QUADRINHOS, VIDEO GAMES E APLICATIVOS: UMA ESTRATÉGIA TRANSMÍDIA NO GAME INJUSTICE GODS AMONG US1 Felipe Mussarelli2 Resumo: Com base nos estudos do movimento Transmídia e no conceito de Gênero do Discurso idealizado pelo Círculo de Bakhtin, foi analisada a produção do vídeo game Injustice Gods Among Us (2013), produzido pelo estúdio Netherhealms, publicado pela Warner Brother Games e dirigido por Ed Boon. A análise buscou identificar elementos do movimento Transmídia na produção do vídeo game principal e seus jogos complementares. Como resultado pode-se compreender que nem todos os pilares do lançamento do game podem ser considerados como partes de uma narrativa transmídia/estratégia transmídia. Conclui-se, portanto que apenas uma parcela da estratégia de lançamento do game Injustice pode ser considerada como uma estratégia transmídia, estando as outras etapas do lançamento mais ligadas a aumentar a vida útil do game nos consoles do que contribuir para ampliar significativamente um universo em potencial. Palavras-chave: Transmídia. Bakhtin. Gêneros do discurso. Vídeo games. Abstract: Based on the studies of Transmedia movement and the concept of Gender Discourse conceived by Bakhtin Circle, we analyzed the production of the video game Injustice Gods Among Us (2013), produced by the studio Netherhealms, published by Warner Brother Games and directed by Ed Boon. The analysis sought to identify elements of Transmedia production movement in the main video game and its complementary games. As a result, one can understand that all or Pillars launch the game may be considered as parts of a narrative transmedia / transmedia strategy. We conclude therefore that only a portion of the launch of the game Injustice strategy can be considered as a transmedia strategy with the other stages of launching more linked to increase the life of the game on consoles than contribute to significantly expand a universe in potential. Keywords: Transmedia. Bakhtin. Speech genres. Video games. Aspectos introdutórios Com o avanço das tecnologias e sua maior abrangência advento de, entre outros fatores, a diminuição de impostos e sua fabricação em ambientes propícios, torna-se cada vez mais comum o cruzamento entre mídias para promover a venda e acrescer a experiência Trabalho apresentado no Seminário Temático “Serialidade e Narrativa Transmídia”, durante a I Jornada Internacional GEMInIS, realizada entre os dias 13 e 15 de maio de 2014, na Universidade Federal de São Carlos. 2 Doutorando do Programa de Pós-Graduação em Ciência, Tecnologia e Sociedade da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar). Mestre em Ciência, Tecnologia e Sociedade (UFSCar). Trabalha com questões ligadas ao estudo de linguagens, CTS e Histórias em Quadrinhos. E-mail: [email protected] 1 imersiva em diversos tipos de narrativas. Este fenômeno da era da convergência midiática possibilita, de acordo com Massarolo, que “uma história seja desdobrada em diversas mídias, criando a arquitetura de um universo narrativo que se expande em diferentes direções, mantendo as características originais e utilizando os dispositivos de geolocalização para estimular a migração de públicos” (2011, p. 157). Umas das mídias que tem feito uso de outras plataformas para aperfeiçoar e implementar novas funções são os vídeo games, que além do aperfeiçoamento buscam também aumentar a vida útil de seus jogos e consoles. Lançado a pouco mais de quarenta anos, mais precisamente no ano de 1972, o primeiro vídeo game, batizado de Odyssey, foi criado pelo engenheiro alemão Ralph Baer baseando-se em uma ideia anterior de criar uma televisão interativa. Apesar de ser uma tecnologia relativamente nova, os vídeo games possuem um quadro evolutivo de velocidade bastante elevada. Hoje nos encontramos as portas do que especialistas consideram a 8ª geração de consoles, inaugurada com o lançamento do Nintendo WiiU e que se consolidou com os lançamentos do Xbox One e Playstation 4, das empresas Microsoft e Sony respectivamente. Este artigo buscará analisar a abordagem transmidiática utilizada pela produtora de jogos Netherhealms em conjunto com a Warner Brothers Games no lançamento do game Injustice: Gods Among Us, visando popularizá-lo e mantê-lo no mercado por mais tempo. Para tal