PROCESSO JUDICIAL
PREVIDENCIÁRIO
PROGRAMA ANALÍTICO DA DISCIPLINA
DISCIPLINA:
Processo Judicial Previdenciário
PROFESSOR: Débora Silva Melo
OBJETIVO DA DISCIPLINA: Levar o aluno a atuar na revisão de benefícios, a partir
de um estudo crítico e reflexivo sobre o processo judicial previdenciário, a morosidade
na apreciação dos Processos de concessão ou de revisão de benefício previdenciário e
suas peculiaridades.
RESULTADOS ESPERADOS: Espera-se que o aluno possa compreender a
abrangência do tema discutido, bem como adquirir os conteúdos, ao final que possa
demonstrar competências, aprimorando sua atuação na área do Processo
Previdenciário.
EMENTA
Tutela Administrativa. A auto-tutela administrativa (Súmula
473 do STF). O Programa Permanente de Revisão (Art. 69 da
Lei 8.212/91). A submissão do processo previdenciário às
garantias constitucionais processuais. Demora na apreciação
dos processos de concessão ou de revisão de benefício
previdenciário.
Greve
dos
servidores
públicos,
não
atendimento ao público. Admissão da prova exclusivamente
testemunhal para bóias-frias. A prova pericial e o início do
benefício por incapacidade. Incapacidade para o trabalho para
fins previdenciários e impossibilidade de trabalhar. Adstrição
da sentença previdenciária e os benefícios por incapacidade. A
tutela antecipada. Omissão na sentença. Concessão após a
sentença. Ordem para pagamento independentemente de
requisição. Coisa julgada. Ação rescisória e solução prómísero. Ação rescisória por alteração jurisprudencial. Juizados
especiais federais.
Aula nº.
Data
Conteúdo a ser Abordado
Tutela
Administrativa.
A
auto-tutela
administrativa (Súmula 473 do STF). O
Programa Permanente de Revisão (Art. 69
da Lei 8.212/91). A submissão do processo
CARGA
HORÁRIA
08 h/a
Metodologia a ser
Utilizada
Expositivo e
casos
previdenciário às garantias constitucionais
processuais. Demora na apreciação dos
processos de concessão ou de revisão de
benefício
previdenciário.
Greve
dos
servidores públicos, não atendimento ao
público.
Admissão
da
prova
exclusivamente testemunhal para bóiasfrias. A prova pericial e o início do
benefício por incapacidade. Incapacidade
para o trabalho para fins previdenciários e
impossibilidade de trabalhar. Adstrição da
sentença previdenciária e os benefícios por
incapacidade.
A tutela antecipada. Omissão na sentença.
Concessão após a sentença. Ordem para
pagamento independentemente de requisição.
Coisa julgada. Ação rescisória e solução prómísero.
Ação
rescisória
por
alteração
jurisprudencial. Juizados especiais federais.
Expositivo e
casos
1
MINICURRÍCULO DO PROFESSOR
Doutoranda (Disciplina Isolada) em Direito Público pela PUC Minas (conceito
Capes 6). Mestra em Direito Público pela PUC Minas (conceito Capes 6). Possui
Especialização em Direito Público pelo IEC/PUC Minas. É graduada em Direito
pela PUC Minas. Atualmente é Professora de Graduação da Faculdade Pitágoras
de Direito de Belo Horizonte, de Pós-graduação na Universidade Federal de Juiz
de Fora e no Centro Universitário UNA de Belo Horizonte. Advogada atuante nas
áreas de Direito Previdenciário e da Seguridade Social.
2
ÍNDICE
I. Tutela Administrativa. A auto-tutela administrativa (Súmula 473, do STF).
O Programa Permanente de Revisão (Art. 69, da Lei 8.212/91)........................05
II.
A submissão do Processo Previdenciário às garantias constitucionais
processuais. Demora na apreciação dos processos de concessão ou de
revisão de benefício previdenciário. Greve dos servidores públicos, não
atendimento ao público.......................................................................................20
III. Admissão da prova exclusivamente testemunhal para bóias-frias. A
prova pericial e o início do benefício por incapacidade. Incapacidade para o
trabalho para fins previdenciários e impossibilidade de trabalhar. Adstrição
da sentença previdenciária e os benefícios por incapacidade. A tutela
antecipada. Omissão na sentença. Concessão após a sentença. Ordem para
pagamento independentemente de requisição................................................34
IV. Coisa julgada. Ação rescisória e solução pró-mísero. Ação rescisória por
alteração jurisprudencial.....................................................................................58
V. Juizados Especiais.............................................................................................74
VI. Bibliografia Básica...........................................................................................76
VII. Bibliografia Complementar...........................................................................76
VIII. Referências...................................................................................................76
3
ATENÇÃO: O conteúdo desta apostina não se propõe a ser um estudo
metodológico, nem de cunho acadêmico para fins de publicação, mas
meramente roteiro de estudos para os estudantes de pós-graduação.
As ideias expressas foram tiradas dos autores citados, combinadas,
para formar uma teia de conhecimentos capazes de integrar técnica e
teoria. O professor, mais uma vez, adverte que posicionamentos
pessoais serão discutidos em sala de aula, pois estes são mero roteiro
de estudo, com pensamento de autores citados.
4
I.
Tutela Administrativa. A auto-tutela administrativa (Súmula 473, do STF). O
Programa Permanente de Revisão (Art. 69, da Lei 8.212/91).
I.1 – Tutela Administrativa. A auto-tutela administrativa (Súmula 473, do STF). O
Programa Permanente de Revisão (Art. 69, da Lei 8.212/91).
A) Princípios da Tutela e Auto tutela - A auto-tutela administrativa (Súmula 473, do
STF)
Tutela é o poder de controle dos atos das entidades da Administração Indireta
pelos órgãos centrais da Administração Direta. O poder de tutela sempre foi denominado de
supervisão ministerial e abrange o controle finalístico dos atos da Administração Indireta.
Já o princípio da autotutela administrativa representa que a Administração Pública
tem o poder-dever de controlar seus próprios atos, revendo-os e anulando-os quando
houverem sido praticados com alguma ilegalidade. Dessa forma, a autotutela funda-se no
princípio da legalidade administrativa: se a Administração Pública só pode agir dentro da
legalidade, é de se considerar que os atos administrativos eivados de ilegalidade devem ser
revistos e anulados, sob pena de afronta ao ordenamento jurídico.
Neste sentido, é a lição de José dos Santos Carvalho Filho:
“a autotutela envolve dois aspectos quanto à atuação administrativa: 1) aspectos de
legalidade, em relação aos quais a Administração, de ofício, procede à revisão de
atos ilegais; e 2) aspectos de mérito, em que reexamina atos anteriores quanto à
conveniência e oportunidade de sua manutenção ou desfazimento”.
Assim sendo, a autotutela abrange o poder de anular, convalidar e, ainda, o poder
de revogar atos administrativos. A autotutela está expressa no art. 53, da Lei nº 9.784/99,
assim como na Súmula nº 473, do STF.
Dentro de tal contexto, importa considerar que, mais que um poder, o exercício da
autotutela afigura-se como um dever para a Administração Pública; reitere-se, dever de
rever e anular seus atos administrativos, quando ilegais. Conquanto tal poder-dever seja de
índole constitucional, seu exercício não pode se dar de forma absoluta e irrestrita, porquanto
a invalidação de atos administrativos não garante, por si só, a restauração da ordem jurídica.
A matéria relativa à autotutela administrativa, tal como de conhecimento geral,
consiste na capacidade da Administração rever os próprios atos, alterando em muitos casos
a situação jurídica de terceiros, através de sua invalidação, quando viciados; ou pela
revogação, em razão de conveniência e oportunidade. Tal poder-dever administrativo
acabou consolidado na Súmula 473, do STF, a qual, pode-se dizer, constitui um dos marcos
do Direito Administrativo. Conforme o enunciado da súmula:
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A Administração pode anular seus próprios atos, quando eivados de vícios que o
tornam ilegais, porque deles não se originam direitos, ou revogá-los, por motivo de
conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos, e ressalvada, em
todos os casos, a apreciação judicial.
Para tal matéria, a ausência de um prazo para o exercício da autotutela efetivamente
gerava uma insegurança jurídica para os administrados ou servidores públicos, os quais
podiam ver suas situações jurídicas alteradas mesmo que transcorridos largos períodos de
tempo.
Como qualquer ato administrativo, a concessão de benefícios previdenciários pode e
deve ser revista de ofício pelo INSS quando constatada violação à lei, respeitado, por óbvio,
o devido processo legal administrativo. Trata-se do exercício da autotutela administrativa,
que pode resultar na anulação do ato de concessão, como previsto no art. 53, da Lei n°
9.784/99 e nas Súmulas nos346 e 473 do STF, em decorrência da vinculação ao Princípio da
Legalidade.
E, é nesse sentido que, a própria Lei Orgânica da Seguridade Social (Lei 8.212/91),
em seu art. 69, faz previsão da prerrogativa da autotutela administrativa a ser exercida pela
Autarquia Previdenciária, o qual dispõe:
Art. 69. O Ministério da Previdência e Assistência Social e o Instituto Nacional do
Seguro Social - INSS manterão programa permanente de revisão da concessão e da
manutenção dos benefícios da Previdência Social, a fim de apurar irregularidades e
falhas existentes.
Mas, essa necessidade de rever falhas e irregularidades, decorrente da vinculação da
Administração Pública ao Princípio da Legalidade seria forte a ponto de vedar limitações
temporais ao dever-poder de a Administração extirpar atos ilegais, ou haveria prazo para
efetuar tal revisão de legalidade?
Há décadas a lei optou pela segunda alternativa, conforme o art. 7º, da Lei n°
6.309/75: “Os processos de interesse de beneficiários e demais contribuintes não poderão
ser revistos após 5 (cinco) anos, contados de sua decisão final, ficando dispensada a
conservação da documentação respectiva além desse prazo”. Assim, passado o lapso, o
direito passa a tutelar a manutenção do ato ilegal. Essa relativização da legalidade deve-se
à necessidade igualmente importante de observar os princípios da segurança jurídica, da
moralidade administrativa, da proteção da confiança e da boa-fé, de modo a estabilizar a
situação do beneficiário que por anos a fio percebeu a prestação e que ficou dispensado até
mesmo de conservar documentos.
- Revogação da Lei n° 6.309/75 e advento da Lei n° 9.784/99
6
A Lei n° 6.309/75 foi revogada pela Lei n° 8.422/92, de modo que, no plano legal,
deixou de haver previsão expressa de prazo para o exercício da autotutela. Somente com o
art. 54, da Lei n° 9.784/99, que regulamentou a matéria para a Administração Pública em
geral, voltou a ser legalmente previsto o prazo decadencial de cinco anos, nos seguintes
termos:
“Art. 54. O direito da Administração de anular os atos administrativos de que
decorram efeitos favoráveis para os destinatários decai em cinco anos, contados da
data
em
que
foram
praticados,
salvo
comprovada
má-fé.
§ 1º No caso de efeitos patrimoniais contínuos, o prazo de decadência contar-se-á da
percepção
do
primeiro
pagamento.
§ 2º Considera-se exercício do direito de anular qualquer medida de autoridade
administrativa que importe impugnação à validade do ato.”
Excepcionam-se da decadência os casos de má-fé, como ocorre, e.g., no momento
do uso de documento falso para obtenção de benefício. Isso porque, havendo má-fé, a
manutenção do ato pelo decurso do prazo privilegiaria, na verdade, a torpeza do infrator, em
prejuízo da confiança legítima, da boa-fé e da moralidade para cuja proteção foi concebido o
instituto.
Entre as Leis n° 8.422/92 e n° 9.784/99, defende-se que continuaria vigorando o
prazo de cinco anos, já que tal lapso é recorrente nas normas de direito público em
situações análogas. Trata-se do entendimento mais consentâneo com a segurança jurídica,
pois o administrado não pode ficar permanentemente sujeito ao poder de autotutela. Porém,
o STJ decidiu que, “Até o advento da Lei 9.784/99, a Administração podia revogar a
qualquer tempo os seus próprios atos, quando eivados de vícios, na dicção das Súmulas
346 e 473/STF”.
Pacificada a questão, impõe-se perguntar: o novo prazo aplica-se apenas aos atos
praticados depois da Lei n° 9.784/99, ou também aos anteriores?
Parece evidente que, instituído lapso decadencial para o exercício da autotutela, os
atos praticados anteriormente à introdução do prazo não ficam a ele imunes, ideia que seria
de todo incompatível com o princípio constitucional da segurança jurídica. Não seria
admissível, em um Estado Democrático de Direito, que determinado ato, apenas porque
praticado em época na qual não havia previsão expressa de prazo decadencial, ficasse
permanentemente sujeito ao poder de revisão administrativa, sob pena de grave
comprometimento da moralidade administrativa, da proteção da confiança legítima e da boafé dos administrados.
7
De outro lado, a segurança jurídica também veda, em princípio, a retroatividade das
leis, somente admitida excepcionalmente – como para beneficiar o réu no processo penal
(CF, art. 5º, XL) – ou, de todo modo, se for expressa (LINDB, art. 1º) e não prejudicar direito
adquirido, ato jurídico perfeito ou coisa julgada (CF, art. 5º, XXXVI, e LINDB, art. 6º).
Qual, então, a solução adequada à luz da segurança jurídica? Forçosamente, concluise que o novo prazo decadencial deve ser aplicado a todos os atos administrativos, pois não
pode haver atos eternamente sujeitos à revisão, e a partir da vigência da lei que o instituiu.
Embora possa parecer que caracteriza retroatividade a incidência do novo prazo
sobre os atos praticados antes da sua instituição, não é disso que se cuida. A lei não está a
desconstituir atos passados ou seus efeitos, mas apenas a projetar sua eficácia para o
futuro. Se a lei marca um prazo, contado a partir de sua entrada em vigor, para que os atos
a ela anteriores possam ser revistos sob pena de consolidação, não há retroatividade, mas
retrospectividade. A diferença é exposta na lição de Canotilho, citada pelo Min. Luiz Fux:
“Primeiramente, é bem de ver que a aplicação da Lei Complementar nº 135/10 com a
consideração de fatos anteriores não viola o princípio constitucional da
irretroatividade das leis. De modo a permitir a compreensão do que ora se afirma,
confira-se a lição de J. J. GOMES CANOTILHO (Direito Constitucional e Teoria da
Constituição. 5. ed. Coimbra: Almedina, 2001. p. 261-262), em textual:
‘[...] Retroactividade consiste basicamente em uma ficção: (1) decretar a validade e
vigência de uma norma a partir de um marco temporal (data) anterior à data da sua
entrada em vigor; (2) ligar os efeitos jurídicos de uma norma a situações de facto
existentes
antes
de
sua
entrada
em
vigor.
[...]’
O mestre de Coimbra, sob a influência do direito alemão, faz a distinção entre:
(i) a retroatividade autêntica: a norma possui eficácia ex tunc, gerando efeito sobre
situações pretéritas, ou, apesar de pretensamente possuir eficácia meramente ex
nunc, atinge, na verdade, situações, direitos ou relações jurídicas estabelecidas no
passado;
e
(ii) a retroatividade inautêntica (ou retrospectividade): a norma jurídica atribui efeitos
futuros a situações ou relações jurídicas já existentes, tendo-se, como exemplos
clássicos, as modificações dos estatutos funcionais ou de regras de previdência dos
servidores públicos (v. ADI 3105 e 3128, Rel. para o acórdão Min. CEZAR PELUSO).
Não por outra razão, o STJ assentou a aplicabilidade do art. 54, da Lei n° 9.784/99 a
partir de sua entrada em vigor (01.02.99) também para os atos anteriores ao diploma:
“ADMINISTRATIVO – ATO ADMINISTRATIVO: REVOGAÇÃO – DECADÊNCIA – LEI
9.784/99 – VANTAGEM FUNCIONAL – DIREITO ADQUIRIDO – DEVOLUÇÃO DE
VALORES. 1. Até o advento da Lei 9.784/99, a Administração podia revogar a
qualquer tempo os seus próprios atos, quando eivados de vícios, na dicção das
Súmulas 346 e 473/STF. 2. A Lei 9.784/99, ao disciplinar o processo administrativo,
estabeleceu o prazo de cinco anos para que pudesse a Administração revogar os
seus atos (art. 54). 3. A vigência do dispositivo, dentro da lógica interpretativa,
tem início a partir da publicação da lei, não sendo possível retroagir a norma
para limitar a Administração em relação ao passado. 4. Ilegalidade do ato
administrativo que contemplou a impetrante com vantagem funcional derivada de
transformação do cargo efetivo em comissão, após a aposentadoria da servidora. 5.
Dispensada a restituição dos valores em razão da boa-fé da servidora no
recebimento das parcelas. 6. Segurança concedida em parte.”
8
A doutrina é pacífica a respeito, pois a eterna possibilidade de revisão pelo INSS dos
benefícios concedidos entre as Leis nos; 8.422/92 e n° 9.784/99 constituiria um apego
extremo à máxima tempus regit actum, em detrimento do efeito imediato das leis (LINDB,
art. 6º).
B) Inclusão do art. 103-A na Lei n° 8.213/91 pela MP n° 138/03
A MP n° 138/03, depois convertida na Lei n° 10.839/04, incluiu o art. 103-A na Lei n°
8.213/91 para dar à decadência previdenciária tratamento específico em relação ao geral:
“Art. 103-A. O direito da Previdência Social de anular os atos administrativos de que
decorram efeitos favoráveis para os seus beneficiários decai em dez anos, contados
da
data
em
que
foram
praticados,
salvo
comprovada
má-fé.
§ 1º No caso de efeitos patrimoniais contínuos, o prazo decadencial contar-se-á da
percepção
do
primeiro
pagamento.
§ 2º Considera-se exercício do direito de anular qualquer medida de autoridade
administrativa que importe impugnação à validade do ato.”
Como se vê, o art. 103-A, da Lei n° 8.213/91 é muito semelhante ao art. 54, da Lei n°
9.784/99, exceto pelo âmbito de aplicação (relações previdenciárias) e pelo lapso (decenal).
A justificativa declarada na Exposição de Motivos da MP n° 138/03 foi a de equiparar os
prazos para o exercício da autotutela administrativa e para o beneficiário pleitear a revisão
de benefícios, este também ampliado pela mesma norma, como será visto no próximo item.
A partir da introdução do art. 103-A, na Lei n° 8.213/91, surgiu inevitavelmente uma
nova questão de direito intertemporal: a partir de quando se aplica o novo prazo decenal?
Embora haja autores e julgado a sustentar que o intervalo de dez anos seria aplicável
apenas para os benefícios concedidos a partir de 20.11.03 (data da publicação da MP n°
138/03), tal orientação não prospera, pelo fato de que não há direito adquirido a regime
jurídico, de modo que o ato praticado sob a égide de uma lei que prevê um prazo
decadencial de cinco anos não fica eternamente sujeito a essa disciplina, caso sobrevenha,
antes da consumação do referido prazo, lei que disponha em sentido diverso.
Nesse sentido, o STJ, em recurso repetitivo, fixou orientação de que o novo prazo
decenal deve ser considerado uma extensão do antigo e contado a partir da vigência da Lei
n° 9.784/99, pois o lapso quinquenal não chegou a se consumar até a edição da MP n°
138/03:
“RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. ART. 105, III, ALÍNEA A, DA CF. DIREITO
PREVIDENCIÁRIO. REVISÃO DA RENDA MENSAL INICIAL DOS BENEFÍCIOS
PREVIDENCIÁRIOS CONCEDIDOS EM DATA ANTERIOR À VIGÊNCIA DA LEI
9.787/99. PRAZO DECADENCIAL DE 5 ANOS, A CONTAR DA DATA DA VIGÊNCIA
DA LEI 9.784/99. RESSALVA DO PONTO DE VISTA DO RELATOR. ART. 103-A DA
LEI 8.213/91, ACRESCENTADO PELA MP 19.11.2003, CONVERTIDA NA LEI
9
10.839/2004. AUMENTO DO PRAZO DECADENCIAL PARA 10 ANOS. PARECER
DO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL PELO DESPROVIMENTO DO RECURSO.
RECURSO ESPECIAL PROVIDO, NO ENTANTO. 1. A colenda Corte Especial do
STJ firmou o entendimento de que os atos administrativos praticados antes da Lei
9.784/99 podem ser revistos pela Administração a qualquer tempo, por inexistir
norma legal expressa prevendo prazo para tal iniciativa. Somente após a Lei 9.784/99
incide o prazo decadencial de 5 anos nela previsto, tendo como termo inicial a data
de sua vigência (01.02.99). Ressalva do ponto de vista do Relator. 2. Antes de
decorridos 5 anos da Lei 9.784/99, a matéria passou a ser tratada no âmbito
previdenciário pela MP 138, de 19.11.2003, convertida na Lei 10.839/2004, que
acrescentou o art. 103-A à Lei 8.213/91 (LBPS) e fixou em 10 anos o prazo
decadencial para o INSS rever os seus atos de que decorram efeitos favoráveis
a seus beneficiários. 3. Tendo o benefício do autor sido concedido em
30.07.1997 e o procedimento de revisão administrativa sido iniciado em janeiro
de 2006, não se consumou o prazo decadencial de 10 anos para a Autarquia
Previdenciária rever o seu ato. 4. Recurso Especial do INSS provido para afastar a
incidência da decadência declarada e determinar o retorno dos autos ao TRF da 5ª
Região, para análise da alegada inobservância do contraditório e da ampla defesa do
procedimento que culminou com a suspensão do benefício previdenciário do autor.”
Este é o entendimento defendido pela melhor doutrina e que já orientava a atuação
administrativa do INSS desde a confecção do Parecer MPS/CJ n° 3509/05.
Decidiu acertadamente o STJ, pois o advento de um novo prazo pode ser aplicado às
situações já existentes, a partir de sua entrada em vigor, o que não configura retroatividade
vedada pelo ordenamento. E o advento de lei que aumenta prazo em curso apenas amplia o
termo final sem mudar o inicial, possibilitando o aproveitamento do tempo já decorrido.
- Decadência para o beneficiário pleitear a revisão de benefícios concedidos
Embora não haja maiores dúvidas sobre a legitimidade do prazo decadencial para
limitar o exercício do direito de autotutela da Administração Pública, o mesmo não ocorre
quando se discute a decadência do direito de o beneficiário pleitear a revisão de benefícios.
- Constitucionalidade da decadência contra o beneficiário
A decadência contra o beneficiário é prevista apenas para a “revisão do ato de
concessão de benefício” que porventura não tenha sido deferido em sua integralidade (art.
103, caput, da Lei n° 8.213/91), o que pressupõe o acesso, ao menos inicial, do beneficiário
à prestação. Isto significa que os atos de indeferimento total não estão sujeitos à decadência
e podem ser revistos a qualquer tempo, respeitada a prescrição quinquenal das parcelas.
A esta altura, seria possível indagar: não haveria um contrassenso entre a instituição
de prazo decadencial para a revisão de atos concessórios e a preservação do fundo de
direito, com base na lógica de que “quem pode o mais (obter acesso ao benefício) pode o
menos (obter a revisão)”?
10
Nesse sentido, é possível encontrar em obras previdenciárias menção ao Projeto de
Lei n° 4.959/09, que “Modifica a Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991, extinguindo o prazo
decadencial para que seja requerida a revisão do ato de concessão de benefício
previdenciário no âmbito do Regime Geral de Previdência Social”.
A imprescritibilidade do fundo do direito de acesso ao benefício já constitui a nota
distintiva da normatização do tempo sobre as prestações previdenciárias em comparação
com outros tipos de obrigações, o que inclusive afasta as Súmulas n os 443, do STF e 85, do
STJ em caso de indeferimento expresso do direito à totalidade do benefício. E o caráter
dilatado do prazo legal – dez anos, semelhante ao maior prazo prescricional do Código Civil
(art. 205) – também constitui reflexo da necessidade de se fixar intervalo mais longo para
oferecer proteção adequada em situações de hipossuficiência informacional, mas sem
eternizá-la, a não ser no ponto em que essa tutela é verdadeiramente fundamental: garantir
acesso ao benefício.
Dessa forma, não se pode concordar com a inconstitucionalidade da decadência
contra o beneficiário, haja vista a incidência de todos os princípios constitucionais que
lastreiam o instituto e a ausência de vulneração dos direitos previdenciários na sua
expressão verdadeiramente fundamental.
- Panorama da sucessão legislativa sobre a matéria
A decadência contra o beneficiário somente foi introduzida no direito previdenciário
com a MP n° 1.523-9/97, que, depois de sucessivas reedições, foi convertida na Lei n°
9.528/97 e assim deixou a redação do caput do art. 103, da Lei n° 8.213/91:
“Art. 103. É de dez anos o prazo de decadência de todo e qualquer direito ou ação do
segurado ou beneficiário para a revisão do ato de concessão de benefício, a contar
do dia primeiro do mês seguinte ao do recebimento da primeira prestação ou, quando
for o caso, do dia em que tomar conhecimento da decisão indeferitória definitiva no
âmbito administrativo.”
Pouco depois, a MP 1.663-15/98 (posteriormente convertida na Lei n° 9.711/98),
alterou o caput do art. 103, da Lei n° 8.213/91 a fim de reduzir o prazo para cinco anos:
“Art. 103. É de cinco anos o prazo de decadência de todo e qualquer direito ou ação
do segurado ou beneficiário para a revisão do ato de concessão de benefício, a
contar do dia primeiro do mês seguinte ao do recebimento da primeira prestação ou,
quando for o caso, do dia em que tomar conhecimento da decisão indeferitória
definitiva no âmbito administrativo.”
Em 2003, frente a uma massiva movimentação dos segurados, associações e
advogados que resultou em um elevado ingresso de ações para revisão de benefícios com
base no índice IRSM de fevereiro de 1994, o executivo se viu obrigado, por motivos
11
políticos, a elastecer novamente o prazo decadencial. Editou então a Medida Provisória n°
138, de 29.12.2003, que foi convertida na Lei n° 10.839, de 05.02.2004, voltando a fixar em
10 anos o prazo de decadência. Assim, voltou a valer a redação que já havia sido dada
ao caput do art. 103, da Lei n° 8.213/91 pela MP nº 1.523-9/97, o que vigora até hoje.
Embora não se cogite permitir um exercício da autotutela ilimitado no tempo para os
benefícios concedidos entre as Leis nos 8.422/92 e 9.784/99, prevalece a interpretação de
que todos os benefícios concedidos anteriormente à edição da MP n° 1.523-9/97 não estão,
até hoje, sujeitos a prazo decadencial, e, portanto, podem ser revistos pelo beneficiário a
qualquer tempo. É o que entende o STJ:
“PREVIDENCIÁRIO. REVISÃO DE BENEFÍCIO. DECADÊNCIA. PERÍODO
ANTERIOR À MEDIDA PROVISÓRIA 1.523/97. PRECEDENTES. 1. É firme neste
Superior Tribunal de Justiça o entendimento de que o prazo decadencial previsto no
