Superior Tribunal de Justiça
EDcl no RECURSO ESPECIAL Nº 960.476 - SC (2007/0136295-0)
RELATOR
EMBARGANTE
ADVOGADO
EMBARGADO
PROCURADOR
:
:
:
:
:
MINISTRO TEORI ALBINO ZAVASCKI
MONTEGUTI INDÚSTRIA COMÉRCIO E TRANSPORTES LTDA
TIAGO CONDE TEIXEIRA E OUTRO(S)
ESTADO DE SANTA CATARINA
RICARDO DE ARAÚJO GAMA E OUTRO(S)
EMENTA
PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. ICMS
SOBRE DEMANDA DE ENERGIA ELÉTRICA. ACÓRDÃO QUE
DEIXOU CLARAMENTE ESTABELECIDO QUE O FATO
GERADOR É O EFETIVO CONSUMO (E NÃO A SIMPLES
CONTRATAÇÃO DA DEMANDA) E QUE A BASE DE
CÁLCULO É O VALOR DA TARIFA CORRESPONDENTE A
ESSA DEMANDA CONSUMIDA (E NÃO SOBRE A
CONTRATADA). IMPERTINÊNCIA DA DISCUSSÃO A
RESPEITO DOS CRITÉRIOS DE FIXAÇÃO DE TARIFAS, QUE,
ALÉM DE ESTRANHOS AO OBJETO DO PROCESSO, ESTÃO
PREVISTOS NO SISTEMA TARIFÁRIO NACIONAL, CUJA
FONTE, PORTANTO, É NORMATIVA E NÃO CONTRATUAL.
INEXISTÊNCIA DE QUAISQUER DOS VÍCIOS DO ART. 535 DO
CPC. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO REJEITADOS.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a
Egrégia PRIMEIRA SEÇÃO do Superior Tribunal de Justiça, por maioria, vencida em parte a
Sra. Ministra Denise Arruda, rejeitar os embargos de declaração, nos termos do voto do Sr.
Ministro Relator. Os Srs. Ministros Castro Meira, Humberto Martins, Herman Benjamin, Mauro
Campbell Marques, Benedito Gonçalves e Eliana Calmon votaram com o Sr. Ministro Relator.
Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Francisco Falcão.
Brasília, 24 de junho de 2009.
MINISTRO TEORI ALBINO ZAVASCKI
Relator
Documento: 897923 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJ: 03/08/2009
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ADVOGADO
EMBARGADO
PROCURADOR
:
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ESTADO DE SANTA CATARINA
RICARDO DE ARAÚJO GAMA E OUTRO(S)
RELATÓRIO
O EXMO. SR. MINISTRO TEORI ALBINO ZAVASCKI:
Trata-se de embargos de declaração (fls. 702-710) opostos contra acórdão cuja ementa é a
seguinte:
TRIBUTÁRIO. ICMS. ENERGIA ELÉTRICA. DEMANDA DE POTÊNCIA. NÃO
INCIDÊNCIA SOBRE TARIFA CALCULADA COM BASE EM DEMANDA
CONTRATADA E NÃO UTILIZADA. INCIDÊNCIA SOBRE TARIFA CALCULADA
COM BASE NA DEMANDA DE POTÊNCIA ELÉTRICA EFETIVAMENTE
UTILIZADA.
1. A jurisprudência assentada pelo STJ, a partir do julgamento do REsp 222.810/MG (1ª
Turma, Min. José Delgado, DJ de 15.05.2000), é no sentido de que "o ICMS não é
imposto incidente sobre tráfico jurídico, não sendo cobrado, por não haver incidência,
pelo fato de celebração de contratos", razão pela qual, no que se refere à contratação de
demanda de potência elétrica, "a só formalização desse tipo de contrato de compra ou
fornecimento futuro de energia elétrica não caracteriza circulação de mercadoria".
Afirma-se, assim, que "o ICMS deve incidir sobre o valor da energia elétrica
efetivamente consumida, isto é, a que for entregue ao consumidor, a que tenha saído da
linha de transmissão e entrado no estabelecimento da empresa".
2. Na linha dessa jurisprudência, é certo que "não há hipótese de incidência do ICMS
sobre o valor do contrato referente à garantia de demanda reservada de potência".