serão colocados em relação conceitos relacionados ao movimento transmídia e conceitos sobre os gêneros do discurso de Mikhail Bakhtin buscando uma compreensão dialógica sobre o movimento envolvendo o game em questão. Transmídia e Gêneros do Discurso O movimento transmídia teve início há alguns anos desenvolvendo-se primeiro na indústria de entretenimento, cinematográfica e televisiva dos Estados Unidos conquistando entusiastas em países diversos. Entre os principais representantes deste movimento, podemos citar séries como Lost (2004) e The Walking Dead (2010) ou franquias como Star Trek (1966), Star Wars (1977) e Matrix (1999) cujas ações transmidiáticas repercutiram pelo mundo todo. Nas ultimas três décadas, observam Massarolo e Alvarenga (2010, p. 01), a franquia de produtos audiovisuais tem se desenvolvido num ritmo vertiginoso, provocando uma série de mudanças no modo como as marcas são pensadas. Os grandes conglomerados de mídia estão descobrindo que na economia da convergência, os consumidores cansaram de consumir ‘mais do mesmo’ e desejam se relacionar com produtos que sejam ‘mundo’ de possibilidades- disponibilizando diversas entradas para serem navegadas a partir de diferentes mídias e que permitam um profundo envolvimento emocional dos usuários. Gosciola (2011) faz um apanhado daquilo que Henry Jenkins define como narrativa transmídia. Suas características são descritas como: partes de uma história dispersos de forma sistemática através de múltiplas plataformas de mídia; cada elemento de uma história tem sua plataforma definida de acordo com o que esta possa melhor contribuir para contar o todo da história, permitindo que a história possa ser expandida; engajamento do público; utilização da estratégia de mídia chamada "viral" (ou spreadable), uma estratégia promocional para despertar a atenção pública. “Tudo que é ideológico possui um significado e remete a algo situado fora de si mesmo, [...], tudo que é ideológico é signo. Sem signos não existe ideologia” (BAKHTIN, 2002, p. 31). Assim como o significado de um signo não esta em sua essência, mas sim em sua construção social, sendo esta uma construção ideológica, a convergência de Jenkins não se dá no objeto em si, mas na construção relacional dos indivíduos. A criação de universos ficcionais a qual Jenkins atribuída ao movimento transmídia depende em grande parte da participação ativa dos fãs, que passaram de meros consumidores de franquias para geradores de conteúdo. Poucas serão as construções de fãs absorvidas pelas grandes produções, mas o feedback poderá ser capaz de causar mudanças significativas em determinadas ocasiões. Assim, um universo ficcional pode ser absorvido a exaustão por um fã, que ainda pode gerar conteúdos ou reimaginar passagens narrativas, e ao fazê-lo, acaba por criar um universo distinto ao daqueles fãs que, por diversos motivos, preferiu ou não pôde acompanhar cada peça narrativa daquele universo. A relação que cada um criará com o universo será particular, ao mesmo tempo em que será social, pois ambos estarão tematizando um universo ficcional de bases em comum. Desta forma, para Jenkins “cada um de nós constrói a própria mitologia pessoal, a partir de pedaços de fragmentos de informações extraídos do fluxo midiático e transformados em recursos através dos quais compreendemos nossa vida cotidiana”. (2008, p.30). Assim sendo, inteiramente relacionado a cultura da convergência, considera-se o movimento transmídia, portanto, como uma maneira de se construir não apenas narrativas que circulam de forma adaptada em diferentes mídias, mas franquias que complementam-se em diversas formas midiáticas construindo um universo repleto de diferentes possibilidades narrativas. No entanto, por ser um conceito bastante recente, Massarolo salienta não haver ainda uma compreensão compartilhada da narrativa transmídia, as abordagens acadêmicas que buscam definir essa noção situam-se entre diferentes interpretações e cada estudo reflete novas convergências de visões. Henry Jenkins define a narrativa transmídia como histórias que são desdobradas nas diversas plataformas de mídia, sendo que cada uma delas deve contribuir de forma distinta para a compreensão do universo narrativo. (2012, p. 163) Uma relação interessante pode ser