ambiente da inovação brasileira Janeiro/Fevereiro/Março 2010 no 59 • Ano XV Para tirar do papel Universidades produzem milhares de pesquisas com potencial para se transformar em produtos inovadores. Mas as questões relacionadas à propriedade intelectual ainda travam o caminho entre o laboratório e o mercado Negócios Em expansão, o mercado esportivo demanda Pesquisa e Desenvolvimento Investimento Como o cooperativismo de crédito pode alavancar MPEs Índice ambiente da inovação brasileira Janeiro/Fevereiro/Março 2010 • no 59 • Ano XV ISSN 1980-3842 22 A revista Locus é uma publicação da Associação Nacional de Entidades Promotoras de Empreendimentos Inovadores Conselho editorial Josealdo Tonholo (presidente), Carlos Américo Pacheco, Jorge Audy, Mauricio Guedes e Maurício Mendonça. Coordenação editorial Débora Horn Colaboração Adriane Alice Pereira, Bruna de Paula, Bruno Moreschi, Cora Dias, Eduardo Kormives, Fernanda Peres, Francis França e Júlia Phittan. Jornalista responsável Débora Horn – MTb/SC 02714 JP Direção de arte Luiz Acácio de Souza Edição de arte João Henrique Moço Revisão Sérgio Ribeiro Foto da capa Shutterstock Diretoria Francilene Procópio Garcia, Gisa Bassalo, Paulo Gonzalez, Renato Aquino Nunes e Tony Chierighini Superintendência Sheila Oliveira Pires Endereço SCN, quadra 1, bloco C, Ed. Brasília Trade Center, salas 209/211 Brasília / DF – CEP 70711-902 Contatos (61) 3202-1555 E-mail: [email protected] Website: www.anprotec.org.br Anúncios: (61) 3202-1555 [email protected] Produção Apoio Impressão Gráfica Coronário Tiragem 5.000 exemplares O valor do conhecimento O desafio de garantir a propriedade intelectual quando o assunto é transferência de tecnologia para o setor produtivo. Entenda como o Brasil lida com esse processo e quais são as defasagens da área. 6 10 16 29 32 Presidente Guilherme Ary Plonski c a p a 34 38 41 44 48 49 50 E n t re v i s t a O economista Rafael Lucchesi, diretor de operações da Confederação Nacional da Indústria (CNI), fala sobre a agenda da inovação no país e ressalta a importância das parcerias público-privadas. E m Mo v i m e n t o Chamadas de trabalhos para o Seminário da Anprotec, adesão à Frente em Defesa da Ciência e Tecnologia, mudanças no Finep Inova Brasil e parceria com Inglaterra e Moçambique são algumas das novidades no cenário da inovação no Brasil. Ne g ó c i os O Brasil corre contra o relógio para se preparar para a Copa de 2014 e para as Olimpíadas de 2016. E d u c a ç ã o A evasão de cursos superiores pede que um novo modelo de ensino seja pensado. Bacharelados Interdisciplinares têm sido a opção adotada por diversas instituições brasileiras. O p or t u n i d a de Integrar as classes C e D às novas tecnologias é o objetivo do Plano Nacional de Banda Larga. I n t er n a c i o n a l Ano Brasil-Alemanha de Ciência, Tecnologia e Inovação mobiliza organizações dos dois países para fomentar processos de inovação. I n v es t i m e n t o Saiba por que as cooperativas de crédito cresceram durante a crise e de que forma as MPEs podem se beneficiar com o sistema cooperativista. S u c esso Um dos maiores e mais importantes parques tecnológicos brasileiros completa 10 anos. O Porto Digital, vanguarda no cenário de inovação nacional, comemora o sucesso de olho no futuro. Ges t ã o Redes sociais podem ser poderosas aliadas na conquista de novos mercados. Pequenas empresas mostram como é possível aproveitar esse filão. Cr i a t i v i d a de Os segredos do Desafio Sebrae para atrair futuros empreendedores e tornar o jogo virtual cada vez mais instigante. C u lt u r a A biografia de Steve Jobs, as novidades em DVDs, livros, discos e o melhor e o pior do cinema dos últimos tempos são as dicas desta edição. O p i n i ã o Mauricio Guedes: o espírito empreendedor é tão necessário nas instituições públicas quanto nas empresas privadas. carta ao leitor E m entrevista publicada nesta edição, o diretor de operações da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Rafael Lucchesi, defende que o processo de inovação envolve cooperações que vão além do universo empresarial. “Esse processo também envolve universidades, institutos tecnológicos e laboratórios. As sociedades que produzirem a melhor cultura de cooperação entre esses agentes vão ser seguramente mais bem-sucedidas no jogo competitivo”, afirma. E no Brasil, como tem se dado essa interação? Na busca pela resposta, a matéria de capa trata dos mecanismos de transferência de tecnologia e licenciamento de patentes no país. Entre 2005 e 2009, o Brasil ampliou em 77% o número de registros de patentes internacionais. Apesar da melhora do índice nacional, a reportagem mostra que há um longo caminho a percorrer: a Toyota, em meio à sua pior crise, registrou, sozinha, mil patentes em 2009, mais que o dobro do Brasil, que registrou apenas 480. As justificativas para o desempenho brasileiro também são abordadas na matéria: marcos regulatórios recentes, o desenvolvimento incipiente dos Núcleos de Inovação Tecnológica (NITs) nas instituições de pesquisa e as dificuldades burocráticas que travam a transferência de conhecimento. Mesmo assim, encontramos empresas e universidades que conseguiram superar os entraves e agora colhem bons resultados de seus projetos inovadores. Resultado é palavra de ordem para empresas que atuam no setor esportivo, tema da seção Negócios. Com grandes eventos a realizar, como a Copa do Mundo de 2014 e as Olimpíadas de 2016, o Brasil desponta como o maior mercado do mundo em termos de infraestrutura esportiva. Mas, além de pensar em infraestrutura e logística, será necessário, também, muito planejamento e investimento em Ciência e Tecnologia. Nesse sentido, alguns passos importantes estão sendo dados, como a criação de laboratórios especializados em ciência dos esportes, que reunirão diversas instituições de pesquisa do país. A reportagem revela também que grandes oportunidades de negócios devem surgir no desenvolvimento de tecnologias para o esporte, deixando em alerta start ups, incubadoras e parques tecnológicos. Identificar oportunidades faz parte da rotina das empresas que aderiram às redes sociais para divulgar seus negócios. Na seção Gestão, Locus explica as diferentes experiências oferecidas por essas ferramentas, que exigem estudo, análise e preparação das empresas que queiram realmente aproveitar o que as redes têm a oferecer. C onselho E ditorial Locus • Janeiro/Fevereiro/Março 2010 5 6 Divulgação/CNI Entrevista C ora D ias Por um objetivo comum P arceria público-privada e maiores investimentos são pontos-chave para que o Brasil evolua na agenda da inovação. Essa é a opinião de Rafael Lucchesi, diretor de operações da Confederação Nacional da Indústria (CNI). Para o economista, o atraso do Brasil nessa agenda deve-se ao modelo de desenvolvimento adotado até a década de 1990 e à política de inovação ainda muito recente. Agora o país corre para recuperar o prejuízo. Em agosto de 2009, Locus • Janeiro/Fevereiro/Março 2010 durante o 3º Congresso Brasileiro de Inovação na Indústria, a CNI criou a Mobilização Empresarial pela Inovação (MEI), formada por lideranças industriais do país, que assumiu a responsabilidade de investir em estratégias inovadoras. A ideia é sensibilizar empresários e governo sobre a importância da inovação para o desenvolvimento econômico e social do país. Para explicar a proposta e os desafios que a compõem, Lucchesi recebeu Locus na sede da CNI em Brasília. Locus: A MEI tem como meta duplicar o número de empresas inovadoras nos próximos quatro anos. Que fatores são essenciais para que isso aconteça? Lucchesi: Partimos da constatação de que a nossa agenda avançou, desde a criação dos fundos setoriais, no final dos anos 90, e mais recentemente a criação da Lei do Bem e da Lei de Inovação. São avanços, mas modestos. Temos uma agenda a melhorar pelo lado da oferta de instrumentos de políticas públicas. Precisamos de mais segurança jurídica e de uma logística mais empresarial. Políticas menos burocráticas e uma elegibilidade maior para as empresas efetivas. Isso por que muitas das ações (do governo) são dirigidas a um conjunto de atividades que não contempla grande parte das empresas existentes. Por outro lado, temos problemas com relação à demanda empresarial. As empresas brasileiras não tiveram uma cultura construída em cima de uma agenda de inovação, de agregação de valor aos seus produtos. Locus: Nesse contexto, quais os objetivos da MEI? Lucchesi: A MEI vem exatamente no sentido de estabelecer um ambiente de colaboração público e privado, a exemplo das iniciativas nacionais de inovação que ocorreram em outros países. Estamos empenhados em mobilizar o empresariado. Realizamos eventos importantes em torno dessa nova agenda, que aponta na direção de ampliar o gasto empresarial em inovação e o investimento público na mesma dimensão. Se um número significativamente maior de empresas for sensibilizado por essa agenda, certamente essas empresas terão, ao final de seus processos, programas e projetos voltados para inovação de produtos. Locus: O Manifesto lançado pela CNI diz que no Brasil se inova mais que em qualquer outra economia latinoamericana, mas que ainda estamos longe dos índices de inovação e pesquisa de economias desenvolvidas. A que se atribui esse atraso? Lucchesi: A várias razões. Uma delas é o modelo de desenvolvimento, no caso o de substituição de importações, que não colocou como grande desafio a questão da inovação. Depois, o período de hiperinflação administrada, que não criou uma cultura empresarial robusta nessa direção. Os instrumentos de polí- A combinação entre a cultura empresarial que nem sempre reconheceu a inovação como prioridade e as políticas públicas muito recentes coloca essa agenda brasileira de forma relativamente atrasada. tica pública para indução da inovação no Brasil foram criados há pouco mais de 10 anos. A combinação entre a cultura empresarial que nem sempre reconheceu a inovação como prioridade e as políticas públicas muito recentes coloca essa agenda brasileira de forma relativamente atrasada. Ainda assim, pela dimensão econômica, e por termos construído um sistema nacional de inovação, temos uma universidade com capacidade de contribuir, além de uma rede de institutos de pesquisa. Podemos, a partir de um emparelhamento de políticas públicas, avançar nessa direção. Esse é o desafio que se coloca ao Brasil. Somos o país de maior destaque em inovação na América Latina, mas nos encontramos muito atrás dos países de economia industrial avançada e daqueles emergentes que têm sido mais bem-sucedidos. Somados, os instrumentos de políticas públicas brasileiros (de oito a 10 anos atrás) contemplam em torno de 1.500, apenas. No Brasil, 30 mil empresas declaram inovar. Locus: A MEI convocou empresas a liderarem o processo de inovação. Quais as principais dificuldades Locus • Janeiro/Fevereiro/Março 2010 7 Entrevista enfrentadas pela indústria brasileira atualmente para inovar? Lucchesi: Para pequenas e médias empresas, a inovação é algo muito distante, complexo. Muitas já praticam processos ou geram produtos inovadores, mas desconhecem isso. Assim, não inovam com a melhor técnica, não o fazem de forma sistemática, não têm o melhor modelo de gestão para que esse aprendizado seja mais eficiente e permanente na atuação da empresa. É preciso estruturar isso melhor na cultura empresarial: colocar a inovação no centro da estratégia de negócios, porque é isso que acontece com a concorrência em outras partes do mundo, seja nos países de economia industrial avançada, seja nos emergentes. Locus: Em termos de políticas públicas, em que pontos específicos ainda é preciso avançar? Lucchesi: Entre outros fatores, há necessidade de um volume maior de recursos para a subvenção econômica, em uma agenda mais horizontal, com maior elegibilidade para o conjunto das empresas brasileiras. Temos que desburocratizar instrumentos e, sobretudo, dotá-los de É preciso colocar a inovação no centro da estratégia de negócios, porque é isso que acontece com a concorrência em outras partes do mundo, seja nos países de economia industrial avançada, seja nos emergentes. uma lógica mais empresarial, eliminando inseguranças jurídicas. À medida em que as empresas passam a ter uma agenda de inovação mais abrangente, o foco de apoio deve ser o plano de negócios e não um projeto específico. A agenda atual é muito ligada à academia, projeto a projeto. As empresas precisam ter um planejamento estratégico para inovar. Seria muito mais econômico para o país estabelecer contratos de longo prazo 8 Locus • Janeiro/Fevereiro/Março 2010 com esses empreendimentos, do que manter uma relação em que as empresas terão um enorme custo de transação e incertezas de participar de cinco, seis, sete ou oito chamadas pulverizadas para eleger projetos. Junto à subvenção, precisamos fortalecer a agenda de serviços técnicos, com uma articulação sólida com Senai e Sebrae. Por fim, algo que já é um grande consenso: a necessidade de não haver contingenciamento. O dispêndio em C,T&I é um investimento que se faz para construir a estrada do futuro. E esse dispêndio tem que ser plenamente exercido. Os recursos hoje disponíveis são insuficientes e têm elevado retorno para geração de emprego, renda, competitividade empresarial e, sobretudo, arrecadação pública. Se identificarmos que estamos assegurando uma economia com maior capacidade de resposta ao alocar esses recursos para C,T&I, em hipótese nenhuma eles podem ser contingenciados. Locus: O processo de inovação pode ser compartilhado/dividido entre MPEs e grandes empresas? Que tipo de parcerias podem ser construídas nesse sentido? Lucchesi: Sim. O esforço tecnológico dentro de cadeias produtivas já acontece há muitos anos. A distribuição do progresso técnico na estrutura automotiva de produção enxuta é um dado da realidade. A combinação que existe entre empresas de biotecnologia com as grandes produtoras de fármacos é outro exemplo disso. A estruturação dessas ações em torno de habitats de inovação, que são os parques tecnológicos, é outro exemplo de que a combinação de esforços dentro da cadeia, de clusters e de arranjos produtivos cria redes cooperativas em torno do desenvolvimento técnico não só de empresas. A natureza do processo de inovação envolve lógicas de cooperação para além do universo empresarial, para além da heterogeneidade de portes de empresa, seja grande, média ou pequena. Esse processo também envolve universidades, institutos tecnológicos e laboratórios. As sociedades que produzirem a melhor cultura de cooperação entre esses agentes, bem como instrumentos de políticas públicas que favoreçam mais a cooperação entre eles e também uma maior mobilização da sociedade em torno da agenda de inovação, vão ser seguramente mais bem-sucedidos no jogo competitivo. Locus: Como incubadoras de empresas e parques tecnológicos atuam no fomento à inovação no país? Lucchesi: Hoje, no Brasil, há um esforço enorme de uma rede, de um coletivo que se reúne em torno da Anprotec. Os instrumentos de política pública para incubadoras de empresas e parques tecnológicos melhoraram muito, mas ainda são tímidos. Temos enormes deficiências do ponto de vista dos instrumentos de gestão das instituições públicas. Temos problemas de cultura e enormes assimetrias entre universidades de estados mais desenvolvidos e menos desenvolvidos. Existem aqueles que estão capturados por essa agenda e outros que ainda estão muito distantes. É necessário fortalecer a cultura do empreendedorismo nas universidades brasileiras, a cultura da inovação e os instrumentos de políticas públicas no âmbito federal, estadual e municipal de apoio ao empreendedorismo, dos habitats de inovação e das start ups. Ainda falta uma agenda robusta no Brasil nessa direção. Ela ainda precisa de impulso, seja nos instrumentos colocados à disposição, seja nos instrumentos de gestão e nos aspectos institucionais que os gestores de incubadoras têm que ter à frente dessas instituições. Prevalece muito no Brasil uma cultura baseada na lei da usura. Temos uma cultura pública antiempresarial. Evidentemente isso cria um enorme custo para toda a sociedade, na medida em que você esteriliza insti- tuições que poderiam prestar um enorme serviço ao desenvolvimento de toda a sociedade, assegurando maior taxa de geração de riqueza, na medida em que essas instituições têm o papel