UNIVERSIDADE DE COIMBRA
Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação
CIÊNCIAS SOCIAIS
Docente: Prof. Doutor José Manuel Canavarro
O que podemos entender como teoria sociológica?
Uma possível definição diz-nos que uma teoria é um conjunto de
proposições,
interrelacionadas,
que
permitem
uma
sistematização
do
conhecimento, uma explicação, uma previsão da vida social e ainda a geração
de novas hipóteses de pesquisa.
É difícil estabelecer uma data de início para o pensamento sociológico
com base científica. A verdade é que, seguramente, muitas se não todas as
pessoas, desde o início dos tempos, pensam e teorizam sobre a vida em
sociedade. Olson (1993) atribui ao trabalho de James Harrigton, nos meados
do século XVII, sobre as relações entre economia e a comunidade política,
algum pioneirismo científico no domínio da análise sociológica. No entanto, foi
no século seguinte (XVIII) e ainda mais no que se sucedeu (XIX) que surgiram
as primeiras referências tidas e aceites como científicas.
Introdução às Ciências Sociais
DESENVOLVIMENTO DA TEORIA OU ANÁLISE SOCIOLÓGICA
Contributos ou transformações sociais conducentes à emergência
do pensamento sociológico
1. Revoluções políticas – sobretudo representadas pela Revolução Francesa.
2. A Revolução Industrial e a emergência do Capitalismo – a Revolução
Industrial constitui-se como um conjunto relacionado de desenvolvimentos e
consequentes transformações sociais que culminaram numa alteração profunda
do Mundo Ocidental, que passou dum sistema agrícola para um sistema
industrial, com o sucedâneo aparecimento do capitalismo e posterior reacções a
esta doutrina económica (o aparecimento do socialismo). Estas transformações
influenciaram claramente o trabalho de quatro figuras históricas da Sociologia –
Marx; Weber; Durkheim; Simmel.
Introdução às Ciências Sociais
3. A Urbanização – parcialmente como resultado da Revolução Industrial, um
grande número de pessoas deslocou-se de comunidades rurais para a cidade, o
que representou algumas dificuldades de adaptação por parte daqueles que se
deslocaram. A natureza da vida urbana e problemas relacionados determinaram
(e ainda determinam) uma grande fatia da análise sociológica. A Escola de
Chicago, a primeira escola do pensamento sociológico norte-americana surge
para estudar a cidade de Chicago, utilizando-a como laboratório de investigação
para a temática ou problema geral da urbanização.
4. Religião – a influência da religião na vida em sociedade e algumas alterações
religiosas que se processaram foram interesses de investigação por parte de
autores como Comte, Weber ou Durkheim.
5. O desenvolvimento da Ciência (no seu todo, enquanto estrutura e instituição
social).
Introdução às Ciências Sociais
Contributos intelectuais para a emergência do
pensamento sociológico
1. O Iluminismo – segundo alguns autores (Nisbet, 1967; Zeitlin, 1981,
1990, 1994) o Iluminismo constitui e motivou um desenvolvimento
importante do pensamento sociológico. A ênfase na possibilidade ou
capacidade de que as pessoas dispunham para compreender e
controlar o universo através da razão e da pesquisa empírica são
aspectos fundadores do Iluminismo e determinantes do pensamento de
algumas figuras como Karl Marx.
Introdução às Ciências Sociais
Contributos intelectuais para a emergência do
pensamento sociológico
2. A oposição ao Iluminismo – as ideias dos filósofos franceses Louis
de Bonald e Joseph de Maistre representam uma reacção
conservadora muito forte ao pensamento iluminista e também à
Revolução Francesa. Apesar do radicalismo das ideias destes
pensadores, estas estarão na base do desenvolvimento da Sociologia
Francesa de inspiração conservadora, destacando premissas como:
ênfase na sociedade e não no indivíduo; a mudança e transformação
social vistas como ameaças à organização social.
Introdução às Ciências Sociais
A SOCIOLOGIA FRANCESA
SAINT-SIMON (1760-1825)
Saint-Simon, de quem Comte foi discípulo, lançou as bases,
simultâneas, do pensamento sociológico conservador, uma vez que
defendia a preservação da ordem social tradicional e manifestava-se
defensor dum sistema positivista de estudo dos fenómenos sociais,
muito à semelhança daquilo que as ciências exactas fazem, ao mesmo
tempo que defendia uma economia planificada e centralizada e alertava
para os aproveitamentos da mobilidade feudal (ideias próximas do
pensamento marxista).
Introdução às Ciências Sociais
A SOCIOLOGIA FRANCESA
COMTE (1798-1857)
Comte foi o primeiro autor a utilizar o termo Sociologia. Desenvolveu
um sistema teórico, o Positivismo em oposição aquilo que considerava ser a
filosofia negativa e destrutiva do Iluminismo.
