ESCOLA SUPERIOR DE GUERRA
DEPARTAMENTO DE ESTUDOS
CAEPE 2011
MONOGRAFIA (CAEPE)
DIFICULDADES PARA A IMPLEMENTAÇÃO DA LEI DE
MODERNIZAÇÃO DOS PORTOS (Lei nº 8.630/93) NO BRASIL
Código do Tema: 03 /136
CMG Eduardo Almeida Santana
ESCOLA SUPERIOR DE GUERRA
EDUARDO ALMEIDA SANTANA
DIFICULDADES PARA A IMPLEMENTAÇÃO DA LEI DE
MODERNIZAÇÃO DOS PORTOS (Lei nº 8.630/93) NO
BRASIL
Rio de Janeiro
2011
CMG EDUARDO ALMEIDA SANTANA
DIFICULDADES PARA A IMPLEMENTAÇÃO DA LEI DE
MODERNIZAÇÃO DOS PORTOS (Lei nº 8.630/93) NO BRASIL
Trabalho de Conclusão de Curso – Monografia
apresentada ao Departamento de Estudos da
Escola Superior de Guerra como requisito à
obtenção do diploma do Curso de Altos Estudos de
Política e Estratégia.
Orientador:
Rio de Janeiro
2011
CMG (RM1)
Martins.
Caetano
Tepedino
Este trabalho, nos termos da legislação que
resguarda os direitos autorais, é considerado
propriedade da ESCOLA SUPERIOR DE
GUERRA (ESG). É permitida a transcrição
parcial de textos do trabalho, ou mencioná-lo
para comentários e citações, desde que sem
propósitos comerciais e que seja feita a
referência bibliográfica completa.
Os conceitos expressos neste trabalho são de
responsabilidade do autor e não representam,
necessariamente,
qualquer
orientação
institucional da ESG.
____________________________________
Biblioteca General Cordeiro de Farias
Santana, Eduardo
Dificuldades para a Implementação da Lei de Modernização dos
Portos (Lei nº 8.630/93) no Brasil / Eduardo Almeida Santana - Rio de
Janeiro : RJ, 2011.
51 f.: il.
Orientador: CMG (RM1) Caetano Tepedino Martins
Trabalho de Conclusão de Curso – Monografia apresentada ao
Departamento de Estudos da Escola Superior de Guerra como
requisito à obtenção do diploma do Curso de Altos Estudos de
Política e Estratégia (CAEPE), 2011.
1. Setor Portuário. 2. Infraestrutura. 3. Portos. I.Título.
A todos da minha querida família que,
mesmo privados de minha companhia mais
uma vez para que este trabalho chegasse a
bom termo, me apoiaram diuturnamente e
sem reservas.
Agradeço especialmente a minha esposa,
Denise, que com sua paciência sem fim, se
desdobrou para que minhas ausências não
fossem tão sentidas.
.
AGRADECIMENTOS
Ao meu orientador e amigo de longa data, CMG Caetano Tepedino Martins pela
orientação precisa e tranqüila e pela atenção a mim dispensada em mais uma etapa
de minha carreira. Seu perfil metódico, sua paciência ilimitada e sua destacada
inteligência muito contribuíram para que esse estudo chegasse a bom termo.
Aos companheiros e companheiras da melhor Turma de todos os tempos da Escola
Superior de Guerra, a Turma Segurança e Desenvolvimento, pela convivência
enriquecedora e extremamente agradável durante o ano de 2011 e pelo constante
incentivo e diárias manifestações de amizade e apreço. Com certeza, todos ficarão
guardados em minha memória e presentes em minhas orações.
À minha esposa Denise e filhos Dominique, Gabriela e Guilherme, por mais um ano
de sacrifícios e constantes incentivos, sem os quais não poderia cumprir mais esta
derrota e chegar ao porto de destino.
Aos meus pais, Armando e Therezinha que, mesmo do plano celestial, ajudaram
com sua constante proteção esse tenaz marinheiro em mais uma jornada.
Por último, agradeço a Deus pela inspiração e proteção neste e em todos os
momentos de minha vida.
RESUMO
Esta monografia tem por objetivo discorrer sobre a evolução do setor portuário
brasileiro desde seu “marco inicial”, a Abertura dos Portos às Nações Amigas,
ocorrido em 1808, até os dias de hoje. Dentro desse contexto, especial atenção é
dada ao marco legal vigente, a Lei 8.630, de 25 de fevereiro de 1993, a Lei dos
Portos, também conhecida como Lei de Modernização dos Portos. Tendo como
objetivo principal apontar os dispositivos da referida Lei que ainda não foram
implantados completamente, o presente estudo se propõe, também, a apresentar o
contexto pré-Lei dos Portos e as conseqüências de sua implantação para o setor
portuário nacional, seus pontos positivos e negativos, ações em curso por parte do
Estado e sugestões para o futuro. Com essa proposta de estudo, pretende-se
permitir um conhecimento geral sobre o Sistema Portuário Brasileiro, suas
características, sua importância para o desenvolvimento nacional, suas limitações e
suas atuais perspectivas. A metodologia adotada foi a de pesquisa bibliográfica e
documental e fontes secundárias, como livros, periódicos e artigos disponíveis na
Internet, além da experiência do autor em assuntos ligados à Comunidade Marítima.
Palavras-chave: Setor portuário. Infraestrutura. Portos.
RESÚMEN
Esta monografia tiene por objetivo discurrir sobre la evolución del sector portuário
Brasileño desde su “marco inicial”,
la Apertura de los Puertos a las Naciones
Amigas, ocurrido en 1808, hasta el día de hoy. Dentro de este contexto, es de
especial atención el marco legal vigente, La Ley 8.630, del 25 de febrero de 1993, La
ley de los Puertos, también conocida como Ley de Modernización de los Puertos.
Teniendo como objetivo principal apuntar a los dispositivos de la referida Ley, que
todavia no fueron implantados completamente, en el presente estudio se propone,
también la presentación del contexto pré-ley de los Puertos y las consecuencias de
su implantación para el sector portuario nacional, sus puntos positivos y negativos,
acciones en curso por parte del Estado y sugerencias para el futuro. Con esa
propuesta de estudio, se pretende alcanzar un conocimiento general sobre el
Sistema Portuário Brasileño, sus características, su importancia para el desarrollo
nacional, sus limitaciones y sus actuales perspectivas. La metodologia adoptada fué
la de investigación bibliográfica y documental y fuentes secundarias como libros,
periódicos y artículos disponibles en la internet, además de la experiencia del autor
en asuntos ligados a la Comunidad Marítima.
Palabras - Claves : Sector Portuário, Infraestructura , Puertos
SUMÁRIO
1
INTRODUÇÃO.......................................................................................... 8
2
2.1
2.2
ANTECEDENTES HISTÓRICOS ............................................................ 13
FATOS MARCANTES E NORMAS JURÍDICOS .......................................14
PLANOS DE INVESTIMENTO E DESENVOLVIMENTO ..........................20
3
3.1
3.2
ORGANIZAÇÃO DO SETOR PORTUÁRIO BRASILEIRO ..................... 23
ORGANIZAÇÃO PRÉ-LEI DOS PORTOS ................................................ 23
ORGANIZAÇÃO PÓS-LEI DOS PORTOS ............................................... 24
4
4.1
4.2
4.3
LEI DOS PORTOS .................................................................................... 28
ASPECTOS POSITIVOS ........................................................................... 31
ASPECTOS NEGATIVOS.......................................................................... 33
PENDÊNCIAS DE IMPLEMENTAÇÃO ...................................................... 34
5
COMENTÁRIOS, ANÁLISE E SUGESTÕES ............................................ 39
6
AÇÕES EM CURSO E PERSPECTIVAS .................................................. 43
7
CONCLUSÃO ............................................................................................ 48
REFERÊNCIAS ......................................................................................... 50
8
1 INTRODUÇÃO
“Os avanços em transportes deram ao homem acesso à
modernidade. No entanto, a atual decadência dos sistemas de
transporte parece ameaçar conduzir a modernidade a um
recuo. O Brasil se encontra nesta encruzilhada. A deterioração
da rede de transportes do país inferniza a vida de nossas
grandes cidades e dificulta o crescimento econômico, o
comércio com outros países e a expansão das fronteiras
agrícolas.”
José Carlos Mello e Norman Gall
Estudar a história dos portos juntamente com a evolução de seu regime
jurídico e analisar a situação da aplicação do marco jurídico que hoje rege todo o
sistema portuário nacional se reveste de grande importância para um país com as
dimensões do Brasil. Além dos portos serem a porta de entrada e saída da maior
parte dos produtos importados e exportados pelo país, eles também fazem parte do,
ou compõem o, Poder Marítimo de nosso país. Segundo Vidigal (2002, p. 57-58):
Poder Marítimo é o conjunto de elementos de toda a ordem capazes de
assegurar a uma Nação o completo uso do mar e, eventualmente, negar ao
inimigo do momento esse uso. Frota mercante, portos, estaleiro civil e naval
para construção e reparo de embarcações, frota de pesca, legislação
adequada, agências comerciais e, finalmente, uma frota de guerra, cuja
principal tarefa é a proteção do tráfego marítimo nacional ou,
eventualmente, o ataque ao tráfego marítimo do inimigo que, quando
presentes da maneira adequada, contribuem para a existência do poder
marítimo.
Dessa forma, por abordar, predominantemente, aspectos ligados a esses elos
da cadeia comercial (os portos) e sendo eles parte do Poder Marítimo Brasileiro, o
presente estudo aborda, principalmente, as Expressões Econômica e Militar do
Poder Nacional.
A história dos portos no Brasil começa com as instalações rudimentares,
implantadas logo após o descobrimento, até os grandes complexos portuários e
terminais especializados hoje existentes ao longo de toda sua costa. A disseminação
desses portos pelo litoral brasileiro seguiu a lógica da ocupação e do povoamento
desde o Brasil colonial. Porém, para fins deste estudo, considera-se o Decreto de
Abertura dos Portos às Nações Amigas, promulgado pelo Príncipe-Regente de
Portugal, Dom João de Bragança em 28 de janeiro de 1808, como marco inicial do
funcionamento dos portos brasileiros, consequentemente, temos mais de dois
9
séculos de funcionamento daqueles que são um dos mais importantes pontos da
cadeia do comércio exterior brasileiro. No entanto, devido a erros estratégicos de
diversos governos, por muito tempo o setor portuário brasileiro foi sendo relegado a
segundo plano. Em uma primeira fase histórica, entre 1808 e 1940, toda a prioridade
política e estratégica de investimento era para o setor ferroviário, seguindo uma
tendência mundial, sem considerar as peculiaridades do território brasileiro. Em um
segundo momento, entre 1940 e 1980, os governos priorizaram o modal rodoviário,
em consonância com a política de desenvolvimento adotada pelo Governo Federal,
de abrir estradas e incentivar a indústria automobilística. Mais uma vez, a vocação
marítima brasileira foi deixada de lado e os portos brasileiros foram se tornando
cada vez mais morosos no que diz respeito às operações de carga e descarga,
desaparelhados, quase obsoletos. Os portos eram excessivamente burocratizados
(muitos ainda são), graças ao excesso de intervencionismo do Estado. O monopólio
dos Sindicatos de Trabalhadores Portuários na alocação de mão de obra para as
operações portuárias deixava nas mãos desses sindicatos a decisão sobre quando e
como realizar as operações de carga e descarga, sem critérios claros, prejudicando
o desempenho das mais importantes operações portuárias. Além disso, a utilização
sistemática de bagrinhos1, em substituição aos estivadores sindicalizados,
acrescentava uma perversa faceta a essa realidade. A morosidade contribuiu
sobremaneira na composição daquilo que se convencionou chamar de “Custo
Brasil”2, principalmente nas exportações nacionais. Segundo Ferreira (2009, não
paginado):
Como exemplo, entre 1990 e 1993 os portos brasileiros empregavam 45 mil
pessoas e, apesar disso, em 1991 só embarcaram 320 milhões de
toneladas (7.111 toneladas por empregado). Enquanto isso, o porto de
Roterdã na Holanda, com seus 2 mil funcionários, movimentou 290 milhões
de toneladas (145.000 toneladas por empregado). As atividades marítimas e
portuárias eram administradas por várias leis, decretos e portarias. Antes da
Lei da Modernização, os portos impediam o sonho de competitividade dos
produtos brasileiros pela ação do corporativismo sindical e pela ineficiência
gerencial.
Por um longo tempo, o setor aquaviário como um todo foi alvo de pouca
1
Bagrinhos: trabalhadores da estiva, não-sindicalizados, que - por serem jovens e se considerarem,
por isso mesmo, imunes e refratários a doenças em geral - aceitavam manusear cargas perigosas ou
tóxicas, nas operações de carga e descarga dos navios, chegando, até, a dispensar trajes e
equipamentos complementares de segurança do trabalho.
2
Custo Brasil: expressão criada no âmbito do Grupo Permanente de Política Industrial (GPPI), órgão
de assessoramento da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (FIESP), e inicialmente
conhecida como Fator Brasil. Pode ser definido como o conjunto de gastos internos que só existem
no Brasil e que oneram os produtos e serviços brasileiros, tornando-os menos competitivos quando
comparados aos produtos e serviços estrangeiros similares.