Todavia, nessa mesma linha jurisprudencial, também é certo afirmar, a contrario sensu,
que há hipótese de incidência de ICMS sobre a demanda de potência elétrica
efetivamente utilizada pelo consumidor.
3. Assim, para efeito de base de cálculo de ICMS (tributo cujo fato gerador supõe o
efetivo consumo de energia), o valor da tarifa a ser levado em conta é o correspondente
à demanda de potência efetivamente utilizada no período de faturamento, como tal
considerada a demanda medida , segundo os métodos de medição a que se refere o art.
2º, XII, da Resolução ANEEL 456/2000, independentemente de ser ela menor, igual ou
maior que a demanda contratada.
4. No caso, o pedido deve ser acolhido em parte, para reconhecer indevida a incidência
do ICMS sobre o valor correspondente à demanda de potência elétrica contratada mas
não utilizada .
5. Recurso especial parcialmente provido. Acórdão sujeito ao regime do art. 543-C do
CPC e da Resolução STJ 08/08 (fl. 665).
Sustenta a embargante, em suma, que houve obscuridade, porquanto o acórdão embargado
parece contrariar a jurisprudência até então pacificada do STJ, no sentido de que o ICMS
somente poderá incidir sobre o valor correspondente à energia efetivamente consumida. Assim,
entende não esclarecidos os seguintes pontos: (a) "se a Corte manteve o entendimento anterior
de que o ICMS somente incide sobre a parcela da tarifa binomial correspondente à totalidade da
energia elétrica ou se modificou tal jurisprudência para acrescentar à base de cálculo do ICMS
outra parcela (...) e, em caso afirmativo, qual parcela seria esta" (fl. 706); (b) qual a base de
cálculo a ser utilizada, se a demanda medida máxima ou a média de cada mês; e (c) qual valor a
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ser atribuído à demanda de potência medida (máxima ou média), para efeito de ICMS, quando
esta for menor do que a demanda contratada.
É o relatório.
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PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. ICMS
SOBRE DEMANDA DE ENERGIA ELÉTRICA. ACÓRDÃO QUE
DEIXOU CLARAMENTE ESTABELECIDO QUE O FATO
GERADOR É O EFETIVO CONSUMO (E NÃO A SIMPLES
CONTRATAÇÃO DA DEMANDA) E QUE A BASE DE
CÁLCULO É O VALOR DA TARIFA CORRESPONDENTE A
ESSA DEMANDA CONSUMIDA (E NÃO SOBRE A
CONTRATADA). IMPERTINÊNCIA DA DISCUSSÃO A
RESPEITO DOS CRITÉRIOS DE FIXAÇÃO DE TARIFAS, QUE,
ALÉM DE ESTRANHOS AO OBJETO DO PROCESSO, ESTÃO
PREVISTOS NO SISTEMA TARIFÁRIO NACIONAL, CUJA
FONTE, PORTANTO, É NORMATIVA E NÃO CONTRATUAL.
INEXISTÊNCIA DE QUAISQUER DOS VÍCIOS DO ART. 535 DO
CPC. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO REJEITADOS.
VOTO
O EXMO. SR. MINISTRO TEORI ALBINO ZAVASCKI (Relator):
1. Não há qualquer obscuridade no acórdão embargado. O acórdão embargado enfrentou e
decidiu, clara e motivadamente, todos os pontos relacionados com a controvérsia. Eis como essa
controvérsia foi colocada na petição inicial:
Observe-se que o contrato de fornecimento de energia elétrica firmado entre a
impetrante e a CELESC somente vem a garantir uma demanda de energia elétrica,
conforme supra descrito, não promovendo alterações na situação fática da energia
realmente gasta, sobre a qual deva incidir o ICMS, uma vez que é ilegal e
inconstitucional cobrar pelo que não foi gasto, ou seja, sobre a quantia de demanda
não utilizada, mas colocada à disposição. Entretanto, é o que vem ocorrendo.
Ora, a mera formalização de contrato não caracteriza a circulação de mercadoria.
O fato gerador do ICMS não se configura com o simples contrato, é necessário a
efetiva circulação física ou econômica da mercadoria (energia elétrica), em termos
de seu real consumo. O valor da operação é a base de cálculo do ICMs, então, o
valor da operação corresponde ao que é entregue ao consumidor, que é a energia
elétrica efetivamente consumida.