Em 1822, Comte propôs a Física Social como sistema para combater
as filosofias negativas e a anarquia social prevalecentes na sociedade
francesa. Esta nova ciência preocupava-se com a estática social (estruturas
sociais existentes) e a dinâmica social (mudança social), sendo esta mais
importante que a primeira. Comte não propunha grandes mudanças sociais,
acreditava na bondade da sociedade e entendia que as reformas apenas
assistiriam ao processo de evolução da sociedade.
Introdução às Ciências Sociais
A SOCIOLOGIA FRANCESA
Lei dos Três Estádios
1. Teológico – domínio da crença no sobrenatural (antes de 1300)
2. Metafísico – remete as explicações para a natureza, mais do que para
Deus (1300-1800)
3. Positivista – caracterizado pela crença na ciência, pela tendência para
crer menos em causas absolutas
O mundo físico e social deveriam ser explicados pela observação
sistematizada. Esta Lei dos três estádios dá-nos uma ideia clara sobre
as ideias cientistas e evolucionárias de Comte.
Introdução às Ciências Sociais
A SOCIOLOGIA FRANCESA
DURKHEIM (1858-1917)
Durkheim, um académico ao contrário de Comte, legitimou a
sociologia em França e o seu trabalho tornou-se determinante para o
desenvolvimento da sociologia. Como Comte, Durkheim assume uma posição
conservadora, pois também receava a desordem social.
Na sua obra Regras do Método Sociológico, define o estudo dos
factos sociais como missão ou objectivo principal da sociologia. Os factos
sociais são forças e estruturas externas e coercivas para o indivíduo. Podem
ser materiais (leis, burocracias) e não materiais (cultura, moralidade),
constituindo-se os últimos como o focus da abordagem de Durkheim.
Introdução às Ciências Sociais
A SOCIOLOGIA FRANCESA
Para demonstrar a utilidade do estudo dos factos sociais, da sociologia,
Durkheim resolveu estudar o suicídio. Considerava que se conseguisse
estabelecer um nexo entre um comportamento individual como o suicídio e
causas sociais a utilidade da sociologia seria assumida pela comunidade em
geral.
Durkheim não estudou o suicídio do indivíduo A ou B, mas, interessouse sobre o que explicaria diferentes taxas de suicídio em função de
determinadas
categorias
sociais
(grupos;
regiões;
países).
Partia
do
pressuposto que a natureza e a transformação de factos sociais estariam na
origem das diferenças nas taxas de suicídio (ex. – uma crise económica). No
geral, a obra de Durkheim (incluiu estudos sobre trabalho, religião,...) e o
impacto social da mesma levaram à institucionalização académica da sociologia.
Introdução às Ciências Sociais
A SOCIOLOGIA ALEMÃ
A sociologia alemã fica historicamente marcada por duas linhas
de pensamento.
- O Marxismo, corrente tangencialmente sociológica.
- Os trabalhos de Max Weber e de Georg Simmel assumidos
como um corrente claramente sociológica.
Introdução às Ciências Sociais
A SOCIOLOGIA ALEMÃ
KARL MARX (1818-1883)
O pensamento de Karl Marx foi muito influenciado pelas ideias
do filósofo alemão Hegel, designadamente a dialéctica (uma forma
dinâmica de pensar e ver o mundo) e o idealismo (ênfase dos
processos e produtos mentais em detrimento do mundo material).
Marx, ainda que muito influenciado, assume-se crítico em
relação ao idealismo pois considera que o mesmo se pode vir a revelar
como muito conservador e adere a uma perspectiva mais materialista,
defendida por Feuerbach, constituindo o que se veio a designar por
materialismo dialéctico.
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A SOCIOLOGIA ALEMÃ
Principais razões para a rejeição do pensamento de Karl Marx (segundo
Ritzer, 1996):
1. Natureza ideológica do pensamento – não conservadora; radical.
2. Os interesses da obra de Marx, ao contrário dos sociólogos de inspiração
conservadora, focalizavam-se não na ordem social mas numa certa desordem.
3. Concepção da natureza humana como produtiva e colectivizadora – o
homem é inerentemente social e necessita de trabalhar em conjunto para
sobreviver. Com base nesta concepção, o capitalismo enquanto estrutura ou
conjunto de estruturas edifica barreiras entre o indivíduo e o processo
produtivo, entre o indivíduo e outros indivíduos (a alienação).
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A SOCIOLOGIA ALEMÃ
MAX WEBER (1864-1920)
Relativamente ao trabalho de Marx, Weber não se focalizou na
classe social, afasta-se dum certo determinismo económico marxista e
assume claramente uma influência filosófica diferente – Kant e não
Hegel.
A Teoria Burocrática – racionalidade/autoridade/poder/política
Fundou a Sociedade Alemã de Sociologia, em 1910.
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A SOCIOLOGIA ALEMÃ
GEORG SIMMEL (1858-1918)
Foi também um dos fundadores da Sociedade Alemã de Sociologia.
O trabalho de Simmel teve uma enorme divulgação e importância
nos Estados Unidos da América, já que esteve na base e nos fundamentos
da Escola de Chicago e da principal corrente teórica desta Escola - o
interaccionismo simbólico.