10
atenção por parte do Governo Federal
e recebeu investimentos oficiais
incompatíveis com sua importância para o país, principalmente se considerarmos
que mais de 90% do comércio exterior brasileiro se processa por esse modal. Além
disso, com seus mais de 7.300 km de litoral e seus 48 mil km de rios navegáveis, é,
como já citado, notória a vocação marítima brasileira. Assim, seria natural que o
Brasil concentrasse investimentos e ações estratégicas no setor aquaviário, o que
alavancaria seu desenvolvimento.
Porém, a partir do final dos anos 80 do século passado, algumas medidas
começaram a ser tomadas, com o intuito de reverter esse quadro, tanto na esfera
pública, quanto na esfera privada. Algumas distorções começaram a ser combatidas,
investimentos foram feitos e um planejamento começou a ser esboçado e posto em
prática. O setor portuário, parte do setor aquaviário, começou a sair de seu estado
de “letargia”, ganhando uma nova perspectiva e abrindo novas oportunidades.
A partir da década de 90, os portos em todo o mundo passaram por profundas
reformas, a fim de adequá-los à nova ordem econômica e política internacionais. Os
portos brasileiros não fugiram a esta regra, por estarem diretamente conectados ao
desempenho portuário mundial, ao grande aumento do comércio internacional e à
busca por ganhos contínuos e cada vez maiores em eficiência. A preocupação
federal com a reestruturação dos portos nacionais se materializou com a
promulgação, em 25 de fevereiro de 1993, da Lei nº 8.630/93, denominada Lei dos
Portos ou, como ficou mais conhecida, Lei de Modernização dos Portos. A referida
Lei foi uma tentativa de atender aos anseios por portos mais competitivos,
reestruturando-os e promovendo uma reorganização logística. No que diz respeito
ao gerenciamento da mão de obra, foi quebrado o já citado monopólio dos
Sindicatos de Trabalhadores Portuários em sua alocação de mão de obra para as
operações portuárias. Tal responsabilidade foi transferida para o Órgão Gestor de
Mão de Obra (OGMO), órgão constituído em cada porto organizado 3 com a
finalidade de administrar o fornecimento da mão de obra do trabalhador portuário e
do trabalhador portuário avulso, promovendo seu treinamento e sua habilitação
profissional. Após a criação do OGMO, tornou-se obrigatória a alocação de mão de
obra do trabalhador portuário por intermédio desse órgão, exceto nos Terminais de
3
Porto organizado: o construído e aparelhado para atender às necessidades da navegação, da
movimentação de passageiros ou da movimentação e armazenagem de mercadorias, concedido ou
explorado pela União, cujo tráfego e operações portuárias estejam sob a jurisdição de uma
autoridade portuária.
11
Uso Privativo 4. Foram criados, também, os Conselhos de Autoridade Portuárias
(CAP) e as personalidades jurídicas denominadas − Operadores Portuários. Ao CAP
compete, dentre outras funções, promover a racionalização e a otimização do uso
das instalações portuárias, desenvolver mecanismos para atração de cargas,
homologar os valores das tarifas portuárias, aprovar o plano de desenvolvimento e
zoneamento do porto e estabelecer normas visando ao aumento da produtividade e
à redução dos custos das operações portuárias, especialmente as de contêineres e
do sistema roll-on roll-off5. Sua composição inclui representantes do poder público
(um representante dos governos nas três esferas, federal, estadual e municipal), dos
Operadores Portuários, dos trabalhadores portuários e dos usuários dos serviços
portuários. Essa composição, além de procurar legitimar os atos dos CAP, dá às
atividades do órgão uma transparência com a sociedade, que participa das decisões
que afetam os portos. Ao Operador Portuário, pessoa jurídica pré-qualificada para a
execução de operação portuária (antes executada pelas Entidades Estivadoras) na
área do porto organizado, cabe a realização das operações portuárias previstas na
Lei nº 8.630/93. Dentre outras atribuições, o Operador Portuário é responsável,
perante a autoridade aduaneira, pelas mercadorias sujeitas a controle aduaneiro, no
período em que essas lhe estejam confiadas ou quando tenha controle ou uso
exclusivo de área do porto onde se acham depositadas ou devam transitar e tem
poderes para negociar com os sindicatos de trabalhadores os acordos e convenções
coletivas de trabalho. Além disso, o Operador responde pela preservação ambiental
em sua área de atuação, é responsável pela obediência às normas que regulam a
saúde e a segurança do trabalho no ambiente portuário e contrata apólices de
seguro que cobrem os danos materiais e pessoais das operações portuárias na área
do porto organizado. Com a criação do Operador Portuário, foi feita a separação da
atividade de agenciamento marítimo6 e da operação de carga e descarga e do
4
Terminais de Uso Privativo: são instalações portuárias privadas, localizadas dentro ou fora de um
porto organizado, que são autorizadas pela União a operar por prazo indeterminado e que são
utilizadas na movimentação ou armazenagem de mercadorias. Os investimentos de toda a ordem
nesses terminais é de responsabilidade de seus proprietários.
5
Sistema roll-on roll-off: sistema que diz respeito ao tipo de carregamento e descarregamento de
navios roll-on roll-off, que são navios em que sua carga entra e sai pelos seus próprios meios, através
de rodas (como os automóveis, ônibus, caminhões, trailers, etc.) ou, até mesmo sobre outros
veículos.
6
Agenciamento Marítimo: é o conjunto de atividades necessárias à entrada, permanência e saída de
embarcações no porto de escala desde a comunicação e o pagamento de taxas aos órgãos oficiais,
até a contratação de prestadores de serviços, tais como: rebocadores, praticagem e assistência à
tripulação. O Agente Marítimo é o representante legal dos interesses do armador ou afretador.
12
recebimento de cargas nas áreas alfandegadas em portos públicos.
No entanto, apesar da Lei dos Portos estar em vigor há mais de 18 anos, sua
implementação ainda não ocorreu de maneira integral. De certa forma, não é de se
estranhar que esse tempo não tenha sido suficiente para permitir sua
implementação in totum. Como já citado, desde 1808 até sua promulgação, mais de
180 anos se passaram. É natural, então, que os problemas enfrentados fossem
complexos e que os ajustes não ocorressem “da noite para o dia”. Dificuldades de
toda sorte não foram contornadas, muitas delas envolvendo grupos que tiveram
seus interesses contrariados. Alguns pontos da referida lei ainda não estão vigindo
ou se encontram parcialmente em vigor.
Outro ponto a ser salientado é que, pela complexidade dos diversos
problemas que assolavam os portos brasileiros antes da promulgação da Lei nº
8.630/93, esta última certamente necessita de ajustes, visando corrigir pequenas
imperfeições que não foram visualizadas pelo legislador, mas que ficaram evidentes
quando de sua aplicação.
Com este trabalho, pretende-se analisar o atual estágio de vigência da Lei de
Modernização dos Portos no Brasil e identificar as dificuldades a serem suplantadas
para sua implementação de forma integral, apresentando sugestões para que essas
dificuldades sejam superadas. Dessa forma, será necessário verificar quais os itens
da referida lei que ainda não vigoram integralmente e quais os fatores que
contribuíram para que isso acontecesse.
Por último, cabe ressaltar que o autor não tem a pretensão de analisar se a
referida lei pode ser aperfeiçoada, tanto naqueles pontos que já vigoram, como
naqueles que ainda não foram implementados. No entanto, nada impede que, no
decorrer do estudo, algumas idéias surjam. Nesse caso, elas serão apresentadas e
comentadas, mas não serão feitos estudos aprofundados.
13
2 ANTECEDENTES HISTÓRICOS
Para se entender o porquê das medidas implantadas pela Lei de
Modernização dos Portos, as conseqüências dessa mesma lei e a situação atual dos
portos brasileiros, faz-se necessária uma descrição do histórico dos portos
nacionais, das legislações que os regularam e dos planos de investimento e
desenvolvimento a eles relacionados desde os primórdios.
Durante o período colonial, a maior parte dos portos espalhados pelo litoral
brasileiro eram, na verdade, ancoradouros naturais, onde não ocorria a atracação
dos navios ao cais, e pequenos trapiches de madeira. Apenas Recife, Salvador e
Rio de Janeiro, por serem as localidades mais importantes à época e por terem
maior fluxo de pessoas e mercadorias, tinham melhores instalações portuárias. Os
portos brasileiros do Brasil Colônia ficavam sob a responsabilidade das Câmaras
Municipais. Dessa forma, conforme citado no capítulo anterior, considera-se, no
presente estudo, que o marco inicial do funcionamento dos portos brasileiros foi o
Decreto de Abertura dos Portos às Nações Amigas, promulgado pelo PríncipeRegente de Portugal em 28 de janeiro de 1808. Na verdade, esse Decreto foi uma
carta-régia7 do Príncipe Regente de Portugal endereçada ao governador da
Capitania da Bahia entre 1805 e 1809, João de Saldanha da Gama Melo Torres
Guedes Brito, o Conde da Ponte, e que marcou o fim do Pacto Colonial. Este
conjunto de regras, leis e normas impostas por Portugal às suas colônias obrigava a
que todos os produtos comprados ou vendidos pelo Brasil passassem antes pelas
alfândegas lusitanas. Nenhum país podia vender produtos, nem importar matériasprimas diretamente do Brasil, sendo forçado a fazer negócios com Portugal. Essa
carta-régia simplesmente autorizava que mercadorias trazidas por navios de nações
que estivessem em paz com Portugal fossem desembarcadas diretamente em
portos brasileiros e que os produtos produzidos no Brasil podessem ser exportados
diretamente pelos mesmos portos. Não havia no referido Decreto artigos que
regulassem a operação dos portos ou que organizassem o sistema portuário, já que
não era esse o seu propósito.
7
Carta-régia: nome dado à carta de um monarca dirigida a uma autoridade e que, em seu conteúdo,
continha, geralmente, determinações gerais e permanentes.
14
2.1 FATOS MARCANTES E NORMAS JURÍDICAS
Em 1820, os portos brasileiros passaram da responsabilidade das Câmaras
Municipais para o Ministério da Marinha.
Após a Independência, em 1822, os portos brasileiros passaram à
subordinação da Intendência dos Arsenais da Marinha, que fazia parte do Ministério
da Marinha.
Em 1845, a responsabilidade pelo policiamento e melhoramento dos portos
passou a ser das Capitanias dos Portos, criadas nesse mesmo ano e também
integrantes do Ministério da Marinha.
Em 1846, o Decreto Imperial 447 aprovou o Regulamento das Capitanias dos
Portos.
Em 1869, o Decreto Imperial 1.746 autorizava a concessão dos portos à
iniciativa privada, por um período de noventa anos. Dezessete anos depois, esse
período de concessão foi reduzido para setenta anos.
Em 1873, a responsabilidade pelos portos brasileiros passou a ser do
Ministério da Agricultura, Comércio e Obras Públicas. Este dividiu a costa brasileira
em seis distritos e, em 1890, criou as Inspetorias de Distritos dos Portos Marítimos,
cada uma responsável por um dos distritos. Após a divisão do Ministério da
Agricultura, em 1892, os portos ficaram sob a responsabilidade do Ministério da
Viação e Obras Públicas.
No que se refere às normas legais, a primeira norma jurídica conhecida afeta
aos portos brasileiros foi o Decreto que passou os portos à responsabilidade da
Repartição da Marinha, em 1820, citado acima. Como já comentado neste estudo,
pelo fato de ter apenas autorizado o comércio da colônia diretamente com outras
nações, o Decreto de Abertura dos Portos às Nações Amigas não é considerado,
pelo autor, como uma norma legal sobre os portos.
Em 1903, através do Decreto Presidencial nº 4.859, o Governo Federal se
encarregou de executar as obras nos portos podendo, após o término das mesmas,
fazer concessões à iniciativa privada por um período de dez anos. Para financiar tais
obras, o referido Decreto Presidencial criou, segundo seu texto original, um caixa
especial para cada um dos portos. Os recursos provinham da renda das
propriedades adquiridas e desapropriadas, da taxa de 2%, em ouro, das
importações que passavam por cada porto, da renda dos cais, armazéns e outros
15
serviços e de outras rendas eventuais criadas por lei. Logo ficou clara a dificuldade
para se financiar obras e melhorias em portos pequenos, já que as taxas por eles
geradas não eram suficientes para recompor o capital investido na construção.
O Decreto Imperial 1.746 e o Decreto Presidencial nº 4.859 fizeram surgir
várias companhias portuárias, como a Port of Pará em Belém do Pará, Compagnie
du Port de Rio de Janeiro no Rio de Janeiro e a Société de Construction du Port de
Bahia em Salvador. Essas companhias estrangeiras tinham como sócios
empresários brasileiros. Seus resultados financeiros e gerenciais não foram dos
melhores. Segundo Goularti Filho (2007, não paginado):
Com base na lei da concessão de 1869 e no decreto do contrato por
administração de 1903, foram criadas várias companhias estrangeiras com
a participação de empresários brasileiros, que tinham como objetivo
construir e administrar os principais portos brasileiros. Mesmo com as
concessões repassadas às companhias privadas (com exceção do Porto de
Manaus), umas não cumpriram os prazos, outras os contratos não foram
renovados e outras foram entregues aos governos estaduais.
O Decreto-Lei nº 6.368 de 1907 criou uma repartição que centralizou as obras
de melhoramento, conservação e administração dos portos. Além disso, o referido
Decreto-Lei criou um caixa único, denominado Caixa Especial dos Portos, que
reunia as receitas provenientes de todos os portos, corrigindo, assim, a deficiência
citada anteriormente que diz respeito ao Decreto Presidencial nº 4.859 de 1903.