Não é a mera disponibilidade de energia ao consumidor que representa a hipótese
de incidência do ICMS. O entendimento do que seja 'efetivamente consumida' deve
ser a da energia elétrica que sai da linha de transmissão e entra no estabelecimento
empresarial para sua utilização e consumo. (fls. 05)
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2. Como se percebe, a controvérsia central diz respeito ao fato gerador do ICMS sobre
energia elétrica: se a demanda de energia elétrica simplesmente contratada ou se demanda
efetivamente utilizada. Segundo a petição inicial, "é ilegal e inconstitucional cobrar (...) sobre a
quantia da demanda não utilizada".
Sobre essa questão, reiterando a jurisprudência pacificada no STJ, o acórdão afirmou
claramente o seguinte (itens 1 e 2 da ementa):
1. A jurisprudência assentada pelo STJ, a partir do julgamento do REsp 222.810/MG
(1ª Turma, Min. José Delgado, DJ de 15.05.2000), é no sentido de que "o ICMS
não é imposto incidente sobre tráfico jurídico, não sendo cobrado, por não haver
incidência, pelo fato de celebração de contratos", razão pela qual, no que se refere à
contratação de demanda de potência elétrica, "a só formalização desse tipo de
contrato de compra ou fornecimento futuro de energia elétrica não caracteriza
circulação de mercadoria". Afirma-se, assim, que "o ICMS deve incidir sobre o
valor da energia elétrica efetivamente consumida, isto é, a que for entregue ao
consumidor, a que tenha saído da linha de transmissão e entrado no estabelecimento
da empresa".
2. Na linha dessa jurisprudência, é certo que "não há hipótese de incidência do
ICMS sobre o valor do contrato referente à garantia de demanda reservada de
potência". Todavia, nessa mesma linha jurisprudencial, também é certo afirmar, a
contrario sensu, que há hipótese de incidência de ICMS sobre a demanda de potência
elétrica efetivamente utilizada pelo consumidor. (fls. 665)
No voto, essas conclusões foram justificadas a partir de duas premissas, também
devidamente justificadas, a saber:
3. Premissa (I) que justifica a jurisprudência: para efeito de ICMS, energia elétrica é
mercadoria, e não serviço. (item 3 do voto - fls. 667/668)
4. Premissa (II) que também justifica a jurisprudência: a energia elétrica só é gerada
e só circula quando há consumo. (item 4 do voto - fls. 668/669)
Com base nessas premissas, foi estabelecida a seguinte conclusão:
Correta, portanto, repita-se, a jurisprudência firmada no STJ no sentido de que
"O ICMS deve incidir sobre o valor da energia elétrica efetivamente consumida,
isto é, a que for entregue ao consumidor, a que tenha saído da linha de transmissão
e entrado no estabelecimento da empresa"; "Não há hipótese de incidência do ICMS
sobre o valor do contrato referente a garantir demanda reservada de potência. (fls.
669)
Reproduziu-se inclusive a insuspeita manifestação da própria Confederação Nacional da
Indústria - CNI, na sua condição de amicus curiae , nos seguintes termos:
Anoto que essa conclusão guarda consonância com a manifestação da
Confederação Nacional da Indústria - CNI, como amicus curiae , a fls. 604:
"A demanda contratada pelo grande consumidor de energia com a distribuidora
de energia elétrica só é fato gerador do tributo em questão na medida em que o
consumidor faz uso dessa energia, pois é só nessa medida que tem lugar a
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transferência, pressuposto do tributo sub examen .
Quando um consumidor industrial reserva uma certa quantidade de potência
energética com a distribuidora e não chega a consumir toda essa monta, observa-se
que, em relação à diferença, não ocorreu a condição necessária e suficiente para o
nascimento da obrigação tributária. (fls. 677)
Os votos que acompanharam o relator também foram claros e explícitos:
"A EXMA. SRA. MINISTRA DENISE ARRUDA (Relatora): Em julgamentos
proferidos pela Primeira Turma/STJ, já acompanhei voto proferido pelo Ministro
Teori Albino Zavascki, sustentando que o fato gerador do ICMS é a demanda
efetivamente consumida, e não a contratada" (fls. 687).
"O EXMO. SR. MINISTRO HERMAN BENJAMIN (Relator): Discute-se a
incidência do ICMS sobre fornecimento de energia elétrica, considerando a
existência de demanda contratada, também conhecida por reserva de demanda ou
demanda garantida.
(...)