Simmel alterou, relativamente aos seus antecessores, o nível de
análise,
passou
duma
larga
escala,
duma
macro-sociologia,
da
racionalidade da sociedade e do capitalismo, para a acção individual e
para a interacção.
Introdução às Ciências Sociais
A SOCIOLOGIA ALEMÃ
Simmel considerava que compreender a interacção como a tarefa
principal da Sociologia. No entanto, tornava-se impossível estudar o
incontável número de interacções existentes ou decorrentes da vida social
sem algumas ferramentas conceptuais.
Simmel decidiu então limitar formas de interacção e tipos de
interactores
e,
apesar
de
ter
escrito
trabalhos
sobre
temas
macrosociológicos (por exemplo, a Filosofia do Dinheiro), foi em áreas
como o estudo da pobreza, da prostituta, do estrangeiro que a obra de
Simmel se tornou mais divulgada e conhecida em conjunto com o seu
trabalho sobre díades e tríades sociais.
Introdução às Ciências Sociais
A SOCIOLOGIA ALEMÃ
O pensamento de Simmel indicava que desenvolvimentos
sociológicos cruciais aconteciam quando uma díade se transformava
em tríade, pela adição de um novo membro e da emergência de novas
possibilidades sociais, inexistentes na situação de apenas duas
pessoas (o terceiro membro pode transformar-se num árbitro ou num
mediador, pode também originar dinâmicas conflituais ou disputas de
poder).
Introdução às Ciências Sociais
A SOCIOLOGIA BRITÂNICA
HERBERT SPENCER (1820-1903)
Este autor é geralmente considerado ou categorizado como, em
simultâneo, um conservador (ainda que menos conservador que Comte) e um
liberal.
Para Spencer, a intervenção do estado na sociedade deveria estar
limitada, no que aos assuntos individuais diz respeito, à protecção. Portanto,
Spencer não defendia reformas sociais, defendia que a vida social deveria
evoluir liberta de controlo externo. Spencer assumia uma visão Darwinista
Social, a ideia que o mundo social evoluía tendencialmente para melhor,
seguindo processos de adaptação dos quais resultava a sobrevivência dos
mais fortes.
Introdução às Ciências Sociais
A SOCIOLOGIA BRITÂNICA
Como Comte, Spencer interessava-se pela estrutura geral da
sociedade, a relação entre as partes constituintes dessa sociedade e as
funções dessas partes e do sistema no seu todo. Tinha também uma ideia
evolucionária do desenvolvimento histórico mas não aceitava a Lei dos
Três Estádios.
Sustentava, por exemplo, que a sociedade estava e tinha vindo a
aumentar
de
dimensão
através
da
multiplicação
dos
indivíduos
(demografia) e da união entre estes e criação de grupos e que este
crescimento acarretava a criação de estruturas sociais mais diferenciadas.
Introdução às Ciências Sociais
A SOCIOLOGIA BRITÂNICA
Uma outra perspectiva evolucionária do trabalho de Spencer liga-
se à ideia da passagem duma sociedade militante para uma sociedade
industrial. A primeira assentava na preparação para a guerra. A segunda,
na opinião do autor, fundava-se em valores como a amizade, o altruísmo, a
especialização de funções, o reconhecimento do trabalho e seria mantida
por relações contratuais voluntária. Spencer não punha de parte a
possibilidade de regressões periódicas para um sociedade militante.
As ideias de Spencer mereceram grande acolhimento inicial,
posterior e forte rejeição e recente reabilitação, designadamente em
algumas teorias sociológicas recentes.
Introdução às Ciências Sociais
A SOCIOLOGIA ITALIANA
PARETO (1848-1923) e MOSCA (1858-1941) são duas referências importantes
da Sociologia Italiana.
O primeiro desenvolveu o seu pensamento em oposição a Marx e aos
Iluministas. Pareto enfatizava aspectos não-racionais como os instintos
humanos e considerava que estes aspectos do comportamento humano e
social eram tão imutáveis que seria pouco realista esperar-se o alcance de
mudanças sociais a partir duma revolução económica (crítica ao Marxismo).
O mesmo autor desenvolveu uma teoria da mudança social
francamente contrastante com a Teoria Marxista. Ao contrário duma teoria
focalizada nas massas, Pareto desenvolveu uma teoria da mudança social
baseada nas elites, que sustenta que a sociedade é dominada por uma elite
que domina as massas e que estas funcionam numa base não-racional.
Introdução às Ciências Sociais
A SOCIOLOGIA ITALIANA
A mudança social acontece quando uma elite começa a
degenerar e é substituída por uma nova elite saída duma elite não
governante ou por elementos destacados das massas. Quando a nova
elite chega ao poder, o processo recomeça, constituindo-se a teoria
como cíclica.
Pareto considerava a sociedade como um sistema em
equilíbrio, um todo constituído por partes interdependentes A mudança
numa das partes implicaria mudança noutras partes. Esta visão
sistémica foi posteriormente adoptada por Parsons.
O trabalho de Mosca é consonante com o de Pareto.
Introdução às Ciências Sociais