Em 1911, foi aprovado, pelo Decreto Presidencial nº 9.078, o regulamento da
recém-criada Inspetoria Federal dos Portos, Rios e Canais (IFPRC), diretamente
subordinada ao Ministério da Viação e Obras Públicas. Entre suas finalidades
estavam o estudo das obras nos portos nacionais e rios navegáveis e da abertura de
canais marítimos e fluviais e quaisquer serviços técnicos relativos ao melhoramento
dos portos, rios navegáveis e canais, à conservação das obras, dos ancoradouros e
estuários e ao regime das águas, que lhe fossem atribuídos.
Em 1922, foi aprovado, através do Decreto Presidencial nº 15.693, o
Regulamento de Portos Organizados. Esse regulamento tinha como propósito
centralizar as ações técnicas e administrativas, espalhadas, anteriormente, em
diversas entidades nos estados da federação. Outro propósito era estabelecer
claramente as competências de fiscalização do porto, da Alfândega e das Capitanias
dos Portos. Decorrente da definição estabelecida por esse Decreto Presidencial, os
Portos de Manaus, Belém, Recife, Salvador, Vitória, Rio de Janeiro, Santos e Rio
Grande foram classificados como portos organizados.
16
Em 1923 foi extinto o Caixa Especial dos Portos.
É importante mencionar que, no período entre 1917 e 1933, a União transferiu
a concessão de 13 portos aos estados da federação. Mesmo assim, a União
continuou a prover recursos para melhoramento e conservação dos portos
concedidos. Infelizmente, essas obras de melhoramentos, via de regra, não
acompanhavam o ritmo crescente dos fluxos de mercadorias importadas e
exportadas pelos portos nacionais.
Apesar de algumas medidas centralizadoras, iniciadas com a criação da
IFPRC, o Estado manteve-se, de certa forma, afastado dos portos, do ponto de vista
da legislação e da fiscalização das atividades portuárias. Pode-se considerar no
Brasil Colônia e durante o Império que a visão do Estado sobre os portos nacionais
era privatista. Mesmo nas primeiras décadas da República a maior preocupação
com os portos estava voltada para a questão alfandegária e tributária. Somente em
1933, foi criado o primeiro órgão estatal abrangendo a estrutura portuária. Foram
criadas as Delegacias de Trabalho Marítimo (DTM), por meio do Decreto nº 23.259,
de 20 de outubro de 1933, para inspeção, disciplina e policiamento do trabalho nos
portos.
Esse “afastamento” do Governo Federal dos assuntos relativos aos portos,
refletido em uma ausência de planejamento para o setor, acabou por resultar no
estabelecimento de uma miríade de portos ao longo da costa brasileira. Cada
governo estadual defendia a realização de melhoramentos nos portos no interior de
seus estados e pleiteava, ainda, a construção de outros, sem ao menos levar em
consideração a existência de portos situados em estados vizinhos que certamente
poderiam atender às suas necessidades, racionalizando esforços e custos. Havia a
necessidade de elaboração de um programa amplo e único de construção e
ampliação de portos, com uma visão nacional. Essa necessidade acabou por
nortear, mesmo que de maneira lenta e nem sempre contínua, as políticas adotadas
para o setor portuário brasileiro no começo da década de 30 do século passado. Era
necessário estabelecer um planejamento de obras e investimentos que enfrentasse
os inúmeros problemas dos portos nacionais, como assoreamento, falta de área de
cais, retroporto8 e necessidade de equipamentos de manobra de cargas.
8
Retroporto: local de carga ou descarga de mercadoria que se situa atrás do porto. Esse atrás do
porto indica também certa proximidade com o porto. É, então, um terminal auxiliar do porto.
17
A partir da Revolução de 1930, o Estado começa um processo de
centralização e racionalização de suas funções. No que diz respeito ao setor
portuário, cria-se, em 1933, com a fusão do IFPRC e da Inspetoria Federal de
Navegação, o Departamento Nacional de Portos e Navegação (DNPN), subordinado
ao Ministério da Viação e Obras Públicas. Suas competências ligadas ao setor
portuário eram:
1) estudar, projetar, executar ou fiscalizar as obras de melhoramento dos
portos e o balizamento das vias de navegação interior;
2) organizar, executar ou fiscalizar a conservação e a exploração comercial
das vias navegáveis e dos portos melhorados;
3) organizar as estatísticas do tráfego dos portos; e
4) coordenar todos os elementos informativos sobre a exploração comercial
dos portos.
O DNPN foi criado com o intuito de, dentre outros objetivos, resolver os
problemas dos portos nacionais. Segundo Goularti Filho (2007, não paginado):
O novo órgão foi criado para solucionar os velhos problemas portuários,
agora também os da navegação fluvial e marítima a vapor. Velhos
problemas portuários que se arrastavam, como o das „parcas possibilidades
financeiras‟ (Ministério da Viação e Obras Públicas, 1937b, p. 3). Com
exceção dos Portos de Santos, Rio de Janeiro e Manaus, os demais portos
organizados ainda careciam de novos investimentos e conservação, sem
falar dos vários pequenos portos, ou trapiches, espalhados pela costa
brasileira. Esses pequenos portos, tanto quanto os grandes, também
pleiteavam melhoramentos, que em muitos casos eram atendidos, mas o
ritmo das obras sempre foi muito lento. Segundo Burlamaqui, „muito já se
tem conseguido levar a efeito, mas muito há ainda a se fazer no que diz
respeito ao melhoramento e exploração comercial dos nossos
portos‟(Ministério da Viação e Obras Públicas, 1937b, p. 3).
Em junho de 1934 é publicado o primeiro Plano Geral de Viação Nacional. No
entanto, esse Plano não apresenta nenhum destaque para assuntos relacionados
aos portos brasileiros.
Em julho de 1934, o Presidente Getúlio Vargas decreta um novo regime para
nossos portos, no qual a União era autorizada a contratar, por meio de concessão
de no máximo 70 anos, os estados ou empresas privadas para realizarem obras de
melhoramento e para exploração comercial dos portos. Esse mesmo Decreto, de nº
24.599, também revogou as duas leis de concessão dos portos que ainda datavam
do século XIX.
Em 1941, o Governo Getúlio Vargas criou a Comissão de Marinha Mercante.
Composta por três membros, tinha entre suas atribuições, como disciplinadora da
18
navegação brasileira: estudar, organizar e alterar as tarifas de fretes; organizar as
tabelas de tráfego; fixar as linhas de navegação; e requisitar qualquer embarcação
mercante nacional, revertendo ao proprietário os saldos líquidos pela utilização.
Em 1º de maio de 1943, o Presidente Getúlio Vargas sancionou o Decreto-Lei
nº 5.452, a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), que trouxe maior proteção aos
trabalhadores de modo geral e, em especial, aos trabalhadores do ramo portuário,
dedicando-lhes duas seções completas. Porém, por se tratar de lei exclusivamente
voltada para a salvaguarda dos direitos dos trabalhadores, a CLT não tratava das
estruturas e das operações portuárias. Também em 1943, o DNPN muda de
denominação e passa a se chamar Departamento Nacional de Portos, Rios e
Canais. Mais tarde, em 1963, foi transformado em autarquia com autonomia
financeira, técnica e administrativa em relação ao Ministério da Viação e Obras
Públicas, passando a ser denominado Departamento Nacional de Portos e Vias
Navegáveis (DNPVN).
Somente nas décadas de 60 e 70, após a Revolução de 1964, é que houve
uma maior preocupação por parte dos governos com a questão portuária. As DTM
tiveram sua autoridade ampliada e foram investidas de mais atribuições. Os
trabalhadores portuários conseguiram mais alguns direitos, tais como: férias
remuneradas; repouso semanal remunerado; e 13º salário, dentre outros.
Em 1965, foi criado o Grupo Executivo para a Integração das Políticas de
Transportes (GEIPOT), através do Decreto nº 57.003. Entre suas atribuições,
constava a elaboração de planos setoriais para os diversos meios de transporte e,
por extensão, para o setor portuário. Dentre os estudos conduzidos pelo GEIPOT,
destaca-se a criação do Programa dos Corredores de Exportação, que selecionou
portos (além de estradas e ferrovias) que receberiam investimentos. Entretanto,
mesmo tendo como um dos propósitos a integração dos meios de transporte, as
rodovias continuaram a ser a prioridade do governo. O GEIPOT foi extinto em 2008
e suas funções passaram a ser exercidas pelo Conselho Nacional de Integração de
Política de Transportes Terrestres – CONIT, pela Agência Nacional de Transportes
Aquaviários – ANTAQ, pela Agência Nacional de Transportes Terrestres – ANTT – e
pelo Departamento Nacional de Infra-Estrutura de Transportes – DNIT.
19
Em 1966, pelo Decreto-Lei nº 5, foi feita uma tentativa de unificação das
atividades de estiva9 e capatazia10, sendo criada, sem sucesso, a categoria dos
operadores de carga e descarga, embrião da multifuncionalidade. Ainda em 1966, foi
criada a Superintendência Nacional da Marinha Mercante (SUNAMAM), que
substituiu a Comissão de Marinha Mercante. Sua principal tarefa era determinar a
forma como se organizava o trabalho portuário, a composição das equipes de
trabalho (denominadas ternos) e, também, sua remuneração. Após o escândalo que
levou seu nome11, a SUNAMAM foi extinta em 1989.
Na década de 70 do século passado, os governos militares editaram os
Planos Nacionais de Desenvolvimento I e II (PND I e II). Para o setor portuário,
estavam previstos investimentos em expansão, modernização e reaparelhamento
dos portos, construção de novos terminais e portos (inclusive fluviais) e a
implementação de estudos de viabilidade técnico-econômica de obras de
engenharia, entre outros assuntos. Os investimentos no setor portuário mais que
quadruplicaram entre 1970 e 1979. No entanto, nas duas décadas seguintes, os
investimentos previstos para o setor no Plano Diretor Portuário do Brasil (1975-1988)
e no Plano de Desenvolvimento Portuário (1987-1996) ficaram condicionados à
disponibilidade de recursos e sofreram seguidos contingenciamentos. Previa-se
também, no PND II, transformar o DNPVN em uma empresa de capital aberto,
visando à captação de recursos e aumentando, assim, seu potencial de
investimentos.
Em 1975, foi criada a Empresa de Portos do Brasil S/A (PORTOBRAS), uma
“holding” que centralizou as atividades portuárias e que explorava os portos através
de subsidiárias − as Companhias Docas. Essa veio a substituir o Departamento
Nacional de Portos e Vias Navegáveis e controlava 25 portos, sendo 15 deles
administrados por oito Companhias Docas e os demais administrados diretamente
por ela. Foi estabelecido, assim, o monopólio estatal para o Sistema Portuário
Nacional. A criação da PORTOBRAS foi considerada, na ocasião, um grande
avanço em termos gerenciais, possibilitando importantes investimentos em
9
Estiva: conjunto de estivadores de um porto, ou seja, o conjunto de trabalhadores que executa a
movimentação de carga a bordo dos navios nos portos, a qual compreende a retirada e a arrumação
da referida carga nos conveses e porões dos navios.
10
Capatazia: conjunto de trabalhadores encarregado da movimentação da carga em terra nos portos
até o costado do navio mercante.
11
Escândalo da SUNAMAM: ocorrido em 1984, foi resultado de uma série de denúncias sobre
corrupção e operações de crédito duvidosas para aprovação de projetos na construção naval.
20
equipamentos e infraestrutura portuária. Os portos mais beneficiados foram aqueles
dentro dos corredores de exportação, os ligados ao setor siderúrgico e aos setores
de energia e de petróleo. Porém, a citada visão positiva sobre empresa não
perdurou por muito tempo.
A Constituição de 1988, ao mudar as relações do Estado com a sociedade,
tornou independentes os sindicatos, além de proporcionar aos trabalhadores
portuários avulsos12 uma série de direitos que já eram comuns aos demais
trabalhadores. Em 1989, foram extintas as Delegacias de Trabalho Marítimo, o que
acabou trazendo sérios prejuízos ao setor, pois a falta de fiscalização conduziu ao
poder excessivo dos sindicatos e a situações que contribuíram para a ineficácia das
atividades portuárias, cujos reflexos são sentidos até os dias de hoje.
Nos anos 90 da década passada, vários órgãos da administração pública
foram extintos, atendendo à “onda de desestatização”. Um desses órgãos foi a
PORTOBRAS, extinta pela Lei nº 8.029 de 12 de abril de 1990, o que, como
veremos adiante, gerou um “apagão portuário”, devido à pulverização das
atribuições da empresa. Também foram extintas as DTM. A mão de obra avulsa
ficou à mercê dos sindicatos, que se transformaram em verdadeiros monopólios,
estabelecendo, sem critérios técnicos, o tamanho das equipes de trabalho, a
remuneração e os horários de trabalho. A Lei nº 8.630/93 constituiu-se, então, na
reação do Estado brasileiro a essa crise, tornando-se o novo marco legal para o
setor portuário nacional.
2.2 PLANOS DE INVESTIMENTO E DESENVOLVIMENTO
Desde 1934, com a publicação do Plano Geral da Viação Nacional, vários
outros planos de desenvolvimento foram aprovados pelo Governo Federal, como: o
Plano Especial de Obras Públicas e Aparelhamento da Defesa Nacional (1939); o
Plano de Obras e Equipamentos (1943); e o Plano Salte (Saúde, Alimentação,
Transporte e Energia – 1950). No entanto, em nenhum deles foi dada a devida
atenção e prioridade aos portos brasileiros, tendo em vista que não se tratavam de
planos setoriais.