caput do artigo 103, da Lei de Benefícios, introduzido pela Medida Provisória nº
1.523-9, de 27.06.1997, posteriormente convertida na Lei nº 9.528/1997, por se tratar
de instituto de direito material, surte efeitos apenas sobre as relações jurídicas
constituídas a partir de sua entrada em vigor. 2. Agravo interno ao qual se nega
provimento.”
Em defesa da tese, diz-se que o segurado incorporou ao seu patrimônio jurídico a
possibilidade de revisão ilimitada no tempo, pois não havia prazo decadencial no momento
da concessão, bem como se invoca a vedação à retroatividade, com um reforço de
argumentação decorrente do caráter substancial, e não processual da norma. Porém, como
já visto, não há direito adquirido a regime jurídico. E não se trata de retroatividade, mas de
simples aplicação imediata da lei para o futuro. Assim, é inócuo ressaltar a natureza não
processual da decadência para obstar uma retroatividade que não ocorre. Não apenas as
leis processuais têm aplicação imediata (CPP, art. 2º), mas todas as normas que não
dispuserem de forma diversa, respeitados o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa
julgada (LINDB, art. 6º).
Embora ainda minoritária, começa a ganhar força na doutrina e na jurisprudência a
interpretação de que o prazo decadencial aplica-se também aos benefícios concedidos
anteriormente à MP n° 1.523-9/97. Nesse sentido, a Turma Nacional de Uniformização dos
Juizados Especiais Federais reviu seu entendimento e passou a adotar o seguinte:
“REVISÃO DE BENEFÍCIO. APLICABILIDADE DO PRAZO DECADENCIAL DO ART.
103 DA LEI Nº 8.213/1991 AOS BENEFÍCIOS ANTERIORES E POSTERIORES À
EDIÇÃO DA MEDIDA PROVISÓRIA Nº 1.523-9/1997. POSSIBILIDADE. 1. Tomando,
por analogia, o raciocínio utilizado pelo STJ na interpretação do art. 54 da Lei
9.784/99 (REsp n° 658.130/SP), no caso dos benefícios concedidos anteriormente à
entrada em vigência da medida provisória, deve ser tomado como termo a quo para a
contagem do prazo decadencial não a DIB (data de início do benefício), mas a data
da entrada em vigor do diploma legal. 2. Em 01.08.2007, 10 anos contados do “dia
primeiro do mês seguinte ao do recebimento da primeira prestação” recebida após o
início da vigência da Medida Provisória nº 1.523-9/1997, restou consubstanciada a
12
decadência das ações que visem à revisão de ato concessório de benefício
previdenciário instituído anteriormente a 26.06.1997, data da entrada em vigor da
referida MP. 3. Pedido de Uniformização conhecido e provido.”
A matéria está atualmente pendente de julgamento no STF, sob regime de
repercussão geral, no RE 626489 (Rel. Min. Ayres Britto).
Como visto acima, o caput do art. 103, da Lei n° 8.213/91 ainda veio a ser alterado
mais duas vezes depois da previsão inicial do prazo de dez anos pela MP n° 1.523-9/97: na
primeira, a MP n° 1.663-15/98 (depois convertida na Lei n° 9.711/98) reduziu o prazo para
cinco anos; na segunda, a MP n° 138/03 (posteriormente convertida na Lei n° 10.839/04)
restabeleceu o prazo decenal. O termo inicial, porém, foi sempre o mesmo: o “dia primeiro
do mês seguinte ao do recebimento da primeira prestação ou, quando for o caso, do dia em
que tomar conhecimento da decisão indeferitória definitiva no âmbito administrativo”. Como
fica a situação dos benefícios concedidos sob a vigência de tais diplomas?
A aplicação cega da máxima tempus regit actum levaria à conclusão de que o prazo a
ser aplicado depende da data da concessão do benefício (cinco ou dez anos, a depender do
caso). Porém, tal solução desconsidera a eficácia imediata das leis e as regras de direito
intertemporal que devem ser aplicadas no caso de extensão ou redução de prazos em
curso.
A Medida Provisória n° 1.523-9/97 passou a viger em 28.06.97. Considerando que o
termo inicial da decadência introduzida pela norma é o “dia primeiro do mês seguinte ao do
recebimento da primeira prestação”, e que a primeira prestação depois da edição da referida
MP foi paga no mês de julho de 1997 (conforme as antigas redações do art. 41, § 4º, da Lei
n° 8.213/91), conclui-se que o termo inicial do prazo decadencial para o segurado rever
benefícios concedidos antes da MP n° 1.523-9/97 é o dia 01.08.97.
Já a Medida Provisória n° 1.663-15/98, que reduziu o prazo para cinco anos, foi
publicada em 23.10.98. Considerando que o saldo remanescente para a consumação dos
dez anos da lei antiga é superior à totalidade do prazo da lei nova, despreza-se o tempo
anterior e reinicia-se a contagem, agora de acordo com a lei em vigor. Levando em conta a
manutenção da regra do termo inicial, e que a primeira prestação posterior ao advento da
mencionada MP foi paga em novembro de 1998, o prazo quinquenal passou a ser contado
de 01.12.98.
Por fim, a Medida Provisória n° 138/03 entrou em vigor no dia 20.11.03,
restabelecendo o prazo de dez anos. Como não se completaram cinco anos entre o termo
inicial do prazo instituído pela MP n° 1.663-15/98 (01.12.98) e o início da vigência da MP n°
13
138/03 (20.11.03), nenhum benefício chegou a ser atingido pela decadência no período.
Assim, passa-se a aplicar novamente o prazo de dez anos, considerando o tempo decorrido
desde a vigência da MP n° 1.523-9/97, que instituiu o prazo pela primeira vez. Portanto, a
decadência para rever benefícios concedidos antes da referida MP ocorreu no dia 01.08.07.
A propósito, este é o entendimento previsto no art. 441 da IN INSS/PRES n° 45/10 e
no Enunciado n° 63 das Turmas Recursais dos Juizados Especiais Federais do Rio de
Janeiro:
“Em 01.08.2007 operou-se a decadência das ações que visem à revisão de ato
concessório de benefício previdenciário instituído anteriormente a 28.06.1997, data
de edição da MP nº 1.523-9, que deu nova redação ao art. 103 da Lei nº 8.213/91.”
Note-se que, como já referido, o elastecimento de prazo em curso permite o
aproveitamento do tempo decorrido sob a lei antiga, de modo que o advento da MP n°
138/03 não interrompeu nenhum prazo decadencial que já havia se iniciado, mas apenas
modificou
o
termo
final,
em
razão
da
mudança
de
cinco
para
dez
anos.
- Aspectos do benefício atingidos pela decadência
É preciso debater ainda a extensão dos efeitos da decadência sobre o benefício
atingido, devido à existência de interpretações que restringem o alcance do instituto.
Exemplo disso é a discussão acerca da possibilidade de averbação de novo tempo de
serviço para majorar benefício já concedido.
Pode-se sustentar que a ação declaratória para a inclusão ou averbação de tempo de
serviço/contribuição é imprescritível, o que é verdadeiro, desde que a eficácia do provimento
seja meramente declaratória. Caso se pretenda extrair efeitos condenatórios da sentença
declaratória incidirá a decadência, conforme jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça.
Defende-se ainda que, em caso de discussão do tempo de serviço ou de salários de
contribuição na Justiça do Trabalho, a decadência para a revisão de benefício só começaria
a correr com o trânsito em julgado da sentença trabalhista. Porém, a lide em face do
empregador não constitui etapa necessária para a defesa do segurado perante o INSS,
bastando a concessão a menor para o exercício do direito de revisão. Note-se que a lide
trabalhista pode nem ser mais admissível à luz da consumação do prazo quinquenal previsto
no art. 7º, XXIX, da CF, embora a decadência previdenciária ainda possa estar em curso.
14
Em suma: a inclusão de tempo de serviço para aumentar a renda mensal constitui,
inegavelmente, “revisão do ato de concessão”, como já decidido pelo STJ em casos de
aposentadorias estatutárias. Assim, uma vez obtido acesso ao benefício, a inclusão de mais
tempo de serviço constitui revisão sujeita ao prazo decadencial, tenha esse período sido
objeto de prévio requerimento administrativo ou não, pois o art. 103, caput, da Lei n°
8.213/91 não excepciona essa hipótese, e os §§ 2º e 4º, do art. 347, do Regulamento não
podem ser interpretados no sentido de abrir possibilidades que a lei não oferece.
Recente precedente da TRU da 4ª Região parece ter acolhido esse entendimento:
“REVISÃO DE BENEFÍCIO DE APOSENTADORIA POR TEMPO DE
CONTRIBUIÇÃO MEDIANTE INCLUSÃO DE TEMPO DE SERVIÇO NÃO
RECONHECIDO NA ESFERA ADMINISTRATIVA. APLICAÇÃO DO PRAZO
PREVISTO NO ART. 103 DA LEI 8.213/91. INCIDENTE A QUE SE NEGA
PROVIMENTO. O pedido de revisão de aposentadoria por tempo de contribuição
mediante inclusão de tempo de serviço não reconhecido na via administrativa
também está sujeito ao prazo previsto no art. 103, da Lei 8.213/91.”
Apesar de tudo, note-se que o próprio INSS admite a inclusão de tempo de serviço
sem as limitações decorrentes da decadência (IN INSS/PRES n° 45/10, art. 445).
Quanto
a
reajustes
supervenientes,
há
autores
para
os
quais
eventual
questionamento não estaria sujeito a decadência. Isso devido à interpretação da expressão
“revisão do ato de concessão”, entendida como referente apenas à concessão inicial da
prestação, o que vem em reforço da ideia de que a decadência seria restrita à discussão da
renda mensal inicial. A interpretação, aliás, poderia dar sentido ao segundo possível termo
inicial da decadência previsto na parte final do caput, do art. 103, da Lei n° 8.213/91 (“ou,
quando for o caso, do dia em que tomar conhecimento da decisão indeferitória definitiva no
âmbito administrativo”), que se aplicaria nas hipóteses de pedido de revisão decorrente de
fato posterior à concessão. Tal exegese, porém, peca pelo problema de fazer o curso do
prazo depender de requerimento administrativo de revisão (o que já seria possível desde a
lesão), pois sem essa iniciativa do segurado não haverá o indeferimento que põe o prazo em
marcha e a revisão continuará potencialmente pendente, o que é incompatível com o caráter
público do prazo decadencial.
Dizer que a “revisão do ato de concessão” refere-se apenas ao momento inicial do
benefício é o mínimo que se pode extrair do texto legal, embora também se possa ler a
norma no sentido de que cada reajuste é um “ato de concessão”, o que parece mais lógico.
Com a consumação da decadência, se a lei veda a discussão de todos os aspectos que
compõem a renda mensal inicial – os quais impactarão o benefício durante toda sua duração
–, por qual motivo a lei deixaria para sempre aberta a possibilidade de discutir reajustes
15
supervenientes? Parece mais ajustado ao princípio da segurança jurídica, e conforme o
texto legal, entender que cada reajuste constitui um ato de concessão, sujeito, portanto, à
decadência, contada a partir do primeiro dia do mês seguinte ao recebimento da primeira
parcela reajustada a menor.
Portanto, vê-se que, em princípio, todos os aspectos do benefício podem ser
atingidos pela decadência do direito de revisão: renda mensal, tempo de serviço, reajustes
posteriores etc. No entanto, além do fundo de direito de acesso ao benefício, há que
ressalvar mais dois aspectos que não se sujeitam à decadência, como decorrência lógica da
essencialidade do acesso às prestações previdenciárias: (a) o rol de beneficiários; e (b) a
modalidade do benefício, quando estiver envolvido o direito de acesso de possíveis
dependentes.
O primeiro caso é recorrente: trata-se da situação em que, por exemplo, o INSS
defere pensão por morte a um dependente de um segurado falecido, e, tempos depois,
surge um novo dependente de classe igual ou superior a pleitear a sua cota-parte. Nessa
situação, está em jogo o fundo do direito de acesso ao benefício do segundo dependente,
de modo que, independentemente do lapso decorrido, o INSS e o primeiro beneficiário não
poderão alegar decadência para manter o benefício conforme a concessão inicial. A pensão
por morte deverá passar a ser paga ao segundo dependente, mas apenas a partir da sua
respectiva habilitação, o que também se aplica ao auxílio-reclusão, como previsto nos arts.
76 e 80 da Lei n° 8.213/91.
O segundo caso – que se ora reconhece em virtude de mudança de compreensão
anteriormente adotada, propiciada por melhor reflexão sobre o tema – envolve pedidos de
pensão por morte cuja concessão dependa da revisão de um benefício deferido em vida ao
instituidor. Por exemplo: se o falecido recebia benefício assistencial em vez da
aposentadoria por idade que lhe era devida, o dependente poderá pedir a revisão, ainda que
passados mais de dez anos da concessão inicial, para garantir o seu próprio direito de
acesso à pensão por morte. Ou ainda: se o instituidor teve deferido em vida benefício de
auxílio-doença quando fazia jus à aposentadoria por invalidez e faleceu depois da cessação
do benefício e do período de graça (art. 15, da Lei n° 8.213/91), o dependente poderá pedir
a revisão, independentemente do intervalo transcorrido, para obter o reconhecimento da
qualidade de segurado do instituidor e, por conseguinte, o seu próprio acesso ao benefício
de pensão por morte.
As situações em exame decorrem da natureza indireta da relação entre o pensionista
e o INSS, a depender do reconhecimento da qualidade de segurado do instituidor, o que
16
pode não ter sido buscado em vida. Nas hipóteses narradas, embora se trate de “revisão do
ato de concessão”, está envolvido o próprio direito de acesso à prestação previdenciária
pelos dependentes, razão pela qual a decadência não pode obstar a discussão revisional.
Nestes casos, portanto, não se pode impedir a revisão da modalidade de prestação, sob
pena de privar o dependente do direito fundamental de acesso ao benefício previdenciário a
que faz jus.
Eventual conclusão em sentido diverso conduziria a um resultado insustentável: se o
instituidor nunca tiver feito qualquer requerimento em vida, apesar de ter adquirido direito a
benefício gerador de pensão por morte, eventual dependente poderá pleiteá-lo sem ser
afetado pela decadência, pela simples razão de que não houve benefício concedido a ser
revisado. De outro lado, se houve requerimento em vida e o benefício foi deferido em
modalidade inferior à devida, o dependente não poderia revisá-lo em razão da consumação
da decadência.
Portanto, vê-se que a modalidade de concessão do benefício não está sujeita à
decadência quando envolvido o direito de acesso por parte de eventuais beneficiários. Já
outros casos de mudança de modalidade de benefício – como, por exemplo, a
transformação de aposentadoria por tempo de contribuição para aposentadoria especial –
submetem-se ao prazo decadencial, por não envolverem o direito de acesso de eventuais
beneficiários (já que ambos os benefícios geram pensão por morte), mas apenas reflexos
patrimoniais.
17
II)
A
submissão
do
Processo
Previdenciário
às
garantias
constitucionais
processuais.
II.1) Processo Administrativo Previdenciário
O vocábulo processo expressa algo dinâmico, em movimento, dirigido a determinado
fim. Em sentido amplo, processo consiste em instrumento utilizado pelos Poderes Executivo,
Legislativo e Judiciário para executar suas funções típicas.
Para Marcus Vinicius Corrêa Bittencourt, citado por Rafael Laynes Bassil:
"Assim, pode-se compreender um processo legislativo, para a elaboração de normas
gerais e abstratas (lei); um processo judicial, para compor conflitos de interesses,
cujo ato final será uma sentença e um processo administrativo, para concretizar
direta e imediatamente os anseios da coletividade, mediante a edição de um ato
administrativo.
Tendo em vista que o processo judicial e o processo administrativo existem para
aplicar a lei ao caso concreto, cabe estabelecer suas diferenças.
O processo judicial se inicia mediante provocação das partes que formam uma
relação trilateral: juiz, que representa o Estado e irá solucionar o conflito entre as
partes em litígio, autor e réu. Uma vez esgotada a via recursal, o processo judicial
produzirá coisa julgada. (...) O processo administrativo, em contrapartida, pode ser
instaurado tanto por provocação do interessado como ex officio, isto é, por impulso
da própria Administração Pública, formando uma relação bilateral: administrado e
Administração. O Poder Público, além de ser parte interessada, decide a questão.
Tendo em vista essa posição peculiar do Estado, a decisão emanada do processo
administrativo não produz coisa julgada no sistema brasileiro."
Importante salientar que o processo administrativo é, via de regra, gratuito,
diversamente do processo judicial, uma vez que a Administração também detém interesses
que serão alcançados na conclusão desse processo.
Segundo Celso Antônio Bandeira de Mello, citado por Rafael Laynes Bassil, processo
administrativo "é uma sucessão itinerária e encadeada de atos administrativos que tendem,
todos, a um resultado final e conclusivo".
Assim, o processo administrativo consiste em um conjunto de atos interligados, no
exercício da função administrativa, dirigidos a uma tomada de decisão nessa esfera, o que
difere do procedimento administrativo que é o rito - aspecto externo do processo. Logo, o
processo administrativo pode ter vários ritos ou procedimentos, dependendo da decisão que
deve ser tomada e da finalidade a ser alcançada pela Administração Pública.
18
Deve-se destacar que o Processo deve ser visto como uma garantia dos
administrados, bem como por meio deste o indivíduo poderá trazer informações ao
conhecimento da Administração Pública.
Marcus Vinicius Corrêa Bittencourt, novamente citado por Rafael Laynes Bassil,
salienta que se compreende que o "processo administrativo é uma forma de assegurar o
controle das tomadas de decisão da Administração Pública e garantia dos direitos
fundamentais dos administrados".
E, com o advento da Lei nº 9.784/99 (Processo Administrativo Federal), se tornou
usual a utilização da palavra processo como representativa dessa relação jurídica de direito
público estabelecida entre a Administração e o administrado, momento em que passou a
possuir contornos jurídicos melhor definidos, destinados à proteção dos direitos dos
administrados e ao melhor cumprimento dos fins precípuos da Administração.
Conforme o art. 5º da Constituição Federal de 1988 em seus incisos LV, LXXII e
LXXVIII, legitimam o uso da expressão processo administrativo para definir a disciplina da
relação
jurídica
estabelecida
entre
a
Administração
Previdenciária
e
seus
segurados/beneficiários.
José Antonio Savaris, citado por Rafael Laynes Bassil, ressalta que:
"quanto ao processo administrativo previdenciário, certamente que o cancelamento
de um benefício previdenciário, pelo exercício da autotutela administrativa, deve
guardar respeito ao devido processo legal desde a sua instauração, com imediata
cientificação do titular ou representante. É o núcleo do princípio constitucional
segundo o qual 'ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido
processo legal' (CF/88, art. 5º, LIV). O processo comumente chamado de 'verificação
da regularidade de concessão de benefício, isto é, o exercício da autotutela
administrativa', pressupõe, assim, uma sequência de atos com conteúdo próprio do
processo."
Logo, muito bem exemplifica Savaris, o fenômeno processual administrativo no
campo previdenciário é identificado a partir de critérios do interesse preponderantemente
particular que reclama colaboração por parte do destinatário do ato, qualificada pelo
exercício do contraditório. E, como consequência, se reconhece o direito do particular ao
devido processo legal desde o requerimento administrativo.
- Legislação Aplicável
Por inexistir lei específica que discipline o processo administrativo previdenciário,
cabe extrair o regramento básico da matéria de dispositivos esparsos existentes na
Constituição Federal de 1988, na Lei nº 8.212/91 (Lei de Custeio), na Lei nº 8.213/91 (Lei de
19
Benefícios), no Decreto nº 3.048/99 (Regulamento da Previdência Social), na Instrução
Normativa INSS/PRES nº 45/10 e, principalmente, na Lei nº 9.784/99 (Processo
Administrativo Federal).
No âmbito federal, a Lei nº 9.784/99 estabelece normas básicas sobre o processo
administrativo, visando, em especial, à proteção dos administrados e ao melhor
cumprimento dos fins da Administração. Essa Lei também se aplica aos órgãos dos Poderes
Legislativo e Judiciário da União Federal, quando no desempenho de função administrativa.
Saliente-se que essa lei pode ser aplicada subsidiariamente aos processos
administrativos federais específicos, como, por exemplo, os processos administrativos
disciplinares e os processos administrativos previdenciários.
É o que preconiza o art. 69, da Lei nº 9.784/99: "os processos administrativos
específicos continuarão a reger-se por lei própria. Aplicando-se-lhe apenas subsidiariamente
os preceitos desta lei".
José Antonio Savaris, citado por Rafael Laynes Bassil, explica essa questão da
subsidiariedade para o direito previdenciário:
"Segundo a Lei nº 8.213/91 (art. 103-A), o prazo para a Previdência Social 'anular os
atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis para os seus beneficiários
decai em dez anos, contados da data em que foram praticados, salvo comprovada
má-fé'. De outra forma, o art. 54, da Lei nº 9.874/99, de aplicação subsidiária, dispõe
que o 'direito da Administração de anular os atos administrativos de que decorram
efeitos favoráveis para os destinatários decai em cinco anos, contados da data em
que foram praticados, salvo comprovada má-fé'. No âmbito da Administração Federal,
à luz do art. 69, da Lei nº 9.784/99, é de prevalecer as normas dos processos
específicos quando colidentes com as normas gerais da lei procedimental.
Se, no entanto, as regras processuais específicas se revelarem contrárias aos
princípios da Lei Geral do Processo Administrativo, elas devem ser afastadas por
inconstitucionais porque, em última análise, serão incompatíveis com os princípios
constitucionais processuais que se viram reafirmados na Lei nº 9.784/99. Neste
sentido, os princípios expressos neste diploma legal não traduzem senão
densificação dos princípios constitucionais processuais. Se, por exemplo, não for
observado o contraditório por uma lei específica de qualquer das esferas de poder ou
de qualquer pessoa política constitucional, a norma correspondente será
inconstitucional não porque a Lei do Processo Administrativo deve prevalecer, mas
porque a Constituição impõe a mais perfeita obediência ao devido processo legal
(CF/88, art. 5º, LIV), ao contraditório e à ampla defesa (CF/88, art. 5º, LV)."
A partir dessas informações conclui-se que a Lei nº 9.784/99 é de extrema
importância para o direito previdenciário, visto que a Administração Previdenciária mantém
estreita relação com o particular no que diz respeito a sua pretensão de obter ou manter um
benefício previdenciário.
Importante esclarecer que o processo administrativo previdenciário não deve
apenas observar as garantias processuais constitucionais para que se respeite o
20
devido processo legal, quais sejam: contraditório e ampla defesa; motivação das
decisões; direito de petição e publicidade dos atos processuais, mas principalmente
os princípios constitucionais administrativos - legalidade, finalidade, razoabilidade,
proporcionalidade, moralidade, interesse público, segurança jurídica e eficiência.
É o que estabelece o art. 2º, da Lei nº 9.784/99, que determina a observância desses
princípios pela Administração Pública em relação aos administrados:
"Art. 2º - A Administração Pública obedecerá, dentre outros, aos princípios da
legalidade, finalidade, motivação, razoabilidade, proporcionalidade, moralidade,
ampla defesa, contraditório, segurança jurídica, interesse público e eficiência.
Parágrafo único - Nos processos administrativos serão observados, entre outros, os
critérios de:
I - atuação conforme a lei e o Direito;
II - atendimento a fins de interesse geral, vedada a renúncia total ou parcial de
poderes ou competências, salvo autorização em lei;
III - objetividade no atendimento do interesse público, vedada a promoção pessoal de
agentes ou autoridades;
IV - atuação segundo padrões éticos de probidade, decoro e boa-fé;
V - divulgação oficial dos atos administrativos, ressalvadas as hipóteses de sigilo
previstas na Constituição;
VI - adequação entre meios e fins, vedada a imposição de obrigações, restrições e
sanções em medida superior àquelas estritamente necessárias ao atendimento do
interesse público;
VII - indicação dos pressupostos de fato e de direito que determinarem a decisão;
VIII - observância das formalidades essenciais à garantia dos direitos dos
administrados;
IX - adoção de formas simples, suficientes para propiciar adequado grau de certeza,
segurança e respeito aos direitos dos administrados;
X - garantia dos direitos à comunicação, à apresentação de alegações finais, à
produção de provas e à interposição de recursos, nos processos de que possam
resultar sanções e nas situações de litígio;
XI - proibição de cobrança de despesas processuais, ressalvadas as previstas em lei;
XII - impulsão, de ofício, do processo administrativo, sem prejuízo da atuação dos
interessados;
XIII - interpretação da norma administrativa da forma que melhor garanta o
atendimento do fim público a que se dirige, vedada aplicação retroativa de nova
interpretação."
Conforme ensina Allan Luiz Oliveira Barros, citado por Rafael Laynes Bassil:
"No processo administrativo previdenciário podemos classificar os princípios em
gerais e específicos. Princípios gerais são aqueles conhecidos por todos e bastante
explorado na doutrina pátria, insculpidos no art. 37, da Constituição Federal e art. 2º,
da Lei nº 9.784/99: legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade, eficiência,
finalidade, motivação, razoabilidade, proporcionalidade, ampla defesa, contraditório,
21
segurança jurídica e interesse público. Alguns princípios específicos aplicáveis à
relação jurídica previdenciária podem ser extraídos da legislação, dentre os quais: a
obrigatoriedade da concessão do benefício mais vantajoso; a primazia da verdade
real; a oficialidade na atuação dos órgãos para a realização de requerimentos
administrativos e produção de provas; e a presunção de veracidade dos dados
constantes nos sistemas corporativos da Previdência Social."
A) Demora na apreciação dos processos de concessão ou de revisão de benefício
previdenciário. Greve dos servidores públicos, não atendimento ao público.
- Duração Razoável do Processo
O processo administrativo previdenciário é deflagrado mediante pedido formulado
pelo segurado ou dependente e, em algumas situações específicas, pelo empregador ou de
