-ativa das organizações frente à evolução social da classe
trabalhadora e constitui um desafio para a gerência de Recursos Humanos, tendo em vista
que os trabalhadores são o sustentáculo da empresa, e que a participação e/ou
engajamento do trabalhador na busca constante do aumento de seu desempenho,
influenciará de forma decisiva na permanência da empresa no mercado onde atua.
Atualmente, uma maior atenção tem sido dada à qualidade de vida no trabalho, na
esperança de promover um maior envolvimento e motivação no ambiente de trabalho,
propiciando assim um incremento da produtividade. Procura-se com a qualidade de vida no
trabalho, fazer com que a satisfação das necessidades individuais passe a ser alcançada no
próprio ambiente do trabalho (BARRELA, 1994).
2.2. Qualidade de Vida no Trabalho: evolução histórica no contexto econômico e
organizacional.
A economia mundial, até meados da primeira revolução industrial, voltava-se
somente para a satisfação das necessidades primordiais das comunidades, já que as
dificuldades de escoamento das mercadorias inviabilizavam a expansão dos mercados
consumidores. A primeira revolução industrial, impulsionada pelo uso da máquina a vapor,
provocou o surgimento da produção em série de bens e proporcionou uma distribuição mais
rápida desses bens. Mas essa fase expansionista esbarrou na grande depressão 1929/30,
o que ocasionou o término do liberalismo econômico (a mão invisível de Adam Smith) e, o
nascimento da teoria keynesiana na qual o Estado assume importância fundamental na
economia, na medida em que passa a oferecer bens e serviços em setores estratégicos e,
como grande empregador, diminui os efeitos da crise econômica.
A política de intervenção estatal na economia perdura até o fim da 2ª Guerra
mundial, em 1945. Entre 1981 e 1983 passa-se por um processo de reestruturação, política
e econômica, mundial, onde ocorre o desenvolvimento de novas tecnologias como: a
biotecnologia, a robótica, a informática, entre outras.
No decorrer da década de 90, Coutinho apud Almeida-Filho (1990, p.56), destaca a
existência de sete tendências principais para o surgimento de uma nova economia mundial:
o crescente poder da tecnologia eletrônica; a automação integrada flexível; novas bases de
complexibilidade; a globalização e o conseqüente aumento da internacionalização de
capitais; as “alianças tecnológicas”, a transformação das estruturas e estratégias
empresariais, e a revolução dos processos de trabalho. A qualidade de vida no trabalho,
então, estaria relacionada tanto com a transformação das estruturas e estratégias
empresarias quanto com a revolução dos processos de trabalho.
Rodrigues (1995, p.11-18), por sua vez, explica que no início do século XIX a
racionalização do trabalho, através de métodos científicos era o único meio pelo qual se
vislumbrava um aumento na produtividade.
Depois, o foco da atenção dos estudiosos
passou a ser o comportamento do indivíduo e sua satisfação (Escola das Relações
Humanas). Nos primeiros 50 anos do século XX, a atenção voltou-se tanto para o aumento
da produtividade como para a satisfação do trabalhador, surgindo, assim, novas teorias que
tentavam unir a produtividade à satisfação do trabalhador.
Todavia, Vieira (1993) afirma que a expressão “Qualidade de Vida no Trabalho” só
se tornou conhecida, publicamente, na década de 70 com os escritos do professor Loui
Davis (University of Califórnia at Los Angeles - UCLA). Embora os estudos relativos a este
assunto tenham iniciado na década de 60, só ganhou força por volta de 1979, nos EUA,
como resultado do baixo comprometimento dos empregados com suas tarefas e pelo medo
da concorrência externa (Japão), provocando a aplicação prática de qualidade de vida no
trabalho dentro das organizações. Embaladas pelo avanço tecnológico dos anos 80, as
organizações investiram na automatização dos meios de produção, gerando muitas
mudanças nas condições e na própria concepção de qualidade de vida no trabalho.
2.3. Satisfação e Motivação do Trabalhador: principais correntes/estudos
Desde o surgimento das Teorias Administrativas, por volta de 1903, já existia o
interesse no tocante ao grau de motivação do trabalhador, entendendo-se que bastava
aumentar o salário para que o trabalhador ficasse motivado o suficiente para melhorar o seu
desempenho (ETZIONI, 1984, p. 27-28).
A deteriorização dos padrões de trabalho identificadas pela passividade, resistência
às mudanças, a não aceitação de responsabilidades e, ao mesmo tempo, a busca cada vez
maior por benefícios econômicos, é fruto da reação dos indivíduos à carência de
oportunidades de satisfazer suas necessidades mais importantes, tais como: boa
alimentação, moradia, saúde, entre outros.
Mattos (1988, p.128) indica a existência de três visões alternativas sobre a
necessidade do estudo da motivação humana no ambiente de trabalho: a incapacidade do
ser humano de se automotivar (precisa ser motivado), a crescente necessidade, por parte
do sistema econômico mundial, de maior produtividade e a inadequada estruturação das
organizações sociais para o trabalho humano. O autor referido entende a motivação como
um sistema composto por três fatores: necessidades, valores, comportamentos/atitudes,
que, por sua vez vão à busca de objetivos. Classificando essas necessidades em:
fisiológicas, sociais, psicológicas, políticas e transcendentais-místicas.
