FRACASSO ESCOLAR E POLÍTICAS PÚBLICAS: A AMPLIAÇÃO DO ENSINO FUNDAMENTAL Aline Paula Marin 1 UNIVERSIDADE FEDERAL DE RONDÔNIA Financiamento: CNPq [email protected] RESUMO: Embora nos últimos anos tenha ocorrido significativo avanço nas discussões a respeito do fracasso escolar ainda existem concepções cristalizadas que culpabilizam a criança e sua família pela não aprendizagem. A partir da década de 1980, quando as discussões sobre o tema ganham a importante contribuição dos estudos de Patto, a Psicologia passa a analisar as Políticas Públicas referentes à educação, que têm em comum o discurso de enfrentamento da exclusão, superação de preconceitos e defesa de uma escola para todos. O que se constata é que há um hiato entre intenção e realidade. Essa constatação aponta para a importância de trabalhos que se dediquem a conhecer os bastidores dessas políticas e o que de fato ocorre em suas implementações. Nesse sentido, o presente texto apresenta algumas discussões baseadas na literatura e nos dados de uma pesquisa de abordagem qualitativa realizada em oito escolas públicas da rede estadual de ensino no município de Rolim de Moura - RO sobre a ampliação do Ensino Fundamental para nove anos realizada em 2009. Instrumentos utilizados: análise documental, registro fotográfico, entrevistas individuais e coletivas. Foram entrevistadas a Coordenadora Pedagógica da Representação de Ensino (REN), órgão representativo da Secretaria de Estado da Educação (SEDUC) no município, e os/as professores/as das escolas envolvidas na pesquisa. Os resultados indicam que os objetivos propostos pela ampliação não foram plenamente alcançados e que podem contribuir com o avanço do fracasso ao invés ajudar na sua superação. A implantação se deu de forma intempestiva, sem nenhuma preparação prévia que garantisse alterações dos aspectos estruturais das escolas, adaptações curriculares e/ou discussões/formação com as equipes pedagógicas e os professores. Diante disto destaca-se a importância da discussão dessas políticas pelos atores escolares e os grandes problemas advindos das formas errôneas de implantá-las, como por exemplo, a imposição, colaborando para a manutenção do fracasso nas escolas. PALAVRAS-CHAVE: Fracasso escolar; Políticas públicas; Ensino Fundamental. 1- Introdução Uma das grandes contribuições da Psicologia à Educação se dá na possibilidade de, através dos conhecimentos daquela compreender os processos desta. Processos que, em sua maioria, são relacionados a comportamento e aprendizagem. Entretanto, durante muito tempo prevaleceram (e por que não dizer ainda prevalecem) no campo Psicologia Escolar, explicações para a não aprendizagem de crianças, principalmente as das classes populares, 1 Pedagoga, acadêmica do Mestrado em Psicologia da Universidade Federal de Rondônia. 2 que centravam a culpa no indivíduo e em sua família, utilizando os mais diversos argumentos fundamentados em teorias como carência cultural, desnutrição, famílias desestruturadas, etc. Esse quadro só começa a sofrer alterações quando essas explicações passam a ser questionadas nas suas finalidades e princípios epistemológicos, introduzidas a partir da publicação da obra de Maria Helena Souza Patto (1984) “Psicologia e Ideologia: uma introdução crítica à Psicologia Escolar” onde, segundo Souza (2006) a autora expõe claramente a inconsistência dessas explicações. A partir desses questionamentos a Psicologia passa a analisar as Políticas Públicas referentes à educação. A escola então começa, a partir da década de 1980 a ser atravessada por processos de transformação com implantações das mais diversas políticas públicas. Uma das mais recentes foi a ampliação do Ensino Fundamental para nove anos. Partindo do princípio de que um dos objetivos presentes no bojo dessas políticas é a melhoria da educação brasileira e consequentemente a superação do fracasso escolar, mister se faz discuti-las nesse contexto. Procurou-se contribuir com essas discussões neste texto. Primeiramente são apresentadas e discutidas algumas concepções acerca do fracasso escolar e em seguida algumas considerações sobre políticas públicas, sendo focalizada a ampliação do Ensino Fundamental para nove anos, com base em uma pesquisa realizada em Rondônia. 