pensada a partir da teoria dos gêneros do discurso desenvolvida por Bakhtin e seu Círculo. Para o filósofo russo, os discursos da vida dividemse de acordo com um conjunto de características específicas sob as quais este acontece. Cada situação discursiva ocorre de maneira a adequar-se ao momento, lugar ou suporte em que está inserida. A diversidade funcional parece tornar os traços comuns a todos os gêneros do discurso abstratos e inoperantes. Provavelmente seja esta a explicação para que o problema geral dos gêneros do discurso nunca tenha sido colocado. Estudaram-se, mais do que tudo, os gêneros literários. Mas estes, tanto na Antiguidade como na época contemporânea, sempre foram estudados pelo ângulo artístico-literário de sua especificidade, das distinções diferenciais intergenéricas (nos limites da literatura), e não enquanto tipos particulares de enunciados que se diferenciam de outros tipos de enunciados, com os quais, contudo tem em comum a natureza verbal (linguística). (BAKHTIN, 1997, p. 280). Cada gênero possui preceitos e regras características de acordo com a esfera social em que se encontra. Sendo essas esferas do uso da linguagem não “uma noção abstrata, mas uma referência direta aos enunciados concretos que se manifestam nos discursos”. (MACHADO, 2005, p. 156). Os gêneros discursivos distinguem-se em dois agrupamentos, primários e secundários. Os gêneros primários são aqueles construídos em circunstâncias discursivas em esferas privadas, ligadas a experiências cotidianas e mais íntimas, como uma carta pessoal, um bilhete, um convite informal ou uma conversa a mesa de bar. Os secundários, por sua vez, são arquitetados em situações públicas, relativamente mais formais, como entrevistas, palestras, editoriais, reportagens, propagandas, novelas e trabalhos acadêmicos. Marchezan (2010, p. 268-269) complementa que, entre os tipos relativamente estáveis de enunciados, salienta-se, como se sabe, a diferença – sem, no entanto, deixar de destacar também sua inter-relação – entre gêneros primários e os gêneros secundários: entre os enunciados espontâneos do cotidiano, que acontecem, principalmente, face a face, e os enunciados mais complexos, que compartilham dos valores da sociedade como um todo, mas surgem e atuam mais diretamente em uma área particular: uma ciência, uma religião, uma escola artística, entre outros. Fazendo parte do elo da comunicação verbal, os gêneros dão forma à experiência sócio-histórica, que neles se estabiliza; institui e reforça as formas já tradicionais, mas retira da dinâmica do dia-a-dia (dos gêneros primários, portanto) o alimento de sua transformação. [...] o gênero não pode ser concebido senão como um conceito plural: reporta-se às formações combinatórias da linguagem em suas dimensões verbal e extra-verbal. Além disso, articula formas discursivas criadoras da linguagem, de visões de mundo e de sistemas de valores configurados por pontos de vista determinados. O conceito de gênero segundo a abordagem dialógica de Bakhtin é instância de criação e acabamento do objeto estético. [...] o gênero organiza a manifestação e promove seu acabamento. Quer dizer: o gênero mobiliza relações entre aspectos internos e externos da manifestação estética (MACHADO, 2005, p.133) Os estudos que Mikhail Bakhtin desenvolveu sobre os gêneros discursivos considerando não a classificação das espécies, mas o dialogismo dos processos comunicativo que estão inseridos no campo dessa emergência. Aqui as relações interativas são processos produtivos de linguagem. (MACHADO, 2005). Desta maneira, compreende-se, pois, que a importância dos estudos dos gêneros discursivos não está no processo classificatório, mas na compreensão da mudança de um gênero para outro no processo dialógico, e na sua formação. Assim sendo, durante o processo de sua formação, esses gêneros secundários absorvem e transmutam os gêneros primários (simples) de todas as espécies, que se constituíram em circunstâncias de uma comunicação verbal espontânea. Os gêneros primários, ao se tornarem componentes dos gêneros secundários, transformam-se dentro destes e adquirem uma característica particular: perdem sua relação imediata com a realidade existente e com a realidade dos enunciados alheios - por exemplo, inseridas no romance, a