proeminente de fazer isso e já o fazem nas sociedades mais desenvolvidas. Se identificarmos que estamos assegurando uma economia com maior capacidade de resposta ao alocar recursos para C,T&I, em hipótese nenhuma eles podem ser contingenciados. Locus: Como disseminar a cultura da inovação entre as empresas brasileiras? Lucchesi: O que nós estamos fazendo com a MEI é algo semelhante ao que fizemos com o Programa Brasileiro de Qualidade e Produtividade, também uma parceria muito bem-sucedida entre o setor público e o setor privado. Fizemos isso com ações de sensibilização, modelos de gestão, com documentação de cases e com depoimentos de empresários bem-sucedidos nos seus setores de atuação com iniciativas voltadas para qualidade e produtividade. Além disso, ações como prêmios, que difundem a excelência e premiam as melhores práticas, criam também todo um aspecto cultural de rápida disseminação. Outra ação é a sistematização de informações, criando uma plataforma de difusão do conhecimento que vai ser incorporado pelos executivos. É claro que o jogo da inovação é mais complexo, envolve um volume de recursos maior. O modelo de inovação não é interno à empresa e sim externo a ela. Hoje o modelo é de inovação aberta, que pressupõe estabelecer redes com organizações diferentes, com outra lógica e outra cultura. A inovação tem muito maior risco. Mas, ainda assim, as ferramentas que utilizamos na difusão de gestão da qualidade são extremamente úteis para esse novo propósito. Locus • Janeiro/Fevereiro/Março 2010 9 E M M O V I M E N TO Anprotec adere à Frente em Defesa da Ciência e Tecnologia Divulgação A Anprotec aderiu à Frente Plurissetorial em Defesa da Ciência e Tecnologia durante o evento de criação do movimento, dia 24 de março. O grupo é formado por parlamentares, representantes do governo, de empresas e de entidades ligadas ao setor. Representando a Anprotec estavam o presidente da associação, Guilherme Ary Plonski; a superintendente, Sheila Oliveira Pires, e o conselheiro e ex-presidente Luís Afonso Bermúdez. “A intenção é envolver diversos setores da sociedade para facilitar o processo de articulação de ações e ampliar também a capacidade de inovação no país”, explicou o deputado Júlio Semeghini (PSDB-SP), coordenador da frente. Para o ministro da Ciência e Tecnologia, Sergio Rezende, o movimento é uma importante alavanca para o progresso da nação. “O Brasil acaba de dar um passo importante para que ciência, tecnologia e inovação possam contribuir de forma mais efetiva para o desenvolvimento nacional”. Apesar do avanço nos marcos regulatórios dos últimos anos, o presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI), deputado Armando Monteiro Neto (PTB-PE), acredita que ainda há pontos a serem trabalhados, principalmente em relação ao financiamento, pesquisa e incentivos fiscais às empresas. “A frente terá papel fundamental na sensibilização de setores do governo e da sociedade, na criação de ambiente para a ampliação dos recursos para políticas públicas de inovação e na promoção de ações que visem ao aperfeiçoamento das leis de incentivo”, observou. 10 A Anprotec abre chamada para apresentação de trabalhos no XX Seminário Nacional de Parques Tecnológicos e Incubadoras de Empresas. O evento será realizado em Campo Grande (MS), de 20 a 24 de setembro. Neste ano, o tema do Seminário é “Desbravando Campos Inovadores, Desenvolvendo Empreendimentos Sustentáveis”. Serão apresentados trabalhos em duas categorias: artigos curtos, apresentados sob forma de pôsteres, e artigos completos. Ao todo, serão selecionados até 60 artigos curtos e 60 completos. O melhor trabalho de cada categoria receberá certificado e prêmio no valor de R$ 1,5 mil e R$ 2 mil, respectivamente. Os trabalhos completos que forem bem avaliados pelo Comitê Científico podem ser recomendados para publicação na íntegra na revista Locus Científico. A revista está indexada pela Capes por meio no Sistema Qualis, o que significa que apresenta alto impacto para estudantes e docentes de cursos de pós-graduação. As inscrições dos trabalhos podem ser feitas até 5 de julho. Mais informações no site www.anprotec.org.br. Locus • Janeiro/Fevereiro/Março 2010 Florianópolis lança marca “Capital da Inovação” Florianópolis (SC) passou a se posicionar oficialmente como “Capital da Inovação”, em iniciativa que envolve diversas entidades empresariais, governamentais e instituições de ensino e pesquisa. A capital catarinense possui quatro incubadoras, dois parques tecnológicos e mais de 500 empresas de base tecnológica, que faturaram em 2009 cerca de R$ 1,2 bilhão e empregaram cerca de 5 mil pessoas. Ainda conta com quatro fundos de capital de risco e semente, 10 centros e institutos de pesquisa e desenvolvimento e 15 centros universitários. Divulgação Divulgação Chamada de Trabalhos A Eletrobrás e a Universidade Federal do Pará (UFPA) inauguram em abril o Centro de Excelência em Eficiência Energética da Amazônia (Ceamazon), em Belém (PA). O projeto demandou investimentos da ordem de R$ 103 milhões. O objetivo é estimular pesquisas na área de eficiência energética e capacitar profissionais na área de conservação de energia. A iniciativa pretende levar desenvolvimento tecnológico e econômico à região Norte. A inauguração é parte integrante das SHUTTERSTOCK Eletrobrás e UFPA abrem centro de pesquisa em eficiência energética ações do Procel Educação, fomentado pelo Programa Nacional de Conservação de Energia Elétrica (Procel). O Ceamazon integra o Parque de Ciência e Tecnologia Guamá, da UFPA, também a ser inaugurado em abril. É a segunda vez que a Eletrobrás/Procel aposta em um centro nacional de pesquisa em eficiência energética. O primeiro foi o Centro de Excelência em Eficiência Energética (Excen), que fica na Universidade Federal de Itajubá (Unifei), em Minas Gerais, e foi inaugurado em 2006. Bolsas para estudantes de países em desenvolvimento O Programa Finep Inova Brasil oferecerá este ano financiamentos reembolsáveis com taxas de juros diferenciadas no total de R$ 1,6 bilhão para o desenvolvimento de projetos de inovação. Além do crédito, o Programa também conta com a possibilidade de concessão de recursos não reembolsáveis no valor de até 10% das operações aprovadas. O valor seria destinado à contratação de projetos de pesquisa e desenvolvimento coordenados pelas empresas e executados por instituições científicas e tecnológicas (ICTs). De acordo com o chefe do Departamento de Indústria da Finep, Ricardo Jabace, a novidade faz parte de uma série de mudanças aprovadas pela diretoria da Finep. Além do chamado voucher de P&D, foi criada também a Subvenção-RH, que possibilita a concessão simultânea do benefício de subvenção à contratação de novos mestres e doutores pelas empresas. A Finep responderia por até 100% do valor assinado em carteira dos salários dos pesquisadores que executariam as propostas financiadas, até o limite de 10% do valor do crédito. Além disso, foi aprovada a criação da sexta linha de crédito do programa – Inovação em Gestão –, que representa o conjunto de ações de estruturação de ambientes internos de estímulo à inovação, com taxa fixa anual de 6,5%. Agora o valor concedido para as seis linhas vai variar entre R$ 1 milhão e R$ 80 milhões. Foram desembolsados cerca de R$ 900 milhões em operações de crédito no ano passado. Para 2010, o Programa Finep Inova Brasil deve desembolsar mais de R$ 1 bilhão. O Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq/MCT) recebe inscrições até 13 de agosto para bolsas de Doutorado, Doutorado Sanduíche (parte no Brasil e no exterior) e Pós-Doutorado em instituições brasileiras de ensino e pesquisa, avaliadas com conceito 5, 6 ou 7 pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes/ MEC). Estudantes e pesquisadores estrangeiros de países em desenvolvimento são o público-alvo. O CNPq trabalha em cooperação com a Academia de Ciências para o Mundo em Desenvolvimento (TWAS). O objetivo da parceria é apoiar o intercâmbio de experiências entre estudantes e pesquisadores de países em desenvolvimento, para retornarem como multiplicadores do conhecimento adquirido. Mais informações no site endereço http:// www.cnpq.br. Para saber mais sobre programas do TWAS direcionados a brasileiros, consulte www.twas.org. Arquivo/MCT Novidades no Programa Finep Inova Brasil Locus • Janeiro/Fevereiro/Março 2010 11 E M M O V I M E N TO A Finep divulgou o primeiro relatório do primeiro edital de Subvenção Econômica à Inovação, lançado há quatro anos. Para o estudo, a financiadora convidou oito microempresas, 12 pequenas e quatro de porte médio para receber integralmente os recursos, até setembro de 2009, e desenvolver 27 projetos. Do total, 22 foram contratados no edital de 2006 e cinco no de 2007. De acordo com dados levantados junto aos empresários, os empreendimentos registraram um crescimento de 65,94% no faturamento médio. Dos 27 projetos, 11 são de software, cinco envolvem desenvolvimentos relativos à TV digital, cinco são da área de defesa, dois referem-se a implementos agrícolas e quatro tratam de desenvolvimentos nas áreas de nanotecnologia, esportes, construção civil e máquinas e equipamentos industriais. Havia 47 produtos, processos ou serviços em desenvolvimento. Quinze destes já estão sendo comercializados, 22 aguardam o momento de venda e 10 são protótipos. Vale lembrar que os recursos da subvenção são para desenvolvimento e não para comercialização inicial, gastos com marketing ou itens equivalentes. 12 Prêmio Mercosul focará nanotecnologia Brasil e Inglaterra já têm um acordo básico de cooperação científica e tecnológica há mais de uma década. Ainda assim, a Inglaterra está interessada em ampliar e fortalecer ações nessas áreas. Quem manifestou o interesse foi o embaixador britânico no Brasil, Alan Charlton, em encontro com o ministro da Ciência e Tecnologia, Sergio Rezende. O conselheiro da embaixada britânica para assuntos de C&T, Damian Popolo, presente ao encontro, disse que desde 2006, quando a cooperação bilateral em ciência e tecnologia foi fortalecida, o Reino Unido já investiu o equivalente a R$ 1 milhão em estudos conjuntos. Popolo também fez referência à parceria na área espacial, destacando a instalação de uma câmera de alta resolução no satélite Amazônia 1, com lançamento previsto para 2011. O Prêmio Mercosul de Ciência e Tecnologia tem como objetivo reconhecer e premiar os melhores trabalhos que auxiliam o desenvolvimento científico e tecnológico dos países que fazem parte do Mercosul. A edição deste ano tem como tema a nanotecnologia. Interessados podem se inscrever nas categorias Iniciação Científica, Estudante Universitário, Jovem Cientista e Integração. Os trabalhos devem ser enviados até 23 de agosto. A avaliação levará em conta a atualidade do tema, inovação e criatividade, metodologia, pertinência e aplicabilidade dos trabalhos no âmbito do Mercosul. A entrega do prêmio será em novembro. Mais informações: (61) 3317 7811 [email protected] http://eventos.unesco.org.br/premiomercosul Locus • Janeiro/Fevereiro/Março 2010 Divulgação Brasil e Inglaterra devem ampliar cooperação científica SHUTTERSTOCK FINEP divulga resultado da primeira avaliação da Subvenção Econômica A Anprotec integra a Comissão Organizadora da 4ª Conferência Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação (CNCTI), que acontece de 26 a 28 de maio, em Brasília. O encontro é resultado das cinco conferências regionais (Centro-Oeste, Norte, Nordeste, Sul e Sudeste) coordenadas pelo Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT) e o Centro de Gestão e Estudos Estratégicos (CGEE) em abril. Durante a CNCTI serão analisados os resultados do Plano de Ação 2007-2010 e formuladas sugestões para um plano de Política de Estado de Ciência, Tecnologia e Inovação, com foco na sustentabilidade. Quatro empresas brasileiras e outras quatro francesas vão desenvolver em conjunto projetos inovadores nas áreas de nanotecnologia, saúde, aeronáutica e meio ambiente. Essa é a primeira rodada da chamada binacional do Programa OSEO/Finep. As duas instituições celebraram acordo de cooperação tecnológica em 2009, para financiar pesquisas a serem desenvolvidas por pequenas e médias empresas dos dois países. Estão sendo disponibilizados R$ 7 milhões para as pesquisas. As regras são as mesmas do Programa Inova Brasil, da Finep, que opera empréstimos com juros subsidiados a partir de R$ 1 milhão. As empresas apresentaram as propostas às duas agências através de formulário eletrônico. Os projetos que não se enquadraram às regras do programa de cooperação estão sendo redirecionados para análise por outras linhas convencionais de apoio. Até setembro está prevista uma segunda rodada do programa. SHUTTERSTOCK Brasil faz chamada binacional em inovação junto à França Divulgação Anprotec na organização da 4ª CNCTI O investimento em pesquisa e desenvolvimento no agronegócio pode ser um dos caminhos para que o Brasil cresça e preserve os recursos naturais. “Nos últimos anos, o agronegócio tem sido o principal alicerce da economia brasileira. Discutir o desenvolvimento sustentável é pensar em ciência e tecnologia voltadas para o agronegócio”, declarou o diretor-executivo da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), José Geraldo Eugênio de França, durante o seminário preparatório para a 4ª Conferência Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação (CNCTI). De acordo com França, em março o país se tornou o terceiro maior exportador do mundo de alimentos. Além de impulsionar a economia nacional o agronegócio aquece o mercado interno. Dados de institutos de pesquisa e do Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT) mostram que o consumo interno, em especial das classes baixas, foi fundamental para o Brasil superar a crise financeira internacional. As discussões do seminário preparatório serão levadas para a 4ª CNCTI, que ocorre em maio, em Brasília. SHUTTERSTOCK Ciência e tecnologia caminham juntas com a agropecuária, diz diretor da Embrapa Locus • Janeiro/Fevereiro/Março 2010 13 E M M O V I M E N TO A Embrapa e a Agência Brasileira de Cooperação (ABC) assinaram com o vice-ministro de Agricultura de Moçambique, Antônio Limbau, termo para execução de projeto que dará suporte técnico à plataforma de inovação agropecuária do país africano. A ABC investirá pelo menos US$ 4,2 milhões, enquanto a Embrapa responderá por US$ 7,9 milhões, por um período de quatro anos. O objetivo do projeto é o fortalecimento do Instituto de Investigação Agrária de Moçambique (IIAM). A Embrapa tem a responsabilidade de executar as atividades nas áreas de planejamento estratégico, gestão territorial, sistemas de sementes e comunicação e informação para transferência de tecnologia. A Agência Americana de Cooperação (USAID) também aplicará US$ 8,4 milhões no financiamento de cinco centros internacionais privados de pesquisa agropecuária que atuam em Moçambique. Os recursos serão utilizados para manter uma unidade de gestão do programa de inovação agropecuária de Moçambique, a UGP – formada por representantes do IIAM, da Embrapa e dos organismos internacionais financiados pela USAID. SHUTTERSTOCK A Sociedade Brasileira de Física (SBF) divulgou documento com as perspectivas da comunidade científica sobre os principais desafios da ciência brasileira. O documento inclui recomendações dos físicos para o fortalecimento das políticas de C,T&I nos próximos cinco anos. O fortalecimento da infraestrutura estatal de pesquisa é a principal recomendação da SBF. O documento destaca a necessidade da ampliação do número de instituições com missões científicas e tecnológicas bem definidas, além de quadros de pesquisa compatíveis com as atividades desenvolvidas. 