2. Concepções de Fracasso Escolar Na década de 1980, quando se intensificaram diversos movimentos em favor da redemocratização do país, ocorre também o início das discussões e questionamentos a respeito de concepções cristalizadas da psicologia escolar relacionadas ao fracasso escolar, principalmente após a publicação da obra de Patto (1984). Nesse momento de grande movimentação social e acadêmica começam também a ocorrer mudanças no cenário educacional, muitas delas voltadas à implantação de políticas públicas buscando a melhoria da complicada situação educacional no país. Um dos maiores complicadores dessa situação era o analfabetismo que atingia níveis altíssimos, já que a maioria da população sequer tinha acesso à educação. 3 Após a promulgação da Constituição de 1988 abriram-se novas perspectivas para implantação dessas políticas. Uma delas foi constar na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional 9394 (1996) o direito à educação básica, que compreende da educação infantil ao ensino fundamental, para todos. Porém, somente possibilitar a entrada na escola sem oferecer condições de permanência e acesso ao saber escolar não é suficiente. De acordo com Souza (2006) pesquisas realizadas sobre essa temática (Asbahr, 2005; Viégas, 2002), a apontam como uma questão de fundamental importância e que deve ser considerada no âmbito das políticas públicas em educação, visto que nem sempre nas implantações são alcançados os objetivos propostos, objetivos esses que quase em sua totalidade buscam a promoção do sucesso e não do fracasso escolar. No campo da Psicologia encontramos diversas concepções sobre as dificuldades de escolarização que se traduzem no fracasso escolar. Concepções “tradicionais” que vão desde a centralização da causa no indivíduo, causa que advém de carências que podem ser de ordem nutricional, cultural, etc fazendo com que toda a responsabilidade do mau rendimento escolar recaia sobre o aluno e consequentemente sobre sua família, até concepções mais críticas (Patto, 1984) que procuram analisar o processo que leva ao fracasso como um todo para tentar compreendê-lo e contribuir para sua superação. Dentre as perspectivas que tentam explicar o fracasso escolar focalizando a culpa na criança, se apresentam as que partem, ora de um viés médico/psíquico, ora relacionando técnicas e métodos inadequados responsáveis pela não aprendizagem, sinalizando em sua maioria o preconceito existente em relação às camadas menos favorecidas da população. Quando o fracasso escolar é compreendido por esse viés contribui-se para estigmatizar o aluno de camadas menos favorecidas em virtude do preconceito. De acordo com Collares e Moysés, (1996) no contexto por elas pesquisado: A explicação para o fracasso escolar recai sempre sobre o aluno e seus pais: Crianças não aprendem porque são pobres, porque são negras, porque são nordestinas, ou provenientes de zona rural; são imaturas, são preguiçosas; não aprendem porque os pais são analfabetos, são alcoólatras, as mães trabalham fora, não ensinam aos filhos... (p. 26) 4 No interior desses preconceitos há o discurso biologizante do fracasso escolar. Afirmando que por possuir algum problema de ordem biológica, podendo ser neurológico, físico e até mesmo psíquico, a criança não aprenderia. Esse discurso isenta de responsabilidades o sistema social/educacional que se apresenta como “vítima”. Asbahr, Viégas e Angelucci (2006) afirmam que essas concepções que defendem a culpabilização do indivíduo justificando seu insucesso em carências “[...] têm contribuído para a intensa psicologização da educação. O psicólogo é chamado para emitir laudos, buscando na criança as causas das dificuldades escolares.” (p. 11) As autoras ainda afirmam que além de não explicar realmente o fracasso, essas concepções até imobilizam a prática pedagógica dificultando a reflexão dos professores sobre a constituição social do indivíduo que é fortemente marcada pelas práticas e processos escolares. Aparecem também explicações que tendem a culpabilizar o professor por não dominar técnicas de ensino adequadas, mudando o foco que estava no aluno e sua família e agora recai sobre o professor: “Afirma-se que o fracasso escolar é produzido na e pela escola, mas reduz-se esta produção à sua inadequação técnica. Na verdade continua-se a compreender