réplica do diálogo cotidiano ou a carta, conservando sua forma e seu significado cotidiano apenas no plano do conteúdo do romance, só se integram à realidade existente através do romance considerado como um todo, ou seja, do romance concebido como fenômeno da vida literário-artística e não da vida cotidiana. O romance em seu todo é um enunciado, da mesma forma que a réplica do diálogo cotidiano ou a carta pessoal (são fenômenos da mesma natureza); o que diferencia o romance é ser um enunciado secundário (complexo). (BAKHTIN, 1997, p. 282). Baseando-nos nas características de uma narrativa transmídia apresentadas por Jenkins, de que cada elemento de uma história tem sua plataforma definida de acordo com o que esta possa melhor contribuir para contar o todo da história permitindo que a história possa ser expandida, podemos lançar um paralelo relacional com algumas características da teoria bakhtiniana. Como visto anteriormente, o gênero constrói-se de forma a funcionar de acordo com determinadas regras e através de determinadas formas, sendo cada gênero específico para um orbe social da vida. Tomamos como exemplo uma História em Quadrinhos. Em suas características básicas encontramos, entre outras, a repetição, a serialidade, apresentadas na forma de narrativas visuais sequencialmente dispostas dentro de quadro, sendo as falas das personagens apresentadas em balões. A esse gênero cabe apenas a forma de apresentação e utilização que suas características permitem. Diferente de um game, por exemplo, que permite o controle e a tomada de decisões de uma personagem, a interatividade com uma História em Quadrinhos tradicional limita-se a leitura da narrativa e as relações que o leitor faz de forma cognitiva, não cabendo ao leitor tomar as decisões da personagem. Para uma experiência interativa maior, buscar-se-ia a apresentação do conteúdo narrativo em outro gênero. Assim sendo, uma narrativa transmídia busca em sua construção de universo diversas mídias (ou gêneros) que possibilitem a interação esperada/desejada para aquele momento narrativo. Neste sentido, um movimento que ocorre de forma quase natural, se optarmos pelos gêneros ligados a comunicação como fala, carta, sermão, conversa de bar onde, de acordo com a necessidade, pulamos de gênero a gênero sem percebermos a troca do conjunto de regras relativamente estáveis, a indústria do entretenimento aproveita os diversos gêneros narrativos para expandir seu universo e alcançar nichos distintos de consumo, ou nos casos de maior sucesso, introduzindo seus consumidores a novos nichos, de custos mais baixos de produção, no caso de uma História em Quadrinhos ou Webssérie. Parece-nos que um diálogo mais aprofundado das relações entre alguns conceitos foucaultianos, bakhtinianos, e o movimento transmídia pode apresentar compreensões interessantes no que diz respeito da apropriação de gêneros do discurso emergentes nas diversas formas de narrativas. O Game Lançado em abril de 2013, Injustice Gods Among Us foi produzido pelo estúdio Netherhealms, publicado pela Warner Brother Games e dirigido por Ed Boon. Trata-se de um game de luta 2.5D, ou seja, seu design é tridimensional, mas sua jogabilidade é bidimensional (figura 01). O game traz para os consoles Playstation 3 e 4, Xbox 360 e Xbox One, Nintendo WiiU e PCs a luta entre personagens das histórias em quadrinhos da DC Comics, como Batman, Superman, Coringa, Lex Luthor e Bane. Todo o ambiente do jogo é construído dentro do universo criado pela DC Comics, bem como sua narrativa, cuja trama baseia-se em famosos arcos tradicionais das HQs envolvendo universos paralelos, entretanto, de forma inédita. A trama do game tem início com o Coringa, um dos vilões mais famosos cuja origem se deu nas estórias do Batman, detonando uma bomba nuclear no meio de Metrópolis, a cidade protegida por Superman. Como geralmente aconteceria em uma história e quadrinhos mais clássica, os super-heróis conseguiriam impedir a detonação da bomba e capturar o vilão, todavia, na trama do game, a detonação da bomba não é impedida, causando a destruição da cidade toda. De alguma maneira o Coringa ainda consegue manipular Superman fazendo com que ele mate sua amada Lois Lane, e seu amigo Jimmy Olsen. Este é então o início da trama do game, bastante