A questão ganha relevo quando o adquirente da energia utiliza apenas parcela do
valor total contratado, ou seja, quando o consumo é menor que a demanda garantida.
(...)
A contratação da demanda é objeto de negócio jurídico importante para a integridade
do sistema elétrico e para as atividades empresariais. Isso não significa, porém, que a
incidência estadual poderá alcançar a totalidade do contrato. Trata-se de garantia de
fornecimento que, por isso mesmo, não se confunde com a efetiva entrega da
mercadoria e, portanto, com a circulação tributável pelo Estado.
Importante salientar que não se afasta a tributação do ICMS sobre toda a demanda
contratada, mas apenas sobre a parcela não consumida pelo interessado" (fls.
691/692).
"O EXMO. SR. MINISTRO MAURO CAMPBELL MARQUES:
Sr. Presidente, concordo com a delimitação feita para fixação da abrangência do fato
gerador apresentada no voto do eminente Ministro Relator. Entendo que não estamos
confundindo a situação de política tarifária, como foi dito anteriormente, com a
delimitação do fato gerador". (fls. 693)
"EXMA. SRA. MINISTRA ELIANA CALMON:
(...)
A lei determina o fato gerador, que é a circulação da mercadoria. Se energia é
mercadoria, só pode ser sobre aquilo que circula. O que não circula pode ser
contratado, e é o valor do contrato, mas não é ICMS. Pode ser qualquer coisa, mas
não pode ser ICMS" (fls. 694).
Já os votos vencidos foram igualmente claros, no sentido de que simples contratação da
demanda de energia elétrica constitui fato gerador do ICMS. São elucidativas, no particular, as
seguintes passagens:
"EXMO. SR. MINISTRO CASTRO MEIRA:
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(...)
Como a energia elétrica é tratada como bem móvel por ficção legal, torna-se
compreensível que a entrega da mercadoria no ponto de conexão seja adotado como
critério decisivo de imputação temporal da operação tributável que, assim, se
considerará ocorrida nesse instante.
Sob esse prisma, a simples colocação da energia elétrica à disposição do consumidor
no ponto de entrega já é suficiente para aperfeiçoar o fato gerador do imposto.
(...)
Nesses termos, a destinação dada à potência contratada, seja ela efetivamente
utilizada ou não, é circunstância irrelevante para a incidência do ICMS.
Dá-se a circulação do bem quando disponibilizada a energia no ponto de entrega
indicado no contrato de fornecimento. A partir desse momento, pode-se dizer que a
empresa fornecedora já não detém titularidade sobre a demanda contratada.
Assim, o fato de não ter sido consumida a energia não desfigura a operação de
circulação, já que, colocada à disposição do consumidor, nenhum outro usuário
poderá consumi-la.
(...)
Em outras palavras, o consumidor está pagando para garantir a energia que consome
ou para dispor, quando bem lhe aprouver, de demanda de energia colada à sua
disposição" (fls. 680/6).
O EXMO. SR. MINISTRO HUMBERTO MARTINS:
A controvérsia restringe-se à não-incidência de ICMS sobre a demanda contratada
de energia elétrica, quando não consumida. Somente incide o ICMS sobre a demanda
efetivamente consumida, e não sobre a contratada, pois o fato gerador da obrigação
é a energia elétrica consumida; se não ocorrer o consumo, não há porque incidir a
obrigação da cobrança do tributo. Esse entendimento está pacificado nas duas
Turmas, inclusive na Primeira Seção
(...)
Todavia, diante do voto-vista do Min. Castro Meira - proferido no recurso em
mandado de segurança 21.748 - passei a manifestar meu entendimento no sentido de
que deve incidir o ICMS na operação de energia elétrica conhecida como "demanda
contratada".
De fato, a própria agência reguladora do sistema elétrico entende que a
responsabilidade da distribuidora vai até a disponibilização da energia elétrica no
ponto de conexão do sistema elétrico. A partir daí, se a energia será ou não
consumida, não interessa para a incidência do ICMS.
O importante é que a energia foi disponibilizada ao consumidor, e que esta mesma
energia não retorna ao poder da distribuidora, tampouco poderá ela ser vendida a
terceiros, ou seja, a transferência da mercadoria esgotou-se no momento em que foi
colocada à disposição no ponto de conexão.