14 Locus • Janeiro/Fevereiro/Março 2010 MCT instala campus tecnológico em Recife para descentralizar ações Um campus tecnológico do Ministério da Ciência e Tecnologia está sendo instalado em Recife (PE), com investimentos de cerca de R$ 70 milhões. O objetivo é a descentralização das ações do órgão. “Isso faz parte de uma política de desenvolver e consolidar unidades descentralizadas e potencializar as ações do MCT nas regiões”, informou o representante do MCT no Nordeste, Ivon Fittipaldi. O campus está sendo construído em uma área cedida pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), onde serão instaladas unidades de pesquisa e desenvolvimento (P&D). O campus tecnológico pretende desenvolver laboratórios multiusuários, nos quais é possível ter acesso ao experimento em microscopia eletrônica online. Eles estarão disponíveis para a comunidade científica e tecnológica da região Nordeste e de todo o país. SHUTTERSTOCK Físicos recomendam fortalecimento da infraestrutura de pesquisa nos próximos cinco anos SHUTTERSTOCK Brasil e Moçambique iniciam projeto de inovação agropecuária Curitiba (PR) irá sediar a X Conferência Anpei de Inovação Tecnológica, de 26 a 28 de abril. O evento da Associação Nacional de Pesquisa e Desenvolvimento das Empresas Inovadoras (Anpei) vai ser realizado em parceria com a Federação das Indústrias do Estado do Paraná, por meio do centro de inovação, educação, tecnologia e empreendedorismo do Paraná – Cietep. Como tema, a X Conferência Anpei refletirá sobre a evolução e a interligação dos conceitos de cooperação, inovação e sustentabilidade. Com o mote “Cooperação para a Inovação Sustentável”, o evento dá continuidade ao tema da edição do ano passado do evento, cujas discussões abordaram “a inovação sustentando sua empresa e seu planeta”. Realizada anualmente desde 2001, a Conferência Anpei é um dos principais fóruns temáticos e de debates sobre inovação tecnológica no Brasil. Estarão presentes representantes de todos os segmentos que compõem o sistema nacional de inovação: empresas, instituições de ciência e tecnologia, agências de fomento e órgãos públicos. A programação contará com palestras, painéis de discussão e apresentação de cases de empresas inovadoras. High-Tech Sem riscos A Coopnatural, de Campina Grande (PB), apresenta ao mercado o Gasolimp. O equipamento de proteção individual é voltado para frentistas. Produzido a partir de resíduos de fio de algodão agroecológico, o produto inovador evita que os frentistas entrem em contato direto com a gasolina, poupando-os dos malefícios que ela pode provocar. Diferente da flanela, o Gasolimp absorve todo o combustível que eventualmente vaza das mangueiras, que pode manchar os veículos e provocar acidentes. Além dos resíduos do algodão agroecológico, o produto também é composto por uma espuma biodegradável que absorve a gasolina. FOTOS: Divulgação Anpei promove conferência para discutir inovação e sustentabilidade Ecologicamente correto Aquecer água sem produzir fumaça e economizar até 90% de energia é a promessa do novo produto da Hidrotécnica, de Londrina (PR). O aquecedor a biomassa queima sem emitir fumaça graças a uma tecnologia exclusiva em que a própria fumaça também é incinerada na fornalha. O produto pode ser utilizado na área urbana e atinge a temperatura ideal em poucas horas de funcionamento por dia. Saiba mais em http://www.hidrotecnica.com.br Funcionalidade A Multilaser, fornecedora nacional de suprimentos de informática, acaba de lançar um novo modelo de teclado sem fio, que também possui smart pad. O teclado wireless de 2.4 GHz tem alcance de até 10 metros. O smart pad pode funcionar como um touch pad comum, parecido com o de um notebook, como um teclado numérico ou com a função smart, na qual interpreta até 12 movimentos diferentes dos dedos para facilitar a navegação e o uso de imagens. Locus • Janeiro/Fevereiro/Março 2010 15 e g ó c i o s SHUTTERSTOCK N Tecnologia que vale ouro O Brasil terá nos próximos anos uma oportunidade única de desenvolvimento na área esportiva. Para aproveitá-la, além de infraestrutura, é preciso investir em P&D E duardo K ormives 16 S em a ajuda da tecnologia, dificilmente o lema olímpico Citius, altius, fortius (mais rápido, mais alto, mais forte, em latim) seria tão imperativo nas competições esportivas. Graças à ciência surgiram os equipamentos e métodos de treino que forjaram os atletas de alto rendimento, para quem a diferença entre a vitória ou a derrota pode ficar na casa dos centésimos de segundo – os cronômetros com tal precisão foram introduzidos nos Jogos de Helsinque, em 1952. O Brasil terá nos próximos anos uma oportunidade única de desenvolvimento na área esportiva. A bem-sucedida organização dos Jogos Pan-americanos do Rio, em 2007, e a solidez econômica demons- Locus • Janeiro/Fevereiro/Março 2010 trada durante a crise global foram fundamentais no credenciamento do país a potência mundial. A agenda de eventos inclui Jogos Mundias Militares de 2011, no Rio; Copa das Confederações, em 2013; Copa do Mundo, em 2014, e os Jogos Olímpicos e Paraolímpicos de 2016. Além de pensar em infraestrutura e logística, será necessário, também, muito planejamento e investimento em ciência e tecnologia. Talvez o exemplo mais contundente do impacto desse tipo de investimento venha das piscinas. Em 2000, nas Olimpíadas de Sydney, depois de quatro anos de pesquisa, a Speedo lançou o maiô Fast Skin. O desenvolvimento envolveu até biólogos, na tentativa de reproduzir os efeitos hi- Investimento de peso A despeito da polêmica criada em torno dos maiôs e das restrições impostas pela Federação Internacional de Natação (FINA) neste ano, a lição que fica dessa história é que o Brasil terá que investir pesado não apenas na formação de atletas, mas na tecnologia capaz de lhes garantir um alto rendimento. Em Pequim, o país acabou no modesto 23 o lugar no quadro de medalhas (três de ouro, quatro de prata e oito de bronze), atrás de países como Quênia, Jamaica, Polônia e Romênia. “Muitas vezes não chegamos ao ápice da preparação em função de não ter a ciência”, reconhece Marcus Vinícius Freire, superintendente executivo de Esportes do Comitê Olímpico Brasileiro (COB). A autocrítica foi feita durante o Congresso de Ciência do Desporto, na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), em dezembro do ano passado. Se o Brasil vai agarrar a oportunidade alavancada pelo esporte ainda é difícil de prever, mas a largada foi promissora. O planejamento para os Jogos do Rio começou no ano passado, o que dá uma margem de sete anos. Até então, explica Freire, ex-jogador da seleção brasileira de vôlei e chefe de missões brasileiras em Pan-americanos e Olimpíadas, esse prazo para preparação nunca havia superado os 12 meses. O dinheiro, aparentemente, também não será empecilho. Segundo a Secretaria de Alto Rendimento do Ministério do Esporte, o orçamento cresceu mais de três vezes desde a criação da pasta, em 2003, chegando a R$ 1,4 bilhão em investimentos nos últimos sete anos. Outra fonte importante de verba foi a Lei Agnelo-Piva, que prevê a destinação de 2% dos prêmios das loterias federais aos esportes olímpico, paraolímpico, escolar e universitário. Entre os anos de 2003 e 2008, o governo federal repassou ao COB R$ 433 milhões para a preparação de atletas e equipes nacionais. “Nunca os atletas brasileiros tiveram tantos recursos e condições para se preparar”, afirma o secretário de Alto Rendimento do Ministério do Esporte, Ricardo Leyser. O maior déficit em relação às potências esportivas, no momento, é a falta de locais adequados para formar e preparar atletas de alto desempenho: centros de treinamento, laboratórios e institutos de pesquisa. O Brasil não conta com um único centro. A Austrália possui nove. A China, 35. SHUTTERSTOCK drodinâmicos da pele do tubarão, animal que nada a até 65 quilômetros por hora. A “shark skin”, um tecido de lycra/poliéster, moldava-se ao corpo como uma segunda pele, levando em consideração a forma peculiar de cada grupo muscular e os movimentos exigidos durante o nado. Das 153 medalhas disputadas na natação em Sydney, 126 foram conquistadas por atletas usando Fast Skin. O mesmo vale para 13 dos 15 recordes mundiais quebrados durante a competição. Em 2008, a Speedo foi ainda mais longe. Lançou um novo modelo de maiô, o LZR Racer, criado a partir de tecnologias da era espacial. Foi vestindo um traje desses que o norte-americano Michael Phelps faturou oito medalhas olímpicas em Pequim e outros nadadores quebraram mais de 100 recordes mundiais apenas em 2009. Locus • Janeiro/Fevereiro/Março 2010 17 N e g ó c i o s A novidade é que o COB pretende implantar dois projetos de ponta: o Laboratório Olímpico e o Centro Olímpico de Desenvolvimentos de Talentos (CODT), no Parque Aquático Maria Lenk, no Rio. “Esse projeto já faz parte do esforço de preparação de atletas brasileiros para os Jogos de Londres, em 2012, e do Rio, em 2016”, observa Leyser. O laboratório, planejado para ser a maior referência em ciências do esporte da América Latina, será criado com R$ 13 milhões financiados pela Financiadora de Estudos e Projetos do Ministério da Ciência e Tecnologia, a Finep. O projeto é uma parceria com a Rede Cenesp, que reúne centros nacionais de excelência esportiva e seis universidades: Unicamp, USP e Unifesp, de São Paulo; UFMG, de Minas; UFPR, do Paraná, e a UFRJ, do Rio. Uma área já construída de 1.720 m 2 abrigará pesquisas nas áreas de bioquímica, biomecânica, fisiologia do exercício, fisioterapia esportiva, gestão aplicada ao treinamento, medicina esportiva, nutrição, psicologia esportiva, tecnologia da informação aplicada ao treinamento e treinamento desportivo. O CODT custará R$ 11,4 milhões, a serem captados via Lei de Incentivos Fiscais. O objetivo é atender atletas entre 12 e 17 anos, em 11 modalidades. A meta é beneficiar em torno de 1,5 mil jovens até o fim do primeiro ano de funcionamento. “Pela primeira vez no Brasil teremos a área científica pensando exclusivamente no e para o esporte”, animase Marcus Vinícius Freire, do COB. Bons negócios Segundo o Ministério do Esporte, a Copa de 2014 deve atrair 600 mil turistas estrangeiros. Para recebê-los, será preciso aplicar US$ 5 bilhões em obras de infraestrutura. O torneio deverá transformar o país no mercado esportivo mais importante do mundo, na opinião do presidente e executivo-chefe do Bonham Group, Dean Bonham, uma das principais consultorias 18 Locus • Janeiro/Fevereiro/Março 2010 globais do setor. “O Brasil já apresentava um grande potencial refreado, independentemente da Copa. Ele já pode ser visto como o maior mercado do planeta, em termos de demanda por estrutura esportiva”, diz Bonham. Outras grandes oportunidades estão no desenvolvimento de tecnologias para o esporte, que deve girar R$ 39 bilhões em 2010. “Surgirão enormes oportunidades para start ups. É muito importante que os gestores de parques tecnológicos e incubadoras as identifiquem e tragam para as empresas”, avalia José Eduardo Fiates, presidente da divisão latino-americana da Associação Internacional de Parques Tecnológicos (IASP). Talvez o Brasil não tenha como competir com a impecável organização alemã da Copa de 2006. Nem com o investimento chinês em Pequim-2008 ou a sofisticação prometida pelos ingleses para os Jogos de Londres, em 2012. Mas já existe um time nacional, batizado de Seleção 14-Bis, pensando em como “surpreender, encantar e emocionar” o mundo na Copa verde-amarela. Estima-se que 3,3 bilhões de pessoas assistirão a pelo menos uma partida do torneio em 2014. Capitaneado pela Finep e coordenado por Fundação Certi e a PUC/RJ, o projeto terá sede no Centro de Inovação do Sapiens Parque, em Florianópolis. “Queremos mostrar o que temos de especial, que são as pessoas e a natureza, usando a tecnologia como um instrumento”, afirma José Eduardo Fiates, que é também diretor executivo do Sapiens Parque. A Finep fez um investimento inicial de R$ 3,2 milhões no 14-Bis. Apesar do estágio embrionário, um pequeno aperitivo do que vem por aí será exibido na África do Sul durante a Copa, em um espaço chamado Casa Brasil. Entre os projetos que serão levados a Joanesburgo estão games do C.E.S.A.R., de Pernambuco, e simuladores de jogos de botão, da Fundação Certi, que apresentarão de uma maneira divertida o futebol brasileiro. DIVULGAÇÃO O Velaqua vai ajudar nadadores a acompanhar as performances e melhorar o desempenho Das piscinas às quadras A natação brasileira foi uma agradável surpresa nos Jogos de Pequim, em 2008. Conquistou o primeiro ouro olímpico e, de quebra, foi o esporte que mais rendeu medalhas ao país. Para garantir que a evolução continue em Londres-2012, técnicos e nadadores poderão contar com a ajuda do Velaqua. Criado pela empresa paulista IT&D, o carro-robô mede a velocidade do atleta em tempo real e filma debaixo d’água. Instalado sobre trilhos na borda da piscina, ele se desloca a até cinco metros por segundo. Um sistema de mira militar de tecnologia nacional, o Zaifo Target System, permite ao robô detectar o centro do corpo do atleta para acompanhá-lo e coletar dados. Inventor do Velaqua e sócio da IT&D, Humberto Ribeiro de Souza conta que a ideia amadureceu a partir de um projeto na faculdade de Ciência da Computação, em 2002. Dois anos depois nascia o empreendimento na Incubadora de Empresas de Santos (SP), onde a IT&D se graduou em 2007. Uma grande inovação do sistema é o software que recebe as imagens registradas pela câmera e as transforma em gráficos. Assim, técnicos e biomecânicos podem fazer uma análise quantitativa do desempenho dos nadadores e corrigir posturas. O Velaqua, que começa a ser vendido neste ano, tem sido testado por jovens apostas da natação brasileira. Inspirada nos simuladores para pilotos de caça e de forças de defesa produzidos pela matriz francesa, a subsidiária brasileira da Thales Information Systems (Thales-IS), baseada em São Paulo, decidiu aplicar esta tecnologia num campo ainda inexplorado. Em 2007, ela obteve R$ 2,08 milhões em subvenção da Finep, com contrapartida de R$ 700 mil, para um projeto de desenvolvimento de um ambiente virLocus • Janeiro/Fevereiro/Março 2010 19 e g ó c i o s SHUTTERSTOCK N ótimo grau de realismo. Ou seja, um atleta que queira estudar detalhes do adversário pode tirar vantagem do produto, que deve ser comercializado no Brasil e na Europa. Sobre duas rodas tual para treinamento de tênis. Sem similar no mercado, o produto deve ser lançado este ano. Segundo o diretor geral da companhia no Brasil, Marcos Sakamoto, algumas situações específicas de uma partida de tênis, como o peso dado na bola ou pequenas variações na raquete, que fazem uma enorme diferença para tenistas de alto rendimento, são complicadas de serem reproduzidas no ambiente virtual. Por outro lado, o simulador permitirá avaliar as influências que altitude, tipo de quadra, clima e outros fatores exercem durante as partidas de tênis. Além disso, é possível fazer a modelagem (transposição da realidade para o mundo virtual) de estilos variados de jogo com um A ProShock aposta no desenvolvimento de tecnologia para suspensões de bicicletas para o mountain bike 20 Locus • Janeiro/Fevereiro/Março 2010 DIVULGAÇÃO SHUTTERSTOCK Simulador desenvolvido pela Thales-IS permite avaliar estilos de jogo de tênis com realismo O mountain bike faz parte das Olimpíadas desde Atlanta-1996. A ProShock System nasceu três anos antes, em São José dos Campos (SP), apostando num mercado ainda incipiente de suspensões para bicicletas com tecnologia de ponta. Em 2008, a empresa tornou-se a primeira no Brasil a desenvolver e lançar no mercado suspensões com sistema dual air. Antes disso, ciclistas tinham que importar equipamentos similares, fabricados na Itália ou em Taiwan, a um custo muito maior. “Essas suspensões permitem ao atleta uma vasta gama de regulagens aliada ao baixíssimo peso. Isso garante sempre um excelente comportamento de amortecimento independentemente do terreno, do peso do ciclista ou do estilo de pilotagem”, explica César Salvarani Tonoli, engenheiro responsável por novos projetos da ProShock. O modelo inovador é composto por uma suspensão hidráulica (ar e óleo) e outra a ar. O ciclista pode deixar a suspensão mais macia ou mais dura de acordo com a sua preferência. O projeto rece- No laboratório “Os atletas trabalham muito do pescoço para baixo, mas é preciso trabalhar do pescoço para cima também”. A frase de efeito é do psicólogo Emílio Takase, que coordenou uma pesquisa do Laboratório de Neurociências do Esporte da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), em Florianópolis. O estudo relacionou treinos cognitivos (mentais) a índices fisiológicos para melhorar os resultados dos corredores analisados. O projeto foi um dos 13 selecionados pelo edital lançado pela Finep em 2006. Com os R$ 300 mil recebidos, os pesquisadores acompanharam, entre outubro de 2007 e março de 2009, 34 atletas, com idades entre 15 e 27 anos, de 10 cidades catarinenses. Divididos entre velocistas e meio-fundistas, cada grupo foi