12
Trabalhadores portuários avulsos: aqueles sem vínculo empregatício com o contratante e que, por
meio de rodízio gerenciado pelos OGMO, prestam os serviços nas áreas de porto organizado de
maneira exclusiva, quanto à movimentação nas embarcações e instalações relacionadas.
21
Com base nas recomendações apresentadas pelo II Congresso Brasileiro de
Engenharia e Indústria de 1946, foi elaborado, em 1947, pelo Departamento
Nacional de Portos, Rios e Canais, aquele que é considerado o primeiro plano
portuário nacional: − o Plano de Reaparelhamento e Ampliação dos Portos
Organizados. No entanto, esse plano, com previsão de execução no período entre
1952 e 1955, só foi aprovado em 1951, através do Decreto Presidencial nº 30.334.
De acordo com o Artigo 1º do referido decreto, a previsão de gastos para a
execução do Plano era de 3.525 milhões de cruzeiros, sendo 1.925 milhões para os
serviços e obras custeados em cruzeiros; 800 milhões (equivalentes a 40 milhões de
dólares norte-americanos) para os equipamentos a serem importados e 800 milhões
(equivalentes a 40 milhões de dólares norte-americanos) para compras de navios.
Infelizmente, devido ao recorrente problema de falta de recursos, a execução do
plano foi sendo retardada e as obras de ampliação e conservação de portos eram
realizadas conforme a urgência de cada uma e atendendo, muitas vezes, à
conveniências políticas. O setor portuário seguia com a oferta a reboque da
demanda, em uma perversa inversão da lógica que deve se aplicar a esse
estratégico setor.
Em 1958, foi criada a Comissão do Plano Portuário, que tinha como tarefa a
elaboração de um novo plano para o setor portuário nacional. Tendo como
referência para investimentos a Taxa de Melhoramento dos Portos (TMP = à soma
de 1% sobre as importações + 0,2 % sobre as exportações + 0,2% sobre o comércio
de cabotagem13), criada em 1958 e remetida ao Fundo Portuário Nacional (FPN), o
Plano Portuário Nacional foi confeccionado e aprovado pelo Presidente Juscelino
Kubitschek em 1960. O Plano previa gastos em expansão, melhoramentos,
construção, estudos e aquisições da ordem de 23,4 bilhões de cruzeiros, a serem
aplicados entre 1960 e 1962. Em abril de 1963, os valores financeiros desse plano
foram revisados, prevendo investimentos, até 1966, de quase 72 bilhões de
cruzeiros. Essa revisão se fez dentro do escopo do Plano Trienal do Governo João
Goulart. Com a Revolução de 1964, a execução desse plano foi interrompida.
Mesmo tendo sido prejudicado pela destinação prioritária de recursos para o setor
rodoviário, principalmente no Governo JK, o Plano Portuário Nacional permitiu
13
Cabotagem: navegação nacional para transporte de cargas entre portos marítimos nacionais e/ou
entre portos interiores, fluviais ou lacustres.
22
investimentos em expansão de cais, na aquisição de equipamentos de manobra de
carga e na construção de canais de acesso aos portos.
O trabalho conjunto do GEIPOT e do Departamento Nacional de Portos e Vias
Navegáveis permitiu a elaboração do Plano Diretor Portuário do Brasil, 1975-1984,
dividido em obras prioritárias, recomendadas e a serem confirmadas. Os
investimentos previstos eram de 9,8 bilhões de cruzeiros, a serem aplicados em 25
portos. Algumas metas desse Plano Diretor foram cumpridas durante a execução do
II Plano Nacional de Desenvolvimento (II PND).
Após o fim dos governos militares, foi elaborado o I Plano de Nacional de
Desenvolvimento da Nova República (I PND-NR)1986-1989. No setor de
transportes, o governo reconheceu a pouca importância atribuída nos governos
anteriores ao setor portuário em função da concentração de investimentos no setor
rodoviário e ferroviário urbano. Entretanto, devido à escassa capacidade de
investimento do Estado, poucas metas do I PND-NR foram atingidas. O já citado
Plano de Desenvolvimento Portuário 1987-1996 foi elaborado no mesmo período.
Até o lançamento do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), que
será abordado mais a frente neste estudo, nenhum outro plano de caráter nacional
foi elaborado.
O quadro abaixo resume os planos portuários nacionais do século passado
citados.
Plano Portuário
Plano
de
Reaparelhamento
e
Ampliação dos Portos Organizados
Período
Elaborado em
1947
Governo
Plano Nacional
Eurico Gaspar Dutra
Plano SALTE
Plano de Reaparelhamento Nacional
de Portos e Navegação
Plano Portuário Nacional
1952-1955
Getúlio Vargas
1960-1962
Juscelino Kubitschek
Plano de Metas
Plano Portuário Nacional
1963-1966
João Goulart
Plano Trienal
Ernesto Geisel
II PND
João Figueiredo
III PND
José Sarney
I PND-NR
1975-1984
Plano Diretor Portuário do Brasil
Revisão do Plano Diretor Portuário do
1979-1988
Brasil
1987-1996
Plano de Desenvolvimento Portuário
Quadro 1: Aspectos gerais dos planos portuários nacionais
Fonte: Alcides Goularti Filho (2007, p. 477)
23
3 ORGANIZAÇÃO DO SETOR PORTUÁRIO BRASILEIRO
3.1 ORGANIZAÇÃO PRÉ-LEI DOS PORTOS
Conforme já citado, a operação do setor portuário brasileiro no período
imediatamente anterior à promulgação da Lei dos Portos era um monopólio estatal
controlado pela PORTOBRAS, que explorava os portos através de suas
subsidiárias, as Companhias Docas. De acordo com a Lei Federal nº 6.222 de 10 de
julho de 1975, a PORTOBRAS tinha por finalidade realizar atividades relacionadas
com a construção, administração e exploração dos portos e das vias navegáveis
interiores, exercendo a supervisão, orientação, coordenação, controle e fiscalização
sobre tais atividades. Competia a ela, entre outras atribuições: promover a execução
da Política Portuária Nacional, segundo diretrizes baixadas pelo Ministério dos
Transportes; realizar ou promover e aprovar estudos, planos e projetos destinados à
construção, expansão, melhoramento, manutenção e operação dos portos, bem
como executar serviços de assistência técnica para os mesmos fins; executar ou
promover, autorizar e aprovar a execução de obras e serviços de construção,
expansão e melhoramento de portos ou de suas instalações, qualquer que seja o
regime de exploração dos mesmos; administrar e explorar os portos; e fiscalizar a
administração e exploração dos portos que se encontrem em regime de concessão
ou autorização.
Esse modelo adotado para nossos portos não atendia às necessidades de
nosso crescente comércio. Os principais problemas eram: excesso de centralização
por parte do Estado; tarifas estabelecidas pelo Estado, com base em legislação que
datava da década de 30, com critérios baseados apenas nos custos de cada porto;
falta de investimentos em equipamentos e infraestrutura; falta de interesse do
governo; excesso de burocracia, com a sobreposição de competências de diversos
órgãos que, geralmente, não tinham as ações coordenadas; excesso de poder dos
sindicatos, que ditavam “normas” para os portos; impossibilidade de um terminal
privativo operar cargas de terceiros, a fim de evitar a concorrência com portos
públicos, mesmo que esses estivessem sobrecarregados, formando-se longas filas
de espera no mar e em terra (como no Porto de Paranaguá); a antiquada legislação
sobre trabalho portuário forçava a contratação excessiva de mão de obra, mesmo
que parte das operações de embarque ou desembarque fizessem uso de
24
equipamentos modernos de estiva, encarecendo a operação.
Dessa forma, as condições que imperavam em nosso Sistema Portuário antes
da promulgação da Lei nº 8.630 conduziam os portos brasileiros para a
obsolescência, aumentavam os custos de operação, diminuindo a competitividade, e
não incentivavam a competição e a consequente busca pela eficiência. Segundo
Ferreira (2009, p.77):
Os portos brasileiros tinham o “cheiro de mofo" e burocracia; pareciam
ambientes inóspitos, com muros sujos que os isolavam das cidades e
desencorajava qualquer tentativa de proximidade por parte da população.
Bem distinta do que ocorria nos terminais europeus, os portos brasileiros
eram vistos como uma espécie de buraco negro na rota do comércio
exterior brasileiro.
Como exemplo, entre 1990 e 1993 os portos brasileiros empregavam 45 mil
pessoas e, apesar disso, em 1991 só embarcaram 320 milhões de
toneladas (7.111 toneladas por empregado). Enquanto isso, o porto de
Roterdã na Holanda, com seus 2 mil funcionários, movimentou 290 milhões
de toneladas (145.000 toneladas por empregado).
As atividades marítimas e portuárias eram administradas por várias leis,
decretos e portarias. Antes da Lei da Modernização, os portos impediam o
sonho de competitividade dos produtos brasileiros pela ação do
corporativismo sindical e pela ineficiência gerencial.
3.2 ORGANIZAÇÃO PÓS-LEI DOS PORTOS
Com a extinção da PORTOBRAS e após a promulgação da Lei dos Portos, o
Sistema Portuário Brasileiro foi sendo aperfeiçoado e é composto, hoje, por 37
portos públicos, sendo que 18 são delegados, concedidos ou têm sua operação
autorizada por parte da administração dos governos estaduais e municipais.
Existem, ainda, 129 terminais portuários de uso privativo, que operam sob
concessão da União. É importante destacar que, de acordo com a Constituição
Federal de 1988, em seu Artigo 21, compete à União explorar, diretamente ou
mediante autorização, concessão ou permissão os portos marítimos, fluviais e
lacustres, sendo a administração destes dois últimos de competência do Ministério
dos Transportes.
Dos 34 portos públicos marítimos, hoje sob gestão da Secretaria de Portos da
Presidência da República (SEP/PR), 16 encontram-se delegados, concedidos ou
têm sua operação autorizada aos governos estaduais e municipais. Os outros 18
portos marítimos são administrados diretamente por 7 Companhias Docas, que são
sociedades de economia mista e que têm como acionista majoritário o Governo
Federal e, portanto, estão diretamente vinculadas à SEP/PR. A finalidade das
25
Companhias Docas é administrar, explorar e construir novas instalações portuárias.
Essas Companhias contribuem para o desenvolvimento social e econômico da
região sob sua responsabilidade ao executar as atividades de importação,
exportação e transporte marítimo de cabotagem. As Companhias Docas hoje
existentes são as seguintes: Companhia Docas do Pará (CDP), responsável pelos
Portos de Belém, Santarém e Vila do Conde, no Estado do Pará; Companhia Docas
do Ceará (CDC), responsável pelo Porto de Fortaleza (CE); Companhia Docas do
Rio Grande do Norte (CODERN), responsável pelos Portos de Natal (RN) e Maceió
(AL) e pelo Terminal Salineiro de Areia Branca (RN); Companhia Docas do Estado
da Bahia (CODEBA), responsável pelos Portos de Salvador, Ilhéus e Aratu, no
Estado da Bahia; Companhia Docas do Espírito Santo, responsável pelos Portos de
Vitória e Barra do Riacho, no Estado do Espírito Santo; Companhia Docas do Rio de
Janeiro (CDRJ), responsável pelos Portos do Rio de Janeiro, Niterói, Angra dos Reis
e Itaguaí, no Estado do Rio de Janeiro; e Companhia Docas do Estado de São
Paulo, responsável pelo Porto de Santos (SP).
Os 16 portos que se encontram delegados, concedidos ou têm sua operação
autorizada aos governos estaduais e municipais são: Porto de Santana (AP); Porto
do Itaqui (MA); Porto de Cabedelo (PB); Portos do Recife e do Suape (PE); Porto do
Forno (RJ); Porto de São Sebastião (SP); Portos de Paranaguá e de Antonina (PR);
Portos de São Francisco do Sul, Itajaí, Laguna e Imbituba (SC); e Portos de Estrela,
Pelotas e Rio Grande (RS). Os 3 portos fluviais e lacustres, de competência do
Ministério dos Transportes, são: Porto de Manaus (AM); Porto de Santarém (PA); e
Porto de Porto Alegre (RS).
26
Os 37 portos públicos que compõem o Sistema Portuário Brasileiro são
mostrados na figura abaixo.
Figura 1: Portos públicos componentes do Sistema Portuário Brasileiro
Fonte: Sítio oficial da Secretaria de Portos da Presidência da República
Na condução das políticas relativas ao setor portuário, destacam-se dois
órgãos do Governo Federal: a Agência Nacional de Transportes Aquaviários
(ANTAQ) e a Secretaria de Portos da Presidência da República.