ofício pela Administração.
A relação jurídica processual possui, no polo ativo, o segurado ou dependente que
mantém relação de seguro social com o Estado; e, no polo passivo, o Instituto Nacional do
Seguro Social (INSS), Autarquia Federal, com personalidade jurídica de direito público
interno.
Através da Emenda Constitucional nº 45, de 8 de dezembro de 2004, estabeleceu no
art. 5º, inciso LXXVIII, da Constituição Federal, o direito à duração razoável do processo,
que preconiza que "a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável
duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação".
Como bem salienta Allan Luiz Oliveira Barros, citado por Rafael Laynes Bassil, ao
discorrer sobre a duração razoável do processo administrativo previdenciário:
"No âmbito do direito previdenciário tem-se defendido que a conclusão da análise do
processo deve se efetivar no prazo de 45 (quarenta e cinco) dias, considerando o
disposto no § 5º, do art. 41-A, da Lei de Benefícios, que prevê que 'o primeiro
pagamento do benefício será efetuado até quarenta e cinco dias após a data da
apresentação pelo segurado da documentação necessária a sua concessão'.
Concluída a instrução do processo, a decisão deve ser proferida no prazo de 30 dias,
salvo prorrogação por igual período, devidamente motivada, nos termos do art. 49, da
Lei nº 9.784/99."
Não são raros os casos em que o segurado aguarda meses ou até anos para ver seu
direito reconhecido, seja através do restabelecimento de auxílio-doença previdenciário,
pensão por morte ou mesmo por decisão imotivada que suspende aposentadoria por tempo
de contribuição, por exemplo.
E, como anteriormente suscitado, por inexistir lei específica que discipline o processo
administrativo previdenciário, servimo-nos da Lei nº 9.784/99, que regula o processo
22
administrativo no âmbito da Administração Pública Federal, em seus arts. 24, 48 e 49,
verbis:
"Art. 24 - Inexistindo disposição específica, os atos do órgão ou autoridade
responsável pelo processo e dos atos administrados que dele participem devem ser
praticados no prazo de 5 (cinco) dias, salvo motivo de força maior.
Parágrafo único - O prazo previsto neste artigo pode ser dilatado até o dobro,
mediante comprovada justificação."
"Art. 48 - A Administração tem o dever de explicitamente emitir decisão nos
processos administrativos e sobre solicitações ou reclamações, em matéria de sua
competência."
"Art. 49 - Concluída a instrução de processo administrativo, a Administração tem o
prazo de até 30 (trinta) dias para decidir, salvo prorrogação por igual período
expressamente motivada."
A Instrução Normativa INSS/PRES nº 45, de 6 de agosto de 2010, que disciplina o
processo administrativo previdenciário no âmbito do Instituto Nacional do Seguro Social
(INSS), em observância à Lei nº 9.784/99, estabelece também o prazo de até 30 (trinta) dias
para decidir, salvo prorrogação por igual período expressamente motivada, conforme
preconiza o art. 624 e parágrafos - alterado pela Instrução Normativa INSS/PRES nº 59, de
17 de abril de 2012 -, verbis:
"Art. 624 - A administração tem o dever de explicitamente emitir decisão nos
processos administrativos e sobre solicitações ou reclamações em matéria de sua
competência (art. 48 da Lei nº 9.784, de 1999). Alterado pela Instrução Normativa
INSS/PRES nº 59, de 17 de abril de 2012 - DOU de 18.04.2012
§ 1º - A decisão administrativa, em qualquer hipótese, deverá conter despacho
sucinto do objeto do requerimento administrativo, fundamentação com análise das
provas constantes nos autos, bem como conclusão deferindo ou indeferindo o pedido
formulado, sendo insuficiente a mera justificativa do indeferimento constante no
sistema corporativo da Previdência Social. Alterado pela Instrução Normativa
INSS/PRES nº 59, de 17 de abril de 2012 - DOU de 18.04.2012
§ 2º - A motivação deve ser clara e coerente, indicando quais os requisitos legais que
foram ou não atendidos, podendo fundamentar-se em decisões anteriores, bem como
notas técnicas e pareceres do órgão consultivo competente, os quais serão parte
integrante do ato decisório. Alterado pela Instrução Normativa INSS/PRES nº 59, de
17 de abril de 2012 - DOU de 18.04.2012
§ 3º - Todos os requisitos legais necessários à análise do requerimento devem ser
apreciados no momento da decisão, registrando-se no processo administrativo a
avaliação individualizada de cada requisito legal. Alterado pela Instrução Normativa
INSS/PRES nº 59, de 17 de abril de 2012 - DOU de 18.04.2012
§ 4º - Concluída a instrução do processo administrativo, a unidade de atendimento do
INSS tem o prazo de até trinta dias para decidir, salvo prorrogação por igual período
expressamente motivada. Alterado pela Instrução Normativa INSS/PRES nº 59, de 17
de abril de 2012 - DOU de 18.04.2012
§ 5º - Para fins do § 4º deste artigo, considera-se concluída a instrução do processo
administrativo quando estiverem cumpridas todas as exigências, se for o caso, e não
houver mais diligências ou provas a serem produzidas. Alterado pela Instrução
Normativa INSS/PRES nº 59, de 17 de abril de 2012 - DOU de 18.04.2012"
23
Logo, em processo administrativo previdenciário que suspende determinado benefício
e aguarda o conhecimento de defesa administrativa, por exemplo, ou que aguarda perícia
médica para analisar restabelecimento de auxílio-doença previdenciário, por um período
mais do que razoável para essa análise, entendemos que se aplicam tais dispositivos
supramencionados.
É o que preconiza inclusive o Código de Ética do Servidor Público Civil do Poder
Executivo Federal - Decreto nº 1.171/94, pelo qual se aplica o dano moral - que será
analisado no próximo - pela demora da análise do processo administrativo previdenciário:
"Anexo - Código de Ética Profissional do Servidor Público Civil do Poder Executivo
Federal
Capítulo I
Seção I
Das Regras Deontológicas
(...)
X - Deixar o servidor público qualquer pessoa à espera de solução que compete ao
setor em que exerça suas funções, permitindo a formação de longas filas, ou
qualquer outra espécie de atraso na prestação do serviço, não caracteriza apenas
atitude contra a ética ou ato de desumanidade, mas principalmente grave dano moral
aos usuários dos serviços públicos.
Seção II
Dos Principais Deveres do Servidor Público
XIV - São deveres fundamentais do servidor público:
(...)
b) exercer suas atribuições com rapidez, perfeição e rendimento, pondo fim ou
procurando prioritariamente resolver situações procrastinatórias, principalmente
diante de filas ou de qualquer outra espécie de atraso na prestação dos serviços pelo
setor em que exerça suas atribuições, com o fim de evitar dano moral ao usuário;
Seção III
Das Vedações ao Servidor Público
XV - É vedado ao servidor público:
(...)
d) usar de artifícios para procrastinar ou dificultar o exercício regular de direito por
qualquer pessoa, causando-lhe dano moral ou material;"
Um outro questionamento que pode surgir, diz respeito à greve dos servidores
públicos e o não atendimento ao púbico. Pois bem, é cediço que o direito de greve dos
servidores públicos ainda está pendente de regulamentação e, a solução jurídica encontrada
pela Corte Constitucional foi a utilização do método concretista no âmbito dos vários
24
Mandados de Injunção, ajuizados pela categoria dos servidores públicos. Tal método valeuse da aplicação da legislação trabalhista aos servidores públicos, a fim de que os mesmos
possam, até ulterior regulamentação, usufruir do direito de greve, constitucionalmente
autorizado.
Ocorre que, a problemática acerca do assunto, qual seja, o exercício constitucional do
direito de greve, por parte dos servidores públicos, também encontra entraves, sobretudo ao
se considerar como princípio reitor do serviço público, o princípio da continuidade na
prestação dos serviços públicos.
Assim, a fim de que o dito princípio não fosse violado, em atividades/serviços
considerados essenciais, o Poder Judiciário tem decidido, reiteradas vezes, que o
quantitativo mínimo para manutenção da legalidade do movimento grevista é de 30%.
Contudo, cada caso precisa ser analisado e, sempre que possível, deve ser buscada uma
definição conjunta com a Administração sobre quais sejam as necessidades mínimas e o
percentual de servidores mantidos em serviço.
Logo, se o servidores públicos também não atenderem a esse percentual mínimo
estarão incorrendo em violação não só aos seus estatutos funcionais, mas, também, em
crime de desobediência.
De forma que o agente público que pratica uma conduta inadequada que afete a
ordem interna dos serviços, que venha a causar um dano patrimonial à Administração
Pública ou a terceiro, ou que venha caracterizada pelo ordenamento como crime funcional,
está sujeito à responsabilidade administrativa, civil e penal.
Nos ensinamentos de José Maria Pinheiro Madeira, citado por Rafael Laynes Bassil:
"Tais responsabilidades não se excluem mutuamente. Ao contrário, podem incidir
simultaneamente. É possível que a mesma conduta configure infração administrativa,
acarrete dano à Administração e seja tipificada como crime. Neste caso, o servidor
arcará com as consequências da responsabilidade administrativa, civil e criminal, pois
as três têm fundamento e natureza diversa."
Salienta Madeira, citado por Rafael Laynes Bassil que, quando se tratar de dano
causado a terceiros, aplica-se a norma do art. 37, § 6º, da Constituição Federal, em
decorrência da qual o Estado responde objetivamente, ou seja, independentemente de culpa
ou dolo, mas fica com o direito de regresso contra o servidor que causou o dano, desde que
tenha agido com culpa ou dolo.
- Dano Moral
25
Em razão de o processo administrativo previdenciário ser moroso em alguns casos,
como já elucidado, não é de causar estranheza o total desrespeito aos segurados com a
atuação do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, deixando-lhes marcas de indignação,
descrença, humilhação e impotência que pretendem ver ressarcidos por meio de ação
judicial.
De forma alguma pode o INSS alegar que a simples demora na análise do processo
administrativo que desencadeou determinada demanda judicial não gera sofrimento passível
de indenização a título de dano moral. Isso porque, não raros os casos, o
segurado/beneficiário não tem nenhuma outra fonte de remuneração para seu sustento e de
sua família, tendo este que socorrer-se da ajuda de terceiros e adquirir dívidas e
empréstimos para tentar manter sua qualidade de vida, que sem seu benefício
previdenciário não saberá se um dia conseguirá adimplir.
Fato este que se agrava com a não observância ao disposto no Enunciado nº 5 da
JR/CRPS, que estabelece que "a Previdência Social deve conceder o melhor benefício a
que o segurado fizer jus, cabendo ao servidor orientá-lo nesse sentido".
O que inclusive está preceituado na Instrução Normativa INSS/PRES nº 45, de 6 de
agosto de 2010, art. 621: "o INSS deve conceder o melhor benefício a que o segurado fizer
jus, cabendo ao servidor orientar nesse sentido".
Como bem salienta Wânia Alice Ferreira Lima Campos, citada por Rafael Laynes
Bassil:
"(...) não se podem banalizar as práticas ilícitas reiteradamente praticadas pelo INSS
como se fossem do cotidiano, como o caso de atraso injustificado na concessão de
benefícios previdenciários, a não concessão do reajuste nos proventos e a não
concessão injustificada ou o atraso injustificado na concessão de benefício
previdenciário, pois o costume antijurídico deve ser coibido e não incentivado.
Não menos importante é perceber que a integridade emocional do segurado ou
dependente é extremamente sensível a uma negativa ou demora de concessão de
benefício previdenciário, por vícios ocorridos no processo administrativo ou no ato
administrativo de concessão dos mesmos, pois se trata de um direito de caráter
fundamental e essencial para a sobrevivência da pessoa, bem como da manutenção
de sua higidez física e mental, principalmente nos momentos difíceis da vida da
pessoa, que estará diante de várias contingências."
Logo, verifica que a demora, em alguns casos, na análise do processo administrativo
previdenciário é fato incontroverso passível de indenização a título de dano moral.
26
Segundo José de Aguiar Dias, citado por Rafael Laynes Bassil "o dano moral é o
efeito não patrimonial da lesão de direito e não da própria lesão abstratamente
considerada".
A Constituição Federal de 1988 garante expressamente a indenização por dano
moral, cumulável com indenização por dano material oriundo do mesmo fato, não exigindo,
por outro lado, a comprovação do reflexo patrimonial do prejuízo.
Hodiernamente, entende-se que o dano moral, mesmo que puramente moral, emana
da norma do art. 186 do Código Civil, tendo sua reparação garantida pelos incisos V e X, do
art. 5º da Constituição Federal, além do inciso VI, do art. 6º, do Código de Defesa do
Consumidor, no âmbito das relações de consumo.
Aliás, perfeitamente possível a cumulação de danos morais e materiais pelo mesmo
fato, nos termos do Verbete nº 37, da Súmula do Superior Tribunal de Justiça - STJ: "São
cumuláveis as indenizações por dano material e dano moral oriundos do mesmo fato".
Wânia Alice Ferreira Lima Campos, citada por Rafael Laynes Bassil, é prudente ao
mencionar que, embora sejam compatíveis os pedidos cumulativos de reparação por dano
moral com a concessão de benefício previdenciário, não é recomendável tal cumulação,
visto que a discussão sobre a responsabilidade civil pode prejudicar o trânsito em julgado
que determine a concessão de benefício.
Logo, ressalta a autora que a propositura de ações autônomas na prática não
prejudica o encerramento da ação de concessão de benefício previdenciário para iniciar a
ação de reparação por dano moral, desde que este esteja caracterizado.
Essa reparação por dano moral visa compensar a vítima e não recompor prejuízos.
Com efeito, sua reparação cabe ao prudente arbítrio do juiz, que há de analisar o que lhe
parecer equitativo e justo.
Nesse sentido, ensina José de Aguiar Dias, citado por Rafael Laynes Bassil, que "a
condição da impossibilidade matemática exata da avaliação só pode ser tomada em
benefício da vítima e não em seu prejuízo".
Quanto à reparação do dano, esta pode ser obtida administrativamente ou mediante
ação de indenização junto ao Poder Judiciário. Para conseguir o ressarcimento do prejuízo,
a vítima deverá demonstrar o nexo de causalidade entre o fato lesivo e o dano, bem como o
valor do prejuízo.
No caso de reparação por danos morais, não se paga um preço pela dor sofrida. Ao
contrário, a reparação serve como meio de atenuar a lesão jurídica. Portanto, o dinheiro não
27
serve de equivalente, como ocorre nos danos materiais, mas de pena imposta àquele que
lesou a moral alheia.
Assim, cabe ao juiz harmonizar o dano moral sofrido pelo autor e sua respectiva
reparação, tutelando a paz social - objetivo do direito.
- Responsabilidade Civil do Estado
A responsabilidade nada mais é que o dever de indenizar o dano.
Para Rui Stoco, citado por Rafael Laynes Bassil, noção de "responsabilidade pode
ser haurida da própria origem da palavra, que vem do latim respondere, reponder a alguma
coisa, ou seja, a necessidade que existe de responsabilizar alguém por seus atos danosos".
Segundo Maria Helena Diniz, também citada por Rafael Laynes Bassil: “A
responsabilidade civil é a aplicação de medidas que obriguem uma pessoa a reparar o dano
moral ou patrimonial causado a terceiros, em razão de ato por ela mesma praticado, por
pessoa por quem ela responde, por alguma coisa a ela pertencente ou de simples imposição
legal."
A responsabilidade civil pode se apresentar sob diferentes espécies, segundo a
classificação adotada por Maria Helena Diniz:
"a) quanto ao fato gerador:
- responsabilidade contratual, se oriunda de inexecução de negócio jurídico bilateral
ou unilateral. Resulta, portanto, de ilícito contratual, ou seja, de falta de adimplemento
ou da mora no cumprimento de qualquer obrigação;
- responsabilidade extracontratual ou aquiliana, se resultante da violação de um
dever geral de abstenção pertinente aos direitos reais ou de personalidade. O onus
probandi caberá à vítima; ela é que deverá provar a culpa do agente. Se não
conseguir, tal prova ficará sem ressarcimento. Além dessa responsabilidade delitual
baseada na culpa fundada no risco, ante a insuficiência da culpa para cobrir todos os
danos.
b) quanto ao fundamento:
- responsabilidade objetiva: se fundada no risco, que explica essa responsabilidade
no fato de haver o agente causado dano à vítima ou a seus bens. É irrelevante a
conduta culposa ou dolosa do causador do dano, uma vez que bastará a existência
do nexo causal entre o prejuízo sofrido pela vítima e ação do agente para que surja o
dever de indenizar;
- responsabilidade subjetiva: se encontrar sua justificativa na culpa ou dolo por ação
ou omissão, lesiva a determinada pessoa. Desse modo, a prova da culpa do agente
será necessária para que surja o dever de reparar.
c) quanto ao agente:
- responsabilidade direta: se proveniente da própria pessoa imputada, o agente
responderá, então, por ato próprio;
28
- responsabilidade indireta ou complexa: se promana de ato de terceiro, com o qual o
agente tem vínculo legal de responsabilidade, de fato de animal e de coisas
inanimadas sob sua guarda."
O entendimento hoje é de que a responsabilidade civil decorrente da demora da
análise do processo administrativo previdenciário é extracontratual, decorrente de uma
violação legal; objetiva, decorrente de ato ilícito, respondendo o Estado objetivamente pelos
danos perpetrados ao indivíduo.
A Constituição Federal de 1988 preconiza em seu art. 37, § 6º, a responsabilidade
objetiva do Estado e a responsabilidade subjetiva do funcionário:
"As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de
serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade,
causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos
casos de dolo ou culpa."
Para ocorrer a responsabilidade objetiva são exigidos os seguintes requisitos:
a) pessoa jurídica de direito público ou de direito privado prestadora de serviço
público;
b) entidades que prestem serviço público;
c) dano causado a terceiro em decorrência da prestação de serviço público (nexo de
causalidade);
d) dano causado por agente, de qualquer tipo;
e) agente aja nessa qualidade, no exercício de suas funções.
Uma vez indenizada a vítima, fica a pessoa jurídica com o direito de regresso contra o
responsável, isto é, com o direito de recuperar o valor da indenização junto ao agente que
causou o dano, desde que este tenha agido com dolo ou culpa.
Logo, plenamente possível a indenização em favor do segurado em face da demora
da análise do processo administrativo previdenciário através da Responsabilidade Civil do
Estado. Visto que a conduta estatal que causa dano à pessoa gera para esta o direito de ver
o dano reparado, independentemente da existência de culpa da Administração Pública,
bastando que haja nexo causal entre a conduta do estado e o dano causado.
Corroborando esse entendimento, assim leciona Celso Antônio Bandeira de Mello,
citado por Rafael Laynes Bassil: "Responsabilidade objetiva é a obrigação de indenizar que
incumbe a alguém em razão de um procedimento lícito ou ilícito que produziu uma lesão na
esfera juridicamente protegida de outrem. Para configurá-la basta, pois, a mera relação
causal entre o comportamento e o dano."
29
Da exposição supra, extrai-se que a Responsabilidade Civil do INSS possui caráter
objetivo, pelo fato de tratar-se de autarquia prestadora de serviço público.
Assim, aduz Wânia Alice Ferreira Lima Campos, também citada por Rafael Laynes
Bassil:
“Por isso, a responsabilidade do Estado na concessão de benefícios previdenciários
é extracontratual, pois não advém de um contrato e sim de uma imposição aceita por
toda a coletividade e, portanto, de cunho publicístico derivado de uma relação legal
estabelecida entre o segurado e o INSS, no caso do benefício previdenciário ou entre
o contribuinte da União, no caso do custeio da Previdência Social."
30
III. Admissão da prova exclusivamente testemunhal para bóias-frias. A prova pericial
e o início do benefício por incapacidade. Incapacidade para o trabalho para fins
previdenciários e impossibilidade de trabalhar. Adstrição da sentença previdenciária e
os benefícios por incapacidade. A tutela antecipada. Omissão na sentença.
Concessão após a sentença. Ordem para pagamento independentemente de
requisição.
III.1. Aspectos controvertidos sobre a Aposentadoria para o Trabalhador Rural: A
questão da admissão da prova exclusivamente testemunhal para bóias-frias.
Inicialmente, urge destacar que os bóias-frias são segurados do Regime Geral de
Previdência Social, na categoria a qual pertence o trabalhador rural, qual seja, a dos
Segurados Especiais, aqueles cujas atividades são desempenhadas individualmente ou em
regime de economia familiar.
A questão, agora, que se coloca em exame é: De que forma se comprova ou se pode
comprovar o tempo de trabalho rural?
A comprovação do tempo de serviço – e aí está incluído o efetivo exercício de
atividade rural – só produzirá efeitos quando baseada, pelo menos, em início de prova
material, posto não ser admitida a prova exclusivamente testemunhal, como dispõe o
artigo 55, § 3º, da Lei 8.213/91 e já sumulado pelo Superior Tribunal de Justiça através do
verbete 149: “A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade
rurícola, para efeito de obtenção de benefício previdenciário”.
Quando se fala que a comprovação do efetivo exercício da atividade rural far-se-á,
pelo menos, com base em “início de prova material”, tem-se em vista que a própria Lei dos
Benefícios prevê no artigo 106 alguns documentos, os quais, por estarem enumeradas em
lei, são considerados como “prova plena”, isto é, não carecem de corroboração por prova
testemunhal.
Por esses documentos previstos na legislação serem considerados “provas plenas” e
por essa mesma lei dispor que a comprovação pode ser feita com base em início de prova
material, resta pacificado que “o rol de documentos hábeis à comprovação do exercício de
atividade rural, inscrito no art. 106, parágrafo único, da Lei 8.213/91, é meramente
exemplificativo, e não taxativo, sendo admissíveis, portanto, outros documentos além dos
31
previstos no mencionado dispositivo” (STJ. AgRg no REsp 700298/CE. Rel. Min. José
Arnaldo da Fonseca. DJ 17.10.2005, p. 341).
Essa benesse legal de aceitar o início de prova material se dá “em razão das
dificuldades encontradas pelos trabalhadores do campo para comprovar o seu efetivo
exercício no meio agrícola” (STJ. AgRg no Ag 437826/PI. Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima.
DJ 24.04.2006, p. 433).
Diante desse contexto, se o trabalhador rural possuir algum dos documentos
previstos no artigo 106, da Lei 8.213/91, terá em seu poder uma prova plena do efetivo
exercício de atividade rurícola. Outro que não esteja na referida relação poderá ser
considerada como início de prova material que, para produzir efeito, dependerá de
ratificação por depoimento de testemunha.
Como o próprio texto legal informa, a comprovação da atividade rural pode ser feita
“ainda que de forma descontínua” (arts. 39, I, e 48, § 2º). Isto quer dizer que não há
necessidade de o segurado acostar um ou vários documentos para cada ano do período
equivalente à carência do benefício, pois
“é prescindível que o início de prova material abranja necessariamente o número de
meses idêntico à carência do benefício no período imediatamente anterior ao
requerimento do benefício, dês que a prova testemunhal amplie a sua eficácia
probatória ao tempo da carência, vale dizer, desde que a prova oral permita a sua
vinculação ao tempo de carência” (STJ. AgRg no REsp 939191. Rel. Min. Hamilton
Carvalhido.
DJ
07.04.2008,
p.
1).
Tanto é assim que a Turma Nacional de Uniformização da Jurisprudência dos
Juizados Especiais Federais (TNU) já tornou esse entendimento uníssono ao editar a
Súmula 14: “Para Concessão de aposentadoria rural por idade, não se exige que o início de
prova material corresponda a todo o período equivalente à carência”.
Apesar disso, há de observar que o início de prova material deve ser contemporâneo
ao período que ela pretende comprovar a atividade rural, não podendo, pois, ser aceito um
documento recente com intuito retroativo, a fim de provar fato passado. Por exemplo, uma
declaração emitida hoje, mesmo informando que o segurado trabalha como agricultor num
determinado imóvel há 05 (cinco) anos, isoladamente só poderá vir a ser aceita como início
de prova da atividade nos dias atuais.
É isso que se extrai da Súmula 34 da TNU: “Para fins de comprovação do tempo de
labor rural, o início de prova material deve ser contemporâneo à época dos fatos a provar”.
32
Há de se observar, ainda, a prescindibilidade de que em tais documentos a
informação se refira única e exclusivamente ao segurado, pois ainda poderão ser
considerados como início de prova material se deles se extrair menção de que o segurado,
cônjuge ou familiar próximo (pais, filhos, irmãos, etc.) seja agricultor, lavrador, trabalhador
rural ou outros sinônimos, ou de que tenha endereço na zona rural, por transparecer, pelo
menos a princípio, a agricultura no regime de economia familiar (TNU, processo
2006.72.95.01.8643-8; STJ, REsp nº 425.380/RS, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, DJ
12.05.2003; STJ, AgRg no Ag 493294/SC, Rel. Min. Paulo Gallotti, DJ 19.03.2007, p. 397;
STJ, REsp 608007/PB, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, DJ 07.05.2007, p. 350).
Logo, analisar se determinado documento serve ou não como início razoável de
prova material acaba por ter forte subjetividade por parte do aplicador do Direito, o que
dificulta uma definição e impossibilita uma enumeração numerus clausus. Assim, a
construção jurisprudencial é a sua principal definidora, entendendo no caso concreto se este
ou aquele documento possa servir como tal.
E ao longo dos anos nossos Tribunais já apreciaram diversos processos envolvendo
a discussão sobre a existência ou não de documentos passíveis de serem reconhecidos
como início de prova material, razão pela qual segue abaixo relação de precedentes nos
quais já houve o reconhecimento de tal característica em algum caso concreto, cuja eficácia
dependeu,