submetido a quatro dias de testes. Além de indicadores de potência muscular, consumo de oxigênio e capacidade de se recuperar da fadiga, o monitoramento incluiu capacidade de atenção, memória e reação. “Utilizamos os jogos para ensinar (o atleta) a realizar uma leitura dos próprios aspectos cognitivos e emocionais enquanto joga. À medida que vai aprendendo, vamos criando situações mais complexas para o atleta aprender a conseguir um autocontrole emocional e cognitivo”, diz o psicólogo. O programa de treinamento mental foi individualizado para cada atleta e englobou capacidade de concentração, de antecipar a tomada de decisões, a velocidade de respostas e a interferência do estresse e do cansaço na atenção. Um dos resultados da pesquisa é que, no segundo semestre, o laboratório deve finalizar um game com biofeedback da variabilidade da frequência cardíaca (VFC). A partir dessa variação, é possível inferir se o atleta começa a reduzir a sua “atenção” ou aumentar a “ansiedade”. O jogo se adapta a essas respostas e pode, por exemplo, mover mais rápido as peças. O professor lamenta que o acompanhamento dos atletas tenha se encerrado ao fim da pesquisa. “Hoje realizamos avaliações psicológicas, mas não há psicólogos nas equipes esportivas. Nesse sentido, estamos desenvolvendo avaliações computadorizadas e jogos eletrônicos online de tal forma que, se não houver psicólogos nas equipes esportivas, poderemos realizar o trabalho a distância”. Mercado esportivo doméstico • 80 milhões de brasileiros praticam um ou mais esportes. • Mercado de bolas é de 13 milhões/ano, sendo 90% de fabricação nacional. • Mercado global de confecção de roupas para ginástica movimenta US$ 360 milhões por ano. • 13 mil é o número de confecções de moda esportiva no Brasil. • Esporte é o terceiro maior mercado de publicidade, atrás da mídia impressa e da TV. • R$ 4 bilhões é faturamento anual com artigos esportivos. • Dos R$ 328 milhões em patrocínios, o futebol fica com 60%. O vôlei tem a segunda maior fatia, com 14%. • 1,3% da população brasileira pratica atividades físicas. • Existem 9 mil academias de ginástica no Brasil • Elas atendem 1,7% da população, o SHUTTERSTOCK beu R$ 1,6 milhão do programa de subvenção econômica da Finep em 2007. A contrapartida da empresa somou outros R$ 820 mil. que representa 2,8 milhões de pessoas. • R$ 1,5 bilhão é a receita anual com mensalidades e matrículas. • 600 mil turistas deverão vir ao Brasil para a Copa 2014, alta de 12% no fluxo normal de estrangeiros no país. • 330 mil empregos devem ser gerados entre 2009 e 2014. Fontes: Abravest, Ibope, IBGE, ACAD, Ministério do Esporte e Amcham. Locus • Janeiro/Fevereiro/Março 2010 21 s p e c i a l SHUTTERSTOCK e Valor agregado ao conhecimento Transferência de tecnologia para o setor produtivo é imprescindível, mas as instituições de pesquisa precisam garantir a propriedade intelectual C ora D ias 22 A capacidade de uma nação gerar conhecimento e de convertê-lo em riqueza e desenvolvimento social depende da sinergia em que atuam os componentes da chamada Hélice Tripla: universidades, empresas e governo. Mas, no Brasil, uma das hélices concentra o conhecimento, pois a maior parte das atividades de pesquisa e desenvolvimento ocorre em ambientes acadêmicos, onde estão 80% dos pesquisadores. De acordo com dados de IBGE, CNPq e Capes, existem 397.170 pesquisadores no país, dos quais 307.416 estão nas universidades e apenas 79.350 nas empresas. Os demais pesquisadores atuam em órgãos do governo ou em instituições sem fins lucrativos. Locus • Janeiro/Fevereiro/Março 2010 Para equilibrar a Hélice Tripla brasileira, os mecanismos de transferência de tecnologia e licenciamento de patentes são imprescindíveis. Foi para aperfeiçoá-los que a Lei de Inovação, de 2004, estimulou as universidades a criarem Núcleos de Inovação Tecnológica (NIT). Conforme a legislação, os NITs deveriam servir como pontes entre a academia e o mercado, fortalecendo o relacionamento de universidades e empresas e cuidando de questões relativas à propriedade intelectual. Desde que a Lei da Inovação entrou em vigor, o MCT recebe anualmente um questionário respondido pelas Instituições Científicas e Tecnológicas (ICTs) do país, a fim de avaliar o desenvolvimento dos NITs. O último relatório, referente ao ano de 2008, revela que das 101 ICTs brasileiras analisadas, 75 já possuem NITs implementados. Patentes O número de patentes depositadas ainda é o principal indicador dos níveis de inovação de um país. Entre 2005 e 2009, o Brasil registrou aumento de 77% no registro de patentes internacionais, passando da 27ª para a 24ª posição no ranking da Organização Mundial da Propriedade Intelectual (OMPI). Mesmo com a melhora do índice nacional, há um longo caminho a percorrer. Exemplo disso é que somente a montadora Toyota, mesmo passando por sua pior crise, registrou, sozinha, mil patentes em 2009, mais que o dobro do Brasil, que registrou apenas 480. No relatório do MCT, as 101 instituições que responderam ao questionário fizeram requerimento de 1.133 proteções, das quais apenas 167 foram concedidas – 146 no Brasil e 21 no exterior. O próprio documento afirma que isso é reflexo da demora na concessão de proteções por parte do Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI), o órgão responsável pela deposição de patentes no Brasil. Em certos casos, a espera entre a requisição e a concessão de proteções pode chegar a oito anos. Estudo realizado pelo Instituto de Pesquisa Econômi- ca Aplicada (IPEA) em 2009 mostra que o INPI carece de recursos materiais e humanos para agilizar a análise dos processos de concessão de novas patentes. Nos Estados Unidos, por exemplo, esse processo leva, em média, dois anos para ser realizado. Casos como o dos pesquisadores Adriano Moehlecke e Izete Zanesco, da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS) demonstram a lentidão do processo. Os pesquisadores desenvolveram tecnologia para a produção de módulos fotovoltaicos – placas que absorvem radiação solar e a convertem em eletricidade –, criando uma planta-piloto do processo de produção dessas células no Núcleo Tecnológico de Energia Solar (NT – Solar) da Universidade. O depósito da patente dessa tecnologia foi feito no INPI em 2003, mas até hoje ainda não foi concedida pelo Instituto. Segundo Moehlecke, por meio da parceria entre a Universidade e três empresas do setor de energia, a planta-piloto produziu 12 mil células no ano passado, o que representa uma escala pré-industrial. O próximo passo, de acordo com o pesquisador, é constituir uma grande empresa que produzirá em escala industrial para concorrer com fábricas estrangeiras. “Nosso objetivo é produzir equipamentos com a mesma eficiência dos concorrentes internacionais, porém a custos menores”, explica Moehlecke. Locus • Janeiro/Fevereiro/Março 2010 23 e s p e c i a l Como depositar patentes no Brasil O órgão brasileiro responsável pelo depósito de patentes é o Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI). Patente é um título de propriedade temporária sobre uma invenção ou modelo de utilidade, outorgado pelo Estado aos inventores, autores, pessoas físicas ou jurídicas detentoras de direitos sobre a criação. Entenda o processo para depósito de uma patente no INPI: 1. Consultar a LPI (Lei da Propriedade Industrial) para para verificar se a inovação pode ser patenteável. Não são consideradas patenteáveis as matérias contrárias à moral, bons costumes, segurança, ordem e saúde pública. 2. Determinar se o pedido é patente de invenção (PI) ou modelo de utilidade (MU) A PI vigora por 20 anos e se refere a novo produto ou processo. O MU tem vigência de 15 anos e consiste em melhoria incremental de produto ou processo. Ilustrações: SHUTTERSTOCK 3. Realizar uma busca para certificar-se de que sua invenção tem novidade Deve se tratar de algo novo não somente no Brasil, mas também no mundo. Consultar revistas especializadas, publicações técnicas e bases de patentes disponíveis gratuitamente na internet, como o próprio site do INPI, escritório europeu e norte-americano. 24 4. Escrever o pedido de patente O pedido de patente é composto de requerimento, relatório descritivo, reivindicações, desenhos, resumo e comprovante de pagamento da retribuição relativa ao depósito (R$ 200). Locus • Janeiro/Fevereiro/Março 2010 5. Depositar o pedido de patente O depósito deve ser feito na sede do INPI, localizada na Praça Mauá, 7 - Rio de Janeiro (RJ), CEP 20083-900, ou por envio postal. Um exame preliminar é realizado no momento da entrega. 6. Solicitar o pedido de exame O pedido de patente será mantido em sigilo durante 18 meses contados da data de depósito. Depois disso, ele é publicado, com exceção de quando a patente é de interesse da defesa nacional. A publicação do pedido poderá ser antecipada a requerimento do depositante. 7. Acompanhar o andamento processual do pedido e aguardar o exame técnico O processo pode ser acompanhado pela Revista da Propriedade Industrial, editada semanalmente, disponível gratuitamente na biblioteca do INPI. 8. Cumprir as eventuais exigências técnicas feitas pelo examinador No final do exame, o responsável elabora um parecer relativo a: patenteabilidade do pedido (deferimento), adaptação do pedido à natureza reivindicada, reformulação do pedido, divisão ou exigências técnicas. Depois da conclusão do exame, é proferida decisão (R$ 100). 9. Solicitar a expedição da carta patente Pagamento para expedição da carta-patente (R$ 200). Todo o processo pode durar, de acordo com o INPI, até oito anos. 10. Manter o pagamento das anuidades em dia Os valores variam de R$ 500 a R$ 660, nos primeiros seis anos e de R$ 1.030 a R$ 3.380,00, nos nove últimos. Para mais informações, consulte o site do INPI: www.inpi.gov.br. Universidades privadas O caso da PUCRS mostra, também, a importância conquistada por instituições privadas de pesquisa no processo de independência tecnológica do país. Embora a Lei de Inovação apresente o conceito de ICT (Instituição Científica e Tecnológica) como “órgão ou entidade da administração pública que tenha por missão institucional, dentre outras, executar atividades de pesquisa básica ou aplicada de caráter científico ou tecnológico”, as universidades privadas do país buscam, cada vez mais, se adequar à nova legislação para transferir tecnologia para o mercado. O último relatório divulgado pelo Ministério da Ciência e Tecnologia mostra que 20% das instituições de pesquisa que responderam ao questionário são privadas. Em nota, o documento explica: “As instituições privadas não se configuram como ICT, conforme definido na Lei de Inovação, portanto não são obrigadas a preencher o formulário, mas 19 instituições privadas enviaram o formulário informando a sua política de propriedade intelectual e transferência de tecnologia”. Para Marli Elizabeth Ritter dos Santos, coordenadora do Escritório de Transferência de Tecnologia (ETT) da PUCRS e expresidente do Fórum Nacional de Gestores de Inovação e Transferência de Tecnologia (Fortec), não há entraves a entidades privadas que sigam a Lei de Inovação para implementar os NITs e transferir tecnologia, garantindo a propriedade intelectual da instituição. “A Lei de Inovação tem como prioridade flexibilizar a parceria públicoprivada entre a universidade pública e o setor produtivo. Para que as entidades privadas não fiquem fora desse movimento, basta que sua política institucional esteja de acordo com a Lei”, afirma. Ela chama atenção para o fato de que os NITs implantados no país trouxeram resultados positivos em poucos anos. “No exterior, a média para que os NITs comecem a trazer resultados é de oito a 10 anos”. Mesmo assim, há dificuldade em convencer as universidades da necessidade de implantá-los. Em algumas universidades, os núcleos são vistos como uma despesa desnecessária. O Fortec tem uma moção junto ao Ministério da Educação e ao Ministério da Ciência e Tecnologia para tentar ampliar o número de vagas de recursos humanos para os NITs. “Queremos mostrar para as universidades, principalmente as privadas, que os Núcleos podem ser fonte de captação de recursos para as instituições”, conclui Marli. A Universidade de Campinas (Unicamp) está em primeiro lugar entre as 20 maiores instituições residentes depositantes no INPI, com 537 patentes. Chamado Inova Unicamp, o NIT foi criado em 2003 e até o final do ano passado já havia articulado mais de 240 convênios de transferência de tecnologia e de desenvolvimento colaborativo, que renderam à Universidade R$ 1,08 milhão em royalties. O diretor executivo da Inova Unicamp, Roberto Lotufo, explica que a grande dificuldade na interação empresa-universidade está relacionada à diferença de objetivos, culturas e missões dos dois agentes. “A empresa, focada na competitividade e sustentação financeira, busca resultados rápidos de seus investimentos. Já a universidade, focada na disseminação e no avanço do conhecimento, busca projetos interessantes divulgação Mesmo sem a patente concedida pelo INPI, a PUCRS conseguiu celebrar um contrato com as três empresas para garantir a propriedade intelectual à Universidade. Ficou acordado que 52% do que fosse arrecadado com a produção pré-industrial da planta-piloto ficaria para a Universidade e os 48% restantes seriam rateados entre as empresas participantes do projeto. Conforme Moehlecke, a produção de células fotovoltaicas tem 65% do valor agregado à matéria-prima inicial. Marli Elizabeth dos Santos, da PUCRS: instituições particulares devem observar Lei de Inovação e implantar NITs Locus • Janeiro/Fevereiro/Março 2010 25 s p e c i a l divulgação e Pesquisa coordenada por Suzuki foi aproveitada pelo mercado e patenteada 26 para complementar a formação dos alunos”, diz. Para ele, o desafio dos núcleos de inovação é fazer a mediação, trazendo para a universidade oportunidades que fortaleçam o ensino e a pesquisa e que também tragam benefícios para as empresas, como acesso à tecnologia de ponta, identificação de talentos e redução dos custos de P&D. Para Lotufo, ainda há uma baixa demanda por parte do setor empresarial em buscar essa parceria com a universidade. Na contramão estão empresas como a Click Automotiva, fabricante de peças para automóveis, de Campinas (SP), que tem por tradição enviar um colaborador uma vez por semana para dentro da universidade a fim de encontrar algum conhecimento que possa aplicar no mercado. José Luiz Giacomassi, gerente executivo da Click, conta que foi em um desses dias que sua equipe descobriu a existência da patente de um sensor de fibra óptica que havia sido desenvolvido sob a coordenação do pesquisador Carlos Kenichi Suzuki. Propuseram, então, que esse sensor fosse utilizado para verificar a alteração de combustível. Com a confirmação de que o desenvolvimento do produto era possível, a empresa do setor automotivo entrou em Locus • Janeiro/Fevereiro/Março 2010 contato com a Inova Unicamp para que fosse formalizado um contrato entre a Click e a universidade. O trabalho de pesquisa passou a ser desenvolvido com a contrapartida de colaboração financeira. A patente foi licenciada em 2008 e a Click tem o direito de uso do sensor óptico. Como a empresa é a responsável por transformar o conhecimento em riqueza e testá-lo no mercado, foi firmado o compromisso de comercializar o produto em um prazo de três anos após a assinatura do contrato. Caso isso não ocorra, pode haver uma renegociação ou o contrato pode ser rescindido para que a Unicamp negocie a patente com outra organização. Com a venda do sensor, a Click repassará à Fundação da Unicamp um percentual (royalties) de tudo o que for faturado com essa comercialização até o vencimento do contrato. O fato de a empresa ter realizado esse tipo de parceria não substitui a atividade de pesquisa e desenvolvimento interna. Atualmente, a Click possui um departamento próprio de P&D e está desenvolvendo mais dois produtos do setor eletroeletrônico. “A pesquisa interna tem grande importância para a empresa. A única maneira de você sobreviver no setor automotivo é colocando no mercado novos produtos, o retorno é muito maior”, justifica Giacomassi. Quanto vale? Mensurar o valor do conhecimento desenvolvido dentro da universidade é uma das tarefas mais difíceis atribuídas às agências de inovação. O sensor óptico desenvolvido por Carlos Kenichi Suzuki, da Unicamp, por exemplo, foi resultado de 