o fracasso escolar como resultado de variáveis individuais [...]” (Angelucci, Kalmus, Paparelli, & Patto 2004, p.61). Essas concepções já haviam sido apontadas por Patto, (1984) quando esta discute o comprometimento político da Psicologia, questiona a serviço de quem estaria essa Psicologia Escolar e suas práticas que pouco contribuíam para a melhoria da qualidade da escola como direito a todas as crianças principalmente das classes populares. Em 1999 Patto publica o trabalho “A produção do fracasso escolar: histórias de submissão e rebeldia”. Esta obra contribuiu significativamente com os estudos da área da Psicologia Escolar, que busca romper com as explicações inadequadas que centravam a culpa pelo fracasso no aluno e sua família, e defende uma compreensão do fracasso como produção da própria escola. A autora chama a atenção para as contradições dessas explicações que culpabilizam a criança e sua família ao afirmar que 5 É no mínimo incoerente concluir, a partir do rendimento numa escola cujo funcionamento pode estar dificultando, de várias maneiras, sua aprendizagem escolar, que a chamada “criança carente” traz inevitavelmente para a escola dificuldades de aprendizagem. ... a desvalorização social da clientela e o preconceito em relação a ela, certamente estão entre as principais idéias feitas e acriticamente incorporadas; longe de serem meras opiniões gratuitas, estas idéias ganham força ao serem confirmadas por um determinado modo de produzir conhecimentos, que alça opiniões do senso comum ao nível de verdades científicas inquestionáveis. Desvendar as maneiras através das quais este preconceito se faz presente na vida da escola mostrou-se um caminho produtivo no esclarecimento do processo de produção escolar. Como vimos esse preconceito é estruturante de práticas e processos que constituem desde as decisões referentes à política educacional até a relação diária da professora com seus alunos. (p. 407) (grifo da autora) Pode-se ver claramente, de acordo com as considerações da autora, a forma reducionista e preconceituosa que muitos compreendem a questão do fracasso escolar, taxando crianças e suas famílias como portadoras de diferentes déficits e deficiências. Embora discussões, que apontam como equivocadas as concepções excludentes, preconceituosas e patologizantes do fracasso escolar, já venham ocorrendo há algum tempo ainda é comum encontrarmos esses discursos e práticas nos dias atuais. Às vezes até pregase um discurso sem preconceito e de não exclusão, mas a realidade na prática se mostra contrária. Isso é visto nos mais variados setores da educação inclusive nas implantações de políticas públicas. De acordo com Souza (2006) embora as políticas educacionais implantadas no Brasil desde a década de 1990 tenham em comum o discurso de enfrentamento da exclusão, em defesa de uma escola para todos, democraticamente, há um hiato entre a intenção e a realidade. A autora destaca a importância de pesquisas que se dediquem a conhecer os bastidores dessas políticas de maneira a identificar como são analisadas por aqueles que as vivem e que as materializam em suas práticas educativas. 3- A ampliação do Ensino Fundamental para nove anos – uma pesquisa em Rondônia Uma das mais recentes implantações de política pública na área educacional no Brasil foi o aumento no número de anos do Ensino Fundamental. Essa ampliação do ensino 6 obrigatório tem sido gradativa no Brasil. A Lei nº. 4.024 de 1961, estabelecia apenas quatro anos; em 1970 a meta era ampliar a obrigatoriedade para seis anos. E a Lei nº 5.692 de 1971 estendeu-a para oito anos. A partir de um movimento mundial em que vários países adotam o Ensino Fundamental de nove anos, o Brasil estabeleceu como meta no Plano Nacional de Educação/PNE, por meio da Lei nº. 10.172 de 09 de janeiro de 2001, ampliar o ensino obrigatório para nove anos, iniciando-se aos seis anos de idade. Assim diz o segundo ponto da parte denominada Objetivos e Metas para o ensino fundamental do PNE: “Ampliar para nove anos a duração do Ensino Fundamental obrigatório com início aos seis anos de idade à medida que for sendo universalizado o atendimento na faixa de 7 a 14 anos.” O documento deixa claro que a iniciativa para o cumprimento deste objetivo/meta deve partir da União. Diante disto, o