A ANTAQ, que substituiu o Departamento Nacional de Transportes
Aquaviários, criado em 1993, foi instituída com a promulgação da Lei nº 10.233, de
2001. Vinculada ao Ministério dos Transportes e à SEP/PR, trata-se de um órgão da
Administração Federal indireta, submetido ao regime autárquico especial, com
personalidade jurídica de direito público, independência administrativa, autonomia
financeira e funcional e mandato fixo de seus dirigentes. Segundo as informações
contidas no sítio da ANTAQ na Internet (www.antaq.gov.br), cabe à referida agência
emitir regras e fiscalizar a atividade portuária de modo que essa venha a ser
executada com os atributos pertinentes a uma atividade pública, sem desconsiderar
27
os interesses privados nela existentes. Ainda de acordo com o citado sítio, as suas
finalidades são as seguintes: implementar, em sua esfera de atuação, as políticas
formuladas pelo Ministério dos Transportes e pelo Conselho Nacional de Integração
de Políticas de Transporte (CONIT), segundo os princípios e diretrizes estabelecidos
na sua lei de criação, e regular, supervisionar e fiscalizar as atividades de prestação
de serviços de transporte aquaviário e de exploração da infraestrutura portuária e
aquaviária, exercida por terceiros, com vistas a:
garantir a movimentação de
pessoas e bens, em cumprimento a padrões de eficiência, segurança, conforto,
regularidade, pontualidade e modicidade nos fretes e tarifas; harmonizar os
interesses dos usuários com os das empresas concessionárias, permissionárias,
autorizadas e arrendatárias, e de entidades delegadas, preservando o interesse
público; e arbitrar conflitos de interesse e impedir situações que configurem
competição imperfeita ou infração contra a ordem econômica.
Em 2007, foi criada, pelo Presidente Lula, através da Lei nº 11.518, a
SEP/PR. Segundo as informações contidas no sítio da SEP/PR na Internet
(www.portosdobrasil.gov.br), a referida secretaria tem entre suas atribuições e
competências a formulação de políticas e diretrizes para o fomento do setor
portuário, além da execução de medidas, programas e projetos de apoio ao
desenvolvimento da infraestrutura portuária, com investimentos orçamentários e do
Programa de Aceleração do Crescimento. Compete, ainda, à SEP/PR a participação
no planejamento estratégico e a aprovação dos planos de outorgas, tudo isso
visando assegurar segurança e eficiência ao transporte aquaviário de cargas e de
passageiros no país.
28
4 LEI DOS PORTOS
Como já visto anteriormente, a extinção da PORTOBRAS em 1990 pelo
Presidente Collor estabeleceu um “vácuo” político-institucional na administração do
Sistema Portuário Brasileiro, o que suspendeu obras em curso e pôs fim a projetos
em andamento, contribuindo para o aumento da deterioração das estruturas, em um
ritmo ainda maior do que a falta de investimentos contínuos e suficientes, que até
então existia, impunha. As Companhias Docas, repentinamente, ficaram sem estar
subordinadas a nenhum órgão, o que favorecia a administração fragmentada e não
uniforme do Sistema. Segundo Goularti Filho (2007, p. 480):
Mais do que o sistema portuário, o governo Collor pôs fim às políticas de
transportes, inclusive com a extinção do Ministério do Transportes, que foi
reduzido a uma Secretaria dentro do Ministério da Infra-Estrutura,
juntamente com as Comunicações e Minas e Energia. Se a estrutura
portuária vinha se deteriorando nos anos 1980, com o fim da Portobrás a
situação se complicou mais ainda. As obras foram paralisadas, as licitações
foram suspensas e os projetos foram encerrados. No quadro funcional da já
extinta Portobrás, a situação foi de espanto e de expectativa com o que viria
pela frente após a absurda façanha. A solução imediata foi criar o
Departamento de Portos dentro da Secretaria de Transportes, ou seja, a
estrutura de uma grande empresa holding transformou-se num
departamento. Parte das funções da Portobrás foram assumidas pelas
companhias estaduais, como o INPH (Instituto Nacional de Pesquisas
Hidroviárias), que passou para a Companhia Docas do Rio de Janeiro.
A solução encontrada no curto prazo foi a criação do Departamento de
Portos, vinculado à Secretaria de Transportes (na época, parte do Ministério da
Infraestrutura), e a transferência de parte das atribuições da PORTOBRAS para as
Companhias Docas dos estados.
Após intensos debates no Congresso Nacional, três anos se passaram até
que fosse sancionada, pelo Presidente Itamar Franco, a Lei nº 8.630/93, a Lei dos
Portos. Baseada nos modelos estruturais, operacionais e gerenciais dos mais
modernos e eficientes portos do mundo, sua característica mais marcante é a opção
pela participação da iniciativa privada na solução dos graves problemas estruturais
do Sistema Portuário Brasileiro. Esse modelo privatizante tem uma explicação: −
havia a necessidade premente de pesados investimentos visando aproximar as
condições de equipamentos, como guindastes e gruas, existentes nos portos
brasileiros à época, aos existentes nos portos estrangeiros e o Governo Federal não
dispunha de recursos para que esses investimentos fossem feitos. Essa falta
sistemática de investimentos governamentais na estrutura portuária havia se
29
agravado devido à crise cambial e financeira a que o país esteve sujeito nos anos 70
do século passado e que se estendeu pela década seguinte, a chamada “década
perdida”. A solução, então, só poderia passar pela privatização. Nenhum investidor
privado aplicaria significativos recursos em um empreendimento sobre qual não teria
o controle. Começava então a aplicação da doutrina neoliberal na administração de
nossos portos, com a desoneração e a desobrigação do Estado estar presente em
atividades de natureza privada.
É importante frisar que a promulgação da Lei dos Portos não foi fruto apenas
de uma visão neoliberal do Governo Federal. Havia entre o empresariado brasileiro
usuário dos portos um consenso sobre a necessidade de mudanças. Liderados pelo
empresário do setor siderúrgico Jorge Gerdau Johannpeter, que também era
presidente da Associação de Exportadores Brasileiros, um grupo de empresários
entregou ao presidente um documento com sugestões que visavam reduzir os
custos portuários brasileiros, dinamizando, como decorrência, o setor. Visando dar
apoio ao presidente na implementação das sugestões apresentadas, foi constituída
a Ação Empresarial Integrada (AEI), que reunia cinco confederações e cinco
entidades de classe. Em contrapartida, os setores que perderiam poder com essas
medidas (como os Sindicatos de Trabalhadores Portuários) ameaçavam reagir às
mudanças. Segundo Ferreira (2009, não paginado):
A AEI tinha como finalidade "sensibilizar as autoridades na obrigação de
viabilizar um novo regime jurídico para os portos nacionais" e dar ao
governo o apoio de que necessitava. A AIE traçou como meta conseguir a
privatização dos serviços portuários, a quebra do monopólio da mão-deobra avulsa e a licença para os terminais privados operarem cargas de
terceiros. A partir daí, uma equipe trabalhou durante sete meses no Palácio
do Planalto compondo Medidas Provisórias em total segredo. Quando a
mesma encontrou-se quase pronta, aproximadamente três dias antes de
sua assinatura, o serviço de inteligência da Marinha informou que o assunto
havia vazado e que, se a MP fosse editada, "correria sangue nos portos". O
presidente Collor então resolveu transformá-la em projeto de lei e remeter
(no inicio de 1991) à Câmara Federal.
De fato, durante os anos que sucederam à sanção da Lei dos Portos, houve
grande oposição à sua plena implementação, principalmente por parte dos
trabalhadores portuários. Diversas greves ocorreram nos portos. Apesar de não
impedirem a implementação da Lei, suas ocorrências ajudaram a manter, em certa
medida, o poder dos sindicatos e “enfraqueceram” a Lei, como veremos mais
adiante.
Os pontos mais importantes da Lei de Modernização dos Portos eram: a
30
criação do Operador Portuário, ratificando a já citada opção pela participação da
iniciativa privada nas operações portuárias, com a consequente criação de
condições para investimentos em infraestrutura e em aquisição de novos e mais
modernos equipamentos de estiva; a transferência do controle dos portos para o
Ministério dos Transportes; a criação do OGMO, quebrando, como já citado, o
monopólio dos Sindicatos de Trabalhadores Portuários, com o intuito de melhor
administrar e qualificar a mão de obra empregada nos portos brasileiros e adequar a
quantidade de trabalhadores portuários aos novos e modernos processos; a criação
da Administração do Porto, ou Autoridade Portuária, que é exercida pelas
Companhias Docas; a permissão de operação de cargas de terceiros em Terminais
de Uso Privativo, antes proibido; a criação dos Conselhos de Autoridade Portuárias,
foros consultivos, de regulação e de supervisão, porém sem personalidade jurídica,
que ficam responsáveis por estabelecer as regras de funcionamento dos portos sob
sua responsabilidade; e o estabelecimento de condições para que houvesse
competição entre os portos e entre os terminais.
Com esses e outros dispositivos constantes da Lei, o Governo Federal tinha
como principais objetivos, além da privatização: modernizar os portos, que estavam
em estado precário devido à sistemática falta de investimentos em suas
infraestruturas e em seus equipamentos; acabar com o monopólio dos Sindicatos de
Trabalhadores Portuários; e estimular a concorrência entre os portos, o que criaria
condições que proporcionariam uma maior eficiência e uma redução dos preços
excessivamente elevados praticados pelos portos brasileiros, se comparados com
seus congêneres internacionais. Esses altos preços contribuíam, entre outras
mazelas, para o encarecimento de nossas exportações, o que, por sua vez, se
somava a outros componentes de custo indesejáveis ligados, mormente, à
infraestrutura de transportes, para “formar” o − Custo Brasil. Segundo Ferreira (2009,
não paginado):
Assim, devido a fatores que afetavam intensamente os custos da operação
portuária, que inviabilizavam a participação de empresas com competência
técnica e competitividade na disputa de mercados internacionais, face a
essa "rede de ineficiências" que surgiu o termo conhecido como Custo
Brasil. Essa denominação foi utilizada para designar todos os custos extra
fábrica incidentes sobre o produto, que amortizava, e até eliminava, sua
competitividade frente a concorrentes estrangeiros no mercado internacional
e no próprio mercado brasileiro.
Como objetivos secundários, podemos citar: a redução do tempo de espera e
de permanência dos navios, o que seria possível com a maior agilidade dos portos;
31
e a desburocratização do setor, objetivo que norteava, na verdade, todos os setores
da administração pública.
4.1 ASPECTOS POSITIVOS
Apesar da Lei dos Portos não ter resolvido por completo os problemas
anteriores à sua promulgação e ter gerado alguns outros problemas para o setor
portuário nacional, este instrumento destacou-se pelos seguintes aspectos positivos:
- maior aproximação da sociedade das decisões das administrações
portuárias relacionadas aos portos. A prática anterior à Lei era a de tratar assuntos e
decisões que afetavam os portos de maneira dissociada da sociedade, ou seja, sem
a possibilidade de sua participação. Muitas vezes, as decisões tomadas eram
contrárias às suas demandas. Talvez isso explique porque a sociedade não tenha a
exata noção da importância dos portos e sua influência na economia local, regional
e, ainda mais, nacional.
- melhor organização do trabalho portuário, aumento da produtividade e
redução dos custos das operações portuárias, em especial as de contêineres e do
sistema roll-on roll-off. Essas duas virtudes podem ser atribuídas, em grande parte, à
criação dos Conselhos de Autoridade Portuária e dos Órgãos Gestores de Mão de
Obra, já descritos anteriormente neste trabalho. Outro fato positivo ligado à criação
dos OGMO foi o fim da prática de se pagar os trabalhadores portuários em dinheiro
através dos Sindicatos, que concentravam os ganhos diários auferidos e pagavam
os trabalhadores, não sem antes realizarem descontos à título de “taxa de
administração”.
- diminuição da participação das administrações portuárias nos serviços de
movimentação de cargas nos cais públicos. Essa função passou a ser exercida, em
sua quase totalidade, por empresas privadas: os Operadores Portuários, que já
foram descritos anteriormente neste trabalho. Segundo Silva e May (2006, não
paginado):
A segurança nas operações ficou melhor definida, pois o Operador
Portuário, de acordo com a lei, responde diretamente para a Autoridade
Aduaneira pela falhas cometidas nas operações no que tange às questões
aduaneiras; diretamente a Autoridade Portuária pelos danos causados à
infraestrutura existente em cada porto; ao proprietário ou consignatário da
carga pelas perdas e danos; ao armador pelas avarias provocadas na
embarcação ou na mercadoria dada a transporte; ao trabalhador portuário
pela remuneração dos serviços e respectivos encargos; ao OGMO pelas
32
contribuições não recolhidas e aos órgãos competentes pelo recolhimento
dos tributos incidentes sobre o trabalho portuário avulso.
- possibilidade de terminais portuários de uso privativo mobilizarem cargas de
terceiros com autorização do Ministério dos Transportes, o que aumenta o leque de
opções para os usuários do sistema portuário e, consequentemente, tende a reduzir
preços.
- dispensa do pagamento do Adicional de Tarifa Portuária14 (ATP) pelos
terminais privativos fixados fora da área do porto organizado, o que desonerou os
Operadores Portuários. Essa cobrança, dentro da perspectiva privatizante da
administração dos portos e considerando o propósito do ATP, era incoerente, visto
que os investimentos na infraestrutura dos terminais privativos eram de
responsabilidade do Operador Portuário.
- diminuição gradativa da alíquota do ATP, que foi extinto em 1996, o que
contribuiu para desonerar as operações portuárias.
- possibilidade da União descentralizar o setor portuário, promovendo a
concessão da exploração de porto público organizado, ou promovendo contratos de
arrendamento entre o concessionário e o interessado privado, para a exploração
comercial de áreas e instalações portuárias. Foram criadas três modalidades de
transferência da operação dos terminais portuários públicos para a iniciativa privada:
concessão da administração portuária, que se processa por licitação; qualificação e
atuação de operadores portuários privados, efetivada por ato administrativo da
Autoridade Portuária (desde 2001, este ato administrativo é de responsabilidade da
ANTAQ); e arrendamento de áreas e instalações portuárias, normalmente efetuada
mediante a realização de licitação. Esse arrendamento não implica na investidura da
entidade concessionária nas funções de Autoridade Portuária
- concentração dos investimentos públicos em obras de infraestrutura, ficando
a cargo da iniciativa privada os investimentos na superestrutura, equipamentos
portuários, recuperação e conservação das instalações.