30 anos de pesquisa. Rozângela Curi Pedrosa, diretora do Departamento de Inovação da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), explica que a transferência de tecnologia da universidade para a empresa deve ser avaliada com rigor, já que os interesses normalmente são divergentes. “A gente têm que negociar, porque é um valor intangível. O interesse maior é proteger o patrimônio intelectual, mas a universidade precisa também transferir a tecnologia, socializar a informação. Buscamos uma forma para que todas as partes sejam beneficiadas”. Rozângela explica que é essencial que haja um assessor contábil quando se fecha esse tipo de contrato. Além disso, o artigo 13 da Lei de Inovação prevê que é direito do pesquisador, responsável pela pesquisa, uma participação mínima de 5% e máxima de 1/3 nos ganhos econômicos (royalties), auferidos pela instituição científica e tecnológica (ICT), resultantes de contratos de transferência de tecnologia e de licenciamento – a lei não especifica casos em que o pesquisador possui dedicação exclusiva. O Departamento de Inovação da UFSC negociou o primeiro contrato que garantiu a propriedade intelectual à Universidade. Em 2007, o Laboratório de Farmacologia Experimental desenvolveu um creme dermatológico em parceria com uma empresa de cosméticos. Constituído à base de flavonoides de passiflora alata (espécie de maracujá existente no Brasil), o novo produto anti-idade pertence à linha Chronos da Natura. A pesquisa, coordenada pelo professor João Calixto, durou quatro anos. O pesquisador explica que a ideia come- Do Brasil para o mundo Em 1948, procurando explicar como o veneno da jararaca mata ou paralisa vítimas da cobra, o pesquisador Gastão Rosenfeld levou para o laboratório do químico e farmacologista Maurício Rocha e Silva, no Instituto Biológico, em São Paulo, uma amostra da peçonha da Bothrops jararaca. O objetivo era estudar seus efeitos em cães. Após injetarem o veneno em um animal, os pesquisadores observaram que a reação com o plasma sanguíneo liberava uma substância com intensa ação hipotensora, denominada bradicinina. No início da década de 1960, Sérgio Henrique Ferreria, orientando de Maurício Rocha e Silva na Universidade de São Paulo (USP), constatou que a hipotensão provocada pela liberação da bradicinina no sangue da vítima era potencializada pela ação de toxinas encontradas em grandes quantidades no veneno da jararaca. Essas substâncias, denominadas peptídeos potenciadores da bradicinina (BPPs), foram isoladas por Ferreira e outros pesquisadores. Em 1965, Ferreira levou o resultado das pesquisas para a Inglaterra, onde cursaria pós-doutorado, o que permitiu a um grupo de cientistas liderado pelo inglês John Vane (ganhador do Prêmio Nobel de Medicina) chegar a um protótipo molecular dos BPPs. Certos do potencial da pesquisa, Ferreira e Vane firmaram parceria com o laboratório norte-americano Bristol-Myers Squibb, cedendo a descoberta em troca de financiamento para outros estudos. Foi assim que o laboratório registrou a patente da versão sintética da substância isolada pelos brasileiros e criou, em 1977, o Captopril, medicamento utilizado por milhões de hipertensos. Lançada nos Estados Unidos no início da década de 80, a droga se tornou referência mundial para o tratamento da hipertensão e sua comercialização gera um faturamento de US$ 5 bilhões por ano ao laboratório norte-americano. Hoje, uma versão genérica da droga é usada pelo Sistema Único de Saúde (SUS) no Brasil. Locus • Janeiro/Fevereiro/Março 2010 27 e s p e c i a l çou a ganhar corpo depois que algumas pesquisas iniciais em outra área deram resultado negativo. Em 2003, quando iniciaram a parceria, a Natura estava focada em uma pesquisa mais voltada à área de farmacologia. A empresa havia comprado a Flora Medicinal, do Rio de Janeiro, e a parceria com a UFSC era para inicialmente reestudar um produto daquela empresa, que contava com três plantas na sua composição, sendo uma delas a passiflora. A intenção era realizar testes para comprovação de sua eficácia. Como não obteve sucesso, o produto, cujo nome não foi revelado, saiu de linha. Calixto, incomodado com os resultados negativos, decidiu detalhar cada uma das três plantas isoladamente. A passiflora alata chamou a atenção do pesquisador pelo seu componente anti-inflamatório. Foi nesse momento que ele che- gou à ideia de usar a passiflora como cosmecêutico antienvelhecimento. O núcleo de inovação da UFSC auxiliou na questão contratual, garantido à Universidade participação nos ganhos da exploração do novo produto. Calixto explica que, apesar da parceria ter sido um sucesso, houve entraves na negociação do contrato de propriedade intelectual, pois o Regimento Jurídico Único (que regulamente as atividades do servidor público federal) não permitia que ele recebesse os royalties pela descoberta, por atuar como professor em regime de dedicação exclusiva. “Isso exigiu que se buscassem mecanismos alternativos para que eu recebesse os recursos a que tinha direito”, explica. A Natura está negociando outro tipo de parceria com a UFSC para ser iniciada ainda em 2010. Retaliação cruzada Em novembro de 2009, o Brasil foi autorizado pela Organização Mundial do Comércio (OMC) – entidade responsável pelas negociações multilaterais de comércio entre países membros – a adotar contramedidas no setor de bens, serviços e de propriedade intelectual dos Estados Unidos em um valor total de US$ 829 milhões. O processo contra os subsídios do governo norteamericano à produção e exportação de algodão no país teve início ainda em 2005, quando a OMC exigiu que os Estados Unidos retirassem tais subsídios em um prazo de seis meses. Como a medida não foi adotada, a OMC viabilizou que o Brasil fizesse uma retaliação cruzada, ou seja, mesmo que o setor de bens seja o atingido com os subsídios ao algodão, o país pode tomar medidas, também, nos setores de serviços e de propriedade intelectual. Em seguimento à autorização da OMC, em março de 2010 a Câmara de Comércio Exterior (Camex) do Brasil publicou uma lista de produtos que terão suas alíquotas de Imposto de Importação aumentadas para os Estados Unidos. O valor total de retaliação atingido com a lista de bens é de US$ 591 milhões. O restante do valor de compensação a que tem direito o Brasil – US$ 238 milhões – será aplicado nos outros setores. Devido à retaliação, o consumidor brasileiro poderá pagar menos ou até não precisará pagar 28 Locus • Janeiro/Fevereiro/Março 2010 nada para comprar ou utilizar, por exemplo, algum medicamento patenteado pelos Estados Unidos. O objetivo dessa contramedida é que as empresas dos setores de serviços e propriedade intelectual pressionem o governo norte-americano a negociar com o Brasil, já que a exigência da OMC não bastou para que os Estados Unidos parassem de subsidiar a produção e a exportação de algodão. O governo brasileiro colocou, também em março deste ano, 21 itens para consulta pública em propriedade intelectual que podem ser usados para retaliar os Estados Unidos. Entre os itens está a quebra de patentes de produtos ou processos relativos a medicamentos, inclusive os veterinários e químicos agrícolas. Há também quebra de direitos autorais, como para execução pública de músicas, filmes e a possibilidade de licenciamento de patentes de medicamentos sem autorização do titular. A lista foi publicada no Diário Oficial da União. Após o final da consulta pública, o governo editará a lista final de retaliação. A abertura da consulta pública em propriedade intelectual é a última cartada do governo brasileiro para tentar eliminar os subsídios e evitar a retaliação. A indústria farmacêutica dos Estados Unidos já iniciou um lobby intenso para forçar o governo local a negociar com o Brasil. d u c a ç ã o Shutterstock e Um novo modelo de graduação Bacharelados interdisciplinares oferecem estrutura curricular inovadora e podem ajudar a reduzir a evasão em cursos de Engenharia no Brasil Fernanda Peres M anter a expansão do Produto Interno Bruto (PIB) nos patamares de 6% ao ano no próximo quinquênio exigirá que o Brasil forme, pelo menos, 350 mil novos engenheiros. Atualmente entram no mercado 35 mil profissionais por ano, metade do que o país precisa para seguir no mesmo ritmo de crescimento. O dado faz parte do projeto Cresce Brasil + Engenharia + Desenvolvimento, lançado em 2006 pela Federação Nacional dos Engenheiros (FNE) e atualizado em 2009. A pesquisa mostra ainda que uma das principais causas da insuficiente formação de novos profissionais está na evasão dos graduandos em Engenharia. Para corrigir problemas como esse, a popularização dos bacharelados interdis- ciplinares (BIs) na área de Ciência e Tecnologia pode ser uma solução. Com currículo flexível e formação humanística e generalista, a modalidade de ensino já é praticada em oito instituições federais de ensino no Brasil e a cada ano desperta a atenção de mais estudantes. Atualmente, dos cerca de 139 mil alunos que entram nas faculdades de Engenharia do Brasil todos os anos, pouco mais de 35 mil chegam a concluir o curso. Dados da Capes apontam 60% de evasão nos cursos desta área nas IES públicas e 75% nas particulares. “A falta de profissionais poderá ser um gargalo a impedir o desenvolvimento nacional”, alerta o presidente da FNE, Murilo Celso de Campos Pinheiro. Locus • Janeiro/Fevereiro/Março 2010 29 e d u c a ç ã o Escolha madura FOTOS: DIVULGAÇÃO Murilo Celso Pinheiro, presidente da FNE: falta de engenheiros terá consequências para economia do país Um dos maiores dilemas de todo adolescente que sonha em seguir os estudos em uma universidade é qual profissão escolher. Aos 17, 18 anos não é nada fácil ter certeza sobre o que se quer fazer para o resto da vida. A pressão dos pais, da sociedade e a visão pouco clara do currículo e do dia a dia da vida profissional podem levar o jovem a optar por um curso que, mais tarde, acaba revelando-se bem diferente daquilo que ele imaginava quando fez a inscrição para o vestibular. Os bacharelados interdisciplinares foram criados a partir da ideia de que, em dois ou três anos, após uma formação mais geral, o aluno tem condições de fazer uma escolha mais madura sobre sua carreira. De acordo com o Ministério da Educação (MEC), cursos nesses moldes já são realidade em oito universidades federais brasileiras: Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), Universidade Federal de Alfenas (Unifal), Universidade Federal do Vale do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM), Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB), Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), Universidade Federal Rural do Semi-Árido (Ufersa), Universidade Federal do ABC (UFABC) e Universidade Federal da Bahia (UFBA). Os BIs são cursos superiores de graduação (assim como os bacharelados, licenciaturas e cursos superiores de tecnologia) divididos em quatro grandes áreas do conhecimento: humanidades, artes, saúde e ciência e tecnologia. Ao decidir-se pela instituição de ensino que oferece esse tipo de formação, o aluno matriculase em uma das áreas e não em um curso profissionalizante como nos moldes tradicionais. Após o período de formação básica, que tem du- 30 Locus • Janeiro/Fevereiro/Março 2010 ração, em média, de três anos (2.400 horas), o aluno recebe o diploma de graduação e pode seguir estudando para obter também, em aproximadamente dois anos de estudo, a formação mais específica, em cursos como os tradicionais. O MEC considera o modelo de ensino inovador e espera uma modernização do sistema curricular das instituições. Destaque no ENEM Uma das formas de ingresso nos BIs é via Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM), mas cada universidade tem liberdade para escolher como será feita a seleção dos alunos. Na edição de 2010 do exame, o curso mais procurado pelos estudantes foi o de Bacharelado Interdisciplinar em Ciência e Tecnologia (BC&T) da Universidade Federal do ABC (UFABC), do interior de São Paulo, que registrou 16.253 candidatos inscritos. “O nosso diferencial é o projeto pedagógico, que permite ao aluno uma maior flexibilidade de currículo, um entendimento dos diferentes assuntos do seu interesse. O curso é abrangente, estruturado em eixos que compõem uma formação extremamente geral, mas com fundamentação teórica e prática”, avalia o pró-reitor de graduação da UFABC, Derval Rosa. A UFABC conta com 2.557 alunos matriculados atualmente no BI de Ciência e Tecnologia. Em maio, 1.700 novos estudantes devem ingressar na instituição: 1.500 no BC&T e 200 no recém-criado Bacharelado em Ciências e Humanidade. Na universidade, 30% das disciplinas são livres, ou seja, o graduando pode cursá-las na UFABC ou em outras instituições. Essa flexibilidade, explica Rosa, dá maior autonomia e, logo, mais responsabilidade ao aluno, pois é ele quem escolhe o caminho que vai percorrer dentro da universidade desde o começo. “Em longo prazo estamos formando um profissional autodidata”, afirma. Essa liberdade de escolha foi o que atraiu o estudante Juliano Marques Nunes, 20 anos, em 2009. Na época, ele já havia começado um curso de tecnologia em outra faculdade e não teve dúvidas de que queria ingressar no BI de Ciência e Tecnologia da UFABC. Dois aspectos pesaram na escolha de Juliano: a interdisciplinaridade do curso e o projeto pedagógico da Universidade, cujo texto diz que, “afastados do sistema educacional universitário tradicional, os alunos são encorajados a se tornarem responsáveis por suas próprias vidas em vez de apenas escutarem o que devem fazer.” A dúvida é: toda essa liberdade e generalização formam bons profissionais? Ainda não é possível ter uma resposta definitiva, já que a UFABC não tem turmas formadas nos BIs. Para o pró-reitor Derval Rosa, o mercado quer um profissional engajado, empreendedor, que tenha iniciativa na resolução e trânsito sobre os diferentes conhecimentos, uma vez que o acesso ao conhecimento é muito fácil hoje em dia. Se é assim, pelo menos para o estudante Juliano, o modelo parece estar funcionando como o previsto. O jovem diz que se sente preparado e acredita que o curso o está ajudando a ter maior capacidade de se adaptar aos desafios que serão impostos pelo mercado de trabalho. “O curso faz com que tenhamos uma mentalidade diferente do aluno que cursa uma Engenharia tradicional, que fecha a sua visão para determinada área. No BC&T o estudante começa com uma visão ampla sobre tudo, que são as disciplinas obrigatórias. Depois faz as disciplinas mais específicas, pelas quais sente interesse e que o conduzirão para um curso de formação, como as Engenharias, bacharelados e licenciaturas”, explica. Berço ideológico O início das discussões acerca da implantação dos bacharelados interdisciplinares nas universidades brasileiras remonta ao ano de 2006, quando, por iniciativa do reitor da UFBA, Naomar Monteiro de Almeida Filho, reitores de várias universidades federais do Brasil se reuniram com o MEC no 1º Seminário Nacional da Universidade Nova. O movimento produziu o Manifesto da Universidade Nova, que tinha como intenção debater os rumos do ensino superior público brasileiro no ano seguinte. Uma das vedetes do Universidade Nova é justamente a introdução do bacharelado interdisciplinar nas instituições de ensino superior. De acordo com o projeto, os BIs seriam responsáveis por uma mudança na forma de ingresso – abandona-se o vestibular tradicional e adotase o ENEM – e ainda pela ampliação do número de vagas nas universidades. Atualmente, a UFBA oferece quatro bacharelados interdisciplinares somente no campus de Salvador nas áreas de Ciência e Tecnologia, Artes, Humanidades e Saúde. No primeiro ano, em 2009, foram oferecidas 900 vagas nesses cursos, número ampliado para 1.300 em 2010. Mas engana-se quem pensa que os BIs são exclusividade dos jovens que querem mais tempo para se decidir por uma carreira. Entre os estudantes, há pessoas de idades, formações e aspirações muito variadas. “A maioria tem a idade própria dos calouros. Desses, alguns buscaram os BIs como opção de ingresso para os cursos profissionais que já escolheram, enquanto outros ainda não têm essa definição. Há também estudantes bem mais velhos, diplomados ou não, os quais buscam o conhecimento que os bacharelados podem proporcionar”, explica o pró-reitor de ensino de graduação da UFBA, Maerbal Bittencourt Marinho. O pró-reitor aposta em