Congresso Nacional aprovou a Lei nº. 11.274, de 6 de fevereiro de 2006, alterando a redação dos artigos 29, 30, 32 e 87 da LDB, instituindo a matrícula obrigatória no Ensino Fundamental a partir de 6 anos de idade. Lei esta que consequentemente ampliou para 9 anos a duração deste nível de ensino. No artigo 5º estabelece que o prazo para os Municípios, os Estados e o Distrito Federal implementassem a ampliação foi até o final de 2010. Sendo assim supõe-se que todas as escolas públicas e privadas já estejam de acordo com a nova legislação. Em Rondônia, a Resolução n.131/06-CEE/RO de 14 de dezembro de 2006, com base no Parecer 105/06 – CEE/RO de 12 de dezembro do mesmo ano fixou normas para a implantação do Ensino Fundamental de nove anos no Sistema Estadual de Ensino a partir do ano letivo de 2007. E, com base nos referidos documentos a Secretaria Estadual de Educação baixou a Portaria n. 283/07 – GAB/SEDUC em 11 de janeiro de 2007, fixando as normas para implantação do Ensino Fundamental de 9 anos nas unidades escolares da rede pública estadual. A partir deste quadro de grandes mudanças no cenário da educação no Brasil faziase necessária a compreensão de como se dava essa ampliação em um município do estado de Rondônia. Em 2008/2009, durante minha participação no Programa Institucional de Bolsas e Iniciação Científica (PIBIC), realizei uma investigação, parte da pesquisa maior: “O que fazem as escolas quando as crianças não aprendem a ler a e a escrever” financiada 7 pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), sobre a implantação do Ensino Fundamental de nove anos em Rolim de Moura/RO. A investigação, de abordagem qualitativa foi desenvolvida em oito escolas públicas da rede estadual de ensino por meio da análise documental, registro fotográfico, entrevistas individuais e coletivas. Foram entrevistadas a Coordenadora Pedagógica da Representação de Ensino (REN), órgão representativo da Secretaria de Estado da Educação (SEDUC) no município e os/as professores/as das escolas envolvidas na pesquisa. A ampliação no estado, com base na legislação estadual e fala dos entrevistados, aponta o hiato existente entre o que diz a lei e o que de fato ocorreu. Quando questionados/as sobre adaptações curriculares, adaptações de espaço físico, formação de professores, enfim a preparação adequada para que fosse implementada a política de ampliação os/as entrevistados/as são unânimes em afirmar que o que a lei afirma de fato não se concretizou. Na Resolução n.131/06-CEE/RO de 14 de dezembro de 2006 em parágrafo único, lê-se: “O direito ao ensino fundamental corresponde ao acesso e permanência do aluno na escola, e oferta de ensino de qualidade” (2006). Foi questionada essa oferta de qualidade ao constatar-se que as escolas não foram preparadas. A escola permanece a mesma, como pode ser visto nas discussões travadas entre as professoras da Escola C/Rolim de Moura 2008, durante a entrevista coletiva. Entrevistadora: E as condições de atendimento desses de seis é a mesma das outras? Não tem nada de diferente? Tamanho da carteira? Todas: Não, tudo igual. Entrevistadora: Tudo a mesma coisa? Todas: Tudo igual. Tudo igual. Na escola X o discurso é o mesmo: Entrevistadora: Então do ponto de vista físico, carteiras e cadeiras continuam tudo do mesmo tamanho? As crianças... só entraram aos seis anos? A escola continua a mesma... Professora 2: A mesma Professora 3: O espaço físico... Professora 4: A quantidade... (Professoras Escola X/Rolim de Moura - 2008) Na escola E: 8 Entrevistadora: [...] teve alguma alteração no processo da escola para atender esses meninos? Do ponto de vista do espaço físico, da adaptação curricular? Todos: não Entrevistadora: Então essas turmas de seis anos elas têm se caracterizado como uma primeira série pra vocês? Professora 4: Sim! (Professores Escola E/Rolim de Moura 2008) O fato se confirma na fala da Coordenadora Pedagógica da REN: “[...] adaptação do espaço, isso não aconteceu, né... nem do espaço nem do mobiliário...” (Coordenação Pedagógica REN/SEDUC/Rolim de Moura 2008) É então questionada a vantagem de incluir as crianças mais cedo na escola sem a devida preparação para o oferecimento de um “ensino de qualidade”. Rocha (2007) quando questionada sobre a necessidade de preparação para a recepção