- estímulo à concorrência entre portos e entre terminais, o que, em médio
prazo, tende a baratear os custos portuários.
- quebra do monopólio dos Sindicatos de Trabalhadores Portuários no
14
Adicional de Tarifa Portuária: adicional sobre as tabelas de Tarifas Portuárias, com valor de 50% e
que incide sobre as operações realizadas com mercadorias importadas ou exportadas. Esse adicional
se destina à aplicação em investimentos para melhoramento, reaparelhamento, reforma e expansão
de instalações portuárias.
33
provimento da mão de obra aplicada nas operações portuárias.
- descentralização do poder decisório sobre as políticas portuárias, ficando a
cargo de cada porto, no âmbito local, deliberar sobre suas políticas específicas.
- criação, em caráter temporário, do Adicional de Indenização do Trabalhador
Portuário Avulso (AITP) e do Fundo de Indenização do Trabalhador Portuário (FITP),
que visavam indenizar o trabalhador portuário que desejasse deixar o sindicato de
sua classe. A disponibilidade desses recursos indenizatórios provocou um
desligamento significativo de trabalhadores dos sindicatos, ajudando a diminuir o
“inchado” quadro dos trabalhadores portuários.
- graças à criação do Operador Portuário, pôs-se fim à imprópria prática de
operação de duas Entidades Estivadoras em um mesmo navio ao mesmo tempo, o
que, normalmente, gerava desentendimentos e entraves à operação, resultando em
atrasos.
- o estabelecimento de nova sistemática para a fixação das tarifas portuárias,
com a negociação entre Governo Federal, administração portuária e Conselhos de
Autoridade Portuária.
4.2 ASPECTOS NEGATIVOS
Em que pesem os diversos aspectos positivos da Lei dos Portos apontados
anteriormente, alguns aspectos negativos devem ser ressaltados:
- no caso de qualquer divergência relacionada aos contratos de arrendamento
dos terminais de carga para empresas privadas feitos em consonância com o
previsto na Lei nº 8.630/93, sua solução ficará a cargo da justiça comum, de acordo
com a Lei do Inquilinato. Em um caso extremo, devido à conhecida morosidade no
trâmite das ações nos Tribunais Estaduais e nos Tribunais Regionais Federais, um
terminal portuário poderia ficar fechado por anos, trazendo prejuízos de toda a
ordem.
- obrigatoriedade de movimentação de apenas um tipo de carga nos terminais
sob arrendamento, o que, no caso de carga movimentada em caráter sazonal (uma
colheita de determinado produto agrícola, por exemplo), implica na ociosidade desse
terminal em determinados períodos do ano.
- atribuição da Presidência dos Conselhos de Autoridade Portuárias a um
componente do Governo Federal, de acordo com o que preceitua o Artigo 31 da Lei
34
nº 8.630/93. Isso, geralmente, proporciona uma componente política (e, muitas
vezes, partidária) ao Conselho e às suas decisões. Além disso, como esses
Presidentes não eram representantes locais, não conhecem os problemas e as
necessidades dos respectivos portos sob sua jurisdição, o que prejudica suas
avaliações e as decisões tomadas pelos Conselhos. Muitas vezes, esses
Presidentes são egressos dos quadros do Ministério dos Transportes. Não é raro
ocorrer troca dos Presidentes dos Conselhos logo após a troca do Ministro dos
Transportes, explicitando o caráter político do cargo.
- a composição dos CAP, que não é exclusivamente formado por pessoas
estritamente ligadas à atividade portuária, dificulta a tomada de decisão baseada no
amplo conhecimento da atividade e nas necessidades de cada porto. Essa
heterogeneidade, apesar de benéfica pela possibilidade de enriquecer o debate, traz
morosidade na tomada de decisões, na medida em que diferentes (e, às vezes,
conflitantes) interesses têm que ser harmonizados. Em alguns casos, o debate trava
a pauta de deliberações do Conselho e um impasse se estabelece, inviabilizando a
aplicação de solução a um problema importante e que demanda ações no curto
prazo.
- não há na Lei nº 8.630/93 um dispositivo que defina claramente se um
terminal privativo está ou não na área do porto organizado. Essa definição de
maneira inequívoca se faz necessária, pois é notório que estar dentro da área do
porto organizado significa vantagens, principalmente às relativas ao custo.
4.3 PENDÊNCIAS DE IMPLEMENTAÇÃO
Levando em consideração os aspectos positivos da Lei de Modernização dos
Portos e independente de seus aspectos negativos, já se pode inferir que o marco
legal constituiu-se em um importante avanço no sentido de melhor organizar o setor
portuário e oxigenar um setor estratégico para a economia. Porém, conforme será
apresentado a seguir, alguns objetivos da Lei ainda não foram totalmente
alcançados, seja pela não implementação de determinados dispositivos, ou pela sua
implementação parcial. Dessa forma, passamos a abordar essas pendências:
- no que diz respeito à escalação da mão de obra aplicada na estiva dos
navios, prevê a Lei nº 8.630/93, conforme já foi abordado, que o OGMO será,
obrigatoriamente, o responsável por, através de uma postura isenta e isonômica,
35
fazer essa escalação sem privilegiar qualquer trabalhador, de acordo com o Inciso I
do Artigo 18. Nesse caso, ainda persiste, mesmo que em menor escala, a
sistemática anterior à Lei, pela qual os sindicados portuários mantêm em suas mãos
o poder de escalar a mão de obra, geralmente privilegiando aqueles trabalhadores
mais antigos ou com alguma maior “proximidade” do sindicato. Dessa forma, o
propósito da criação do OGMO ainda não foi alcançado plenamente, tendo em vista
que uma das mais nocivas práticas que ele deveria combater ainda persiste.
- prevê a Lei nº 8.630/93, em seu Artigo 21, que o OGMO pode ceder
trabalhador portuário avulso, em caráter permanente, ao Operador Portuário. Essa
possibilidade é, inclusive, ratificada pela Lei nº 9.719/98. Previa-se, com esse
mecanismo, um barateamento da mão de obra e, consequentemente, dos portos. No
entanto, na prática, isso não vem ocorrendo devido às interferências dos sindicatos
portuários. Através de diversos mecanismos, os sindicatos pressionam seus
associados para não aceitarem a contratação em regime avulso pelos Operadores
Portuários. Essa atitude dos sindicatos tem o propósito de evitar a perda de antigos
privilégios e de força de suas diretorias.
- de acordo com o Artigo 32 da Lei nº 8.630/93, os CAP deveriam instituir
Centros de Treinamento destinados à formação e aperfeiçoamento de pessoal para
o desempenho de cargos e o exercício de funções e ocupações peculiares às
operações portuárias e suas atividades correlatas. No entanto, até os dias de hoje,
nenhum porto brasileiro possui um centro de treinamento para a mão de obra
portuária, sem que haja uma explicação concreta para tal. Uma das possibilidades
para que tais centros não tenham sido implantados é a recorrente falta de recursos
destinados à modernização dos portos. Outra possibilidade pode ser atribuída às
ingerências dos sindicatos de trabalhadores portuários dentro dos CAP para que não
se criem tais centros, dentro de uma míope visão de que com o treinamento em
equipamentos mais modernos, a aplicação da mão de obra diminuiria em escala.
Como consequência, muitas operações portuárias continuam a ocorrer, com grande
grau de amadorismo, por trabalhadores mal formados e mal treinados, com o
inevitável aumento do custo portuário e com a ocorrência, em frequência além do
limite do aceitável, de avarias nas cargas e nos navios e acidentes de trabalho.
- prevê a Lei nº 8.630/93, no caput de seu Artigo 57, que no prazo de cinco
anos (a contar da data da publicação da Lei), a prestação de serviços por
36
trabalhadores portuários deve buscar, progressivamente, a multifuncionalidade 15 do
trabalho, visando adequá-lo aos modernos processos de manipulação de cargas e
aumentar a sua produtividade. O que se observa, dentro ainda da dimensão da
inexistência dos Centros de Treinamento citados anteriormente, é que nenhum
passo foi dado em direção à multifuncionalidade do trabalhador portuário. Para que
não se tenha avançado nesse campo, podem ser consideradas as mesmas razões
citadas em relação à falta de Centros de Treinamento: falta de recursos para
investimento em treinamento e falta de interesse dos sindicatos em função da
possibilidade de diminuição numérica da mão de obra nas operações portuárias.
- prevê a Lei nº 8.630/93, no Inciso X, § 1º, do Artigo 30, a elaboração de um
Plano de Desenvolvimento e Zoneamento (PDZ) de cada porto, porém, alguns
portos ainda se encontram elaborando os seus PDZ. Com isso, não há um
planejamento de objetivos em cada um desses portos, dificultando, assim, o
desenrolar das ações decorrentes e os investimentos correspondentes. Cabe à
ANTAQ, como entidade reguladora, fiscalizadora e harmonizadora das atividades
portuárias e de transporte aquaviário, instar esses portos a finalizar a elaboração de
seus PDZ e submetê-los à aprovação dos CAP.
- outro ponto implícito da Lei nº 8.630/93 que ainda não alcançou seus
propósitos diz respeito ao emprego de mão de obra nas operações portuárias. Um
dos objetivos da Lei era modernizar e tornar os portos brasileiros mais eficientes e
competitivos, colocando-os em níveis compatíveis com os mais modernos portos
estrangeiros. Entretanto, na comparação com esses portos, nossos portos
encontram-se ainda muito defasados, em grande parte devido ao emprego
excessivo de mão de obra. Calcula-se que a mão de obra represente cerca de 70%
das despesas dos serviços portuários. Os custos restantes dizem respeito às tarifas
portuárias. As principais componentes da estrutura tarifária portuária dizem respeito
ao uso da infraestrutura de acesso aquaviário e atracação (canais de acesso aos
portos com seu balizamento, locais de atracação, áreas de espera e bacias de
manobra são exemplos) e à utilização da infraestrutura terrestre dos portos
(guindastes, gruas, fornecimento de água e energia, etc.). As tarifas portuárias
também poderiam ser objeto de estudo no sentido da redução de custos, mas não
15
A multifuncionalidade abrange as atividades de capatazia, estiva, conferência de carga, conserto
de carga, vigilância de embarcação e bloco (atividade de limpeza e conservação de embarcações
mercantes e de seus tanques, incluindo batimento de ferrugem, pintura, reparos de pequena monta e
serviços correlatos).
37
serão abordadas neste trabalho, visto que representam parcela menor destes
custos. Isso quer dizer, então, que a mão de obra é, sem dúvida, a maior
componente dos custos portuários brasileiros. Levando-se em conta que, com o
avanço da tecnologia para embarque e desembarque de cargas a bordo, a utilização
intensiva de mão de obra se torna cada vez mais desnecessária, não parece difícil
imaginar a solução para o problema. Ademais, a Lei de Modernização dos Portos
oferece os artifícios legais para tal. Os motivos para que essa situação perdure
também estão relacionados à força que os sindicatos portuários detêm, mesmo
passados dezoito anos da promulgação da Lei nº 8.630/93. Essa força pode ser
exemplificada pela existência de tabelas nos sindicatos que determinam a
quantidade necessária de trabalhadores para cada tipo de operação no porto, sem
participação
ou
intervenção
do
OGMO,
diminuindo
sua
importância
e
enfraquecendo-o. É importante ressaltar, também, que essa prática e diversas
outras infrações dos sindicatos são do conhecimento do Ministério do Trabalho e
Emprego, conforme pode ser observado no Manual do Trabalho Portuário e
Ementário,
edição
2001,
disponível
no
sítio
http://www.prt7.mpt.gov.br/at_portuario/Manual_Portuario.pdf. A introdução de novos
e modernos equipamentos de apoio às diversas atividades portuárias resulta,
inexoravelmente, na redução numérica dos trabalhadores, notadamente na estiva de
navios. Segundo Oliveira (2000, p. 54):
Então, como colocado anteriormente, os avanços tecnológicos nos sistema
portuário provocam dispensa de mão de obra. Por exemplo, entre 1970 e
1982, os portos europeus de Amberes e Liverpool experimentaram
reduções de 38,9% e 78,8%, respectivamente, no número de trabalhadores
empregados. Entre 1960 e 1980, o número de estivadores caiu
significativamente de aproximadamente de 14.000 para um pouco mais de
9.000 em Antuérpia e de 5.046 para 2.235em Amsterdã. Esperava-se que o
número de estivadores diminuísse ainda mais pela não permissão para
substituição do estivador aposentado por um novo trabalhador. Dos 17.265
estivadores em 1966 em Hamburgo, constavam registrados 12.866 em
1978, ou seja, uma redução de aproximadamente 25,5% em 12 anos.
Durante o mesmo período, o volume total de tráfego neste porto cresceu de
37,5 para 54,6 milhões de toneladas. A carga geral aumentou de
aproximadamente 12 para 15 milhões de toneladas no mesmo período. No
porto de Berman, 8.442 trabalhadores de cais estavam registrados em
1962. No começo da década de 80 eram somente 6.605. Durante o mesmo
período, entretanto, o fluxo total de mercadorias aumentou de 16 milhões de
toneladas em 1962 para 23,5 milhões em 1978. Em Roterdã, entre 1960 e
1980, o número de estivadores caiu significativamente de 13.815 para
12.675, enquanto que o tráfego marítimo de óleo mineral mais que
quadruplicou e o de carga seca quase triplicou.