violenta se compararmos com alguns arcos mais clássicos. Figura 1 - Tela do game A interação com o jogador, entretanto, inicia-se alguns anos a frente na cronologia, agora em um universo paralelo ou realidade alternativa onde a bomba não explodiu. Neste ponto, assim como ocorre em muitas tramas dos quadrinhos, os universos se cruzam. O Batman do universo em que a bomba explodiu consegue entrar em contato com os superheróis do universo onde a bomba não explodiu, transportando-os para seu universo na busca de ajuda. Batman então informa os super-heróis do ocorrido e revela que após a explosão e a perda de sua amada e amigos, Superman mudou seu comportamento, decidindo que faria qualquer coisa para impedir que aquilo acontecesse novamente. Sua obsessão o cegou e fez com que ele quebrasse seu juramento de nunca matar, (Spoiler Alert!) assassinando o Coringa e até mesmo outros super-heróis que se opuseram a ele, bem como se aliando a alguns vilões. Superman instaurou uma ditadura com apoio militar a qual Batman, outros super-heróis e vilões remanescentes tentam destruir. Tem-se início uma sucessão de confrontos entre super-heróis e super-vilões dos dois universos que culminará com a derrota do Superman déspota e o retorno dos super-heróis ao seu universo de origem. A estratégia transmídia por trás de Injustice Em outubro de 2012 foi anunciado pelo diretor do game, Ed Boon, o lançamento de uma série de histórias em quadrinhos (figura 02) com o mesmo nome do jogo, escrita por Tom Taylor e ilustrada por Jheremy Raapack, lançada inicialmente no formato digital e posteriormente em seu formato impresso tradicional e possivelmente em um encadernado de volume único contendo todas as edições lançadas. Em se tratando de um game baseado em um universo criado e consolidado nos quadrinhos, não foi surpresa alguma tal anuncio. Figura 2 - Capítulo um da HQ do game O que surpreendeu foi que o enredo da versão em quadrinhos do jogo não trataria de repetir a trama do game em outro formato, mas serviria como uma prequel ou prequência da trama do game. Sendo assim, a estória narrada nos quadrinhos serviria para contar o que teria acontecido antes do início do game e nos anos após a explosão do aparato nuclear que dizimou Metrópolis e posterior assassinato do Coringa. A estratégia transmídia criada pela Warner Brothers em conjunto coma editora DC Comics e a desenvolvedora do game foi a de ampliar o enredo do game e explorá-lo em outra mídia, expandindo seu universo e respondendo alguma das perguntas levantadas e deixadas de lado durante o desenrolar do game. As histórias em quadrinhos, ainda em publicação, estão sendo comercializadas através do site da editora DC Comics e do site Comixology (figura 03), que é especializado na venda de quadrinhos no formato digital, cuja leitura baseia-se principalmente nos novos dispositivos informacionais como smarthphones e tablets, ao preço de $0,99 a edição digital e $3,99 a edição impressa, esta vendida em livrarias e comic shops. Figura 3 - Layout do website Comixology (www.comixology.com) Atualmente a publicação encontra-se na edição 21 da segunda temporada. Devido ao sucesso do primeiro ano a série ganhou uma continuação e uma possível terceira temporada. O lançamento de uma história em quadrinhos cuja trama se insere dentro do universo criado para o game foi uma das estratégias utilizadas. Outra estratégia da produtora foi o desenvolvimento de um aplicativo free-to-play (figura 04) para dispositivos móveis com IOS (sistema operacional Apple) e Android (sistema operacional Google). Free-to-play é o termo criado para identificar aplicativos e jogos disponibilizados de forma grátis. O aplicativo caracteriza-se como um jogo cartas, onde o jogador coleciona cartas de heróis e vilões criando batalhas entre as mesmas, semelhante ao clássico jogo Magic The Gathering. Diferente da história em quadrinhos que expande o universo do jogo, o aplicativo possibilita o jogador desbloquear conteúdo extra de forma gratuita para o jogo, como novas Skins (roupas, design diferenciado) para as personagens do game. Esse conteúdo extra só pode ser desbloqueado através deste aplicativo. Figura 4 - Tela do aplicativo Injustice Gods Among Us, disponibilizado na app store da Apple O uso de aplicativos