uma proposta pedagógica abrangente como forma de reduzir a evasão dos bancos universitários. “Eles (os alunos) têm oportunidade de experimentar, o que pode reduzir a evasão. Principalmente nos cursos seguintes, se decidirem fazê-los, porque terão decidido com mais conhecimento”, conclui. Sentir o gostinho de cada profissão pode ser a chave para evitar a desistência da carreira antes mesmo de iniciá-la. Universidade Federal do ABC foi a preferida por quem optou pelo Bacharelado Interdisciplinar via ENEM Locus • Janeiro/Fevereiro/Março 2010 31 o p o r t u n i d a d e A internet mais abrangente Plano Nacional de Banda Larga promete estender acesso às classes C e D, gerando negócios para provedores, empresas de softwares ou mesmo fabricantes de computadores e laptops É por uma rede de 30.803 quilômetros de fibra ótica que o governo brasileiro espera triplicar o número de domicílios com acesso à internet nos próximos quatro anos. O Plano Nacional de Banda Larga (PNBL), como foi batizado, pretende ampliar o acesso à rede de atuais 12 milhões de casas para 40 milhões até 2014, em 25 capitais brasileiras. No plano anunciado pelo governo, são previstos R$ 785 milhões em desonerações (abatimento de impostos e facilidades). A estatal Telebrás, que recebeu R$ 3,22 bilhões em capitalização do governo, será a gestora do programa. Com o PNBL, o goSHUTTERSTOCK J úlia P hittan verno espera deixar o serviço mais próximo das classes C e D. Esse universo representa uma população de mais de 120 milhões – ou 84% do total dos brasileiros que gastam com roupas, alimentação e com despesas da casa (luz, aluguel, água e condomínio). Um imenso universo de clientes que hoje concentra uma grande oportunidade de negócios para provedores, empresas de softwares ou mesmo fabricantes de computadores e laptops. A gerente da incubadora Raiar, da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), Moema Nunes, compartilha dessa percepção. “O PNBL, ao focar no acesso à internet para as classes C e D, abrirá oportunidades para que novos negócios sejam desenvolvidos voltando-se a essa parcela da população”, declarou. De acordo com ela, esse novo mercado é uma oportunidade a ser explorada pelos empreendedores da área de tecnologia para o desenvolvimento de soluções inovadoras. Desafio aos softwares “A expansão da internet banda larga vai favorecer muito os negócios para as empresas que trabalham com softwares”, avalia Tiago Totti, da DevelopIT. A empresa surgiu em janeiro deste ano na Incubadora Raiar, focada no desenvolvimento de softwares sob encomenda e treinamento em tecnologias Microsoft. Para Totti, a implementação do PNBL abrirá um leque maior de oportunidades para quem trabalha no segmento de mídia digital. “Com acesso maior à banda larga, serviços de downloads de arquivos 32 Locus • Janeiro/Fevereiro/Março 2010 Grandes e pequenas Para o presidente da Associação Brasileira dos Provedores de Acesso, Serviços e Informações da Rede Internet (Abranet), Eduardo Fumes Parajo, o anúncio do governo ainda deixa muitas lacunas sobre o que o PNBL vai representar de avanço para o serviço de provedores no país. “Ainda dependemos da infraestrutura que é oferecida pelas empresas de telecomunicação. Se tivermos outro competidor que entre no mercado para oferecer os serviços a um custo mais acessível, será ótimo”, opina. Pelo modelo anunciado, a Telebrás será a gestora ou “espinha dorsal” do plano, mas o governo quer que empresas privadas atuem de forma complementar, levando o serviço ao usuário final. Como gestora, a Telebrás será encarregada de implementar a rede de comunicação da administração pública federal e prestar suporte a políticas de conexão à internet em banda larga para universidades, centros de pesquisa, escolas, hospitais e outros locais de interesse público. A estatal só levará o serviço para os usuários finais se não houver oferta de par- DIVULGAÇÃO como imagens e filmes tendem a se ampliar”, afirma. Essa ampliação de oferta de banda larga deve chegar a 100 municípios ainda em 2010. Segundo o PNBL anunciado pelo governo, a ideia é completar a implantação de backbones no Distrito Federal e em 15 capitais até o final do ano, formando um anel que abrangerá 11.357 quilômetros de redes nas regiões Nordeste e Sudeste. O serviço disponível terá uma velocidade igual ou superior a 512 quilobits pos segundo (kbps). Segundo Totti, o fato de o usuário estar sempre conectado – e do acesso estar mais disseminado – muda a forma de pensar o software. “A criação do software, a arquitetura de software, permite mais serviços. Há uma base instalada no local ou mesmo na nuvem e serviços que permanecem online”, explica. ticipação de empresas privadas. Segundo Parajo, os pequenos provedores demandam um investimento alto em equipamentos e também na contratação das redes que hoje estão nas mãos das empresas de telecomunicação. Para o presidente da Abranet, o governo deveria pensar em linhas de financiamento que atendessem com especificidade o setor e em redução de tributos relacionados aos serviços. O modelo executado até agora no Brasil, de acordo com Parajo, estimulou uma grande competição no mercado de provedores, mas não no serviço. De acordo com ele, o país tem hoje cerca de 1,7 mil provedores de internet. O resultado dessa competição é a queda vertiginosa do custo dos serviços de provedores – que hoje chegam a ser oferecidos a menos de R$ 10 –, enquanto o serviço de internet mantém-se na faixa entre R$ 60 e R$ 70. Segundo o plano anunciado pelo governo, o custo da tarifa deve ser de R$ 15 para o plano com incentivos, com velocidade de até 512 kbps (quilobits por segundo) e com limitação de downloads, e de R$ 35 para o plano comum, com velocidade entre 512 e 784 kbps. Nos casos em que os incentivos não sejam adotados, a expectativa do governo é de que o preço fique entre R$ 29 e R$ 35, valor que varia em função da cobrança ou não de Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS). Tiago Totti e seu sócio na DevelopIT, Felipe Dorneles: PNBL deve aquecer mercado de softwares Locus • Janeiro/Fevereiro/Março 2010 33 SHUTTERSTOCK i n t e r n a c i o n a l Parceria teuto-brasileira Ano Brasil-Alemanha da Ciência, Tecnologia e Inovação estimula a transferência de conhecimento entre os dois países F rancis F rança A Alemanha sempre esteve presente em momentos importantes do desenvolvimento econômico brasileiro. Primeiro, com as imigrações do final do século XIX, ao enviar mão de obra para movimentar a economia do Brasil agrário depois do fim tardio da escravatura. Depois, na chamada segunda revolução industrial, a partir dos anos 60, quando os alemães participaram do processo de implantação da indústria pesada no Brasil, com suas montadoras de automóveis e fábricas de maquinário. Agora, momento em que o Brasil orienta suas políticas de desenvolvimento para a economia do co- nhecimento, a Alemanha abre as portas para a cooperação tecnológica e fomento à inovação. Para oficializar a parceria teuto-brasileira, será lançado em abril o Ano BrasilAlemanha da Ciência, Tecnologia e Inovação, que vai até abril de 2011 com o tema “Sustentável: Inovador” e pretende mobilizar empresas e instituições de pesquisa e desenvolvimento em ambos os países para fomentar processos de inovação. O primeiro acordo de cooperação científica e tecnológica entre Brasil e Alemanha foi assinado em 1969, mas a colaboração ganhou mais força nos últimos três anos, Investimentos: Brasil x Alemanha País Ano Alemanha 2007 Brasil 2008 Dispêndios em P&D (US$ milhões correntes de PPC (1)) 71.789,0 23.019,3 Dispêndios em P&D em relação ao Produto Interno Bruto (PIB) em percentual 2,53 1,09 Dispêndios em P&D por Dispêndios em P&D pesquisador (em equivalência de per capita tempo integral) (US$ correntes de PPC (US$ correntes de PPC por por habitante) pesquisador) 872,7 121,4 246.822,35 172.732,25 (1)Dispêndios nacionais em pesquisa e desenvolvimento – P&D, em relação ao produto interno bruto – PIB, países selecionados, em anos mais recentes disponíveis Fonte: MCT 34 Locus • Janeiro/Fevereiro/Março 2010 com o esforço de ambos os países em internacionalizar o ensino e a pesquisa. O Ano da Ciência Brasil-Alemanha, como também é chamado, pretende ir além do incentivo à pesquisa e ao desenvolvimento acadêmico e mobilizar políticas bilaterais de inovação. “Queremos uma cooperação mais estreita com o Brasil para que possamos responder em conjunto a questões globais como as alterações climáticas e o reforço da inovação e do crescimento”, disse a ministra para Educação e Pesquisa da Alemanha, Annette Schavan, em São Paulo. Programas específicos Para o Ano da Ciência Brasil-Alemanha, cerca de 40 programas foram concebidos, dos quais 15 já estão prontos para execução. Um dos exemplos é a construção de uma plataforma tecnológica entre alemães e brasileiros na área de biotecnologia. Segundo Cruz Junior, o projeto já tem recursos previstos para implantação. A plataforma digital vai apontar prioridades na elaboração de programas conjuntos para o aprimoramento da indústria de biotecnologia no Brasil. “A Ciência ao alcance de todos Diferentemente do que aconteceu com as imigrações do século XIX e a indústria pesada do século XX, desta vez o Brasil não espera pela ajuda unilateral dos alemães. No século XXI, a conversa é de igual para igual. A Alemanha é reconhecida como um dos países mais inovadores do mundo, não apenas em produtos e processos, mas também nos instrumentos que utiliza para replicar seus programas de C,T&I. O Brasil, por sua vez, oferece um mercado consumidor em desenvolvimento, além da capacidade de absorver tecnologia. “Certamente a Alemanha é muito grata ao Brasil por toda a estabilidade e pelas condições de mercado e de investimentos que nós geramos ao longo dos últimos anos. Isso teve um impacto muito importante para o desenvolvimento e estabilidade da economia alemã”, reconhece o chefe da Divisão de Ciência e Tecnologia do Ministério das Relações Exteriores, Ademar Seabra da Cruz Junior. E a contrapartida não é só econômica. Embora em menor grau, o Brasil também pode contribuir em setores nos quais domina processos tecnológicos, como energias renováveis, vacinas, imunobiológicos e biomedicina em geral, áreas em que o país desenvolve pesquisa de ponta. Além de fomentar políticas de inovação junto a instituições de pesquisa e desenvolvimento e ao setor produtivo, o Ano da Ciência também propiciará a realização de programas para despertar vocações científicas em crianças e adolescentes em idade escolar. Dois projetos desenvolvidos pelo Instituto Max Planck, uma organização de pesquisa científica alemã, já estão prontos para serem trazidos para o Brasil. O “Túnel da Ciência” será sobre a história das descobertas científicas na sociedade e o “Um olhar do céu” sobre astronomia e astrofísica. Ambas as exposições são interativas e devem percorrer várias cidades ao longo do ano com o objetivo de despertar o interesse pela ciência em dezenas de milhares de estudantes brasileiros. DIVULGAÇÃO Via de mão dupla O Túnel da Ciência desperta a atenção de estudantes para as descobertas científicas Locus • Janeiro/Fevereiro/Março 2010 35 i n t e r n a c i o n a l Esforço conjunto Para reforçar o espírito de cooperação no Ano da Ciência será realizado no final de maio, em Munique, o primeiro encontro conjunto entre a Comissão Mista Econômica Brasil-Alemanha e a Comissão Mista de Ciência, Tecnologia e Inovação dos dois países, com a participação de representantes do empresariado. As comissões devem prospectar, juntas, empresas alemãs intensivas em produção tecnológica interessadas em se associarem a empresas no Brasil em troca de acesso a modelos de investimentos e ao mercado brasileiro. O empresariado alemão já se sente de fato bastante confortável no Brasil. “Existem mais empresas alemãs instaladas em São Paulo do que em qualquer cidade da Alemanha”, diz Gerhard Ett, vice-presidente da Associação dos Engenheiros Alemães no Brasil e presidente da Electrocell, DIVULGAÇÃO Alemanha tem uma associação que reúne em torno de 500 grandes empresas do setor de biotecnologia. A ideia é que essa associação investigue programas ou investimentos a serem realizados no Brasil em parceria com empresas brasileiras. Investimentos esses que pressupõem transferência de conhecimento, formação de incubadoras, joint-ventures e o fortalecimento de outros setores da cadeia em empresas já instaladas”, explica Cruz Junior. Também está prevista a publicação de um livro que vai reunir experiências de intercâmbio de conhecimentos em inovação entre Brasil e Alemanha em um esforço conjunto de especialistas dos dois países. Na área espacial, o Ano da Ciência deve fomentar o intercâmbio entre a Agência Espacial Brasileira (AEB) e a alemã (DLR) para eliminar gargalos de gestão, investimento ou de tecnologia que possam ser supridos através de parcerias. No segmento de nanotecnologia, o comitê organizador do Ano da Ciência pretende fazer um levantamento sobre as atuais necessidades do setor e aproveitar a experiência alemã para aumentar a competitividade. O Brasil também deve aproveitar iniciativas bem-sucedidas de políticas de inovação alemãs. Um dos focos é a parceria com a Sociedade Fraunhofer. “Eles têm 49 grandes laboratórios na Alemanha, com índice de patentes forte. A Fraunhofer é uma instituição pública, mas recebe também recursos privados para atender a necessidades específicas no desenvolvimento de setores. Onde tem um problema tecnológico, a Fraunhofer tem uma solução”, enfatiza Cruz Junior. A ideia é que, durante o ano, os laboratórios da Sociedade Fraunhofer também apoiem soluções tecnológicas em projetos-piloto no Brasil, que entraria com os mecanismos de financiamento. Para Ett, o Brasil confia nos produtos alemães, além de oferecer mão de obra qualificada 36 Locus • Janeiro/Fevereiro/Março 2010 que desenvolve células a combustível no Centro de Inovação, Empreendedorismo e Tecnologia (Cietec). Na opinião de Ett, o mercado brasileiro é a principal moeda de troca com os alemães. “O Brasil é um grande mercado em expansão e o público consumidor conhece e confia nos produtos alemães. O Brasil também oferece mão de obra qualificada em empresas de base tecnológica, que conseguem acompanhar e desenvolver em conjunto tecnologias específicas que podem ser aplicadas tanto no Brasil como na Alemanha”, diz. A Electrocell mantém parceria com diversos fornecedores de tecnologia alemães. A Alemanha é fabricante de boa parte das peças utilizadas no gerador que converte energia química em energia elétrica e libera apenas água como resíduo. Segundo Ett, a cooperação entre empresas brasileiras e alemãs aumentou tanto em relação à transferência de tecnologia quanto ao número de empresas brasileiras que possuem representação de companhias alemãs no Brasil, bem como na quantidade de projetos desenvolvidos em conjunto por meio de parcerias teuto-brasileiras. Resultado perene O Ano Brasil-Alemanha da Ciência, Tecnologia e Inovação não tem a pretensão de transformar setores da economia, mas também não deve se limitar a beneficiar nichos. “Não pretendemos ter um impacto macro nem micro, propomos uma ação em setores intermediários da escala produtiva e também do processo do conhecimento”, observa Cruz Junior. Os resultados devem ser mensurados por meio de indicadores qualitativos e quantitativos que serão elaborados até abril de 2011. Segundo Cruz Junior, a ideia é que os resultados se consolidem nos próximos meses, através de uma metodologia permanente para o trabalho bilateral na área de ciência e tecnologia que vá além do Ano da Ciência. Programação Workshop Pro Mata 31 de março a 2 de abril | Porto Alegre Lançamento do Ano Brasil-Alemanha da Ciência, Tecnologia e Inovação em São Paulo 12 de abril | São Paulo Viagem latino-americana no âmbito do projeto-piloto BayLAT – germanismo na América Latina 5 a 18 de abril | São Paulo, Blumenau, Belo Horizonte e Porto Alegre Delegação de especialistas latino-americanos na Feira de Hannover 2010 19 a 23 de abril | Hannover Encontro binacional de Biologia de Sistemas 2010 25 a 29 de abril | Heidelberg Energias renováveis na transferência de conhecimento e tecnologia teuto-brasileira 30 de abril | Hamburgo Workshop do Projeto de Coordenação Conjunta União Europeia-Brasil em Sistemas Nano 5 e 6 de maio | Manaus Seminário sobre Tecnologia de Armazenamento de Frutas 2 e 