Neste trabalho, a motivação do trabalhador em executar um serviço de melhor
qualidade está relacionada a um conjunto de fatores, que engloba não só o conjunto de
objetivos, valores e ambições do próprio trabalhador, como também a satisfação intrínseca
que o mesmo obtém por ter consciência da relevância de suas tarefas para si e para o grupo
no qual está inserido.
3. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
Os dados apresentados neste trabalho são resultantes da pesquisa de campo
desenvolvida dentro de uma organização pública o ITEP/RN.
O ITEP/RN é um órgão de regime especial, integrante da estrutura da Secretaria de
Justiça e Segurança Pública do Estado do Rio Grande do Norte, dotado de relativa
autonomia administrativa e financeira e de quadro próprio de pessoal. Tem jurisdição em
todo o território do Estado, destinando-se à coordenação, execução, supervisão e controle
das atividades de polícia técnico-científica, nas áreas de medicina legal, identificação civil e
criminal e criminalista, em apoio aos órgãos públicos como a Polícia Civil e o Poder
Judiciário.
E sendo o mesmo uma empresa pública que presta serviços especializados à
sociedade, como análise de corpos, exames corporais, entre outros, é constantemente
utilizado por toda a sociedade e necessita prestar serviços de boa qualidade, mesmo
trabalhando em situações estressantes o que, por sua vez, pode provocar alguns
descontentamentos com relação a certos aspectos que envolvem a qualidade de vida no
trabalho.
Dentre os diversos setores do órgão optou-se por se analisar, mais especificamente,
a COMELE – Coordenadoria de Medicina Legal. É neste setor que se desenvolvem as
atividades relacionadas à dissecação e análise dos corpos.
4. ANÁLISE DOS DADOS
As variáveis que compuseram o quadro de análise da qualidade de vida no trabalho
foram identificadas com base no modelo avaliativo de WALTON escolhido para a pesquisa.
Nesse modelo, existem oito critérios que influenciam o ambiente de trabalho: condições de
segurança e saúde; remuneração justa e adequada; oportunidades de uso imediato e de
desenvolvimento de capacidades; oportunidade de crescimento contínuo e segurança de
emprego; integração social organizacional; constitucionalismo organizacional; o trabalho e o
espaço total de vida; e a relevância social da vida no trabalho.
Faz-se necessário, porém, explicar que o modelo serviu de referência ao estudo,
mas não foi aplicado na íntegra, tendo sido incluída uma variável específica para se adequar
ao objeto de estudo – ITEP/RN, devido à peculiaridade das atividades desenvolvidas pelos
trabalhadores da referida instituição – dissecação de cadáveres, elaboração de laudos
técnicos sobre a causa mortis, entre outros.
É importante lembrar que WALTON já previa a condição de que grupos de
trabalhadores e/ou ambientes diferentes, podiam gerar um conjunto distinto de critérios, o
que significa dizer que, mudando o contexto, pode alterar-se a hierarquia e importância dos
critérios e dimensões que influem na QVT.
Deve-se ressaltar, também, a inclusão da variável Nível de Interferência Política por
se tratar de um órgão público, onde os cargos mais importantes, na maioria das vezes, são
indicados de acordo com a política estadual vigente.
Os questionários foram aplicados a pouco mais de 73% (setenta e três) dos
servidores lotados na COMELE, localizada no município de Natal/RN, com a finalidade de
identificar o nível da qualidade de vida no trabalho.
5. CONCLUSÃO
Conforme se enfatizou no início deste trabalho, as transformações no mundo do
trabalho envolvem tanto as organizações públicas quanto as privadas. A melhoria da
Qualidade de Vida no Trabalho – QVT é vista, então, como um dos aspectos relevantes
para a busca por uma maior sinergia organizacional.
No caso do ITEP/RN constatou-se que, os seus servidores possuem um grau
elevado de conscientização de que estão realizando um trabalho muito importante, e por
que não dizer essencial, para a sociedade. Observa-se, também, um orgulho, por parte
deles, de poderem trabalhar nesse órgão, e da vontade de crescer/desenvolver dentro da
organização. Nota-se, porém, a existência de um grupo bastante preocupado com o
descaso das autoridades públicas para com o orgão, e a conseqüente falta de investimentos
em infra-estrutura, equipamentos e instalações físicas, fruto de um direcionamento não
otimizado das verbas destinadas a este órgão.
Se somadas todas as médias obtidas das nove variáveis funcionais adotadas neste
trabalho para identificar o nível de satisfação sobre a qualidade de vida no trabalho, e
divididos pelo número de variáveis, daria uma média de 4,59 (dentro de uma escala que
varia de 1 a 7). Esse resultado, que inicialmente aponta para um grau intermediário entre a
satisfação/insatisfação, que só é possível devido ao alto nível de satisfação obtido na
variável Relevância Social da Vida no Trabalho (6,59), assinala para um funcionário
consciente de que seu trabalho é importante para toda a sociedade, apesar das condições
de trabalho adversas.
O que se pode concluir desse estudo é que os funcionários estão se esforçando para
oferecer um atendimento de forma satisfatória, mesmo estando trabalhando num ambiente
que não favorece uma boa qualidade de vida no trabalho, e que qualquer incremento, ou
melhor, investimento, por parte da instituição, na melhoria de aspectos que causam a
insatisfação dos seus servidores, acarretará um provável aumento da qualidade dos
serviços prestados por seus funcionários.
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