das crianças de seis anos em escolas de Ensino Fundamental afirma: Sem dúvida há. Levar a criança antecipadamente para escola sem mudar as condições de aprendizagem, em termos de diversificação de materiais, de condições de ensino, de acesso, seja aos meios eletrônicos, seja as bibliotecas, enfim, as condições de infra-estrutura da escola, também não alteram muito a qualidade. As crianças ficam na escola mais tempo e vão ter o mesmo tipo de experiência e de qualidade de ensino que já vem sendo realizado. (p. 03) A mesma autora afirma também que, além de não ser vantajosa a implantação sem as condições necessárias, há ainda o risco de que essas crianças sofram prejuízos ainda mais severos do que aquelas que se encontram em processo de alfabetização e não têm obtido êxito O maior perigo que pode haver aqui em termos de prejuízo para as crianças é que se imponha uma mera e simples antecipação do conteúdo, que já se colocava para o primeiro ano. Então, se aquele primeiro ano que tradicionalmente está colocado no Brasil é um primeiro ano que resulta em repetência, em evasão e em uma não efetivação do processo de 9 letramento, antecipá-lo não resolverá o problema, considerando que essas crianças são mais novas. (p. 03) Portanto, de nada adianta implantar uma política sem a devida preparação, visto que algumas vezes o tiro pode sair pela culatra e ao invés de trazermos benefícios às crianças podemos simplesmente estar aumentando as chances de fazê-las fracassar. Diante dos demais dados apresentados pela pesquisa, constata-se que há um descaso por parte do poder público no estado que de maneira frequente assume a implantação de políticas educacionais de forma intempestiva à revelia de discussões, sem nenhum tipo de planejamento em médio e longo prazo, sendo essa uma prática comum não só em Rondônia, mas em todo o país. Sendo assim, Vizin (2003) tem razão quando afirma que “a sinalização desta crescente ampliação de vagas para milhares de crianças brasileiras, não revela com fidedignidade a que preço este processo tem sido feito e se as crianças, de fato, estão se beneficiando de uma educação com qualidade de conhecimento” (p. 50). Barbosa (2003) alerta para a falta de pesquisas bem fundamentadas que possibilitem afirmar os benefícios da antecipação do ensino obrigatório e também discute a persistência de elevados índices de fracasso escolar nos primeiros anos, além da existência de um contingente significativo de crianças de 7 a 14 anos fora da escola. Nas palavras da autora: Se ingressar aos 6 anos significar a expansão da educação infantil a partir dos maiores e dos que necessitam com urgência de uma experiência de letramento através de um projeto pedagógico voltado para a ludicidade, para o desenvolvimento das diversas linguagens simbólicas para as interações sociais, para o jogo e a brincadeira, isto é, para viver a infância, então ótimo. No entanto, se significar “o massacre dos inocentes” como é para aquele terço das crianças que está com 7 anos na primeira série do ensino fundamental, é preciso repensar seriamente essa proposta. (p. 37) (grifo da autora) Os dados da pesquisa mostram que no estado de Rondônia o mais provável é que tenha se optado pela segunda alternativa e o “massacre dos inocentes” esteja em curso, conforme indica a forma como foi encaminhada a implantação do Ensino de nove nas escolas. 10 4- Considerações Finais Sintetizando, concepções cristalizadas que centram as causas do fracasso escolar nas crianças e suas famílias ainda permanecem. Quando o fracasso escolar é compreendido por esse viés contribui-se para estigmatizar o aluno de camadas menos favorecidas em virtude do preconceito. Para enfrentamento desse fracasso são implementadas políticas educacionais. Entretanto o enfrentamento de fato, esbarra nas formas hierarquizadas e pouco democráticas de implementação. E o que é mais grave, a implantação de políticas educacionais sem os necessários investimentos nas condições estruturais imprescindíveis para sua efetivação. De acordo com os resultados da pesquisa realizada em Rolim de Moura sobre a implantação do Ensino Fundamental de nove anos foi justamente isso que aconteceu. Deuse de forma intempestiva, sem nenhuma preparação prévia que garantisse alterações dos aspectos estruturais das escolas, adaptações curriculares e/ou discussões/formação com as equipes pedagógicas e os/as professores/as. Diante disto destaca-se a importância da discussão dessas políticas pelos atores escolares e os grandes problemas advindos das formas errôneas de implantá-las, como por exemplo, a imposição, colaborando para a manutenção do fracasso nas escolas. 