como
já
explicado,
de
corroboração
por
testemunhas:
Certidões de casamento, óbito, nascimento ou outro documento público
idôneo: Nesse sentido é a Súmula 06, TNU, bem como precedentes do STJ (AgRg no Ag
695925/SP, Rel. Min. Hélio Quaglia Barbosa, DJ 13.03.2006, p. 394; e AR 1166/SP, Rel.
Min. Hamilton Carvalhido, DJ 26.02.2007, p. 540);

Ficha de Alistamento Militar ou Certificados de Dispensa do Serviço Militar ou
de Dispensa de Incorporação (CDI): Conforme decido pelo STJ no REsp 226290/SP,
Rel. Min. Vicente Leal, DJ 29.11.1999, p. 235; e no AgRg no REsp 939191, Rel. Min.
Hamilton Carvalhido, DJ 07.04.2008, p. 1;

Título eleitoral ou Certidão do TRE: STJ, AgRg no REsp 939191, Rel. Min.
Hamilton Carvalhido, DJ 07.04.2008, p. 1;
33

Carteira de Identidade de Beneficiário do INAMPS, na condição de Trabalhador
Rural: TRF5, AC375093/CE, Rel. Des. Fed. Napoleão Maia Filho, DJ 30/05/2006, p.
1.016;

Participação no Programa Emergencial de Frentes Produtivas de Trabalho:
Decisões do Tribunal Regional Federal da 5ª Região na AC 433529/PB, Rel. Des. Fed.
Francisco Cavalcanti, DJ 14/05/2008, p. 334; e na AC 276235/CE, Rel. Des. Fed. Paulo
Gadelha, DJ 20/09/2002, p. 958;

Inscrição e/ou recebimento do Seguro (ou Garantia) Safra: TRF5, AC 433529/PB,
Rel. Des. Fed. Francisco Cavalcanti, DJ 14/05/2008, p. 334;

Recebimento de benefício decorrente de programa governamental relacionado
à agricultura: Acórdãos do Tribunal Regional Federal da 5ª Região na REOAC
471451/RN, Rel. Des. Fed. Francisco Barros Dias, DJ 17/06/2009, p. 217; e na
APELREEX 2196/CE, Des. Fed. Manoel Erhardt, DJ 26.11.2008, p. 132;

Recebimento de cesta básica decorrente de estiagem: Julgado do Tribunal
Regional Federal da 5ª Região na AC414794/PB, Des. Fed. Edílson Nobre (Substituto),
DJ 13.12.2007, p.715;

Documentos relacionados ao PRONAF – Programa Nacional de Fortalecimento
da Agricultura Familiar: Decisões dos Tribunais Regionais Federais da 3ª Região (AC
994674/MS, Rel. Des. Fed. Marianina Galante, DJ 13.05.2005, p. 975) e da 5ª Região
(AC 428907/SE, Rel. Hélio Sílvio Ourem Campos [Substituto], DJ 14.05.2008, p. 386);

Participação em programa de distribuição de sementes: TRF5, AC 521138/CE,
Rel. Des. Fed. Francisco Barros Dias, 21/06/2011, p. 337;

Participação em programa de aragem (ou corte) de terra: TRF5, AC 483703/CE
[0003342-04.2009.4.05.9999], Rel. Des. Fed. Paulo Roberto de Oliveira Lima,
13/11/2009, p. 125;

Declaração da EMBRAPA ou de Empresa de Assistência e Extensão Rural
do respectivo estado: TRF5, APELREEX17928/PB, Rel. Des. Fed. Manoel Erhardt, DJe 10/08/2011, p. 172; TRF5, AC510642/PB, Rel. Des. Fed. Hélio Sílvio Ourem Campos
(Convocado), DJ-e 03/03/2011, p. 4;

Nota de crédito rural: TRF5, APELREEX 14072/01-PB (DJe 02/03/2011, p. 107);
TRF5, AC 490181-PE (DJe 04/03/2010, p. 165); TRF5, AC 417507-PB (DJe 17/10/2008,
p. 265);

Insumos e implementos agrícolas: TRF5, AC 369910-PB (2005.05.99.002033-2),
Rel. Des. Fed. Ubaldo Ataíde Cavalcante, DJ 14/06/2006, p. 627; TRF5, EmbInf na AC
34
272543-CE (2001.05.00.044349-4), Rel. Des. Fed. Ubaldo Ataíde Cavalcante, DJ
13/10/2004, pág. 748;

Requerimento de matrícula, ficha de aluno, declaração de escola ou da
Secretaria Municipal de saúde informando que o segurado ou seu responsável é
agricultor ou reside na zona rural e/ou colégio localizado rural: TRF5, AC
492213/PB, Rel. Des. Fed. José Maria Lucena, DJ 26/11/2010, p. 310; TRF5,
AC527243/PB, Rel. Des. Fed. Francisco Barros Dias, DJ-e 15/09/2011, p. 237;

Ficha de atendimento médico-ambulatorial ou ortodôntico: Como já apreciado
pelo STJ ao julgar o REsp 504568/PR, Rel. Min. Laurita Vaz, DJ 13.12.2004, p. 406;

Recebimento anterior de benefício como segurado especial ou como
dependente de um: TRF5, APELREEX 0001170-20.2010.4.05.8200/PB, Rel. Des.
Geraldo Apoliano, DJ 17/10/2012;

Comprovante de pagamento efetuado à Confederação dos Trabalhadores na
Agricultura – CONTAG: TRF1, AC 1848-MG (2003.01.99.001848-7), Rel. Des. Fed.
José Amilcar Machado, DJ 09/12/2003, p.18;