móveis no auxílio narrativo, do ponto dos estudos da convergência midiática, explica Massarolo (2012, p. 160), têm desempenhado um papel importante no desenvolvimento de narrativas para o meio digital. O que diferencia o game para sistemas móveis ao game para consoles é que os mesmos personagens de universos diferentes possuem atributos distintos. O Batman do universo original possui pontuação nos atributos distinta do Batman do universo onde a bomba do Coringa explodiu. No game para consoles os atributos são os mesmos para ambos os personagens. Por fim, outra estratégia utilizada pela desenvolvedora do game, esta mais comum entre os jogos da atual geração, foi o lançamento de forma periódica de conteúdos adicionais ao game, os chamados DLC (Downloadable Content). Por uma determinada quantia a mais, o jogador pode adquirir novos personagens e novas skins (caracterizações/roupas) para os personagens fixos do game. Observa-se uma estratégia bastante elaborada para o lançamento do jogo, explorando diversas mídias e buscando criar um universo significativo que desperte interesse nos jogadores pela exploração do mesmo. Com a atual popularização dos super-heróis na televisão e cinema, algumas skins são lançadas em conjunto com, por exemplo, com a estreia do mais recente longa metragem do Superman, O Homem de Aço (2013), dirigido por Zack Snyder e tendo Henry Cavill no papel principal. Logo após o lançamento do filme, foi disponibilizada para compra, uma skin do personagem Superman (figura 05) caracterizada pelo ator Henry Cavill. Estratégia semelhante foi utilizada com o ator da série Arrow, Stephen Amell, que interpreta o herói Arqueiro Verde. Figura 5 - Skin de Henry Cavill como Superman A estratégia de lançamento do jogo desenvolvida pela produção do game baseou-se, pois, em três pilares: o lançamento de uma história em quadrinhos que serviria como prequência a narrativa do game, a criação de um aplicativo free-to-play para dispositivos com IOS e Android que premia o jogador com conteúdo adicional, e o lançamento periódico de conteúdo extra mediante o pagamento. Aspectos conclusivos Procuramos no presente artigo relacionar o conceito de transmídia com a teoria dos Gêneros do Discurso de Bakhtin e descrever de forma sucinta a estratégia utilizada pela produtora Netherhealms em conjunto com Warner Brothers Games no lançamento e manutenção do game Injustice, sem, no entanto, aprofundarmos uma discussão mais crítica acerca da mesma. Vale ressaltar que muito se tem discutido acerca das estratégias free-toplay e conteúdos adicionais pagos, tanto julgando como “evolução natural” do mercado de entretenimento virtual, como julgando ser esta uma nova forma de arrecadar lucros vendendo produtos inacabados onde o consumidor paga uma quantia extra para obter o produto completo. A partir da estratégia descrita anteriormente, pudemos compreender que nem todos os pilares do lançamento do game podem ser considerados como partes de uma narrativa transmídia, tendo em vista teóricos como Jenkins e Massarolo. Apenas a história em quadrinhos acrescentou um conteúdo narrativo complementar em uma plataforma distinta ao game, acrescentando uma narrativa anterior à narrativa principal, bem como o fechamento de algumas lacunas. Diferente dos outros conteúdos adicionais, a narrativa apresentada pela história em quadrinhos contribui para aumentar a complexidade do universo em questão, propiciando que novos capítulos possam ser contados, em mídias distintas e por diversos outros autores. Conclui-se, portanto que apenas uma parte da estratégia de lançamento do game Injustice pode ser considerada como uma estratégia transmídia, estando as outras etapas do lançamento mais ligadas aumentar a vida útil do game nos consoles do que contribuir para ampliar significativamente um universo em potencial. Referencias: BAKHTIN, M. Estética da criação verbal. 2 ed. São Paulo: Martins Fontes, 1997. ________. Marxismo e filosofia da linguagem. 9 ed. São Paulo: Hucitec, 2002. GOSCIOLA, V. Narrativa transmídia: a presença de sistemas de narrativas integradas e complementares na comunicação e na educação. Quaestio: Revista de Estudos de Educação, v. 13, p. 117-126, 2011. INJUSTICE: gods among us. 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