Desta forma, se a empresa reservou energia perante a distribuidora de energia
elétrica, deverá pagar ICMS, tendo como base de cálculo toda esta "reserva
contratada" , independente ou não de tê-la utilizado" (fls. 688/690).
3. Enfatiza-se, portanto, que não há qualquer dúvida ou obscuridade a ser sanada. Os
embargos de declaração, na verdade, não tratam da questão jurídica posta na demanda, que,
conforme explicitado, diz respeito ao fato gerador . O que neles se questiona é tema relacionado
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com a base de cálculo . Também essa matéria foi clara e explicitamente enfrentada, conforme
se constata da própria ementa do acórdão embargado:
"3. Assim, para efeito de base de cálculo de ICMS (tributo cujo fato gerador supõe o
efetivo consumo de energia), o valor da tarifa a ser levado em conta é o
correspondente à demanda de potência efetivamente utilizada no período de
faturamento, como tal considerada a demanda medida , segundo os métodos de
medição a que se refere o art. 2º, XII, da Resolução ANEEL 456/2000,
independentemente de ser ela menor, igual ou maior que a demanda contratada." (fls.
665)
Essa conclusão, além de estar claramente explicitada, foi justificada amplamente no voto,
constituindo decorrência lógica e natural da própria definição do fato gerador: se o fato gerador é
a demanda de energia elétrica efetivamente utilizada, a base de cálculo é o preço que foi pago
por esse consumo. Fez-se, inclusive, longa explanação sobre o modo como a tarifa de energia é
estabelecida pelo sistema tarifário vigente em nosso País, inclusive no que se refere aos
consumidores do Grupo A (fls. 669-674), ficando claro que a tarifa de energia elétrica é fixada
por atos normativos (especialmente o Decreto 62.724/89, que "estabelece normas gerais de
tarifação para as empresas concessionárias de serviços públicos de energia elétrica ") e não por
contrato, normas essas cuja legitimidade ou constitucionalidade jamais foram postas em dúvida.
Esclareceu-se que, por força desse sistema normativo, a tarifa de energia dos grandes
consumidores (Grupo A) é fixada por critérios especiais. Para esses consumidores,
(...) o valor da tarifa mensal leva em consideração, como já se disse, não apenas a
quantidade de kWh consumida no período de faturamento, mas também o modo
como esse consumo ocorreu nesse período. Nesse caso, o valor unitário de cada
kW consumido leva em conta dois elementos (daí denominar-se tarifa binômia), a
saber: (a) um de valor unitário fixo, que é multiplicado pela quantidade de kWh
consumida no período, e outro (b) de valor unitário variável, fixado de acordo com
as condições de utilização da demanda de potência elétrica no período de
faturamento, para o que se considera, entre outros fatores, (b.1) o horário do dia em
que o consumo se deu (nos horários de ponta a energia é mais cara; de madrugada é
mais barata), (b.2) o dia da semana em que ocorreu o consumo (nos dias úteis é
mais cara; nos domingos e feriados é mais barata), (b.3) a época do ano em que a
energia é consumida (em época de seca é mais cara; em período úmido é mais
barata), e assim por diante. A especificação desses elementos de cálculo constam
dos artigos 49 a 52 da Resolução ANEEL 456/2000.
As questões relacionadas com o modo de fixar a tarifa para os consumidores do Grupo A,
portanto, nada tem a ver com "demanda contratada" ou com o fato gerador do ICMS. Como bem
observou o Ministro Mauro Campbell Marques, não se pode confundir política tarifária com fato
gerador do ICMS. O sistema tarifário tem natureza normativa e não contratual. A tarifa é fixada
por normas expedidas por autoridades federais, razão pela qual não pode ser objeto de disposição
por contrato e muito menos por legislação tributária estadual. É a norma, e não o contrato, que
define o valor e o modo de calcular o preço da demanda de energia elétrica consumida. O que
aqui se decidiu - e se reafirma - é que o fato gerador do ICMS é o efetivo consumo (e não a
simples contratação da demanda de energia elétrica) e que a base de cálculo não é o preço da
demanda de energia contratada, mas sim o preço correspondente a essa demanda efetivamente
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utilizada, preço esse que é determinado, não pelo contrato, mas pelas normas que definem a
política tarifária.