Fichas de Inscrição, Declarações e Carteiras de Associado do Sindicato de
Trabalhadores Rurais e de Associação Rural; Contrato de Comodato com o
proprietário do imóvel,
CCIR (Certificado de
Cadastro de
Imóvel
Rural)
eITR (Imposto Territorial Rural) em nome deste, de herdeiro ou do próprio segurado
ou familiar: Julgados do Tribunal Regional Federal da 5ª Região (AC 428907/SE, Rel.
Hélio Sílvio Ourem Campos [Substituto], DJ 14.05.2008, p. 386) e do STJ (AgRg no AgRg
no REsp 642594/CE, Rel. Min. Paulo Gallotti, DJ 02.04.2007, p. 313; AgRg no REsp
1049930/CE, Rel. Min. Paulo Gallotti, DJe 09/12/2008; AgRg no REsp 911224/CE, Rel.
Min. Nilson Naves, DJe 19.12.2008; EREsp 499370/CE, Rel. Min. Laurita Vaz, DJ
14.05.2007, p. 248; e AR 3384/PR, Rel. Min. Laurita Vaz, DJ 11.02.2008, p. 1).
Porém, recentemente em setembro/2013, o STJ houve por abrandar o seu antigo
posicionamento expressado na Súmula 149, para admitir prova exclusivamente testemunhal,
por exemplo, de período anterior ao expressado pela prova documental. A esse respeito,
veja-se a seguinte notícia extraída do site do STJ:
RECURSO REPETITIVO
Primeira Seção admite tempo de serviço rural anterior à prova documental
A Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) aceitou, por maioria de votos,
a possibilidade de reconhecer período de trabalho rural anterior ao documento mais
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antigo juntado como prova material, baseado em prova testemunhal, para contagem
de tempo de serviço para efeitos previdenciários.
A questão foi decidida seguindo o rito dos recursos repetitivos, quando ações com a
mesma tese ficam suspensas nas instâncias ordinárias e no próprio STJ até uma
decisão definitiva, que guiará as demais.
Prova material
O segurado entrou com ação contra o INSS para ter reconhecido tempo de serviço
anterior à certidão de casamento, prova documental mais antiga juntada aos autos,
levando em consideração testemunhos de outros trabalhadores rurais.
O ministro Arnaldo Esteves Lima, relator do processo, reconheceu a controvérsia da
questão citando o artigo 400 do Código de Processo Civil (CPC), que prevê, quando
não há dispositivo legal diverso, a admissibilidade da prova testemunhal; a Lei de
Benefícios, que, salvo por motivo de força maior ou caso fortuito, admite a prova
exclusivamente documental para basear comprovação de tempo de serviço, e a
Súmula 149 do STJ, segundo a qual “a prova exclusivamente testemunhal não basta
à comprovação da atividade rurícola para efeito da obtenção de benefício
previdenciário”.
Porém, segundo o ministro, o STJ “vem reconhecendo o tempo de serviço rural
mediante apresentação de um início de prova material sem delimitar o documento
mais remoto como termo inicial do período a ser computado, contanto que
corroborado por testemunhos idôneos”. Desse modo, é possível reconhecer o tempo
de serviço rural anterior ao documento mais antigo.
Ao analisar a questão específica, Arnaldo Esteves Lima concluiu que as provas
testemunhais juntadas para complementar o início de prova material, tanto do
período anterior ao mais antigo, quanto posterior ao mais recente, eram válidas. Para
ele, mesmo que não haja nenhum documento que comprove a atividade rural anterior
à certidão de casamento do segurado, ocorrido em 1974, os testemunhos colhidos
em juízo sustentam a alegação de que ele trabalha no campo desde 1967.
Ajustes necessários
O ministro entendeu que os documentos apresentados pelo segurado, associados à
prova testemunhal, demonstram o exercício da atividade rural a partir de 1967 até os
idos de 1990. Por isso, restabeleceu a sentença favorável ao segurado, mas
descontou alguns poucos meses do período reconhecido pela decisão do primeiro
grau, pois existem nos autos documentos que evidenciam registros de trabalho
urbano que coincidem com o termo final das atividades como rurícola.
Ainda assim, a concessão de aposentadoria por tempo de serviço é legítima, pois foi
cumprido o tempo de carência exigido pela lei.
O voto do ministro Arnaldo Esteves Lima foi acolhido pela maioria da Primeira Seção.
Os ministros Humberto Martins, Herman Benjamin e Eliana Calmon não concordaram
com o entendimento do relator, mas ficaram vencidos ao fim do julgamento.
III.2. Aspectos controvertidos sobre os Benefícios por Incapacidade: A questão da
Prova Pericial e o início do Benefício por Incapacidade.
Nos benefícios previdenciários por incapacidade, é notória a importância da prova
pericial. Mesmo nos casos em que a discussão não seja a incapacidade em si, a prova
pericial pode ser necessária para aferição da data de início da limitação funcional e, com
isso, da qualidade de segurado.
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Assim, a concessão do benefício por incapacidade, está atrelada a avaliação médicapericial a cargo da Previdência Social, que analisará sob os “critérios de estigma,
deformação, mutilação, deficiência ou outro fator que lhe confira especificidade e gravidade
que mereçam tratamento especializado” conforme lista elaborada pelo Ministério da Saúde e
da Previdência Social.
Portanto, é de suma importância a avaliação do perito médico do INSS, ao
diagnosticar e determinar se a doença, moléstia ou lesão, trará prejuízo ao segurado no
exercício de sua atividade, ou apenas uma irrisória limitação o que não estará sujeito à
concessão do benefício.
Outra atribuição da perícia médica é determinar e fixar o período inicial e final (se for
o caso) em que haverá necessidade do benefício. A definição da data inicial é essencial,
pois além da avaliação da ocorrência do evento e de não estar atrelada a data da perícia,
poderá definir quais as regras aplicáveis e qual legislação que será utilizada, pois, poderão
surgir efeitos ao fixar retrospectivamente a data de início da invalidez, como a perda da
qualidade de segurado, já mencionada e, também, a hipótese de doença pré-existente.
Atualmente, muitos segurados da Previdência Social, ao terem seus requerimentos
administrativos de concessão de benefícios por incapacidade negados, têm recorrido ao
Poder Judiciário, a fim de terem uma nova avaliação médico pericial.
O cerne da questão, agora no âmbito do Poder Judiciário, é a constatação de que há
possibilidade de reverter a decisão administrativa, concebendo nova analise e entendimento
sobre a doença/incapacidade, alterando a avaliação e modificando de forma significativa a
vida do segurado.
Trata-se da perícia médica realizada também pelo Poder Judiciário, que avalia e
determina o grau e a relevância da doença/incapacidade para a concessão do benefício.
Esta possibilidade altera a ideia de que a analise e a comprovação da doença seja
exclusivamente da competência do INSS, havendo possibilidade de avaliar e chegar a outro
diagnóstico, tratando de forma diferente a mesma questão, segundo Marco Serau Junior,
citado por Cristiana Gomes Fraga:
“ ... não se aceita a tese de que a perícia idônea à comprovação da incapacidade
laboral para fins previdenciários seja privativa do INSS. Tal alegação é desprovida de
amparo legal, já que a decisão administrativa não impende que a questão venha a
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ser apreciada judicialmente, a teor do Princípio da inafastabilidade do Controle
Jurisdicional, estabelecido na Constituição Federal, em seu art. 5º XXXV”.
Assim, se o médico perito, nomeado pelo juízo, atestar que o segurado estava doente
quando pediu o benefício ao INSS, ele tem direito aos valores atrasados.
A TNU (Turma Nacional de Uniformização da Jurisprudência), última instância dos
Juizados Especiais Federais, definiu quais os critérios que deverão ser adotados na
concessão do auxílio-doença por decisão judicial. De acordo com a TNU, é o médico perito
escolhido pela Justiça que determina a data de início do direito ao auxílio-doença. Desse
modo, o laudo pericial será decisivo para definir o valor dos atrasados que o segurado irá
receber. Quando o segurado entra com a ação contra INSS, a Justiça determina que seja
feita uma perícia médica. Esse exame servirá de prova da incapacidade e agora, de acordo
com a TNU, também do início do pagamento do benefício. Se o médico determinar que o
segurado já estava doente quando fez o pedido no posto do INSS, o valor acumulado
que o segurado irá receber começa a contar desde a data do pedido administrativo.
Por outro lado, se o laudo feito pelo perito da Justiça não determinar o início da
doença, mas apenas a incapacidade, os atrasados serão calculados a partir da data da
perícia judicial.
A decisão da TNU foi baseada em um processo de auxílio-doença. Porém, a
recomendação também se aplica a outros tipos de ações que pedem a concessão ou o
restabelecimento de algum benefício por incapacidade. Para esses tipos de processos
também são necessárias perícias judiciais para determinar se existe ou não a incapacidade
do segurado. Na decisão da TNU, o juiz Élio Wanderly defendeu que o laudo sirva de
parâmetro para a contagem dos atrasados, mesmo quando não definir o início da doença.
"Não sendo preciso o laudo judicial quanto ao marco inicial da doença, é a data deste
laudo que conta para o restabelecimento do benefício" disse Wanderly.
Em agosto de 2004, a TNU publicou a Súmula 22, que também serve de referência
para as decisões dos juizados, para regulamentar o início da incapacidade. A súmula 22
estabeleceu que o laudo pericial na Justiça pode ser considerado como uma prova para o
reconhecimento do início da doença. Não tem direito, entretanto, se o laudo feito pelo
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médico perito escolhido pela Justiça indicar que não existe nenhuma incapacidade.
- A questão da Incapacidade para o trabalho para fins previdenciários e
impossibilidade de trabalhar.
Tema recorrente no âmbito da Justiça Especializada do Trabalho, mas não por isso
menos polêmico, diz respeito aos reflexos da declaração de aptidão do trabalhador afastado
e em gozo de benefício previdenciário, que, de fato, não possui condições de saúde para
retomar o exercício das suas atividades junto ao empregador, ainda que mediante
readaptação das suas atividades laborais.
A controvérsia tem seu combustível na lacuna legislativa quanto à matéria, que, via
de consequência, tem o condão de permitir uma análise extensiva pelos operadores do
direito, bem como significativa insegurança jurídica. Tais fatos demonstram a relevância dos
estudos, que, cabe frisar, ainda são incipientes.
No cotidiano trabalhista, não é preciso esforço para se deparar com a situação
descrita no exemplo a seguir: O empregado, que em princípio estava afastado da empresa e
no gozo de benefício previdenciário, tem o seu benefício suspenso. Contudo, ao regressar
ao emprego, e ser avaliado pelo médico da empresa, é declarado por este inapto para o
trabalho, razão pela qual não é permitido o regresso às atividades laborais.
Diante da situação posta, em grande parte dos casos, o empregado passa a viver em
estado de miserabilidade ou a depender da solidariedade de terceiros na sua subsistência,
pois não tem mais o gozo do benefício previdenciário, bem como a percepção do salário.
Sendo assim, surgem vários questionamentos, sobretudo, o de que como o
empregador deverá proceder, em caso de o exame médico pericial da Previdência constatar
aptidão para fins previdenciários e o exame médico pericial realizado por médico do trabalho
da empresa constatar impossibilidade de trabalhar?
O primeiro passo para solucionar a dúvida é saber que a declaração de aptidão
conferida pelo Órgão Previdenciário não produz necessariamente efeitos ao contrato de
trabalho, mas, exclusivamente, para fins de concessão ou suspensão do benefício
previdenciário. Em outras palavras, a declaração de aptidão conferida pelo Órgão
Previdenciário presume a aptidão do trabalhador exclusivamente para fins previdenciários.
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Segundo, o término da suspensão do contrato de trabalho somente se opera quando,
após a cessação do benefício previdenciário, é atestada a aptidão do trabalhador no exame
de regresso à empresa. Isto significa dizer que a ausência de gozo do benefício
previdenciário, por si só, não põe termo à suspensão do contrato de trabalho.
Tudo isso porque, é cediço que o exame médico de retorno do empregado após o
afastamento previdenciário é obrigatório, por força do disposto na norma regulamentadora
(NR) nº 7, do Mistério do Trabalho.
E assim, caso constatada a incapacidade do empregado para o labor no exame
realizado pelo médico da empresa, sob pena de agravamento da doença, o empregador não
poderá permitir o retorno do empregado ao trabalho; em contrário, o empregador poderá ser
condenado pelo prejuízo diretamente causado ao trabalhador, bem como pelo Estado.
Sendo assim, surge para o empregador a legitimidade para demandar perante o
INSS, na Justiça Federal, caso seja conferida declaração de aptidão a emprego
efetivamente inapto para o trabalho, em face do manifesto prejuízo que este ato poderá lhe
causar.
Por fim, somente caso comprovada judicialmente, por meio de perícia médica, a
aptidão para o trabalho do empregado, em contrariedade à conclusão do exame de
readmissão realizado pela empresa, é que o empregador poderá ser responsabilizado pelo
adimplemento dos salários devidos ao empregado desde a alta médica conferida pela
Previdenciária Social, bem como pelo ressarcimento de outros danos morais e materiais
decorrentes da conduta abusiva, nos termos do art. 7º, XXVIII, da CF/88, 186, 187 e 927 do
CC.
O conteúdo constante no exame realizado pelo médico do trabalho da empresa,
somente poder ser afastado mediante decisão do Poder Judiciário, sem a qual não há
embasamento jurídico que justifique a condenação do empregador ao adimplemento de
salários devidos ao empregado desde a alta médica conferida pelo INSS até o retorno as
suas atividades.
- A questão da adstrição da Sentença previdenciária e os benefícios por
incapacidade.
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É cediço que hoje, grande parte das demandas propostas nos Juizados Especiais
Federais trata de benefício previdenciário por incapacidade, categoria na qual se encontram
o auxílio-doença, a aposentadoria por invalidez e o auxílio-acidente.
Uma peculiaridade dessas demandas reside na relação entre o pedido e a causa de
pedir, nos verdadeiros limites da demanda, na aplicação do Princípio da Congruência.
A diferença entre o pedido e a causa de pedir é explicada na lição de Ovídio Baptista
da Silva, citado por Frederico Poles Borgonovi:
Cada demanda, portanto, terá as suas ‘questões litigiosas’, e o conjunto delas
formará o que se denomina causa petendi, ou causa de pedir, que, juntamente com o
pedido, irá defini-la. A demanda deve ser identificada pelo respectivo pedido
formulado pelo autor e também pelos ‘fatos e fundamentos jurídicos’ que qualificam e
substanciam o pedido (art. 282, III, CPC). O conjunto dos fatos relevantes e dos
fundamentos jurídicos constituem a causa de pedir (causa petendi). O autor – diz
Giancarlo Giannozzi (Appunti per un corso de diritto prcessuale civile, p.47) – deve
precisar que coisa pretende e por que a pretende.
Quando o autor vem a juízo requerer o benefício previdenciário por incapacidade, o
pedido reside na concessão do benefício, ao passo que a causa de pedir é a incapacidade
laboral, razão pela qual sua delimitação é de difícil aferição pela falta de conhecimentos
técnicos da parte.
A dificuldade na aferição do grau de incapacidade torna necessária a aplicação do
princípio da fungibilidade à tutela requerida, pois foge ao autor o conhecimento do tempo em
que permanecerá incapaz, a origem da enfermidade, a possibilidade de recuperação, razão
pela qual da análise fática da situação, por meio de prova pericial, decorrerá a extensão da
tutela.
Importante destacar que ainda que o Processo Civil tradicional imponha ao autor o
ônus de delimitar a demanda por meio do pedido, imposição advinda do Princípio da
Congruência, a delimitação trazida pela tutela jurisdicional, que apreciará no caso concreto a
perícia técnica, não parece tornar a sentença incongruente. Ao contrário, pois incongruente
seria o pedido formulado pela parte incapacitada para o trabalho, sem o conhecimento
técnico necessário para aferir a sua situação fática, seu estado de saúde, de forma precisa.
Nesse
sentido,
alguns
autores
defendem
a
fungibilidade
das
Ações
Previdenciárias por incapacidade, na qual se inclui, além das ações já mencionadas, a
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que trata de benefício assistencial à pessoa com deficiência incapacitada para o
trabalho.
No que diz respeito à correspondência da decisão judicial aos termos do pedido, a
fungibilidade das Ações por incapacidade tem encontrado força no Princípio Juria Novit
Cúria para reconhecer a legitimidade da sentença que concede benefício por incapacidade
distinto do que pleiteado pelo autor da demanda, fundada na prova técnica superveniente e
outros meios de prova. Quer dizer, a decisão que concede aposentadoria por invalidez
quando o autor pleiteou auxílio-doença ou auxílio-acidente não consubstancia sentença ultra
petita ou extra petita. Também não violaria o Princípio da Adstrição da Sentença a
concessão de auxílio-doença quando pleiteia invalidez na petição inicial e concedido auxíliodoença ou auxílio-acidente. Não encontramos autorização para tal proceder no Código de
Processo Civil. Ali, ao contrário, prevê-se que ‘é defeso ao juiz proferir sentença a favor do
autor, de natureza diversa da pedida, bem como condenar o réu em quantidade superior ou
em objetivo diverso do que lhe foi demandado’(CPC, art. 460). Para uma saída de
conveniência, algumas decisões invocam fundamentação no art. 462 do CPC (‘se, depois da
propositura da ação, algum fato constitutivo, modificativo ou extintivo do direito influir no
julgamento da lide, caberá ao juiz tomá-lo em consideração, de ofício ou a requerimento da
parte, no momento de proferir a sentença’). O caso é que o benefício é concedido na
sentença ainda que a circunstância identificada no laudo pericial preexistisse ao ajuizamento
da ação, de modo que o Processo Civil clássico é adaptado à força para atender a
especificidade de uma demanda previdenciária.
Assim, as imutáveis instituições processuais, como por exemplo, a vedação de
decisões citra, ultra ou extra petita assistem a uma fase em que conceitos caros ao Direito
ganham novos significados, fruto da necessária aproximação entre um direito material muito
mais complexo e a necessidade de um processo mais dinâmico e instrumental. Um
processo que entenda a relação entre o tempo e o direito, entre o direito de ontem e de hoje,
entre o que as partes esperam do Judiciário e o que este tem a oferecer quando proporciona
àquelas o acesso às suas portas, ou através delas.
III.3. A Tutela Antecipada. Omissão na Sentença. Concessão após a Sentença.
No caso das lides previdenciárias, os segurados sofrem duplo prejuízo: deixam de
receber uma verba alimentar que fora suspensa de forma arbitrária pelo INSS, visto que o
ato de cancelamento dos benefícios por incapacidade são, geralmente, eivados de diversos
vícios de legalidade, a começar pela contraditória motivação e, também, pela falta de
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razoabilidade ante a existência de robustos elementos probatórios que indicam a situação
de incapacidade da maioria dos segurados.
Os relatórios, bem como a própria perícia médica judicial, são provas inequívocas nesse
sentido.
A antecipação de tutela, refletindo o pensamento do legislador moderno, possibilita à
parte a satisfação do pedido final no todo ou em parte, divergindo da tutela cautelar
justamente em razão de seu caráter satisfativo, na medida em que "oferece rapidamente a
quem veio ao processo pedir determinada solução para a situação que descreve,
precisamente aquela solução que ele veio ao processo pedir" (FRIEDE, Reis. Tutela
antecipada, tutela específica e tutela cautelar. Belo Horizonte, ed. Del Rey, 1998, p. 47).
Diante destas considerações, exigem-se, nas lides previdenciárias, a presença da
totalidade dos pressupostos exigidos para a concessão de tutela antecipatória, quais sejam,
a prova inequívoca, o fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação e a
reversibilidade do provimento antecipado.
Da Prova Inequívoca da Verossimilhança da Alegação
A presença de tal pressuposto, nas lides previdenciárias, é apontada, geralmente,
pelo teor dos relatórios médicos e perícias médicas, realizadas no âmbito do Poder
Judiciário, os quais acompanham a evolução do quadro de saúde do segurado.
Fundado Receio de Dano Irreparável
O art. 273, do CPC, ao disciplinar a antecipação de tutela geral, alude à efetiva
existência de dois pressupostos alternativos que autorizam a medida: a) a presença de
fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação (periculum in mora), ou b) a
inequívoca caracterização do abuso do direito de defesa do réu (incluindo o manifesto
propósito protelatório do mesmo).
Demonstrada a prova inequívoca do direito alegado pelos segurados, qual seja, a
situação de incapacidade, demonstrada por perícia médica judicial, resta evidente o
