Reconstrução e reformas
Investir em reformas vigorosas é a exigência que deve permear o sentimento
cidadão no auge deste momento crítico vivido pela sociedade brasileira,
inserida em amplo e complexo contexto de graves crises, locais e mundiais.
Não se pode correr o risco de tratar o momento atual como um assunto
midiático, que passa como uma nuvem e se esvai. Esse perigo é evidente em
razão do modo como os problemas são enfrentados na cultura contemporânea
à semelhança do tratamento dado às notícias. Por um tempo é “quente” um
assunto. Fácil e rapidamente o que estava em pauta é esquecido. Perde lugar
para outros acontecimentos.
Essas ondas que presidem as dinâmicas da cultura contemporânea
enfraquecem a sociedade na sua indispensável capacidade de reação.
Também a afasta da urgente competência para operar a sua própria
reconstrução com vigorosas e incidentes reformas. Por isso, é preocupante o
modo como a sociedade brasileira está lidando com o conjunto de suas crises.
Um enorme conjunto de exigências, urgências e intervenções que é tratado
com lentidão. Mais grave ainda, tratado por líderes que, pelas expressões,
escolhas e posicionamentos, pela falta de um lastro humanístico mais
consistente na sua formação e no seu caráter, não se revelam preparados para
os cargos que ocupam.
É urgente disseminar e cultivar em todo o país um sentimento de que somos
uma sociedade em reconstrução. Indicam isso as estatísticas e os
descompassos graves, como a crescente violência, a exclusão social, a
corrupção, a dependência química, problemas que provocam terror semelhante
ao de contextos de guerra. Ainda que se considerem os avanços sociais e
tecnológicos no contexto brasileiro, o conjunto de crises em curso dizima vidas
e deteriora a cultura que a civilização necessita para se sustentar. Os cidadãos
precisam ser guiados pelo anseio de se promover a reconstrução do país, de
modo semelhante a exemplos históricos de nações que ressurgiram das cinzas
depois das destruições de guerras.
O povo brasileiro tem a grande vantagem de contar com reservas e patrimônios
- culturais, religiosos, ambientais e históricos - para impulsionar esse processo
de reconstrução. É preciso superar um lado terrível e perverso do país que é
caracterizado pela corrupção, mediocridade na política e pela geração pífia de
líderes em todos os segmentos. Para isso, todos devem sustentar a cidadania
em patamares emoldurados pelo altruísmo, por um sentido nobre de pátria.
Nessa tarefa, o conjunto de discriminações e, particularmente, a vergonhosa
exclusão social que atinge o povo devem ser enfrentados.
Inspiradora é a coragem do Papa Francisco - com validade provocante para a
Igreja Católica, também para a sociedade civil – quando, na sua Exortação
Apostólica Alegria do Evangelho, se compromete com a conversão do papado.
Essa corajosa indicação é nobre ato de simplicidade e humildade tão
necessário no mundo contemporâneo, que deve inspirar a Igreja e a sociedade,
com seus segmentos, o recôndito dos lares e todas as instituições, no processo
de reconstrução. Assim será possível superar as mediocridades, que enjaulam
o povo em condição asfixiante. Uma triste situação que se verifica quando se
percebe a supervalorização do status, consolação dos medíocres em ocupar
lugares de importância, em usufruir dos benefícios. Certamente, a realidade
seria outra se, em vez de procurar status, cada pessoa se empenhasse para
ampliar sua capacidade de oferta e serviços.
Compreende-se porque não se avança no conjunto das reformas que precisam
ser urgentemente operadas na sociedade brasileira, atravancadas por
interesses mesquinhos e visões estreitadas. Para mudar esse contexto é
preciso cultivar uma onda duradoura de sentimentos que envolva todos, da
criança ao ancião, encharcando mentes e corações com o senso de mutirão
para a reconstrução e reformas vigorosas na sociedade.
Dom Walmor Oliveira de Azevedo
Arcebispo metropolitano de Belo Horizonte
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