No entanto, no Brasil, ainda hoje, a quantidade de operários empregados em
38
operações portuárias é significativamente maior quando comparados com portos
estrangeiros. Como exemplo, na tabela abaixo, elaborada em 1998, é feita uma
comparação entre o número de trabalhadores utilizados em operações de carga e
descarga para um determinado tipo de navio mercante em alguns países sulamericanos e europeus e nas mesmas operações no Porto de Santos. No caso
extremo, entre Buenos Aires e Santos, esse número é mais de 17 vezes menor.
Tabela 1: Comparação entre o número de trabalhadores aplicados nas operações de
carga e descarga por Navio Porta-contêineres em diversos portos e o número de
trabalhadores no mesmo tipo de navio no Porto de Santos (SP)
Quantitativo de Trabalhadores por Navios Porta-contêineres
16
- 1998
Porto (operação com três ternos)
Número de trabalhadores
Buenos Aires (Argentina)
4 a 19
Callao (Peru)
20 a 25
Valparaíso (Chile)
20 a 25
Antuérpia (Bélgica)
7a8
Barcelona (Espanha)
14
Santos (Terminal 37 – Automatizado)
67 a 70
Fonte: BNDES, 2002
16
Navio Porta-contêineres, Navio Full ou Navio Full Container: navios em que toda a carga vem
acondicionada em contêineres de aço.
39
5 COMENTÁRIOS, ANÁLISE E SUGESTÕES
No tocante à Lei de Modernização dos Portos, e como já foi apresentado, as
pendências de sua implementação estão muito ligadas às resistências das entidades
que teriam a importância reduzida com a sua sanção – os Sindicatos – e também à
falta de recursos. Dessa forma, as ações governamentais a serem desencadeadas,
visando não só ao pleno cumprimento da referida Lei, bem como à continuação do
processo de melhoria do sistema portuário brasileiro, devem ser orientadas para
vencer essas resistências de modo a garantir um fluxo ininterrupto de recursos para
as infraestruturas de acesso aquaviário, de atracação e terrestre dos portos
nacionais.
Quanto à força dos sindicatos na aplicação da mão de obra, deve-se buscar,
através dos meios legais disponíveis, o cumprimento integral dos dispositivos
existentes na Lei dos Portos, fortalecendo os OGMO. Essa busca requer cuidado
para que não se gere o efeito colateral indesejável do desemprego. Deve-se,
também, fomentar o relacionamento dessas entidades com os órgãos portuários,
como as Companhias Docas e os Operadores Portuários. Trata-se de convencer os
trabalhadores de que a realidade das operações portuárias mudou e que os
investimentos em especialização, em treinamento e em multifuncionalidade irão
contribuir para a redução de custos portuários e, com isso, aumentar a eficiência e
lucratividade de nossos portos, beneficiando, por extensão, nossa economia. Como
consequência, melhores salários poderão ser pleiteados pelos sindicatos, em um
círculo virtuoso que beneficiará a todos. Segundo Ferreira (2009, p. 49):
Antigas e ultrapassadas fórmulas para contratação de mão-de-obra foram
absolutamente abandonadas, dando lugar a esquemas bem mais
inteligentes, que aceleravam as operações de cargas e descargas. Na
atualidade, o que se vê nos grandes portos mundiais são as empresas e
sindicatos juntos, buscando novos caminhos para diminuírem custos e
aperfeiçoarem os serviços.
Segundo palavras do Secretário Executivo da SEP/PR, Sr. Mário Lima, em
Conferência proferida na Escola Superior de Guerra, em 01 de setembro de 2011,
quando questionado sobre a necessidade de fazer cumprir integralmente este
dispositivo legal, permitindo que os OGMO cumpram seu papel de maneira
inequívoca, as ações nesse sentido seguem de maneira lenta e desigual pois,
segundo ele, alguns OGMO “deram certo” e outros ainda não. Dessa forma, existe
uma concentração de esforços nos OGMO que não conseguiram ainda assumir,
40
plenamente e sem interferências externas, sua função de administrar o fornecimento
de toda a mão de obra e seu treinamento.
No que diz respeito aos recursos para investimento na modernização da
estrutura portuária existe, em tese, arrecadação por parte da Autoridade Portuária
que pode ser revertida para essas necessidades. Entretanto, esses recursos não
vêm sendo aplicados, em parte devido às dívidas trabalhistas, fiscais e
previdenciárias “herdadas” pelas Companhias Docas. Essas dívidas, em muitos
casos, são expressivas, “engessando” o poder de investimento em infraestruturas
portuárias. Além disso, as Companhias Docas, de acordo com a Resolução nº 2.827
de 2001 do Banco Central do Brasil, estão impedidas de obter financiamentos do
BNDES17. Dessa forma, as únicas maneiras vislumbradas para tentar resolver este
impasse seriam: fim das restrições previstas pela Resolução acima citada o que, em
período de contingenciamento de recursos, será muito difícil, principalmente porque
outras entidades públicas seriam beneficiadas; e transferir parte das atribuições das
Companhias Docas, concessionárias da União e a quem cabe a administração do
porto organizado (Autoridade Portuária), para a iniciativa privada. Importante
ressaltar que, nesse caso, tal “subconcessão” se processaria mediante a realização
de processo licitatório e que não se poderia transferir para o “subconcessionário”
todas as competências da Autoridade Portuária, em virtude do contido na Resolução
nº 517 de 2005 da ANTAQ. Com essa proposta, as Companhias Docas disporiam de
receitas provenientes dos arrendamentos de instalações portuárias, que já dispõem
hoje, mais as provenientes das “subconcessões”.
No que diz respeito aos meios de transporte, as novas exigências do
comércio marítimo mundial geraram a necessidade de adequar os veículos desse
comércio, os navios. Aumento de deslocamento18, de calado19, de comprimento e a
retirada de equipamentos de estiva de bordo foram algumas mudanças que
ocorreram. Essas, por sua vez, exigiram mudanças nos portos. Como exemplo, com
o grande aumento da conteinerização das cargas, há a necessidade de adequar os
portos que, em muitos casos, eram especializados em carga geral (não17
BNDES: Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social. Empresa pública federal, com
personalidade jurídica de direito privado e patrimônio próprio, vinculada ao Ministério do
Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, e que tem como objetivo apoiar empreendimentos
que contribuam para o desenvolvimento do Brasil.
18
Deslocamento: medida do peso do volume de água que o navio desloca, quando flutuando em
águas tranqüilas.
19
Calado: é a distância vertical entre a superfície da água e a parte mais baixa do navio naquele
ponto.
41
conteinerizada) e grãos. No Brasil, essas adequações não foram feitas em um ritmo
aceitável, levando grande parte de nossos portos a um estado de quase
obsolescência, tanto no tocante aos seus aparelhamentos, quanto nas suas
capacidades de armazenagem e nas profundidades de canais de acesso e cais para
atracação. Com isso, os altos custos de operação dos portos nacionais reduzem o
comércio, principalmente as exportações. Em alguns casos, nossos portos são
quatro vezes mais caros, em termos de custos, do que portos de outros países. Um
movimento no sentido de baratear a operação de nossos portos aumentaria a
competitividade de nossos produtos no exterior e fomentaria o transporte de cargas
pela navegação de cabotagem.
Um dos objetivos da Lei dos Portos, que diz respeito ao estabelecimento de
uma sadia concorrência entre portos e entre terminais, merece alguns comentários.
Como citado anteriormente, na antiga estrutura de nosso Sistema Portuário, a
concorrência não era incentivada, principalmente entre terminais privativos e portos
públicos. A explicação para essa situação devia-se ao fato de que, em geral, a
produtividade dos terminais privados era em muito superior à dos portos públicos.
Hoje, com a autorização para que os Terminais de Uso Privativo operem carga de
terceiros, essa situação mudou, já que é sensível a melhora na produtividade de
alguns de nossos portos públicos. A concorrência, então, passa a ser pautada nas
vantagens comparativas. Essas vantagens podem ser em relação às infraestruturas
marítimas e terrestres ou em relação à administração portuária. Entres as primeiras,
podemos citar: profundidade do canal de acesso e do cais; facilidade de acesso
terrestre ao porto; dimensão dos berços de atracação e suas especializações em
termos de carga manobrada; mecanização e automação da manobra de cargas;
redução de uso de mão de obra; disponibilidade de sistemas informatizados de
controle; e custos portuários reduzidos. De acordo com vários estudos levados a
cabo nos últimos anos, os portos brasileiros apresentam graves problemas
relacionados à facilidade de acesso terrestre e profundidade do canal de acesso e
do cais. Anos de abandono e falta de investimentos no setor acabaram por gerar
imagens como as enormes filas de caminhões para descarregar suas cargas no
porto de Paranaguá (PR) no período da safra agrícola. Por essas mesmas razões,
diversos portos sofreram efeitos do assoreamento, sem que os necessários serviços
de
dragagem
fossem
realizados.
Como
resultado,
esses
portos
ficaram
impossibilitados de receber os navios de maior porte (e com maior calado). A
42
solução encontrada pelos armadores foi tomar para frete navios menores ou reduzir
a carga embarcada em navios maiores, subutilizando suas capacidades. A
conseqüência inevitável é a majoração dos preços dos fretes, o que diminui a
competitividade dos portos e dos produtos brasileiros. Portos brasileiros podem estar
sendo preteridos por portos de países próximos. A título de exemplo, a
movimentação de contêineres no Porto de Santos tem um custo quase duas vezes
maior do que em Buenos Aires (Argentina) e quase três vezes maior do que em
Montevidéu (Uruguai). No que diz respeito à administração portuária, deve-se ter em
mente, como em qualquer negócio, a satisfação do cliente e, atendendo às
demandas em voga nos dias de hoje, a imagem do porto para a população. É
essencial que o administrador do porto busque consolidar junto à sociedade a
imagem de um porto que represente a cidade ou a localidade em que se encontra e
que preserva o meio ambiente. É necessário que se acabe a imagem existente há
anos de um entorno portuário degradado e de vizinhança perigosa. Experiências
como a de Puerto Madero, em Buenos Aires, Argentina, constituem-se em exemplos
a serem seguidos. Seguindo essa tendência, a cidade do Rio de Janeiro vem, aos
poucos, tentando revitalizar sua área portuária.
A concorrência entre portos no Brasil já é uma realidade e, conforme a
reformulação do setor portuário iniciada pela Lei dos Portos vai se consolidando, a
disputa tornar-se-á mais agressiva. Com isso, as administrações portuárias terão
que usar criatividade e flexibilidade, além de investir na melhoria da gestão, com a
participação e cooperação cada vez maior dos Conselhos de Autoridade Portuárias
(CAP) e dos demais órgãos do setor portuário.
43
6 AÇÕES EM CURSO E PERSPECTIVAS
As demandas cada vez mais expressivas por melhores infraestruturas e
instalações portuárias e hidroviárias, pela redução de custos, por atendimento aos
rigorosos critérios das legislações ambientais e às crescentes exigências dos
usuários por serviços de qualidade foram algumas das razões para que um
planejamento de estado fosse estabelecido, definindo planos e ações de médio e
longo prazos. Faz-se necessário, então, apresentar algumas ações que estão sendo
ou serão implementadas pelo Governo Federal, visando proporcionar condições
para que nosso setor portuário aperfeiçoe seu aparelhamento físico e legal,
melhorando suas vantagens comparativas.
Sem dúvida, em relação aos atos regulatórios do setor, a ANTAQ vem
envidando esforços para a elaboração de normas e na fiscalização do setor
aquaviário, com ênfase nas ações direcionadas ao subsetores mais sensíveis,
como: transporte de passageiros e de cargas; de instalações portuárias públicas; de
Estações de Transbordo de Carga20; e de arrendamentos em portos públicos e
terminais privativos. Outro tema de grande interesse da ANTAQ e que conta com a
contribuição da Marinha do Brasil, através das Capitanias dos Portos, é a
fiscalização das embarcações no que diz respeito aos itens de segurança e conforto.
A adequabilidade das instalações de embarque e desembarque também são
periodicamente fiscalizadas.
No que diz respeito às ações e planos em vigor para o setor aquaviário, serão
elencados a seguir alguns projetos e medidas em andamento no âmbito da SEP/PR,
de acordo com as informações coletadas nas conferências do Secretário Executivo
da SEP/PR, Sr. Mário Lima e do Diretor-Geral da ANTAQ, Sr. Fernando Fialho,
conferências essas proferidas na Escola Superior de Guerra, em 01 de setembro de
2011.
No que diz respeito a Planos e Programas, foram apresentados os seguintes:
- Plano Nacional de Logística Portuária (PNLP) - envolve as ações voltadas à
expansão e adequação da capacidade portuária nacional, à clara definição das
atribuições e dos papéis institucionais dos entes envolvidos nas atividades
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Estação de Transbordo de Carga: situada fora da área do porto organizado, utilizada,
exclusivamente, para operação de transbordo de cargas destinadas ou provenientes da navegação
interior.
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portuárias e à melhoria da eficiência da gestão dos portos nacionais.
- Porto sem Papel - tem por objetivo promover a desburocratização dos
procedimentos de estadia dos navios nos portos brasileiros, de forma a otimizar os
processos de importação e exportação.
- Plano Nacional de Integração Hidroviária (PNIH) – em parceria com a
Universidade Federal de Santa Catarina, estão sendo desenvolvidos estudos e
análises das hidrovias brasileiras e suas instalações portuárias para a implantação
de Base de Dados Georreferenciada e Sistema de Informação Geográfica, visando
verificar a viabilidade de inserção de hidrovias e terminais, de forma plena, no
Sistema de Transportes Nacional.