periculum in mora decorrente do risco de agravamento do quadro clínico de saúde desses
mesmos segurados.
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Ademais, a manutenção da suspensão do benefício previdenciário representará
prejuízos muito mais significativos para os segurados do que para a Autarquia
Previdenciária, na hipótese de um eventual deferimento da tutela inaudita altera pars
pleiteada.
Nesse sentido, já entendeu a Justiça:
“Outrossim, por se tratar de benefício de caráter alimentar, é visível a natureza
especialíssima que assume o pedido de tutela antecipada, visto que a suspensão
traria como consequência a frustração do próprio direito reclamado.”
(STJ. AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 391.449 – RS. RELATOR : MINISTRO
EDSON VIDIGAL. DJ DATA:21/08/2001)
“Antecipação da tutela – ausência de requisito – Prova – art. 273 do C.P.C. – Como
prova inequívoca do direito do pretendente a obtenção da tutela antecipada deve ser
considerada aquela que lhe asseguraria sentença de mérito favorável, caso fosse a
causa julgada no momento da apreciação da medida. – Tutela antecipatória dos
efeitos da sentença de mérito é providência que tem natureza jurídica de execução
lato sensu, objetivando entregar ao autor, total ou parcialmente, a própria pretensão
deduzida em juízo, ou seus efeitos. Inexistindo periculum in mora e sendo a
antecipação de tutela mais danosa ao réu que sua não concessão ao autor,
caracterizando-se o ‘periculum in mora inverso’, impõe-se o indeferimento da medida
pleiteada”. (A.I nº 223.490-6, Rel. Juiz Lauro Bracarense, TAMG, julgado em
17.10.96).
Em um primeiro momento, a análise do caput, do artigo 273, pode levar o interprete à
errada ideia de que na decisão que concede ou não a tutela antecipada possa haver alguma
discricionariedade por parte do juiz.
O §1º, do artigo 273, demonstra que a decisão do pedido de tutela antecipada não dá
margem para a discricionariedade do juiz. Uma vez preenchidos os requisitos legais para a
concessão da tutela antecipada, o juiz é obrigado a concedê-la e quando não estão
preenchidos os requisitos legais é obrigado a indeferi-la.
O juiz possuiu liberdade apenas para apreciar o preenchimento dos requisitos legais,
devido aos conteúdos vagos do texto legal, não confundindo essa atividade com a de decidir
a tutela antecipada requerida pela parte.
Portanto, se entender que estão preenchidos os requisitos legais, o juiz deve
obrigatoriamente conceder a tutela antecipada e se entender que não estão preenchidos os
requisitos legais deve obrigatoriamente indeferir o pedido. A decisão da tutela antecipada é
totalmente vinculada à fundamentação do juiz no que diz respeito ao preenchimento dos
requisitos legais.
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Também, é sabido que a tutela antecipada pode ser requerida em qualquer fase
processual até que se tenha o trânsito em julgado da decisão.
A concessão da tutela antecipada inaudita altera parte, ou seja, antes da citação do
Réu, poderá ocorrer em situações de extrema urgência, quando a simples espera da citação
do Réu seja suficiente para o perecimento do direito do Autor. E, também, nos casos em que
a ciência do Réu possa motivá-lo a adotar uma conduta que vise frustrar uma futura
antecipação de tutela concedida liminarmente.
Quando concedida a tutela antecipada inaudita altera parte, ou após a citação e
manifestação do Réu, este não perde o interesse em continuar o processo. O Réu terá como
objetivo provar que o pedido do Autor deve ser julgado improcedente, devendo a situação
fática e jurídica do bem retornar ao status quo, ou no caso de irreversibilidade da satisfação
concedida, a condenação do Autor pelas perdas e danos causados ao Réu.
No entanto, nos casos em que não há prejuízo aos interesses do Autor, é prudente
que o juiz aguarde a manifestação do Réu, após a citação, para decidir se concede ou não a
tutela antecipada, valorizando o Princípio do Contraditório tradicional previsto na CF/88.
Existe, também, a possibilidade de a tutela antecipada ser concedida junto com a
tutela definitiva na Sentença de mérito. Isso só é possível, pois, a antecipação da tutela
antecipa apenas os efeitos práticos executivos, ou seja, a tutela só pode ser concedida em
definitivo. Caso a Sentença seja omissa em relação à tutela antecipada, sugere-se a
oposição de Embargos de Declaração.
Dessa forma, a antecipação da tutela concedida na Sentença visa entregar ao Autor
os efeitos práticos da tutela obtida, tendo em vista que a Sentença é sempre recorrível,
através de recurso recebido com efeito suspensivo, ao não ser nos casos excepcionais
previstos no artigo 520, do CPC. Por isso, o recurso, recebido no duplo efeito, interposto
contra a Sentença não gera nenhum efeito prático para o Autor, mas caso a tutela
antecipada tenha sido concedida na mesma sentença, o Autor poderá ter a satisfação
imediata do seu direito.
Ocorre, portanto, que o artigo 520, VII, do CPC, faz referência apenas à Sentença
que confirma os efeitos da tutela antecipada, sendo omisso nos casos da Sentença que
concede a tutela antecipada. Ora, se o julgador antecipa os efeitos da tutela na Sentença é
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porque quer que a sua decisão gere efeitos imediatos, sendo controverso antecipar a tutela
e suspender os efeitos da decisão quando a apelação é interposta .
Nesse sentido, o Superior Tribunal de Justiça, pacificou que:
"PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA.
DEFERIMENTO NA SENTENÇA. POSSIBILIDADE. APELAÇÃO. EFEITOS.
- A antecipação da tutela pode ser deferida quando da prolação da sentença.
Precedentes.
- Ainda que a antecipação da tutela seja deferida na própria sentença, a apelação
contra esta interposta deverá ser recebida apenas no efeito devolutivo quanto à parte
em que foi concedida a tutela.
Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa parte, provido.
(REsp 648886/SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em
25/08/2004, DJ 06/09/2004 p. 162)"
Porém, podem ocorrer situações em que exista interesse do Réu em suspender os
efeitos da Sentença, ou até mesmo casos que o próprio juiz recebe a Apelação no duplo
efeito e é interesse do Autor ter a eficácia imediata da antecipação de tutela.
Nos casos que o Autor pretende a eficácia imediata da Sentença que concede a
tutela antecipada, mas com recurso de Apelação recebido no duplo efeito, a medida que
deverá ser tomada é a interposição de Agravo de Instrumento contra a decisão do juiz que
define os efeitos que a Apelação é recebida, conforme preceitua o caput do artigo 522, do
Código de Processo Civil:
"Art. 522. Das decisões interlocutórias caberá agravo, no prazo de 10 (dez) dias, na
forma retida, salvo quando se tratar de decisão suscetível de causar à parte lesão
grave e de difícil reparação, bem como nos casos de inadmissão da apelação e nos
relativos aos efeitos em que a apelação é recebida, quando será admitida a sua
interposição por instrumento."
A Lei nº 11.280/2006, expressamente, admitiu a concessão de tutela antecipada na
Ação Rescisória. Com isso, não restou dúvidas quanto à competência do Tribunal para a
concessão da tutela antecipada nos casos em que tem a competência originária.
Acrescente-se, ainda, a competência do Tribunal para antecipar a tutela na fase
recursal. O Agravo de Instrumento, por exemplo, traz expressamente no artigo 527, III, do
CPC, a possibilidade de antecipar a tutela recursal, facilidade que ocorre devido à sua
interposição diretamente no juízo ad quem.
A dificuldade prática ocorre nos casos que o Recurso é interposto no tribunal a
quo, como por exemplo, nos casos da Apelação. Alguns doutrinadores entendem ser cabível
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a interposição de mera petição requerendo a concessão da tutela antecipada, mesmo antes
da subida dos autos para o Tribunal ad quem.
O que ocorre, a petição do artigo 558, do CPC, pode ser rejeitada pelo cartório,
devendo a parte ingressar com uma Ação Cautelar Inominada, com o pedido de liminar para
antecipar a tutela.
Nas hipóteses de Recurso Extraordinário e Especial, parte da doutrina entende que
não é possível a concessão da tutela antecipada, pois estes recursos são recebidos apenas
no efeito devolutivo, após longa cognição processual, não cabendo aos Tribunais Superiores
a analise de fatos e provas, conforme estabelece a Súmula 7º, do STJ.
A possibilidade, neste caso, para suspender a eficácia da decisão recorrida é através
de Ação Cautelar.
O Superior Tribunal de Justiça firmou, ainda, entendimento de que não cabe Recurso
Especial para impugnar decisões de instâncias inferiores que tenham como objeto a tutela
antecipada, mas neste caso a vedação não refere à concessão de tutela antecipada em
grau recursal.
III.4. Ordem para Pagamento independentemente de Requisição.
A execução por quantia certa em face da Fazenda Pública procede-se mediante a
expedição de Precatório, tendo em vista o procedimento especial que rege as execuções
contra o Poder Público, em razão da inalienabilidade e impenhorabilidade dos bens públicos.
Há, porém, uma única exceção.
Os créditos definidos em lei como de pequeno valor não se submetem ao regime dos
precatórios, estando previsto no § 3º, do artigo 100 da Constituição Federal.
Vejamos abaixo a previsão legal da requisição de pequeno valor:
“Art. 100,CF: Os pagamentos devidos pelas Fazendas Públicas Federal, Estaduais,
Distrital e Municipais, em virtude de sentença judiciária, far-se-ão exclusivamente na
ordem cronológica de apresentação dos precatórios e à conta dos créditos
respectivos, proibida a designação de casos ou de pessoas nas dotações
orçamentárias e nos créditos adicionais abertos para este fim. (...)
§ 3º O disposto no caput deste artigo relativamente à expedição de precatórios
não se aplica aos pagamentos de obrigações definidas em leis como de
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pequeno valor que as Fazendas referidas devam fazer em virtude de sentença
judicial transitada em julgado.”
O parágrafo 3º, do artigo 100, da Constituição Federal foi incluído pela Emenda
Constitucional 20 de 1998, excetuando do regime dos precatórios as requisições de
pequeno valor.
No ano de 2000 foi promulgada a Emenda Constitucional nº 30 que, alterou o artigo
100 da Constituição Federal e acrescentou o artigo 78, no Ato de Disposições
Constitucionais Transitórias. A referida emenda constitucional autorizou que, cada ente
federativo pudesse estabelecer seu próprio critério de pequeno valor. Trouxe, assim, a
seguinte redação ao parágrafo 4°, do artigo 100, da Constituição Federal: “A lei poderá fixar
valores distintos para o fim previsto no § 3º deste artigo, segundo as diferentes capacidades
das entidades de direito público".
No âmbito federal, a Lei 10.259, promulgada em 12 de julho de 2001, que dispõe
sobre a instituição dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais na esfera da Justiça Federal,
definiu obrigação de pequeno valor, estipulando da seguinte forma:
Art. 17.” Tratando-se de obrigação de pagar quantia certa, após o trânsito em julgado
da decisão, o pagamento será efetuado no prazo de sessenta dias, contados da
entrega da requisição, por ordem do Juiz, à autoridade citada para a causa, na
agência mais próxima da Caixa Econômica Federal ou do Banco do Brasil,
independentemente de precatório.
§ 1o Para os efeitos do § 3o, do art. 100, da Constituição Federal, as obrigações
ali definidas como de pequeno valor, a serem pagas independentemente de
precatório, terão como limite o mesmo valor estabelecido nesta Lei para a
competência do Juizado Especial Federal Cível (art. 3o, caput).
O artigo supratranscrito nos remete ao artigo 3º da mesma lei, que assim dispõe:
Art. 3o. “Compete ao Juizado Especial Federal Cível processar, conciliar e julgar
causas de competência da Justiça Federal até o valor de sessenta salários
mínimos, bem como executar as suas sentenças”.
Fixou-se, portanto, que para a Fazenda Federal, considera-se obrigação de pequeno
valor os créditos de até sessenta salários mínimos.
No âmbito estadual e municipal, a Emenda n° 37 de 2002 acrescentou o artigo 87 ao
Ato de Disposições Constitucionais Transitórias que, estabeleceu, provisoriamente,
parâmetros a serem seguidos, dispondo da seguinte forma:
Art. 87, ADCT. Para efeito do que dispõe o § 3º, do art. 100, da Constituição Federal
e o art. 78 deste Ato das Disposições Constitucionais Transitórias serão considerados
48
de pequeno valor, até que se dê a publicação oficial das respectivas leis definidoras
pelos entes da Federação, observado o disposto no § 4º, do art. 100, da Constituição
Federal, os débitos ou obrigações consignados em precatório judiciário, que tenham
valor igual ou inferior a:
I - quarenta salários-mínimos, perante a Fazenda dos Estados e do Distrito
Federal;
II - trinta salários-mínimos, perante a Fazenda dos Municípios.
Cumpre ressaltar que os valores estabelecidos no artigo 87 do Ato de Disposições
Constitucionais Transitórias vigorarão até que os Estados e Municípios editem leis
definidoras, conforme determina o parágrafo 12, do artigo 97, do ADCT.
Recentemente, o texto constitucional sofreu nova alteração. A Emenda Constitucional
nº 62/2009 novamente alterou o artigo 100 e instituiu regime especial de pagamento de
precatórios pelos Estados, Distrito Federal e Municípios, mantendo a autonomia dos entes
federativos para fixarem seus próprios parâmetros, contudo fez uma ressalva. Os valores
estipulados para fins de requisição de pequeno valor não podem ser inferior ao valor do
maior benefício do regime geral de previdência social.
A emenda constitucional, dessa forma, alterou o parágrafo 4°, do artigo 100, da
Constituição Federal, estabelecendo a seguinte redação:
Art. 100: (...)
§ 4º Para os fins do disposto no § 3º, poderão ser fixados, por leis próprias,
valores distintos às entidades de direito público, segundo as diferentes
capacidades econômicas, sendo o mínimo igual ao valor do maior benefício do
regime geral de previdência social.
Assim, é permitido aos Estados e Municípios fixarem limites distintos para fins de
requisição de pequeno valor, por meio de lei ordinária, devendo ser respeitado o limite
constitucional mínimo, que corresponde ao valor do maior beneficio do regime geral de
previdência social que, hoje, equivale a R$ 4.390,24.
Desse modo, cada ente federativo tem autonomia para definir o que é pequeno valor.
A lei, ao estabelecer limites mínimos, visa evitar a estipulação de valores irrisórios, que
tornassem inaplicável na pratica a requisição de pequeno valor.
Sempre que o valor da execução ultrapassar o que é considerado, pelo ente devedor,
como obrigação de pequeno valor, o pagamento deverá ser feito mediante expedição de
49
precatório. Porém, pode o credor renunciar ao valor do credito que excede o considerado
como obrigação de pequeno valor, para que haja a dispensa de expedição de precatório e
possa proceder a execução através do regime de requisição de pequeno valor.
Frisa-se que não é permitido ao credor o fracionamento do credito com a finalidade
de receber parte do valor pelo regime de requisição de pequeno valor e parte por meio de
expedição de precatório. A vedação foi estabelecida através da Emenda Constitucional
37/2002 e, hoje disposta no §8,° da Constituição Federal, nos seguintes termos:
Art. 100. Os pagamentos devidos pelas Fazendas Públicas Federal, Estaduais,
Distrital e Municipais, em virtude de sentença judiciária, far-se-ão exclusivamente na
ordem cronológica de apresentação dos precatórios e à conta dos créditos
respectivos, proibida a designação de casos ou de pessoas nas dotações
orçamentárias e nos créditos adicionais abertos para este fim. (...)
§ 8º É vedada a expedição de precatórios complementares ou suplementares de
valor pago, bem como o fracionamento, repartição ou quebra do valor da execução
para fins de enquadramento de parcela do total ao que dispõe o § 3º deste artigo.
No entanto, admite-se fracionamento do credito quando, em uma mesma ação, existir
exequentes em litisconsortes e a condenação não for unânime entre eles. Nesse caso,
admite-se o fracionamento e, a quantia que se enquadrar dentro do limite da RPV, será feita
por meio desse procedimento e, as que excederem o valor, serão feitas através da
expedição de precatório.
Admite-se, ainda, o fracionamento do credito para o recebimento dos honorários
advocatícios sucumbenciais. Assim, ainda que o valor da condenação exija a expedição de
precatório, os honorários advocatícios sucumbenciais, desde que não exceda a quantia
estabelecida para requisição de pequeno valor, poderá ser executado através desse
procedimento. Nesses termos, dispõe a Súmula 135, do TJ-RJ, vejamos:
Os honorários advocatícios de sucumbência constituem verba autônoma, de natureza
alimentar, podendo ser objeto de requisição específica e independente de requisitório
correspondente à condenação devida à parte.
A execução de quantia certa em face da Fazenda Pública, feita através do regime de
requisição de pequeno valor não dispensa a necessidade de um futuro processo de
execução, sendo que somente elimina a necessidade de expedição de precatório. Nesse
sentido, traz-se a lição de Leonardo José Carneiro da Cunha, citado por Ana Beatriz Alves
Ferreira Pascoalato, que assim dispõe:
(...), embora não haja previsão legal nesse sentido, parece que devem ser aplicados,
de forma mitigada, os arts. 730 e 731, do CPC, ou seja, a Fazenda Pública será
citada para oferecer embargos. Não oferecidos ou rejeitados os que tenham sido
apresentados, deverá ser expedida ordem de pagamento, ao invés de se expedir um
precatório. Emitida a ordem de pagamento, cabe a fazenda pública creditar o valor
50
respectivo, no prazo assinalado pelo juiz. Não o fazendo, caberá sequestro ou
bloqueio de verbas públicas, no valor suficiente para o cumprimento da ordem.”
(DIDIER JR.,Fredie; CUNHA, Leonardo José Carneiro da; BRAGA, Paula Sarno; e
OLIVEIRA, Rafael. Curso de Direito Processual Civil: Execução. V.5. Salvador:
JusPodivm, 2009, p. 724).
A requisição de pequeno valor será expedida pelo juiz da causa ao representante do
órgão estatal competente, por meio de um oficio requisitório, e o pagamento deverá ser
efetuado em parcela única, dentro do prazo determinado pela lei.
Na esfera federal, o pagamento deve ser feito em até sessenta dias, contados da
entrega da requisição à autoridade competente, nos termos do artigo 17, da Lei 10.259/01.
Independentemente de qual ente figurativo seja executado, o juiz da causa possui
competência para requisitar diretamente ao representante do órgão estatal o pagamento da
quantia devida, o que não ocorre dentro da sistemática dos precatórios, sendo necessário
encaminhar a requisição de pagamento ao presidente do respectivo tribunal, para que este
formule a requisição de pagamento à Fazenda Pública executada.
Caso o ente devedor não cumpra a ordem de pagamento, cabe ao juiz da execução
decretar o sequestro da verba necessária ao pagamento da divida, disponibilizando a
quantia ao credor.
A Emenda Constitucional 20, de 1998, ao criar o procedimento de requisição de
pequeno valor, visou criar um sistema mais simplificado que pudesse satisfazer, com maior
celeridade, as obrigações devidas pelos entes públicos.
51
IV. 1. Coisa Julgada.
Já fora visto que em matéria de lides previdenciárias, mormente as que versem sobre
benefícios por incapacidade, a mesma peculiaridade que permite a aplicação da
fungibilidade, no tocante à adequação do pedido ao melhor benefício aplicável ao caso, a
dificuldade de aferição do grau de extensão da incapacidade, e o tempo em que a situação
permanecerá, acaba, também, por estender seus efeitos para a coisa julgada, criando uma
espécie diferenciada daquela limitada no tempo.
Nesse mesmo sentido, a lição de José Antonio Savaris, citado por Frederico Poles
Borgonovi:
Em tendo o benefício por incapacidade natureza provisória, ganharia fundamentos de
definitividade por força da coisa julgada judicial? Certamente que não. O juiz
previdenciário concede o benefício nos termos em que ele é devido por lei, isto é,
concede definitivamente um benefício provisório. Formula-se outra hipótese: Em
tendo o benefício por incapacidade essa natureza provisória, poderia o INSS, a
qualquer tempo, rever unilateralmente a decisão judicial, fazendo cessar o benefício
por incapacidade, caso identifique a recuperação da capacidade – procedimento que
chegou a ser alcunhado de ‘rescisória administrativa’?.
Interessante notar que a razão de existir da coisa julgada é a sua própria
definitividade, que assegura a pacificação social e o princípio da segurança jurídica
incorporado à atuação do Estado-juiz.
Na doutrina de Luiz Guilherme Marinoni e Sérgio Cruz Arenhart, citados por
Frederico Poles Borgonovi:
A coisa julgada é fenômeno típico e exclusivo da atividade jurisdicional. Somente a
função jurisdicional é que pode conduzir a uma declaração que se torne efetivamente
imutável ou indiscutível, sobrevindo mesmo à sucessão de leis (art. 5º, XXXVI, da
CF). Através do fenômeno da coisa julgada, torna-se indiscutível – seja no mesmo