3 de julho | Ravensburg Parceria de cooperação teuto-brasileira na pesquisa sobre abelhas – resultados e perspectivas 28 a 31 de julho | São Paulo O que mantém a sociedade unida? Comparação entre Constituições e Tribunais Constitucionais: Alemanha e Brasil 18 a 20 de novembro | Dresden Workshop de Física de Partículas Elementares 1º de outubro a 30 de novembro | São Carlos Workshop teuto-brasileiro “Hidrato de Gás” 1º de outubro a 31 de dezembro | Porto Alegre Mais informações: www.ano-brasil-alemanha.org Locus • Janeiro/Fevereiro/Março 2010 37 i nv e s t i m e n t o A união dos pequenos Nem mesmo a crise mundial interrompeu o crescimento das cooperativas de crédito no Brasil. Uma ótima notícia para as MPEs inovadoras que buscam alternativas de financiamento A apreensão invadiu os bancos brasileiros no segundo semestre de 2008. O motivo: a crise mundial que escancarou as fragilidades do sistema financeiro dos Estados Unidos e da Europa. Mesmo sofrendo muito menos do que a média mundial, o Brasil também foi prejudicado. Do final de 2008 até o primeiro trimestre de 2009, os bancos privados brasileiros, muitos por estarem ligados a suas matrizes no exterior, SHUTTERSTOCK B runo M oreschi 38 Locus • Janeiro/Fevereiro/Março 2010 diminuíram em cerca de 25% o crédito às pequenas empresas. Entretanto, algo curioso aconteceu. Enquanto os grandes tremiam, as cooperativas de crédito expandiram seus negócios. Dados da Organização das Cooperativas Brasileiras (OCB) mostram que a oferta de crédito das suas 7.261 cooperativas associadas cresceu durante todo o ano de 2008. A tendência positiva continua até hoje. Em janeiro do ano passado, as operações de crédito do setor somavam R$ 16,4 bilhões. Em agosto, atingiram R$ 19,4 bilhões. Por fim, nos três últimos meses de 2009, o montante chegou a R$ 21 bilhões. Mesmo com a retomada do crédito entre os bancos tradicionais, o setor continua crescendo. Em dezembro do ano passado, ultrapassou a marca de R$ 25 bilhões. Uma breve análise dos ativos totais dos associados da OCB mostra como a crise financeira não foi um grande problema. Durante 2009, o setor cresceu em ativos R$ 8,3 bilhões – somando um total de R$ 52,8 bilhões. O cooperativismo de crédito existe no Brasil desde 1930, mas foi somente a partir da segunda metade da década de 1980 que ganhou maior impulso, migrando da zona rural, onde nasceu, para as cidades. A definição de cooperativa de crédito é clara: um grupo de pessoas que se reúnem em busca da melhor administração de seus recursos financeiros. O cooperativismo de crédito é representado no Brasil por sistemas como Sicredi, Cecred, Sicoob, Unicred, Ancosol e também por cooperativas independentes, que não são ligadas a nenhum deles. O objetivo desse tipo de cooperativa é prestar assistência aos associados e oferecer serviços financeiros com condições mais atrativas que as oferecidas no Sistema Financeiro Nacional. Por isso, de forma indireta, elas também pressionam os bancos tradicionais a diminuírem suas taxas. De acordo com a lei nº 4.595, de 1964, seu funcionamento precisa ser autorizado e regulado pelo Banco Central. Mas há algo que as difere dos bancos comuns. A cooperativa não almeja o lucro e o excedente de suas atividades é dividido entre os associados. Aqui e lá fora Ciente de que o cooperativismo de crédito é essencial para o crescimento de pequenas e médias empresas, o Sebrae criou um grupo de estudos sobre o assunto, que iniciou suas pesquisas no final do ano passado. O objetivo é conhecer até agosto oito experiências distintas pelo Brasil. Com isso, técnicos do Sebrae querem promover um maior intercâmbio entre essas cooperativas. O gerente da unidade de acesso a serviços financeiros do Sebrae Nacional, Alexandre Guerra, não esconde o entusiasmo quando comenta as peculiaridades das cooperativas de crédito. “Nelas há um sentimento de integração que não vemos nos bancos tradicionais. Os associados possuem características em comum e, por isso, participam mais do funcionamento da cooperativa. Num banco podemos até ser acionistas, mas não ajudamos a tomar as decisões. Em um grupo de cooperados é comum ver todos participando das reuniões, votando e discutindo as mais variadas questões ligadas ao funcionamento da cooperativa”, comenta Guerra. Essa proximidade com seus integrantes faz com que as cooperativas de crédito pensem em serviços específicos. “Pode ser um cartão de crédito diferenciado aos empresários, uma linha de crédito aos médicos que precisam ampliar seus consultórios. Tudo varia de acordo com a região em que ela se encontra e o ramo de atividade de seus cooperados.” Mesmo com essas benéficas características e crescendo bastante, o cooperativismo de crédito ainda é pequeno no Brasil, além de estar bastante concentrado no Sul e no Sudeste. “Podemos crescer muito. O Sebrae espera que nos próximos 10 anos sua participação de 2% no sistema financeiro aumente para 10%”, afirma Guerra. O crescimento é de fato necessário. Quando comparado com outros países no mundo, o Brasil ainda é iniciante no setor. Nos países do G7, composto pelas sete nações mais industrializadas e desenvolvidas economi- Cooperar para crescer Não é difícil participar de uma cooperativa no Brasil. Basta pesquisar entre as confederações se há alguma ligada às características de seu ramo de atividade. O atendimento costuma ser mais prestativo e rápido do que nos bancos tradicionais. Todavia, criar uma nova cooperativa exige disposição e cautela. O Sebrae orienta o grupo interessado a analisar se seus integrantes possuem interesses comuns, espírito de cooperacão e uma quantia razoável de dinheiro em poupança. Outra questão importante é a existência de um líder entre os interessados. O número inicial aconselhável para começar uma cooperativa varia de 20 a 30 pessoas. Buscar orientações de especialistas também é essencial. Em geral, as cooperativas singulares (formadas por pessoas de mesmo interesse) estão ligadas a uma cooperativa central. As centrais vinculam-se às confederações. “Por isso, é importante que o grupo entre em contato com uma dessas duas entidades maiores. Elas possuem departamentos para sanar dúvidas, contadores treinados para um público inexperiente e várias atividades para ensinar os primeiros passos”, explica Sílvio Giusti, gerente de Relacionamento e Desenvolvimento do Cooperativismo de Crédito da Organização das Cooperativas Brasileiras (OCB). A abertura de uma cooperativa pode se mostrar um processo burocrático e uma dose extra de paciência é fundamental. Uma cooperativa de crédito é uma instituição financeira e, por isso, sua formação precisa ser atentamente analisada pelo Banco Central. “O BC tem por obrigação analisar os grupos interessados em participar do sistema financeiro para garantir um ambiente econômico estável e livrar o Brasil de ações meramente especulativas. A aprovação ou não depende do grau de clareza de quem está criando a cooperativa. Se o BC perceber que de fato há necessidade do agrupamento e objetivos claros, certamente irá dar todo o apoio necessário”, diz Giusti. Locus • Janeiro/Fevereiro/Março 2010 39 i nv e s t i m e n t o camente, as cooperativas de crédito participam com 16,85% do mercado financeiro. Na Alemanha, a participação é de 20%, o que equivale a US$ 1,38 trilhão em ativos. Grande parte desse montante está concentrada no Deutsche Zentral Bank, cooperativa que reúne 16 milhões de associados. Mas exemplo mesmo é a França, o país com maior participação do cooperativismo de crédito. Cerca de 60% dos recursos financeiros (US$ 3,47 trilhões) estão em quatro cooperativas. Entre elas, o Credit Agricole, o maior banco cooperativo do mundo e quinto na lista dos 50 maiores bancos em volume de ativos. O exemplo Dificilmente o Brasil vai conseguir crescer distribuindo renda se o cooperativismo não continuar ampliando seus negócios. De acordo com o Banco Central, 850 cidades no Brasil ainda não possuem nenhuma agência bancária. Em 40% delas há pelo menos uma cooperativa atuando como o único instrumento capaz de oferecer crédito, poupança e outros serviços financeiros. “Além disso, é preciso ter uma visão nacionalista sobre essa questão. Parte do dinheiro aplicado nos bancos privados vai para suas matrizes no exterior. No caso das cooperativas, o dinheiro fica e é reaplicado no Brasil”, completa Sílvio Giusti, gerente de Relacionamento e Desenvolvimento do Cooperativismo de Crédito da Organização das Cooperativas Brasileiras (OCB). A história da Cooperativa de Crédito de São Roque de Minas (Saromcredi) é um exemplo de como o setor está intimamente ligado à melhoria na vida das pessoas. Quem acessa hoje o site da cooperativa tende a achar que tudo ali foi sempre uma maravilha. Dentre as notícias destacadas está um recente incentivo adicional de R$ 50 mil para os que comercializaram café com o grupo. A cooperativa destaca também que oferece até mesmo proteção financeira para os produtores que aplicaram na Bovespa. Mas nem sempre a região teve boas notícias. 40 Locus • Janeiro/Fevereiro/Março 2010 Até hoje a cidade de São Roque de Minas não possui um único banco. Quando procuradas por prefeitos e lideranças das cidades, as instituições financeiras afirmavam que ali não era um local suficientemente atrativo para instalar uma agência bancária. Aos moradores restava enfrentar uma estrada de terra até uma cidade maior. Até que em 1991, João Carlos Leite, com apenas 25 anos, decidiu liderar um grupo de 22 produtores rurais. A ideia nem era tão pretensiosa: ele apenas queria facilitar a compensação de cheques e pagar os benefícios a aposentados e pensionistas do INSS. O sucesso foi tanto que em menos de um ano de funcionamento o grupo passou a realizar ações de curto prazo, como empréstimos pessoais. Hoje a cooperativa conta com cerca de 8,5 mil associados em diversos segmentos econômicos. Detalhe: São Roque possui 6 mil habitantes. Atuando também em outras quatro cidades vizinhas, as operações de crédito da Saromcredi somam quase R$ 32 milhões. Não por acaso o apelido de João Carlos Leite é Joãozinho Messias. “Na época ninguém acreditava que iria dar certo. Confesso que até mesmo eu”, afirma rindo. “Hoje as pessoas se orgulham de viver em São Roque. Temos empresários respeitados e uma vida digna. Lembro-me que no passado o desejo dos mais jovens era ir embora daqui. Agora aparecem de outros lugares”. Ainda há muitas regiões do Brasil que precisam de cooperativas de crédito como a Saromcredi. Os especialistas são unânimes em afirmar que para isso acontecer é preciso vencer dois desafios. Primeiro é preciso aumentar o número de cooperativas de crédito em regiões como Norte e Nordeste. Ao mesmo tempo, a união das cooperativas precisa ser suficientemente grande para que se crie um único sistema de software capaz de interligar os serviços dos vários grupos existentes no Brasil. Só dessa maneira o país verá o surgimento de um gigante financeiro feito por personagens até então considerados pequenos. s u c e s s o Tecnologia para o desenvolvimento Porto Digital completa 10 anos e se consolida como promotor da transformação inovadora de Pernambuco O Porto Digital aproveita o capital humano especializado na área de tecnologia O Bairro do Recife, na Capital de Pernambuco, reúne, em uma ilha de 100 hectares, muitos séculos da história de formação de uma cidade e de um estado. Foi o local de nascimento de Recife, em 1537, e onde a atividade portuária lançou a cidade como dos principais centros comerciais do mundo e uma das mais modernas e importantes capitais brasileiras. Na história recente, o bairro está conquistando igual notoriedade. Há 10 anos, sedia o Porto Digital, considerado um dos maiores e mais importantes parques tecnológicos brasileiros e escolhido pela revista americana BusinessWeek um dos 10 lugares do planeta onde se pensa o futuro do mundo. Os extremos dessa história têm mais em comum do que se imagina. No século XVII, Recife recebeu com a invasão holandesa arquitetos, astrônomos, engenheiros, médicos e artistas, desenvolvendo assim um ambiente favorável ao desenvolvimento cultural e tecnológico. Também foi na ciDivulgação Adriane A lice Pereira dade que se instalou o primeiro observatório astronômico das Américas. Hoje a cidade é berço de um dos ambientes mais inovadores do país e ganha projeção internacional com as ações de referência para desenvolvimento de capital humano, empreendedorismo e inovação. A história desse novo polo nasceu com a excelência da formação do capital humano local. Do Centro de Informática (CIn) da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) começaram a sair, na década de 80, profissionais e pesquisadores com avançada qualificação para a área tecnológica. Na época, essa mão de obra era facilmente absorvida pelas grandes empresas locais, públicas e privadas, que possuíam estruturas próprias de desenvolvimento de soluções em tecnologia da informação e comunicação. Nos anos seguintes, a excelência do capital humano ganhou força com a concentração de mestres e doutores e a formação de uma massa crítica na área. No entanto, com a abertura econômica do final dos anos 90, essa estrutura foi abalada. As grandes empresas instaladas na região se transferiram, fecharam ou foram privatizadas, reduzindo a demanda por mão de obra na área tecnológica. A partir daí, Pernambuco passou a ser um grande exportador de profissionais qualificados, que, sem oportunidades locais, foram atraídos para outros mercados, especialmente na região Sudeste. Foi então que teve início a articulação para criar um ambiente local que pudesse aproveitar esse capital humano especializado. Com a articulação de instituições, empresas, universidades e governos foi fomentada uma nova indústria para Pernambuco: a indústria do conhecimento. Em 2000, essa indústria tomou forma com a Locus • Janeiro/Fevereiro/Março 2010 41 u c e s s o FOTOS: Divulgação s Francisco Saboya, diretor-presidente do Porto Digital: sucesso se deve a um conjunto de fatores Virgínia Adélia Sgotti, da In Forma Software: conquistas alcançadas devido às facilidades propiciadas pelo Porto 42 criação do Porto Digital, que nasceu com quatro empresas e 50 funcionários. Cinco anos depois,, em 2005, foi apontado pela AT Kearney como o maior parque tecnológico do País em número de empresas e faturamento. Em 2007, o Porto Digital foi eleito o Melhor Parque Tecnológico/ Habitat de Inovação do Brasil pela Anprotec, conquistando o Prêmio Nacional de Empreendedorismo Inovador. Hoje são 135 empresas, que geram quatro mil empregos e faturam R$ 500 milhões por ano. O salário médio pago no Porto Digital é de R$ 2,8 mil, três vezes a média da região. Além disso, 46% dos funcionários das empresas instaladas no parque têm até 25 anos. É da ilha de 100 hectares onde está o Porto Digital que sai 3,5% do PIB pernambucano. “Alguns fatores foram fundamentais para essa história de sucesso do Porto Digital. Além de ser fruto de uma articulação entre academia, empresas e governos, o Porto Digital tem um modelo de governança inovador que trabalha para transformar o parque em um ambiente cada vez mais atrativo para as empresas. Além disso, estimula a cooperação e a sinergia, reforçadas pela localização física de um parque tecnológico urbano e aberto. Por fim, contamos com uma política de incentivo fiscal que reduz de 5% para 2% o ISS das empresas instaladas no Porto e oferece isenção de IPTU por 10 anos para os imóveis histó- Locus • Janeiro/Fevereiro/Março 2010 ricos”, elenca Francisco Saboya, diretorpresidente do Porto Digital. Outro diferencial do Porto Digital é a identificação com a história da cidade. Instalado no Bairro do Recife, o parque tecnológico foi o catalisador da transformação da região, que, após um ápice de desenvolvimento, passou por um período de declínio. Com as empresas de tecnologia, o bairro recebeu mais de R$ 50 milhões de investimentos para renovação urbana ao longo da última década. Hoje o bairro possui infraestrutura de serviços e de telecomunicações adequada para a instalação de empresas de TIC. Em 100 hectares, são oito quilômetros de fibra ótica instalados e 26 quilômetros de dutos, tornando a região uma das mais modernas do país. Embarcar para crescer Principais beneficiadas pelo ambiente de inovação e relacionamento do Porto Digital, as empresas incubadas (no Porto chamadas de “embarcadas”) crescem com o apoio da estrutura e dos