A ÉTICA, A INDICAÇÃO DE MARCAS DE ÓRTESES, PRÓTESES E MATERIAIS POR PROFISSIONAIS DA SAÚDE E OS PLANOS DE SAÚDE *Flávia Robert No último domingo (4 de janeiro), o programa da TV Globo Fantástico, através da matéria denominada Máfia das próteses coloca em risco a vida de milhares de brasileiros preocupou toda a sociedade com tema que há muito é considerado pelas operadoras de planos de saúde como um grave problema ético que impacta diretamente nos custos assistenciais. Órteses, próteses e materiais especiais, conhecidos pela sigla OPME, abrangem os insumos utilizados em procedimentos médicos, em especial, nos tratamentos ortopédicos, neurológicos, cardiológicos e gastroenterológicos. Ninguém opta premeditadamente pela doença, mas quando a enfermidade acomete o paciente, é inerente a fragilidade e necessidade de atendimento, apoio e suporte técnico a ser realizado por profissionais de saúde que inspirem confiança. É certo que a credibilidade é essencial para o êxito do tratamento e a matéria divulgada na reportagem demonstrando os interesses financeiros que envolvem as indicações terapêuticas trouxe a todos os expectadores grande insegurança. Aos beneficiários de planos de saúde é importante esclarecer que a questão de indicação de marca de materiais cirúrgicos, implantes e etc., há muito já se pacificou no sentido de que cabe ao médico assistente a prerrogativa de determinar as características do material a ser utilizado tais como as dimensões, o material de fabricação e tipo, e justificar clinicamente a sua indicação, quando solicitado. Para a segurança de seus beneficiários, assim como a manutenção do equilíbrio econômico financeiro e de acordo com a regulamentação vigente é permitido a utilização de mecanismos de regulação aos Planos Privados de Assistência à Saúde através de ações de gerenciamento, tanto no momento da demanda quanto a utilização dos serviços assistenciais, em compatibilidade com o disposto nos códigos de ética profissionais, na Lei nº 9.656/98 e de acordo com critérios dispostos nos normativos vigentes editados pelo órgão regulador. Tanto o Conselho Federal de Medicina através da Resolução Normativa nº 1.956/2010, como a Agência Nacional de Saúde Suplementar, através da Resolução Normativa nº 383/2013 determinam em caso de divergência médica a respeito de autorização prévia, a definição do impasse através de junta constituída pelo profissional requisitante ou nomeado pelo beneficiário, por médico auditor da operadora e por um terceiro, escolhido de comum acordo, com as despesas arcadas pela operadora de plano de saúde. A arbitragem é cabível mesmo nas situações de emergência, quando não for possível pré-autorização e tenha sido realizado o procedimento ou utilizado material implantável, órtese ou prótese, neste caso a junta será retrospectiva. Finalmente cabe ressaltar que de acordo com o artigos 35, 40, 68 e 69 do Código de Ética Médica, é vedado ao médico exagerar a gravidade do diagnóstico ou do prognóstico, complicar a terapêutica ou exceder-se no número de visitas, consultas ou quaisquer outros procedimentos médicos; aproveitar-se de situações decorrentes da relação médico-paciente para obter vantagem física, emocional, financeira ou de qualquer outra natureza; e, principalmente, ter interação ou dependência de qualquer organização destinada à fabricação, manipulação, promoção ou comercialização de produtos de prescrição médica, qualquer que seja sua natureza, e obter vantagem pelo encaminhamento de procedimentos, pela comercialização de medicamentos, órteses, próteses ou implantes de qualquer natureza, cuja compra decorra de influência direta em virtude de sua atividade profissional. Mesmo que a matéria retrate uma triste realidade do setor de saúde em nosso país, devemos considerar que o esclarecimento à sociedade é primordial para que em conjunto seja possível a mobilização no combate às más práticas relacionadas às OPMEs, uma vez que o paciente não pode em nenhuma hipótese ser colocado em risco para obtenção de vantagens financeiras ilícitas e antiéticas. Deixo aqui, além disso, um apelo para que não caiamos na armadilha da generalização dos fatos evitando imputar a toda categoria médica o papel de algoz diante da vida de seres humanos. A reflexão é a proposta para que tenhamos olhar vigilante, na qualidade de cidadãos, sem cometer o disparate de encarcerar toda uma categoria na vala comum dos péssimos exemplos dos profissionais retratados pela matéria jornalística em comento. * Flávia Robert é advogada e presidente da Comissão de Direito à Saúde