processo, seja em processos subseqüentes – a decisão proferida pelo órgão
jurisdicional, que passa a ser, para a situação específica, a ‘lei do caso concreto’.
Nesse momento, devem ser analisadas duas ideias do filósofo alemão Niklas
Luhmann. Inicialmente, defende que a diferença entre a atividade legislativa e a atividade
judicial não reside propriamente na abstração do processo legislativo, tampouco na suposta
concretude da decisão judicial, que aplicaria a lei ao caso concreto.
A pertinência dessa discussão estende seus efeitos para a questão da coisa julgada,
pois ao se entender que a atividade judicial não necessariamente aplica a lei para o caso
concreto, mas abstrativiza essa aplicação para um sem número de casos concretos,
aproximaremos a atividade judicial da legislativa, tornando não necessariamente imutável
essa decisão em abstrato proferida pelo Estado-juiz.
(...) O juiz compromete-se com suas decisões mas o legislador não. Se esse
compromisso assume a forma jurídica ou resulta da compreensão do papel do juiz é
secundário, da mesma forma que a questão se o autocomprometimento de um juiz
52
amplia-se ou não aos outros juízes através do ordenamento jurídico. O decisivo é que
o juiz se vê confrontado com situações repetidas, tendo que decidir de forma
repetidamente igual quando se apresentam premissas idênticas. O juiz submete-se
ao princípio da igualdade de forma diferente que o legislador: ele não só tem que
tratar igualmente as mesmas condições, mas também decidir da mesma forma os
casos iguais. Com cada decisão ele se ata a casos futuros, e ele só pode criar um
direito novo na medida em que reconheça e trate novos casos constituindo casos
diferentes. (LUHMANN, Niklas. Sociologia do Direito II. Trad. Gustavo
Bayer. Rio de Janeiro: Edições Tempo Brasileiro, 1985, p. 35)
Explicando melhor a questão, quando o juiz analisa um caso concreto, sua decisão
tenderá à abstrativização do concreto, pois em respeito à coerência que notabiliza o
princípio da segurança jurídica, transporá a lide individual, ainda que leve ao plano coletivo
várias demandas individuais, algo semelhante ao verificado nos direitos individuais
homogêneos, pois a complexidade das relações sociais dificilmente permitiria a
individualização liberal da demanda, vez que o moderno processo atua na macroesfera do
direito coletivo, notadamente indisponível.
A implicação prática da discussão do tema na esfera do Direito Previdenciário é a
própria natureza coletiva da demanda, pois os mecanismos de acesso à justiça, à medida
que possibilitam o ingresso na via judicial, massificam e objetivizam essa discussão de
benefício por incapacidade por meio da padronização das perícias judiciais, vinculadas
diretamente à causa de pedir.
Passemos agora à análise de outra lição de Luhmann, segundo a qual a
complexidade das relações sociais possibilita ao Estado-juiz, no presente, a escolha de uma
dentre várias possibilidades, levando para o futuro uma ausência de escolhas, vez que a
escolha já foi feita.
Assim, quando o juiz utiliza-se da conclusão pericial acerca da incapacidade para
conceder ou negar determinada espécie de benefício por incapacidade, escolhe uma dentre
inúmeras possibilidades presentes, produzindo a imutabilidade futura dessa escolha por
meio da coisa julgada.
A coisa julgada escaparia, assim, da esfera eminentemente jurídica e passaria para a
lógica jurídica, vez que a sua institucionalização pelo direito processual é posterior ao
raciocínio lógico que reconhece a sua existência dentro da esfera de atuação de um
princípio que habita a fronteira entre a política e o direito, a segurança jurídica.
53
A importância do reconhecimento da lógica na sistematização da coisa julgada reside
na possibilidade prática de uma eficácia temporal dependente dos motivos determinantes
nas demandas por incapacidade, vez que a possibilidade escolhida pelo magistrado no caso
concreto, além de tender à abstrativização, decorre logicamente da análise da questão
prejudicial, a causa de pedir, ou seja, a questão da incapacidade para o trabalho.
A especialidade temporal da imutabilidade decorreria da fungibilidade dos pedidos, e
ainda da própria objetivização das demandas, arcando o legislador com as escolhas
políticas de limitar o benefício não pelo tempo, mas sim pela temporalidade da incapacidade.
Explicando melhor, a precariedade do benefício não decorre do tempo, mas sim da
limitação para o trabalho, esta sim podendo ser temporária ou permanente, o que altera o
foco da discussão sobre a eficácia temporal da coisa julgada determinada pela manutenção
da causa de pedir.
Nesse sentido, a coisa julgada não teria uma limitação temporal, mas objetiva, pois
ficaria condicionada à manutenção de uma relação fática, a causa de pedir, havendo na
prática um efeito de prolongamento temporal dos motivos determinantes da decisão.
A decorrência lógica entre a situação fática e o pedido impõe a eficácia da sentença
enquanto perdurar a incapacidade, e não a sua imutabilidade, pois a temporalidade da
situação fática estenderia seus efeitos para uma "possibilidade" lógica de alteração do
dispositivo que transitou em julgado, assim como permitiria a imutabilidade desse
dispositivo, se persistisse imutável a situação.
Importante destacar que a tutela jurisdicional manterá a sua intangibilidade nos casos
de concessão de benefício, enquanto não houver a aferição técnica, ainda que na via
administrativa, da cessação da incapacidade.
Assim, a coisa julgada estaria limitada pela manutenção da situação fática, o
que traria dois efeitos importantes: a coisa julgada persiste no tempo enquanto durar
a incapacidade ou a capacidade para o trabalho; a alteração da situação clínica da
parte permitiria a cessação do benefício, após a comprovação por perícia técnica na
própria esfera administrativa, assim como permitiria o ajuizamento de nova demanda
sem que ocorresse litispendência.
Frise-se, nesse ponto, que a fugacidade da coisa julgada não permite a legitimação
da prática ilegal da chamada "Alta Programada" pela Autarquia Previdenciária. Sobre o tema
54
vide o artigo de Marcel Thiago de Oliveira (Alta Programada: afronta ao princípio da
dignidade da pessoa humana. Jus Navigandi, Teresina, ano 13, n. 2151, 22 maio 2009.
Disponível em http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=12882).
Não seria o caso de afirmar que não existe coisa julgada na lide previdenciária
por incapacidade, mas sim de reconhecer a possibilidade de sua limitação não pelo
tempo, mas ao longo do tempo pela modificação da causa de pedir, algo totalmente
impensado para a escola clássica processual, mas que resguardaria a segurança
jurídica, princípio norteador do instituto da coisa julgada.
Assim, as imutáveis instituições processuais assistem a uma fase em que conceitos
caros ao direito ganham novos significados, fruto da necessária aproximação entre um
direito material muito mais complexo e a necessidade de um processo mais dinâmico e
instrumental. Um processo que entenda a relação entre o tempo e o direito, entre o direito
de ontem e de hoje, entre o que as partes esperam do Judiciário e o que este tem a oferecer
quando proporciona àquelas o acesso às suas portas, ou através delas.
- Ação Rescisória e Solução Pró-mísero
A Ação Rescisória visa à desconstituir o que já passou em julgado, mas que possui
algum vício. Assim, define-se: “[...] a ação rescisória como demanda autônoma de
impugnação de provimentos de mérito transitados em julgado, com eventual rejulgamento
da matéria neles apreciada.” (CÂMARA, 2007, p. 30).
Trata-se de uma demanda e não de Recurso, pois visa a rescindir a coisa julgada e
não anulá-la. Quando a decisão é alvo de anulação é porque ela está em desconformidade
com uma norma jurídica dispositiva, norma esta que pode ser afastada por vontade dos
interessados. No caso da decisão nula, ela vai contra norma jurídica cogente, ou seja,
norma de ordem pública, que não pode ser afastada por mera vontade das partes.
Somente nos casos taxativos do artigo 485, do Código de Processo Civil que surge a
rescisão. Nesses casos, uma vez transitado em julgado as invalidades estão sanadas, pois
a coisa julgada é a solidificação da solução do litígio.
Os pressupostos para a propositura da Ação Rescisória são comuns à qualquer
Ação, além dos taxativamente elencados no artigo 485, do Código de Processo Civil.
55
Para o seu cabimento, deve existir uma Sentença de mérito transitada em julgado e
um dos motivos previstos no artigo 485, do Código de Processo Civil.
Ressalta-se que para a propositura do remédio jurídico em questão há um prazo
decadencial de 2 (dois) anos, contados do trânsito em julgado da Sentença que visa a ser
rescindida.
Pode ser que a Sentença rescindente exaure o Processo, mas pode também ser que
não, assim julga-se a questão pendente. Enquanto a questão pendente não houver
transitado em julgado não há que se falar na propositura de Ação Rescisória. Não importa
se a Sentença já produziu os efeitos, o que importa é o trânsito em julgado. Se não houve o
trânsito em julgado, há que se falar nos recursos próprios.
Do caput, do artigo 485, do Código de Processo Civil percebe-se a ênfase às
Sentenças de mérito. Tal questão, é de fácil compreensão, vez que as Sentenças que não
julgam o mérito, ou seja, terminativas, não fazem coisa julgada sobre a lide, podendo a parte
propor outra Ação, se necessário.
Em matéria de lides previdenciárias, a Ação Rescisória ganha força, também, pela
aplicação do Princípio da Solução Pró-mísero, tendo em vista que o segurado é a parte
hipossuficiente da relação jurídica segurado x seguradora social (Estado).
A seguir, apresentam-se alguns principais julgados (Jurisprudência), que envolvam o
tema da Ação Rescisória, tendo como fundamento a aplicação do Princípio da Solução Prómísero.
A primeira decisão, diz respeito a interpretação que se tem dado ao art. 485, VII, do
CPC (documento novo), envolvendo a aplicação do Princípio da Solução Pró-mísero que, in
casu, refere-se ao rurícola, trabalhador rural e boiás-frias:
Ação Rescisória. Documento Novo. Art. 485, VII, do CPC. Rurícola. Dificuldade
de obtenção na época própria. Solução pro mísero. 1. Segundo entendimento
pretoriano. REsp nº 15.007-RJ documento novo referido no inciso VII do art. 485
do Código de Processo Civil, é, “em princípio, o já existente quando da decisão
rescindenda, ignorado pelo interessado ou de impossível obtenção à época da
utilização no processo, apresentando-se bastante para alterar o resultado da
causa”. 2. No caso específico do rurícola (bóia-fria) em virtude de suas
desiguais e até mesmo desumanas condições de vida e de cultura, autoriza-se
inferir, dados os percalços encontrados na busca, não obstante a existência do
documento quando do ajuizamento da ação, cujo julgado ora se rescinde, a
ausência de desídia ou negligência. Pode-se, ainda, sem margem de erro,
concluir que sua existência era ignorada até mesmo em função das adversas
condições de cultura. 3. Matéria previdenciária. Compreensão ampla. Solução
pro mísero. 4. Rescisória procedente. AR 719-SP.
56
Já essa segunda Jurisprudência diz respeito a uma Decisão que exclui do conceito de
Documento Novo e de sua configuração, portanto, a prolação de um Acórdão proferido a
posteriori, em sentido oposto ao julgado rescindendo, ou seja, exclui-se do conceito de
Documento Novo, o documento, in casu, o Acórdão que é proferido, posteriormente à
decisão rescindenda:
Ação Rescisória. Previdenciário. Violação a literal dispositivo de lei. Posterior
decisão em sentido contrário ao julgado rescindendo. Documento novo.
Inconsistência dos fundamentos jurídicos. A decisão que se pretende rescindir
foi proferida com base na Súmula nº 149 do STJ, ou seja, a prova
exclusivamente testemunhal não se presta a comprovar a atividade rurícola
para efeito de benefício previdenciário. Acórdão proferido a posteriori, em
sentido oposto, não constitui documento novo a ensejar a propositura de ação
rescisória. Improcedência da ação. AR 554-SP.
E, por fim, as terceira e quarta decisões, dizem respeito a não valoração de um
Documento, entendido como início razoável de prova material, cuja apreciação e valoração,
também envolvem a aplicação do Princípio da Solução Pró-mísero que, in casu, refere-se ao
início de prova material da condição de rurícola, trabalhador rural e boiás-frias:
Ação Rescisória. Erro de Fato. Omissão, no julgamento, quanto à valoração da
prova. Configuração da hipótese versada no inc. IX, art. 485, CPC. Não havendo
deliberação judicial sobre fato ou valoração desse fato que ocorrera, relevante
para o desate da controvérsia, tem cabida a rescisória porquanto presumível
que o acórdão rescindendo não teria, com base na Súmula nº 149 do STJ,
repelido a comprovação da condição de rurícola, por lastrear-se
exclusivamente em prova testemunhal, eis que presente, no caso, prova
material. Ação que se julga procedente. AR 736-SP.
Ação Rescisória. Erro de Fato. Previdenciário. Início de prova documental
desprezado pelos arestos da Corte a quo e rescindendo, que se fixaram na
valoração de prova testemunhal exclusivamente. Inaplicabilidade da Súmula nº
149, STJ. Erro capaz, por si só, de assegurar pronunciamento favorável à parte
autora, vencida na decisão sob reexame. Natureza rudimentar da atividade
rurícola. Características peculiares que não podem ser relegadas tendo
presente disposto no art. 5º da Lei de Introdução ao Código Civil.Procedência
da ação rescisória. AR 861-SP
- A Ação Rescisória por Alteração Jurisprudencial
Outra problemática em torno do tema Ação Rescisória reside no fato de se a
alteração na jurisprudência configuraria, por via indireta, a violação literal ao dispositivo de
lei.
Contudo, o entendimento que tem prevalecido é o de que a simples
alteração/mudança de interpretação não rende ensejo à violação literal do dispositivo de lei,
mormente em se tratando de interpretação controvertida nos Tribunais. È o que traduz o
verbete sumular 343, do STF
57
"Não cabe ação rescisória por ofensa a literal disposição de lei, quando a
decisão rescindenda se tiver baseado em texto de interpretação controvertida
nos tribunais."
A esse respeito veja-se a seguinte Decisão, na íntegra, verbis:
RELATORA : MINISTRA MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA
REVISOR : MINISTRO NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO
AUTOR : INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
ADVOGADO : CLÁUDIO RENATO DO CANTO FARAG E OUTRO(S)
RÉU : ELZA PARO
ADVOGADO : FÁBIO NOGUEIRA LEMES
EMENTA
AÇÃO RESCISÓRIA. PREVIDENCIÁRIO. VIOLAÇÃO DE LEI FEDERAL.
INEXISTÊNCIA. MUDANÇA DE ENTENDIMENTO DO STF.
INTERPRETAÇÃO ACERCA DA EFICÁCIA DO ART. 202, DA CONSTITUIÇÃO
FEDERAL. SÚMULA 343 DO STF
1 -A simples mudança de interpretação não rende ensejo à violação literal dos
dispositivos legais invocados (art. 202, da Constituição e art. 144, da Lei nº 8.213/91),
e, por isso mesmo, não autoriza a desconstituição da coisa julgada, pilar da
segurança jurídica.
2 -Ação rescisória julgada improcedente
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima
indicadas,acordam os Ministros da Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça: A
Seção, por unanimidade, julgou improcedente a ação rescisória, nos termos do voto
da Sra. Ministra Relatora. Votaram com a Relatora os Srs. Ministros Napoleão Nunes
Maia Filho
(Revisor), Jorge Mussi, Og Fernandes, Celso Limongi (Desembargador convocado do
TJ/SP), Haroldo Rodrigues (Desembargador convocado do TJ/CE), Felix Fischer e
Arnaldo Esteves Lima.
Ausente, ocasionalmente, o Sr. Ministro Nilson Naves.
Presidiu o julgamento a Sra. Ministra Laurita Vaz.
Brasília, 25 de novembro de 2009(Data do Julgamento)
Ministra Maria Thereza de Assis Moura
Relatora
AÇÃO RESCISÓRIA Nº 819 - SP (1998/0072908-9)
RELATORA : MINISTRA MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA
AUTOR : INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
ADVOGADO : CLÁUDIO RENATO DO CANTO FARAG E OUTRO(S)
RÉU : ELZA PARO
ADVOGADO : FÁBIO NOGUEIRA LEMES
RELATÓRIO
MINISTRA MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA (Relatora):
Trata-se de ação rescisória ajuizada pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO
SOCIAL – INSS, com fundamento no art. 485, inciso V, do Código de Processo Civil,
objetivando desconstituir acórdão proferido pela Quinta Turma deste Superior
Tribunal, nos autos do Recurso Especial 105.995/SP, que restou assim ementado (fl.
32):
58
"PREVIDENCIÁRIO -REVISIONAL DE BENEFÍCIOS -CORREÇÃO MONETÁRIA SÚMULA 71, TFR -LEI 6.899/81 SÚMULA 148, STJ -TERMO INICIAL -CONSTITUIÇÃO FEDERAL, ART. 202 -LEI N°
8.213/91 -VERBA HONORÁRIA -PERCENTUAL.
1. A Súmula 71, TFR, não é mais aplicável, como critério de correção monetária, nos
débitos previdenciários vencidos após a vigência da Lei n° 6.899/81. Súmula 148,
STJ.
2. Em face do caráter alimentar do benefício previdenciário, a correção monetária
deve incidir desde quando as parcelas em atraso passaram a ser devidas, mesmo
que em período anterior ao ajuizamento da ação.
3. O art. 202 da Constituição Federal é auto-aplicável, devendo a renda mensal inicial
do aposentado ser calculada com base na média dos últimos 36 salários de
contribuição, corrigidos mês a mês. Precedentes.
4. A reapreciação do percentual fixado a título de verba honorária encontra-se
vedada na via especial, por envolver reexame de matéria-fática. Súmula 7/STJ.
5. Recurso parcialmente conhecido e, nessa parte, parcialmenteprovido."
Em sua exordial (fls. 02/08), alega a autarquia violação aos arts. 202, caput, da
Constituição Federal e 144, parágrafo único, da Lei n° 8.213/91. Sustenta, para tanto,
que não é devido à autora o pagamento de quaisquer diferenças decorrentes da
revisão da renda mensal inicial referente ao período de outubro de 1988 a maio de
1992.
A parte ré, regularmente intimada, oferece contestação (fls. 48/50), aduzindo que a
autarquia deixou de cumprir dispositivo constitucional calculado sobre a média dos
trinta e seis últimos salários de contribuição. Ressalta, ainda, que as alegações
apontadas pela autarquia consistem em mera irresignação com o desfecho da lide.
Saneado o processo (fl. 52) e sem produção de provas, a parte autora apresentou
razões finais, pugnando pela procedência da ação (fls. 57/59). A SubprocuradoriaGeral da República, em seu parecer (fls. 81/85), entendeu que a aplicabilidade
imediata do art. 202 da Constituição Federal não constitui ofensa à literal disposição
de lei, opinando pela improcedência da ação.
É o relatório.
AÇÃO RESCISÓRIA Nº 819 - SP (1998/0072908-9)
EMENTA
AÇÃO RESCISÓRIA. PREVIDENCIÁRIO. VIOLAÇÃO DE LEI FEDERAL.
INEXISTÊNCIA. MUDANÇA DE ENTENDIMENTO DO STF.
INTERPRETAÇÃO ACERCA DA EFICÁCIA DO ART. 202, DA CONSTITUIÇÃO
FEDERAL. SÚMULA 343 DO STF
1 -A simples mudança de interpretação não rende ensejo à violação literal dos
dispositivos legais invocados (art. 202, da Constituição e art. 144, da Lei nº 8.213/91),
e, por isso mesmo, não autoriza a desconstituição da coisa julgada, pilar da
segurança jurídica.
2 -Ação rescisória julgada improcedente
VOTO
MINISTRA MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA (Relatora):
Para fundamentar a presente ação rescisória, o INSS alegou que, quando do
julgamento do REsp 105.995/SP, esta Corte teria incorrido em violação a literal
disposição de lei, ao reconhecer a auto-aplicabilidade do art. 202 da Constituição.
59
Com isso, ficou mantido o entendimento de que a renda mensal do benefício de
aposentadoria deveria ser calculada com base na média dos últimos 36 salários de
contribuição, corrigidos mês a mês.
Em verdade, à época do julgamento do referido recurso especial, em novembro de
1996, havia uma significativa controvérsia a respeito da eficácia plena e
aplicabilidade imediata do art. 202 da Constituição. Inicialmente, tanto o STJ quanto o
STF privilegiaram a auto-aplicabilidade do referido dispositivo. Entretanto, a matéria
foi
pacificada em sentido contrário, quando do julgamento, em sessão plenária, do
Recurso Extraordinário nº 196.456-5/RS, de relatoria do Ministro Maurício Corrêa (DJ
07-11-97), assim ementado:
"CONSTITUCIONAL. PREVIDENCIÁRIO. AUTO-APLICABILIDADE DO ART. 202 DA
CONSTITUIÇÃO FEDERAL. ALEGAÇÃO IMPROCEDENTE. SUPERVENIÊNCIA
DAS LEIS 8.212/91 E 8.213/91. INTEGRAÇÃO LEGISLATIVA. RECURSO
EXTRAORDINÁRIO NÃO CONHECIDO.
1-O art. 202, "caput", da Constituição Federal não é auto-aplicável, por necessitar de
integração legislativa, para complementar e conferir eficácia ao direito nele inserto.
2 -Superveniência das Leis 8.212/91 e 8.213/91, normas sem as quais a vontade da
Lei Maior não se cumpria. Recurso Extraordinário não conhecido."
Destarte, quando foi proferido o acórdão que se busca rescindir, a matéria ainda não
tinha sido pacificada pelo Supremo Tribunal Federal. Não foi configurada, portanto, a
alegada violação a literal texto de lei, mas sim a adoção de uma dentre as possíveis
interpretações da matéria. A simples mudança de interpretação não rende ensejo
à violação dos dispositivos invocados e, por isso, não autoriza a desconstituição da
coisa julgada, pilar da segurança jurídica. Estando o julgado rescindendo assentado