Esclareça-se por fim que, por imposição normativa do sistema tarifário, as faturas de
energia elétrica mensalmente enviadas aos consumidores devem discriminar não apenas a
demanda de energia elétrica contratada , mas também a efetivamente utilizada, razão pela
qual o consumo é monitorado e medido por aparelhagem adequada. Isso permite fazer, na
prática, a distinção entre uma e outra. No caso concreto, as faturas juntadas na inicial trazem
claramente essa discriminação (fls. 24 a 27). O Estado fez incidir ICMS sobre a tarifa cobrada
pelo total da demanda contratada. O que aqui ficou decidido, repita-se, é que ele deve incidir
apenas sobre a tarifa correspondente à demanda utilizada, assim considerada a efetivamente
medida no período de faturamento, devendo, portanto, ser restituída à autora a parcela cobrada a
maior.
4.
Diante do exposto, rejeito os embargos de declaração. É o voto.
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VOTO VENCIDO
A EXMA. SRA. MINISTRA DENISE ARRUDA:
Trata-se de embargos de declaração (fls. 702/709) opostos contra
acórdão sintetizado na seguinte ementa:
"TRIBUTÁRIO.
ICMS. ENERGIA ELÉTRICA.
DEMANDA DE
POTÊNCIA. NÃO INCIDÊNCIA SOBRE TARIFA CALCULADA COM
BASE EM DEMANDA CONTRATADA E NÃO UTILIZADA. INCIDÊNCIA
SOBRE TARIFA CALCULADA COM BASE NA DEMANDA DE
POTÊNCIA ELÉTRICA EFETIVAMENTE UTILIZADA.
1. A jurisprudência assentada pelo STJ, a partir do julgamento do REsp
222.810/MG (1ª Turma, Min. José Delgado, DJ de 15.05.2000), é no
sentido de que 'o ICMS não é imposto incidente sobre tráfico jurídico, não
sendo cobrado, por não haver incidência, pelo fato de celebração de
contratos', razão pela qual, no que se refere à contratação de demanda de
potência elétrica, 'a só formalização desse tipo de contrato de compra ou
fornecimento futuro de energia elétrica não caracteriza circulação de
mercadoria'. Afirma-se, assim, que 'o ICMS deve incidir sobre o valor da
energia elétrica efetivamente consumida, isto é, a que for entregue ao
consumidor, a que tenha saído da linha de transmissão e entrado no
estabelecimento da empresa'
2. Na linha dessa jurisprudência, é certo que 'não há hipótese de incidência
do ICMS sobre o valor do contrato referente à garantia de demanda
reservada de potência'. Todavia, nessa mesma linha jurisprudencial,
também é certo afirmar, a contrario sensu, que há hipótese de incidência de
ICMS sobre a demanda de potência elétrica efetivamente utilizada pelo
consumidor.
3. Assim, para efeito de base de cálculo de ICMS (tributo cujo fato gerador
supõe o efetivo consumo de energia), o valor da tarifa a ser levado em
conta é o correspondente à demanda de potência efetivamente utilizada no
período de faturamento, como tal considerada a demanda medida, segundo
os métodos de medição a que se refere o art. 2º, XII, da Resolução ANEEL
456/2000, independentemente de ser ela menor, igual ou maior que a
demanda contratada.
4. No caso, o pedido deve ser acolhido em parte, para reconhecer indevida
a incidência do ICMS sobre o valor correspondente à demanda de potência
elétrica contratada mas não utilizada.
5. Recurso especial parcialmente provido. Acórdão sujeito ao regime do art.
543-C do CPC e da Resolução STJ 08/08."
(fl. 697)
A embargante sustenta, em síntese, que o acórdão atacado contém as
seguintes obscuridades:
1) a jurisprudência anterior "era no sentido de que a base de cálculo do
ICMS abrangia apenas o valor da energia consumida, com exclusão de qualquer outro valor", e o
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voto condutor "parece" admitir a incidência do ICMS sobre outras parcelas;
2) considerando que a "demanda de potência máxima pode espelhar um
instante absolutamente isolado de sobrecarga do sistema (....), não é razoável adotá-la como o
fator a ser considerado para a apuração da base de cálculo do ICMS de todo o mês em questão";
3) sendo a demanda medida inferior à demanda contratada, subsiste
tão-somente a tarifa decorrente do contrato de demanda, e o ICMS não pode incidir sobre o valor
integral de tal tarifa, sob pena de se inviabilizar "a implementação da decisão tomada por esta
Corte".