5- Referências Angelucci, C. B; Kalmus, J.; Paparelli, R.; Patto, M. H. S. (2004) O estado da arte da pesquisa sobre o fracasso escolar (1991-2002): um estudo introdutório. Recuperado em: 25 de setembro de 2010. Obtido em: http://www.scielo.br/pdf/ep/v30n1/a04v30n1.pdf 11 Asbahr, F.S. F.; Viegas, L. S.; Angelucci, C. B. (2006). Em Asbahr, F.S. F.; Viegas, L. S.; Angelucci, C. B. (orgs.) Políticas Públicas em Educação e Psicologia Escolar (pp. 0923). São Paulo, SP: Casa do Psicólogo. Asbahr, F. S. F. (2006) Sobre o Projeto Político-Pedagógico (Im)possibilidades de Construção. Em Asbahr, F.S. F.; Viegas, L. S.; Angelucci, C. B Políticas Públicas em Educação e Psicologia Escolar (pp. 77-115). São Paulo, SP: Casa do Psicólogo. Barbosa, M. C. Inquietações e perplexidades (2006). Pátio Educação Infantil, 3, 46-47. Collares, C. A. L. & Moysés, M. A. A. (1996) Preconceitos no cotidiano escolar: ensino e medicalização. São Paulo, SP: Cortez. Lei n. 4.024, de 20 de dezembro de 1961. Fixa as Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Recuperada em: 17 de maio de 2011 de http://www.histedbr.fae.unicamp.br/navegando/fontes_escritas/6_Nacional_Desenvolvi mento/ldb%20lei%20no%204.024,%20de%2020%20de%20dezembro%20de%201961 .htm Lei n. 5.692 de 11 de agosto de 1971. Fixa Diretrizes e Bases para o ensino de 1º e 2º graus e dá outras providências. Recuperada em: 16 de maio de 2011 de http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L5692.htm Lei n. 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Em. Coleção Proinfantil: Legislação. Brasília: Ministério da Educação, Secretaria de Educação Básica; Secretaria de Educação à Distância. 12 Lei n. 10.172, de 09 de janeiro de 2001. Aprova o Plano Nacional de Educação e dá outras providências. Em Coleção Pro-Infantil – Legislação. Brasília: MEC/SEB/SED. Lei n. 11.274 de 06 de fevereiro de 2006. Dispõe sobre a duração de 9 (nove) anos para o ensino fundamental, com matrícula obrigatória a partir dos 6 (seis) anos de idade. Recuperado em 15 de setembro, 2010, de: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2004-2006/2006/Lei/L11274.htm Patto, M. H. S. (1984) Psicologia e ideologia: uma introdução crítica à psicologia escolar. São Paulo, SP: T.A. Queiroz. Patto, M. H. S. (1999) A produção do fracasso escolar: histórias de submissão e rebeldia. (2ª ed.) São Paulo, SP: Casa do Psicólogo. Portaria n. 283 de 11 de janeiro de 2007. Fixa normas para implementação gradativa do Ensino Fundamental de 9 anos nas unidades escolares da Rede Pública Estadual, a partir do ano de 2007, e dá outras providências. Porto Velho, RO: Secretaria de Estado da Educação. [Digitado]. Rocha, E. A. C. (2007), Entrevista concedida em Julho de 2007 pela Profª Drª Eloísa Acires Candal Rocha à bolsista de Iniciação Científica Pibic/CNPq Mariê Luise Campos. Recuperado em: 20 de outubro de 2010. Obtido em: http://www.periodicos.ufsc.br/index.php/zeroseis/article/viewFile/857/753 Resolução n. 131 de 14 de dezembro de 2006. Fixa normas para a implantação do ensino fundamental de nove anos no Sistema Estadual de Ensino a partir do ano letivo de 2007. Porto Velho, RO: Conselho Estadual de Educação. [Digitada]. 13 Souza, M. P. R. (2006) Políticas Públicas e Educação: Desafios, Dilemas e Possibilidades. Em ASBAHR, F.S. F.; VIEGAS, L. S.; ANGELUCCI, C. B. (orgs.) Políticas Públicas em Educação e Psicologia Escolar. (pp. 229-243) São Paulo, SP: Casa do Psicólogo. Viégas, L. S. (2006) Regime de Progressão Continuada em Foco: Breve Histórico, o Discurso Oficial e Concepções de Professores. Em Asbahr, F.S. F.; Viegas, L. S.; Angelucci, C. B Políticas Públicas em Educação e Psicologia Escolar. (pp. 147-186) São Paulo, SP: Casa do Psicólogo. Vizin, M. (2003) Educação Inclusiva: o avesso e o direito de uma mesma realidade. Em Silva, S & Vizin, M (orgs.) Políticas públicas: educação, tecnologias e pessoas com deficiência. (pp. 49-72). Campinas, SP: Mercado de Letras.