- Plano Geral de Outorgas Portuário (PGO) – tem como objetivos, entre
outros: estruturar mecanismos técnicos de apoio à governança, cujas bases sejam
fundamentadas no planejamento estratégico para o setor portuário; integrar-se ao
arcabouço metodológico (Plano Nacional de Logística e Transportes do Ministério
dos Transportes) que subsidiou o PAC; e orientar as decisões de investimentos. O
PGO em vigor identificou 19 novas áreas e 45 subáreas distribuídas entre os
estados do Amazonas, Pará, Alagoas, Ceará, Rio Grande do Norte, Sergipe, Bahia,
Espírito Santo, Rio de Janeiro, São Paulo, Rio Grande do Sul e Santa Catarina.
- Planos de Desenvolvimento e Zoneamento (PDZ) – contém a diretriz da
ação estatal sobre a estrutura de cada porto e tem por objetivo a integração das
necessidades do país em matéria portuária com as realidades presentes e as
previstas para a economia nacional, buscando a eficiência e a modernização do
portos organizados. Apesar de ter sido prevista na Lei nº 8.630/93 a elaboração dos
PDZ de todos os portos, alguns PDZ ainda se encontram em fase de elaboração.
- Programas de Arrendamento dos Portos – têm como objetivo otimizar a
operação portuária e atender ao crescimento da movimentação de cargas nos portos
organizados. São elaborados por cada Autoridade Portuária e submetidos à ANTAQ
para aprovação, a quem caberá a fiscalização de seu cumprimento. Ainda existem
portos elaborando seus programas.
Nas aludidas conferências na ESG, as outras atividades apresentadas
foram as seguintes:
- Fiscalização por parte da ANTAQ da elaboração e cumprimento de
Programas de Prevenção de Riscos Ambientais, Programas de Controle de
45
Emergências, Planos de Emergência Individual e outras ações voltadas à
preservação do meio ambiente.
- Ampliação e reaparelhamento do Centro de Instrução Almirante Graça
Aranha (CIAGA), no Rio de Janeiro, e do Centro de Instrução Almirante Braz de
Aguiar (CIABA), em Belém do Pará, além da criação de novos centros de
treinamento para o pessoal da Marinha Mercante.
- Desenvolvimento de projetos ligados à multimodalidade de transporte de
cargas, como os corredores para a soja nas regiões Centro-Oeste, Norte e Sul, e o
Projeto Usina Siderúrgica do Pará (USIPAR). Esses e outros projetos visam: à
integração multimodal entre rodovias, ferrovias e hidrovias; à instalação de terminais
de transbordo nas cidades ribeirinhas ao longo das hidrovias; possibilitar o melhor
escoamento da produção local; desenvolver indústrias e serviços ao longo da malha
multimodal; e atrair investimentos.
- Investimentos em infraestrutura portuária com recursos do PAC Copa 2014,
beneficiando os Portos de Mucuripe (CE), Natal (RN), Recife (PE), Salvador (BA),
Rio de Janeiro (RJ) e Santos (SP). O valor previsto de investimentos é de R$ 809, 5
milhões.
- Melhoria da infraestrutura portuária nos Portos de Vila do Conde (PA), Itaqui
(MA), Luis Correia (PI), Areia Branca (RN), Suape (PE), Maceió (AL), Vitória (ES),
Santos (SP), São Francisco do Sul (SC) e Rio Grande (RS). O valor previsto de
investimentos é de R$ 1,7 bilhões.
- Melhoria dos acessos hidroviários, com a execução do Plano Nacional de
Dragagem, que abrange a execução de obras de dragagem em 20 portos nacionais
com recursos do PAC e do PAC-2. O montante sendo investido é da ordem de R$
2,4 bilhões.
- Melhoria dos acessos terrestres com recursos do PAC, dos estados da
federação e da SEP/PR. As principais obras são: Rodoanel (SP), Arco Rodoviário
(RJ), Ferrovia Norte-Sul, Ferrovia Leste-Oeste, Ferrovia Transnordestina, perimetrais
do Porto de Santos (SP) e acesso ao Porto de Suape (PE).
- Estímulo ao investimento privado em infraestrutura portuária. Os
investimentos privados em andamento em diversos portos, distribuídos desde a
Região Norte até a Região Sul, são da ordem de R$ 31,7 bilhões. Um dos
mecanismos usados para incentivar o investimento é o Regime Especial de
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Incentivos para o Desenvolvimento da Infraestrutura (REIDI), que prevê desconto de
créditos da contribuição para o PIS/PASEP e da COFINS de Edificações.
- Projeto de Cadeia Logística Portuária Inteligente - fará o levantamento
sistêmico do processo de movimentação de cargas no Brasil, com foco nos
processos de exportação, além de propor um modelo de rastreabilidade, que
permitirá o uso de melhores práticas de tecnologia com o objetivo de garantir
benefícios ao usuário dos portos nacionais, assim como maior eficiência às
autoridades envolvidas na atividade portuária.
- Implantação do “Vessel Traffic Management Information System” (VTMIS) sistema de auxílio eletrônico à navegação, com capacidade de prover monitoração
ativa do tráfego aquaviário, cujo propósito é ampliar a segurança da vida humana no
mar, a segurança da navegação e a proteção ao meio ambiente nas áreas em que
haja intensa movimentação de embarcações ou risco de acidente de grandes
proporções. Em esforço conjunto com as Autoridades Portuárias, que administram
cada um dos portos públicos, a SEP/PR gerenciará a implantação dos sistemas de
monitoração. Os estudos para implantação do VTMIS para o controle de tráfego se
encontram bastante adiantados. O Porto do Rio de Janeiro será o primeiro porto
público contemplado com o sistema VTMIS, que será custeado com recursos da
União.
- Descompressão fiscal através do Regime Tributário para Incentivo à
Modernização e à Ampliação da Estrutura Portuária (REPORTO). São beneficiários
do REPORTO o Operador Portuário, o concessionário de porto organizado, o
arrendatário de instalação portuária de uso público e a empresa autorizada a
explorar instalação portuária de uso privativo misto. As vendas de máquinas,
equipamentos e outros bens, no mercado interno, ou a sua importação, quando
adquiridos ou importados diretamente pelos beneficiários do REPORTO e
destinados ao seu ativo imobilizado para utilização exclusiva em portos na execução
de serviços de carga, descarga e movimentação de mercadorias, são efetuadas com
suspensão da contribuição para o PIS/PASEP e da COFINS.
- Fortalecimento dos CAP através de maior participação da Comunidade
Portuária, mudanças em suas presidências e realização de reuniões de integração
entre Conselhos.
- Planejamento de longo prazo incluindo, entre outros, a participação de
consultarias nacionais, estudos para implantação das Zonas de Apoio Logístico,
47
consultoria do Banco Interamericano de Desenvolvimento para o Porto de Santos (já
concluída), estudos privados para o aproveitamento de Barnabé-Bagres (Santos –
SP) e a contratação da Universidade Federal de Santa Catarina e do Porto de
Roterdã para desenvolvimento de um planejamento estratégico para os portos
brasileiros nos próximos 20 anos.
- Melhoria na gestão das Companhias Docas, com a profissionalização dos
gestores, o equacionamento da dívida da previdência complementar e a implantação
de sistema de avaliação de gestão, por indicadores econômicos, financeiros e de
produtividade.
- Ações no sentido de melhorar as relações com trabalhadores e entidades
sindicais.
- Requalificação de mão de obra através de convênios com o Ministério da
Educação e com o Centro de Excelência Portuária (CENEP), em Santos (SP).
Ainda de acordo com as informações obtidas nas conferências já citadas
anteriormente, as propostas para avanços no marco regulatório (Lei nº 8.630/93)
são: institucionalização do sistema de gestão profissional das Companhias Docas,
dos conselhos fiscais e de administração; redefinição da estrutura e do papel dos
CAP; redefinição das relações trabalhistas no sistema portuário; atualização dos
conceitos operacionais de terminais públicos e privativos; incorporação de conceitos
de portos secos e zonas de apoio logístico à plataforma de logística portuária;
incorporação dos sistemas hidroviários e de portos fluviais; estabelecimento de
regras para contratos de arrendamento anteriores à essa Lei; definição do modelo
de concessão e de arrendamento portuário; aprimoramento no alfandegamento
portuário; integração de todos os agentes públicos atuantes nos portos, sob gestão
da Autoridade Portuária; criação de um sistema unificado de guarda portuária;
redefinição das competências da SEP/PR e da ANTAQ; e institucionalização do
processo de arbitragem para a fixação de preços do serviço de praticagem.
Na visão da ANTAQ, a solução para a melhoria na exploração dos portos só
será alcançada com o menor emprego de recursos públicos, maior envolvimento da
iniciativa privada, concessão à iniciativa privada de novos portos e novos
arrendamentos.
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7 CONCLUSÃO
Conforme apresentado neste estudo, a evolução histórica da organização do
Sistema Portuário Brasileiro pode ser dividida em 3 períodos: o período anterior a
1910, quando a política oficial para os portos era predominantemente privatista; o
período entre 1910 e 1990, quando a política oficial foi, de maneira paulatina,
tendendo para a nacionalização dos portos e a centralização das decisões sobre as
políticas portuárias; e o período de 1990 até os dias de hoje, marcado pela
privatização das operações portuárias. O marco legal que permitiu a maior
participação da iniciativa privada na operação e na realização de investimentos em
nossos portos foi a Lei nº 8.630/93, a Lei dos Portos. Esta Lei também marcou o
início de um processo de modernização dos portos brasileiros sendo, por isso,
conhecida também como Lei de Modernização dos Portos.
Por anos a fio, o setor portuário brasileiro não recebeu a atenção proporcional
à sua importância. Essa situação se evidencia pela análise das sucessivas políticas
governamentais que priorizaram outros modais para transporte de cargas, como o
ferroviário e, mais tarde, o rodoviário, em detrimento do modal aquaviário. Vários
planos econômicos e projetos que visavam o setor portuário foram implementados
parcialmente ou simplesmente não saíram do papel.
Dessa forma, a Lei dos Portos pode ser considerada uma reação a um estado
de total abandono em que se encontravam nossos portos, trazendo prejuízos
enormes à nossa economia, se levarmos em consideração que mais de 90% de
nosso comércio externo é feito por via marítima
Com a promulgação da Lei nº 8.630/93, o Governo Federal resolveu dar
prioridade à iniciativa privada na administração de nossos portos, dentro de uma
mentalidade neoliberal que permitiu investimentos privados nesse estratégico setor.
O governo, com isso, reconheceu que não tinha sido um bom administrador.
Excesso de burocracia, falta de recursos para investimentos, sistema tarifário
confuso e falta de controle da alocação de mão de obra, esta ficando nas mãos dos
sindicatos, corroboram essa idéia e ajudam a explicar porque nossos portos eram
alguns dos mais caros do mundo, com baixíssima eficiência.
Após 18 anos de vigência, a Lei de Modernização dos Portos trouxe mais
agilidade, barateou custos, permitiu grandes investimentos (principalmente privados)
e tornou a gestão portuária e da mão de obra mais racionais. No entanto, ainda há
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resistências a serem vencidas e melhoramentos a serem feitos nesse diploma legal.
Além disso, investimentos em infraestrutura, em treinamento e na modernização da
gestão precisam ocorrer.
As ações, planos e projetos da ANTAQ e da SEP/PR apresentados neste
trabalho indicam que o caminho certo está sendo trilhado.
Os investimentos previstos no PAC I e II, se não forem contingenciados,
poderão alavancar de uma vez por todos o setor em direção à modernidade e à
excelência dos serviços, caso acompanhados de medidas gerencias modernas,
eficientes e eficazes.
No entanto, existe a necessidade de serem realizadas ações concretas para
resolver o problema da excessiva interferência e força dos sindicatos, que ainda
decidem sobre a escalação da mão de obra portuária, geralmente em números
elevados, encarecendo, dessa forma, o custo de nossos portos. Para isto, basta que
o previsto na Lei nº 8.630/93 seja cumprido, dando ao OGMO plenos poderes sobre
a escalação da mão de obra. Ainda sobre a mão de obra, é imprescindível que
sejam criados os Centros de Treinamento, previstos também na Lei, e que haja
investimento na multifuncionalidade do trabalhador portuário, o que também sofre
forte oposição por parte dos sindicatos.
Em suma, se o Brasil realmente deseja ter o status de global trader, ou seja,
se o Brasil deseja negociar mercadorias cada vez mais com o mundo todo, é
imprescindível que tenhamos portos cada vez mais ágeis, equipados, baratos e bem
administrados. Para que isso ocorra são necessários pesados e contínuos
investimentos públicos e, principalmente, privados no Sistema Portuário Brasileiro.
Além disso, é necessário que a nossa mão de obra esteja habilitada e
constantemente treinada, o que permitirá sua especialização e a diminuição
numérica das equipes empregadas em cada um dos tipos de operações portuárias,
de acordo com critérios estabelecidos exclusivamente pelos OGMO.
Finalmente, a Lei dos Portos, cumprida integralmente, é o necessário
arcabouço legal que possibilitará mais investimentos e mais racionalidade no
emprego da mão de obra, o que ressalta sua importância e o acerto do legislador em
sua redação.
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SANTANA, Eduardo Almeida. Dificuldades para a implementação