Requer sejam sanados os vícios apontados.
Em Sessão Ordinária realizada em 24 de junho de 2009, a Primeira
Seção/STJ, aderindo aos fundamentos trazidos pelo Ministro Relator, rejeitou os presentes
embargos, entendendo que não há dúvida ou obscuridade a ser sanada, porquanto foi consignado
no acórdão embargado que, "para efeito de base de cálculo do ICMS (tributo cujo fato gerador
supõe o efetivo consumo de energia), o valor da tarifa a ser levado em conta é o correspondente à
demanda de potência efetivamente utilizada no período de faturamento, como tal considerada a
demanda medida".
Não obstante o respeito que tributo aos eminentes Ministros que
compõem a Primeira Seção/STJ, ousei divergir da douta maioria.
Embora tenha acompanhado o Ministro Teori Albino Zavascki no
julgamento do recurso especial, posteriormente, analisando melhor o tema, entendi que,
considerando que o fato gerador do ICMS, nas operações envolvendo fornecimento de energia
elétrica, é o consumo, somente o consumo é que dará margem à base de cálculo do tributo, de
modo que não se pode agregar a tal base de cálculo a tarifa decorrente da demanda medida.
Nesse contexto, é de se considerar que, eventualmente, a tarifa
decorrente da demanda ("demanda medida") não corresponde à energia elétrica efetivamente
consumida, motivo pelo qual não pode integrar a base de cálculo do ICMS. Apenas a tarifa
decorrente do consumo (expressa em Kwh) integra a base de cálculo do tributo. Ressalte-se que a
orientação desta Corte, desde o julgamento do REsp 222.810/MT (1ª Turma, Rel. Min. Milton Luiz
Pereira, Rel. p/ acórdão Min. José Delgado, DJ de 15.5.2000), firmou-se no sentido de que "a
garantia de potência e de demanda, no caso de energia elétrica, não é fato gerador do
ICMS. Este só incide quando, concretamente, a energia for fornecida e utilizada,
tomando-se por base de cálculo o valor pago em decorrência do consumo apurado".
Por tais razões, com renovada vênia, votei no sentido de acolher os
presentes embargos de declaração, para afastar da base de cálculo do ICMS o valor
correspondente à demanda medida.
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CERTIDÃO DE JULGAMENTO
PRIMEIRA SEÇÃO
EDcl no
REsp 960476 / SC
Número Registro: 2007/0136295-0
Números Origem: 20060214353000200 23040017586
PAUTA: 24/06/2009
JULGADO: 24/06/2009
Relator
Exmo. Sr. Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI
Presidente da Sessão
Exmo. Sr. Ministro LUIZ FUX
Subprocurador-Geral da República
Exmo. Sr. Dr. MOACIR GUIMARÃES MORAES FILHO
Secretária
Bela. Carolina Véras
AUTUAÇÃO
RECORRENTE
ADVOGADO
RECORRIDO
PROCURADOR
:
:
:
:
MONTEGUTI INDÚSTRIA COMÉRCIO E TRANSPORTES LTDA
FELIPE DE SOUTO E OUTRO(S)
ESTADO DE SANTA CATARINA
RICARDO DE ARAÚJO GAMA E OUTRO(S)
ASSUNTO: Tributário - ICMS - Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e Serviços
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO
EMBARGANTE
ADVOGADO
EMBARGADO
PROCURADOR
:
:
:
:
MONTEGUTI INDÚSTRIA COMÉRCIO E TRANSPORTES LTDA
TIAGO CONDE TEIXEIRA E OUTRO(S)
ESTADO DE SANTA CATARINA
RICARDO DE ARAÚJO GAMA E OUTRO(S)
CERTIDÃO
Certifico que a egrégia PRIMEIRA SEÇÃO, ao apreciar o processo em epígrafe na
sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
"A Seção, por maioria, vencida em parte a Sra. Ministra Denise Arruda, rejeitou os
embargos de declaração, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator."
Os Srs. Ministros Castro Meira, Humberto Martins, Herman Benjamin, Mauro Campbell
Marques, Benedito Gonçalves e Eliana Calmon votaram com o Sr. Ministro Relator.
Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Francisco Falcão.
Documento: 897923 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJ: 03/08/2009
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Superior Tribunal de Justiça
Brasília, 24 de junho de 2009
Carolina Véras
Secretária
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