na interpretação que prevalecia à época do julgamento, é irrelevante que,
posteriormente, tenha se passado a decidir o tema de forma diversa, incidindo,
assim, o enunciado de nº 343 da Súmula do Supremo Tribunal Federal:
"Não cabe ação rescisória por ofensa a literal disposição de lei, quando a decisão
rescindenda se tiver baseado em texto de interpretação controvertida nos tribunais."
Cumpre salientar que a matéria também já foi objeto de análise pela Terceira Seção,
no julgamento da AR 826/CE (DJ 28/02/00), relatado pelo Ministro Fernando
Gonçalves, em acórdão assim ementado:
"PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO RESCISÓRIA. VIOLAÇÃO DE LEI FEDERAL.
INEXISTÊNCIA. MUDANÇA DE ENTENDIMENTO DO
STF. INTERPRETAÇÃO ACERCA DA EFICÁCIA DO ART. 202, DA CONSTITUIÇÃO
FEDERAL.
1 -A simples mudança de interpretação não rende ensejo à violação literal dos
dispositivos invocados (art. 202, da CF e art. 144, da Lei nº 8.213/91), e, por isso
mesmo, não autoriza a desconstituição da coisa julgada, pilar da segurança jurídica.
É que, se a própria Suprema Corte já adotou a tese da auto-aplicabilidade, mudando,
posteriormente, para a não auto-aplicabilidade, exsurge que o norte seguido pelo
acórdão rescindendo
não foi tão absurdo assim. Aliás, o julgado alvejado louvou-se, na época, no
entendimento que, até então, era adotado pelo STF (fls. 48). Precedentes desta
Corte.
2 -Pedido julgado improcedente."
Diante do exposto, julgo improcedente o pedido formulado nesta ação rescisória.
Condeno o INSS ao pagamento dos honorários advocatícios, estes fixados em R$
5.000,00, nos termos do art. 20, § 4º do Código de Processo Civil.
É como voto.
AÇÃO RESCISÓRIA Nº 819 -SP (1998/0072908-9)
60
RELATORA : MINISTRA MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA
REVISOR : MINISTRO NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO
AUTOR : INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL -INSS
ADVOGADO : CLÁUDIO RENATO DO CANTO FARAG E OUTRO(S)
RÉU : ELZA PARO
ADVOGADO : FÁBIO NOGUEIRA LEMES
VOTO-REVISÃO
(NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO)
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO RESCISÓRIA. AUTOAPLICABILIDADE DO ART. 202 DA CF. MATÉRIA
CONTROVERTIDA À ÉPOCA DA PROLAÇÃO DO ACÓRDÃO RESCINDENDO.
INCIDÊNCIA DA SÚMULA 343/STF. VIOLAÇÃO DE
LITERAL DISPOSITIVO LEGAL NÃO CONFIGURADA. PARECER MINISTERIAL
PELA IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO FORMULADO NA
PRESENTE RESCISÓRIA. AÇÃO RESCISÓRIA IMPROCEDENTE.
1. O tema relativo à auto-aplicabilidade ou não do art. 202 da Constituição Federal
não se encontrava pacificado à época da prolação do acórdão rescindendo, situação
que repele a Ação Rescisória por atrair a incidência da Súmula 343 do STF.
2. Ação Rescisória improcedente.
1. Trata-se de Ação Rescisória proposta pelo INSS com fundamento no art. 485, V do
CPC, visando rescindir Acórdão desta Corte, proferido no julgamento do REsp.
105.955/SP, relatado pelo Ministro FELIX FISCHER, assim
ementado:
PREVIDENCIÁRIO -REVISIONAL DE BENEFICIOS -CORREÇÃO MONETÁRIA SUM. 71, TFR -LEI 6.899/1981 -SUM. 148, STJ -TERMO
INICIAL -RENDA MENSAL INICIAL - CONSTITUIÇÃO FEDERAL, ART. 202 -LEI
8.213/1991 -VERBA HONORARIA -PERCENTUAL.
1. A Sum. 71, TFR, não e mais aplicável, como critério de correção monetária, nos
débitos previdenciários vencidos após a vigência da lei 6.899/1991. Sum. 148, STJ.
2. Em face do caráter alimentar do beneficio previdenciário, a correção monetária
deve incidir desde quando as parcelas em atraso passaram a ser devidas, mesmo
que em período anterior ao ajuizamento da ação.
3. O art. 202 da Constituição Federal e auto-aplicável, devendo a renda mensal inicial
do aposentado ser calculada com base na media dos últimos 36 salários de
contribuição, corrigidos mês a mês. precedentes.
4. A reapreciação do percentual fixado a titulo de verba honoraria encontra-se vedada
a via especial, por envolver reexame de matéria fática. Sum. 7/STJ.
5. Recurso parcialmente conhecido e, nessa parte, parcialmente provido.
2. Sustenta a Autarquia Previdenciária que o acórdão rescindendo, ao considerar que
o art. 202 da CF era auto-aplicável, violou esse dispositivo constitucional, que,
conforme já decidiu o egrégio STF, não é
auto-aplicável. Além disso, alega violação ao art. 144, parágrafo único da Lei
8.213/91, que consigna que não será devido o pagamento de quaisquer diferenças
decorrentes de aplicação desse artigo referentes às competências de outubro
de 1988 a maio de 1992.
3. Em sua contestação, aduz a segurada que as alegações apresentadas como
fundamento desta ação rescisória, pelo autor, revelam mera irresignação com o
desfecho da lide, por sinal, sem a mínima razão jurídica, no tema
debatido e analisado (fls. 50).
61
4. Instados a se manifestar, apenas o INSS apresentou razões finais, pugnando pela
procedência do pedido.
5. O Ministério Público Federal, em parecer da lavra da eminente SubprocuradoraGeral da República MARILENE DA COSTA FERREIRA, opina pela improcedência da
Rescisória.
6. É o relatório. Decido.
7. Inicialmente, constata-se que a presente Ação Rescisória foi ajuizada dentro do
biênio legal.
8. Quanto ao mais, verifica-se que o tema relativo à auto-aplicabilidade ou não do art.
202 da Constituição Federal não se encontrava pacificado à época da prolação do
acórdão rescindendo, situação que repele a Ação
Rescisória por atrair a incidência da Súmula 343 do STF, que ora se transcreve:
Súmula 343 -Não cabe Ação Rescisória por ofensa a literal disposição de lei, quando
a decisão rescindenda se tiver baseado em texto legal de interpretação controvertida
nos tribunais.
9. Idêntica situação já foi objeto de análise desta Corte, conforme se depreende dos
seguintes julgados:
PREVIDENCIÁRIO -AÇÃO RESCISÓRIA - AUTO-APLICABILIDADE DO ART. 202
DA CF/88 -MATÉRIA CONTROVERTIDA À ÉPOCA DO JULGAMENTO DO
RECURSO ESPECIAL -MUDANÇA DE ENTENDIMENTO DO STF -SÚMULA
343/STF -INCIDÊNCIA -VIOLAÇÃO A TEXTO LITERAL DE LEI -INEXISTÊNCIA PEDIDO IMPROCEDENTE.
1 -À época do julgamento do Recurso Especial controvertiam-se os Tribunais pátrios
acerca da eficácia plena e aplicabilidade imediata do art. 202 da CF/88. Os
entendimentos iniciais deste STJ e do próprio STF
privilegiavam a auto-aplicabilidade de aludido dispositivo. A matéria somente restou
pacificada pelo Pleno do Excelso Pretório, e em sentido contrário, após a prolação do
v. acórdão rescindendo.
2 -Inexistência de violação a texto literal de lei; ao revés, cuidou-se apenas da eleição
de uma dentre as possíveis interpretações da matéria, conduta perfeitamente lídima,
sendo irrelevante posterior alteração de
entendimentos doutrinário e jurisprudencial, devendo prevalecer a segurança jurídica
representada pelo respeito à coisa julgada. Incidência da Súmula 343/STF.
3 -Ação Rescisória julgada improcedente .
4 - Honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor da causa, nos termos do
art. 20, § 4o., do CPC, devidos pelo autor. Custas ex lege.
Depósito inicial indevido (Súmula 175/STJ) (AR 461/CE, 3S, Rel. Min. JORGE
SCARTEZZINI, DJU 4.10.2004, p. 203).
PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO RESCISÓRIA. VIOLAÇÃO DE LEI FEDERAL.
INEXISTÊNCIA. MUDANÇA DE ENTENDIMENTO DO STF.
INTERPRETAÇÃO ACERCA DA EFICÁCIA DO ART. 202, DA CONSTITUIÇÃO
FEDERAL.
1 -A simples mudança de interpretação, não rende ensejo à violação literal dos
dispositivos invocados (art. 202, da CF e art. 144, da Lei nº 8.213/91), e, por isso
mesmo, não autoriza a desconstituição da coisa julgada, pilar da segurança jurídica.
É que, se a própria Suprema Corte já adotou a tese da auto-aplicabilidade, mudando,
posteriormente, para a não auto-aplicabilidade, exsurge que o norte seguido pelo
acórdão rescindendo
não foi tão absurdo assim. Aliás, o julgado alvejado louvou-se, na época, no
entendimento que, até então, era adotado pelo STF (fls. 48). Precedentes desta
Corte.
62
2 -Pedido julgado improcedente (AR 826/CE, 3S, Rel. Min. FERNADO GONÇALVES,
DJU 28.2.2000, p. 34).
10. Diante dessas considerações, acompanho o voto da eminente Ministra Relatora e
julgo improcedente o pedido formulado na presente Ação Rescisória. É como voto.
CERTIDÃO DE JULGAMENTO
TERCEIRA SEÇÃO
Número Registro: 1998/0072908-9 AR 819 / SP
Número Origem: 96005476
PAUTA: 11/11/2009 JULGADO: 25/11/2009
Relatora
Exma. Sra. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA
Revisor
Exmo. Sr. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO
Presidenta da Sessão
Exma. Sra. Ministra LAURITA VAZ
Subprocurador-Geral da República
Exmo. Sr. Dr. BRASILINO PEREIRA DOS SANTOS
Secretária
Bela. VANILDE S. M. TRIGO DE LOUREIRO
AUTUAÇÃO
AUTOR : INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL -INSS
ADVOGADO : CLÁUDIO RENATO DO CANTO FARAG E OUTRO(S)
RÉU : ELZA PARO
ADVOGADO : FÁBIO NOGUEIRA LEMES
ASSUNTO: DIREITO PREVIDENCIÁRIO -RMI -Renda Mensal Inicial, Reajustes e
Revisões Específicas
CERTIDÃO
Certifico que a egrégia TERCEIRA SEÇÃO, ao apreciar o processo em epígrafe na
sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A Seção, por unanimidade, julgou improcedente a ação rescisória, nos termos do
voto da Sra. Ministra Relatora.
Votaram com a Relatora os Srs. Ministros Napoleão Nunes Maia Filho (Revisor),
Jorge Mussi, Og Fernandes, Celso Limongi (Desembargador convocado do TJ/SP),
Haroldo Rodrigues (Desembargador convocado do TJ/CE), Felix Fischer e Arnaldo
Esteves Lima.
Ausente, ocasionalmente, o Sr. Ministro Nilson Naves. Presidiu o julgamento a Sra.
Ministra Laurita Vaz.
Brasília, 25 de novembro de 2009
VANILDE S. M. TRIGO DE LOUREIRO
Secretária
Contudo, o entendimento fixado na Súmula 343/Supremo Tribunal Federal vem
sofrendo grande flexibilização por parte da própria jurisprudência do Supremo Tribunal
Federal,
principalmente,
quando
se
tratar
de
interpretação
relativa
às
normas
constitucionais.
63
O Supremo Tribunal Federal vem relativizando a aplicação da Súmula nº. 343 quando
a violação é em desfavor de normas constitucionais, em razão do princípio da Supremacia
da Constituição. Para o citado tribunal, nenhum órgão julgador pode deixar de conferir
aplicabilidade às normas constitucionais, no exercício da atividade jurisdicional.
O Judiciário deve zelar, ainda sob a ótica do Supremo Tribunal Federal, pela máxima
observância dos preceitos existentes na Constituição Federal. Para o Supremo Tribunal
Federal, somente há a proeminência da Constituição, se a interpretação adotada pelos
tribunais for sempre a melhor, reputando-se como não respeitados, plenamente, os
princípios da Carta Magna, quando se adota interpretação razoável que não for a mais
precisa.
O entendimento do Pretório Excelso é acompanhado pelo Superior Tribunal de
Justiça. Ambos os tribunais estão admitindo, majoritariamente, o cabimento da ação
rescisória em face de julgados que, ao apreciarem matéria constitucional, tenham adotado
interpretação que não fosse a melhor a ser aplicada ao texto constitucional, ainda que o
tema à época da decisão comportasse divergências jurisprudenciais e que tivesse havido a
fixação do entendimento da Corte Suprema somente após o trânsito em julgado da decisão
rescindenda.
Nesse sentido, eis o seguinte julgado do Superior Tribunal de Justiça:
“PROCESSO CIVIL E TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA SOBRE
PROVENTOS DE INATIVIDADE DE SERVIDOR PÚBLICO ESTADUAL. LEI
ESTADUAL Nº 7.672/82, ART. 42, "O". INCONSTITUCIONALIDADE. AÇÃO
RESCISÓRIA. VIOLAÇÃO A LITERAL DISPOSIÇÃO DE LEI. MATÉRIA
CONSTITUCIONAL. AFASTAMENTO DA SÚMULA 343/STF. POSICIONAMENTO
RECENTE DA PRIMEIRA SEÇÃO DO STJ. FUNDAMENTOS DO ACÓRDÃO
RECORRIDO. POSSIBILIDADE. ORIENTAÇÃO DA CORTE ESPECIAL (RESP
476.665/SP). 1. O enunciado da Súmula 343 não é aplicável quando a questão verse
sobre "texto" constitucional, hipótese em que cabível ação rescisória mesmo diante
da existência de controvérsia interpretativa nos Tribunais, em face da "supremacia"
da Constituição, cuja interpretação "não pode ficar sujeita à perplexidade", e da
especial gravidade de que se reveste o descumprimento das normas constitucionais,
mormente o "vício" da inconstitucionalidade das leis. (Precedente: ERESP
608122/RJ) "Não cabe ação rescisória por ofensa a literal disposição de lei, quando a
decisão rescindenda se tiver baseado em texto legal de interpretação controvertida
nos tribunais." (Súmula 343 do STF).” (STJ, Primeira Turma, Recurso Especial
896728/RS, Rel. Min. Luiz Fux, DJ. 16/10/2008).
Ainda sobre o tema, citamos a seguinte decisão do Supremo Tribunal Federal:
“AÇÃO RESCISÓRIA. VIOLAÇÃO À LITERAL DISPOSIÇÃO DE LEI. ART. 485, V,
DO CPC. FINSOCIAL. EMPRESA EXCLUSIVAMENTE PRESTADORA DE
SERVIÇOS. MAJORAÇÕES DE ALÍQUOTA DECLARADAS INCONSTITUCIONAIS
NO JULGAMENTO DO RE 150.764. ACÓRDÃO RESCINDENDO QUE AFIRMOU O
ENQUADRAMENTO DA EMPRESA COMO EXCLUSIVAMENTE PRESTADORA DE
SERVIÇOS, MAS EXTIRPOU AS REFERIDAS MAJORAÇÕES COM BASE EM
PRECEDENTE APLICÁVEL ÀS EMPRESAS COMERCIAIS E INDUSTRIAIS. ART.
64
56 DO ADCT. VIOLAÇÃO. 1. Preliminares de decadência por decurso do biênio legal
e citação extemporânea. Afastamento diante de precedentes deste Tribunal. 2.
Preliminar de descabimento da ação por incidência da Súmula STF 343. Argumento
rejeitado ante a jurisprudência desta Corte que elide a incidência da súmula quando
envolvida discussão de matéria constitucional. 3. Este Supremo Tribunal, ao julgar o
RE 187.436, rel. Min. Marco Aurélio, declarou a constitucionalidade das majorações
de alíquotas do Finsocial (art. 7º da Lei 7.787/89, art. 1º da Lei 7.894/89 e art. 1º da
Lei 8.147/90) no que envolvidas empresas exclusivamente prestadoras de serviços.
4. Decisão rescindenda que destoa da orientação firmada nesse precedente,
afrontando os arts. 195 da CF e 56 do ADCT, conforme a interpretação firmada no
mesmo julgado. 5. Ação rescisória julgada procedente”. (STF, Ação Rescisória
1409/SC, Pleno, 26/03/2009,Rel. Min. Ellen Gracie)
A limitação que se impõe, nesses casos, em regra, é que a ação rescisória seja
proposta em até 2 (dois) anos do trânsito em julgado da decisão. No entanto, há
doutrinadores, a exemplo de Humberto Theodoro Júnior, que, de lege ferenda, defendem
não haver limite temporal quando se tratar de violação às normas constitucionais. Já outra
corrente doutrinária entende que o prazo de 2 anos para ajuizamento da ação rescisória
deveria ter início a partir do trânsito em julgado da decisão que firmasse o posicionamento
do Supremo Tribunal Federal em determinado sentido.
O Supremo Tribunal Federal, com a relativização da aplicação da sua Súmula 343,
tem associado a melhor interpretação da Constituição Federal à sua interpretação conferida
à norma constitucional. Assim, quando houvesse, no julgamento de matérias constitucionais,
desrespeito ou inobservância ao entendimento fixado pelo Supremo Tribunal Federal
(mesmo que o entendimento tivesse sido fixado posteriormente à decisão), teria havido
violação literal de disposição de lei. Por outro lado, quando fosse observado o entendimento
do Supremo Tribunal Federal, não seria cabível a rescisória com base no art. 485, V, do
Código de Processo Civil.
Nesse sentido, é o entendimento de Fredie Didier Jr., para quem:
“a violação a uma norma constitucional é bem mais grave do que a ofensa a um
dispositivo de lei infraconstitucional; violar a Constituição equivale a atentar contra a
base do sistema normativo. Cumpre, diante disso, preservar a supremacia da
Constituição e de resto, garantir a autoridade das decisões do Supremo Tribunal
Federal, enquanto guardião do texto constitucional.”
65
V. Juizados Especiais
- Questões Processuais Relevantes:
1) Em atenção ao caráter alimentar do benefício previdenciário, a Constituição admite
a propositura de Ação em face do INSS em qualquer comarca do Brasil, sendo esta
competência meramente relativa, podendo, ainda, o segurado ingressar na Justiça
Federal (Súmula nº 689, do STF e Súmula nº 8, do TRF da 4ª Região);
2) A Justiça Federal é competente para o julgamento das Ações em face do INSS. A
Constituição, entretanto, prevê uma hipótese de delegação de competência para a
Justiça Estadual nas comarcas que não forem sede de Juízo Federal (art. 109, § 3º, da
CR/88). A delegação restringe-se à primeira instância, ou seja, os recursos devem ser
endereçados ao Tribunal Regional Federal pertinente (art. 109, § 4º, da CR/88). Já, na
hipótese de mandado de segurança em face do Gerente Executivo do INSS, a
competência sempre será da Justiça Federal (Súmula nº 216, do extinto TFR);
3) Nos litígios envolvendo segurado e a Previdência Social cujo objeto seja a
discussão de benefícios decorrentes de acidente de trabalho (auxílio-acidente, pensão
por morte, auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez), a competência será da
Justiça Estadual, mesmo no caso de revisão de benefícios acidentários (Súmula nº
235, do STF) (art. 109, I e art. 129, da Lei nº 8.213/91, assinalando-se a previsão do rito
sumário);
4) A Justiça do Trabalho é competente apenas para a execução de contribuições
previdenciárias decorrentes de suas sentenças ou acordos homologados (art.114, VIII,
da CR/88);
5) Segundo entendimento jurisprudencial, o segurado não precisa exaurir a via
administrativa (Súmula nº 213, do extinto TFR), embora vários julgados sustentem a
necessidade de prévio requerimento administrativo para configurar o interesse de
agir;
6) A existência de lesão ou ameaça de lesão pode ser demonstrada pelo indeferimento
do pedido de prestação previdenciária ou por se tratar de pretensão cuja negativa por
66
parte do INSS seja pública e notória, ou, pela apresentação da Contestação pelo ente
autárquico na qual reste demonstrada a existência do litígio mediante defesa de
mérito, ou, ainda, ante a omissão do INSS em conceder o benefício previdenciário, eis
que este possui um prazo de 45 (quarenta e cinco) dias para fazê-lo (art. 41-A, § 3º, da
Lei nº 8.213/91);
7) Os Juizados Especiais Federais foram instituídos pela Lei nº 10.259/01 e são
competentes para julgar ações cujo valor da causa NÃO ultrapasse 60 (sessenta)
salários mínimos. A competência do JEF é absoluta;
8) É possível a concessão de tutela antecipada de ofício nas lides previdenciárias
(Súmula nº 729, do STF);
9) Nas Ações Previdenciárias, os juros de mora, a contar da citação, são de 1% ao
mês.
67
VI. Bibliografia Básica
CASTRO, Dayse Starling Lima. Direito Público. Belo Horizonte: PUC Minas, 2009.
CUNHA, Lásaro Cândido da Cunha. Reforma da previdência. Belo Horizonte: Del Rey,
1999.
OLIVEIRA, Aristeu de. Manual prático de seguridade social. São Paulo: Atlas, 2006.
TAVARES, Marcelo Leonardo. Direito previdenciário: Regime Geral da Previdência Social
e Regimes Próprios de Previdência Social. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2006.
VII. Bibliografia Complementar
CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito constitucional e teoria da constituição. 5.
ed., Coimbra: Livraria Almedina, 1991.
IBRAHIM, Fábio Zambitte. Curso de direito previdenciário. Niterói: Impetus, 2006.
MARTINES, Wladimir Novaes. Curso de direito previdenciário. São Paulo: Ltr, 2005.
ROCHA, Daniel Machado da. Temas atuais de direito previdenciário e assistência
social. Porto Alegue: Lúmen Juris, 2003.
TAVARES, Marcelo Leonardo. Reforma da previdência: Temas polêmicos e aspectos
controvertidos. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2006.
VIII. Referências
AGUIAR DIAS, José de. Da responsabilidade civil. 10. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1995.
AMORIM FILHO, Agnelo. Critério científico para distinguir a prescrição da decadência e para
identificar as ações imprescritíveis. Revista dos Tribunais, São Paulo, n° 300, p. 7-37,
1960.
BARBOSA, Diogo de Medeiros. A responsabilidade civil do INSS por ato que cancela ou
nega a concessão de benefício previdenciário devido. Jus Navigandi, Teresina, ano 14, n.
2134, 5 maio 2009. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/12746>. Acesso em: 12
mar. 2013.
BARROS, Allan Luiz Oliveira. Linhas gerais sobre o processo administrativo previdenciário.
Jus Navigandi, Teresina, ano 15, n. 2614, 28 ago. 2010. Disponível em:
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BASSIL, Rafael Laynes. Dano Moral decorrente da demora para análise do Processo
Administrativo Previdenciário perante o Instituto Nacional do Seguro Social – INSS.
Disponível em: http://www.lex.com.br/doutrina 25254222. Acesso em: 15 mar.2014
BITTAR, Carlos Alberto. Responsabilidade civil: teoria e prática. 4. ed. rev. e ampl. Rio de
Janeiro: Forense Universitária, 2001.
BITTENCOURT, Marcus Vinicius Corrêa. Manual de direito administrativo. Belo
Horizonte: Fórum, 2009.
68
BOEIRA, Alex Perozzo. A cumulação de auxílio-acidente e aposentadoria por tempo de
serviço/contribuição. São Paulo: Mundo Jurídico 2009.
BOLLMANN, Vilian; SEVERO, Gustavo Pedroso. Prescrição e decadência no direito
previdenciário: a inconstitucionalidade do caput do art. 103, da Lei 8.213/91. Disponível
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<http://www.nacionaldedireito.com.br/doutrina/601/prescri-o-e-decad-ncia-no-direitoprevidenci-rio-a-inconstitucionalidade-do-caput-do-art-103-da-lei-8213-91>. Acesso em: 29
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PROCESSO JUDICIAL PREVIDENCIÁRIO