serviços oferecidos no parque tecnológico. “O Porto Digital nos trouxe oportunidades únicas tanto de negócios, através da promoção de parcerias entre empresas e trazendo potenciais clientes até nós, por meio de visitas ou rodadas de negócio, quanto de capacitação, por programas resultantes de convênios com governos estadual e municipal, além de outras instituições, como o SoftexRecife. Alguns exemplos de programas desse tipo são o Fundo de Capacitação Humana, que nos permitiu investir em cursos e treinamentos para a capacitação da equipe; o programa para certificação no MPS-Br, que nos permitiu obter a avaliação nível “F” deste modelo, e palestras diversas com convidados de renome internacional, dentre outros”, afirma Virgínia Adélia Cordeiro Sgotti, diretora da In Forma Software, primeira empresa que se instalou no Porto Digital, em 2001. Para a Manage4Systems, embarcada no Porto Digital em fevereiro deste ano, a instalação no parque tecnológico irá impul- sionar o crescimento da empresa. “As maiores empresas de tecnologia do estado estão aqui e nós também, pois um dia seremos muito grandes. Além disso, todo o apoio mercadológico e estratégico do Porto é fundamental. Outros pontos positivos são a redução do ISS e a marca do Porto no nosso portfólio de parceiros”, diz Rodrigo Lapenda, diretor da Manage4Systems. O empresário também destaca a interação entre as empresas instaladas no parque. “Tudo de TI em Pernambuco acontece aqui. Você está sempre recebendo informações da administração do Porto e das empresas que aqui estão”, completa Lapenda. Próximos dez anos Para manter a trajetória de sucesso nos próximos anos, o Porto Digital está, novamente, inovando em gestão. No mês de abril, lançará a incubadora C.A.I.S do Porto e o Centro Vocacional Tecnológico do Pilar. A incubadora tem como proposta apoiar projetos voltados para desenvolver soluções focadas nos diversos arranjos produtivos de Pernambuco. “Vamos selecionar estudantes, pesquisadores, empresas ou projetos que proponham soluções aos problemas do setor produtivo do estado. Para ser incubado será necessário mostrar profundo conhecimento da realidade pernambucana. O diferencial é que essa incubadora não será uma fábrica de CNPJs, mas de empreendedores e de produtos qualificados para resolver problemas reais”, explica Francisco Saboya, diretor-presidente do Porto Digital. Já o Centro Vocacional Tecnológico (CVT) do Pilar é um projeto de capacitação da comunidade. São salas completas com computadores, projetores e quadro de giz digital. A primeira turma, de 84 alunos, se forma em maio deste ano, depois de ter acesso a 360 horas de capacitação na área de cultura e turismo. O planejamento para a próxima década reforça o Porto Digital como estrutura de vanguarda no cenário de inovação nacional. Consolidar o esforço para estimular a vocação de TI do parque e promover ins- titucionalmente a sua marca como padrão de referência à inovação são alguns dos pilares dessa nova fase de crescimento. Outro ponto de sustentação do planejamento para os próximos anos é ampliar a integração entre a indústria de tecnologia da informação e os demais setores produtivos. “Desenvolvemos o projeto Porto Desembarca, que promove reuniões em diferentes regiões produtivas do estado, onde falamos sobre a importância da inovação e sobre as soluções desenvolvidas no Porto Digital. Dessa forma, mostramos que a tecnologia contribui para o fortalecimento e para a competitividade das empresas dos setores tradicionais, estimulando assim que elas invistam mais em TIC”, observa Saboya. O Porto Digital também se prepara para integrar a tecnologia da informação e comunicação a outras atividades baseadas no conhecimento e na criatividade, tornandose assim um grande centro brasileiro da chamada economia criativa. Moda, entretenimento, comunicação, cinema, música, games, design e publicidade são alguns dos exemplos de setores ligados a essa nova economia. “São atividades que dependem muito de TIC, que nascem, se desenvolvem e são consumidas por suportes digitais”, acrescenta Saboya. Núcleo de gestão do Porto Digital: aposta em arranjos produtivos de Pernambuco Locus • Janeiro/Fevereiro/Março 2010 43 GESTÃO Relacionamento digital Pequenas empresas também podem utilizar as redes sociais para marcar presença onde o seu púbico está P lanejamento. Essa é a palavra de ordem para as empresas que querem explorar o potencial das redes sociais para alavancar negócios e consolidar parcerias. Diante das diferentes oportunidades oferecidas por essas ferramentas, é fundamental estudar, analisar e se preparar para entrar nesse universo e aproveitar da melhor forma o que ele tem a oferecer. Twitter, Orkut e Facebook são as redes sociais mais conhecidas, de uma lista que não para de crescer. Na Wikipedia pode-se encontrar uma relação com quase 180 delas. No Brasil, as redes sociais perdem em núSHUTTERSTOCK Adriane A lice Pereira mero de acessos apenas para os mecanismos de busca, segundo pesquisa da Serasa Experian Hitwise. Entre abril de 2009 e março de 2010, 15,14% das visitas dos internautas brasileiros foram a redes sociais. Apesar do protagonismo do Orkut, que recebeu 62,14% dos acessos, outras ferramentas do gênero estão ganhando cada vez mais adeptos no Brasil, de acordo com a mesma pesquisa. Desde abril do ano passado, os acessos ao Facebook cresceram 804%. Já o Twitter ampliou em 768% os acessos. As redes sociais lideram o ranking de tempo de visitação. São em média quase 22 minutos gastos por acesso pelos internautas brasileiros nesses ambientes virtuais. As redes sociais também registram números significativos de usuários cadastrados. No Brasil, o Orkut reúne quase 27 milhões de pessoas, pouco mais de 50% de todos os usuários da ferramenta no mundo. Já o Twitter concentra 9 milhões de usuários brasileiros e o Facebook, 3,6 milhões. São milhares de pessoas trocando informações, opiniões e experiências. As redes sociais como ferramenta para os negócios Atentas ao potencial dessas comunidades e à importância de acompanharem esse público, as empresas estão ampliando sua atuação na área. Além de uma oportunidade, estar nas redes sociais é uma necessidade. Mas participar desse ambiente exige conhecimento e preparação. Para as micro e pequenas empresas o desafio é não ficar fora desse movimento, mesmo com recursos e estrutura reduzidos. Apesar das dificuldades, muitas pequenas 44 Locus • Janeiro/Fevereiro/Março 2010 Um dos desafios dessa nova vitrine é saber reagir à opinião pública negativa. “As pessoas falam o que quiserem. Saber lidar com isso, também publicamente, é o grande desafio das empresas. Não é fácil criar a política e moldar a cultura necessária para lidar com essas situações da maneira mais eficiente”, aponta Seixas. A dica do empresário é conhecer e se habituar com as redes sociais, entendendo o perfil de cada uma e, dessa forma, explorar todo seu potencial. “Experimente antes, entre devagar, use-as como plataforma de conversação e não somente como plataforma de divulgação, seja pessoal”, ressalta Seixas. Essa é também a orientação do professor do curso de Comunicação e Marketing da Fundação Armando Alvares Penteado (FAAP/SP), Eric Eroi Messa. “O erro mais comum é considerar as redes sociais como uma mídia tradicional de massa, porém de baixo custo. Assim, as empresas criam campanhas de comunicação de massa para publicar nas redes sociais. Porém, quem quer ver um anúncio publicitário? É preciso criar estratégias diferentes da publicidade tradicional”, explica Messa. Conhecer onde pisa De acordo com Messa, as empresas precisam entender que estar presente institucionalmente nas redes sociais significa abrir um novo canal de comunicação. “E vale lembrar que se trata de um canal bidirecional e público, ou seja, uma espécie de conversa por telefone em que todos podem ouvir o diálogo entre a empresa e seu cliente. A partir dessa consideração, é necessário tomar todas as medidas adequa- Para Fábio Seixas, do Camiseteria, as redes sociais são plataformas de conversação, mais do que de divulgação DIVULGAÇÃO empresas têm se saído bem. O Camiseteria. com, uma loja virtual que vende camisetas, é um exemplo. O grande diferencial do negócio é a forma como os produtos são lançados: os próprios clientes criam as estampas das camisetas e publicam para votação. As melhores viram opções no catálogo da loja. Ou seja, a empresa aproveita o ambiente colaborativo que a internet promove para fomentar o negócio. Além de utilizar-se de sua própria rede social, a empresa usa e abusa de outras ferramentas virtuais para divulgar sua marca e suas camisetas. Tem um dos twitters corporativos mais seguidos no Brasil. Possui site, blog, Twitter, Facebook e Orkut, e ainda está no Sonico, Flickr, Vimeo, YouTube, Meme, Drimio e Foursquare, entre outras. O sócio-fundador da empresa, Fábio Seixas, explica que o Camiseteria sempre busca entender o perfil de cada rede para potencializar seu uso. “No Twitter postamos novidades e links que consideramos interessantes para nosso público. No Facebook apostamos nas enquetes e novidades. No Flickr divulgamos as fotos dos ensaios do Camiseteria. Em todos eles, incluindo o Orkut, fazemos atendimento ao cliente”, explica Seixas. Por ser um negócio na internet, o Camiseteria precisa estar sempre de olho nas novidades, avaliando seu potencial de divulgação. O perfil dos sócios contribuiu para a introdução das redes sociais na empresa. Para ficar sempre por dentro das últimas tendências, a MPE se estruturou. Atualmente, três pessoas trabalham na manutenção da Camiseteria nas redes sociais. Além de pesquisar novas ferramentas, a Camiseteria também monitora os resultados da sua presença nas redes sociais várias vezes ao dia, através de mecanismos que buscam conteúdo sobre o Camiseteria.com. São utilizadas diversas ferramentas de medição e identificação de tráfego para mensurar as vendas geradas em cada rede social. Hoje, o Twitter é responsável por 10% a 12% das vendas da empresa, enquanto o Facebook responde por 3% a 4%. Locus • Janeiro/Fevereiro/Março 2010 45 DIVULGAÇÃO GESTÃO Messa, professor da FAAP/SP: redes sociais atingem diretamente público segmentado das para lidar com esse ambiente”, alerta. Dessa forma, as redes sociais devem ser trabalhadas a favor da empresa. “Muitas empresas brasileiras acreditam que é necessário estar presente nos ambientes de relacionamento digital e se esquecem que mais importante do que a presença é o relacionamento que se estabelece nesse espaço”, lembra Messa. Segundo o professor, outro erro é esperar uma audiência equivalente aos veículos de massa. “É preciso lembrar que a mídia social é uma mídia de atuação segmentada. Ou seja, o foco não é a quantidade, mas a qualidade. A ideia central é impactar apenas o seu consumidor potencial”, destaca o professor da FAAP/SP. Tudo começa com a escolha das redes sociais: a mais indicada para uma empresa é aquela que o seu consumidor utiliza com mais frequência. Isso significa que não se deve escolher a rede por sua popularidade mundial. O Facebook é hoje a rede social mais frequentada em todo o mundo, porém no Brasil ainda não atraiu a atenção das classes populares. “Se o seu produto é focado para os consumidores das classes D Como começar 1) Monitore as redes e identifique onde estão e o que fazem os potenciais consumidores do seu produto/serviço. 2) Fique atento a quem são os potenciais influenciadores das comunidades em que sua empresa pretende atuar. 3) Defina as diretrizes de uso das redes sociais que devem ser seguidas por todos da empresa. 4) Elabore uma estratégia de comunicação adequada para as redes sociais. 5) Implante uma estrutura adequada para manter um relacionamento constante, responder de modo rápido e eficaz e estar pronta para lidar com situações de crise de imagem. Fonte: professor Eric Eroi Messa 46 Locus • Janeiro/Fevereiro/Março 2010 ou E, não há razão para investir em ações de comunicação nessa rede de relacionamento”, exemplifica Messa. Após definir onde irá atuar no ambiente virtual, é importante criar na empresa uma estrutura adequada para trabalhar a nova ferramenta em benefício do negócio. “Sem dúvida é essencial um profissional que seja familiarizado com as redes sociais e que tenha know-how suficiente para saber identificar em que redes e comunidades irá encontrar o consumidor da empresa. Além disso, ele deverá ter capacidade para assumir o papel de porta-voz do perfil digital da empresa”, indica o professor da FAAP/SP. Tomando esses cuidados, as pequenas empresas têm muito a ganhar nas redes sociais. Por meio delas é possível iniciar um relacionamento direto com o seu potencial consumidor e, a partir desse relacionamento, estimular a divulgação do produto pelos próprios usuários da rede. “Por se tratarem de espaços livres e segmentados, as redes de relacionamento aparecem como um ótimo espaço para comunicação de baixo investimento. Estabelecendo um relacionamento próximo e fiel com seu público dentro das redes sociais, os valores que serão agregados à imagem da marca superam as expectativas”, explica Messa. Negócios fora da rede Apesar do crescente potencial das redes sociais para o mundo corporativo, as MPEs brasileiras ainda não mergulharam de cabeça nesse universo. De acordo com um levantamento da empresa de pesquisas GfK Brasil e da Associação Comercial de São Paulo (ACSP), divulgado em março deste ano, apenas 17% das micro e pequenas empresas paulistas possuem cadastro em redes virtuais de relacionamento. A mesma pesquisa também mostrou que 49% das empresas não monitoram o que os internautas escrevem em suas comunidades. A pesquisa foi realizada com 500 empresas da capital paulista de todos os setores. A maior parte dos empreendimentos que usam as redes de relacionamento (26%) é da área financeira, seguida pela de serviços (21%), comércio atacadista (17%), indústria (15%) e comércio varejista (12%). Para a Kombo, incubada do MIDI Tecnológico, de Florianópolis (SC), estar nas redes sociais era uma necessidade diante do perfil do negócio. “Por oferecermos nosso serviço pela internet, sabíamos que precisávamos estar onde nossos clientes estavam. A Kombo teve o início de suas atividades com o boom das redes sociais, então não foi uma decisão tomada num determinado momento, mas sim uma questão de seguir a tendência. Precisávamos apenas estruturar a melhor forma de fazer essa inserção. Quando chegou o momento propício, após o desenvolvimento de nosso produto, começamos o estudo das redes sociais”, afirma a diretora de produto da Kombo, Paula Galvão de Barba. A empresa oferece um software para o gerenciamento de pessoas nas organizações, que pode ser acessado pela internet, e mantém um portal gratuito para captação de currículos. Eles ainda utilizam o Orkut e o Via6 para divulgação de vagas, relacionamento com os usuários do site Currículo e divulgação de material de Recursos Humanos. Apostam no Twitter para divulgação de vagas e de posts dos blogs Kombo e o Yahoo! Respostas para relacionamento direcionado com possíveis usuários do Currículo. Ainda existem os blogs (Candidato e Empresa), em que são divulgados artigos sobre empregabilidade, mercado de trabalho e motivação profissional. Com presença nas redes sociais há cerca de um ano, a empresa já contabiliza os resultados. “Nosso site teve um incremento no tráfego de mais de 80% neste último ano. No geral, percebemos o aumento no número de cadastros, autorrecrutamento em vagas e fidelidade ao uso do site Currículo, em maior parte graças às ações no Twitter e no Orkut”, comemora Paula. O resultado se traduz em lucro para a empresa. Indiretamente, as vendas dos produtos aumentaram, devido ao fortalecimento e à presença da marca na internet. Oportunidades Além de estarem nas redes sociais, muitas empresas estão visualizando nesse modelo de relacionamento uma oportunidade para a criação de novos negócios. A Químea, graduada da Incubadora Tecnológica da Universidade Federal de Santa Maria (RS), criou o Voccie, uma rede social gratuita para a divulgação e troca de informações sobre sustentabilidade e inovação. Em funcionamento desde outubro de 2009, o Voccie possui atualmente quase três mil perfis. “A ideia surgiu da necessidade encontrada pela Químea em interagir com parceiros, fornecedores, clientes e profissionais interessados pelo tema em todo o Brasil”, conta Marçal Paim da Rocha, diretor da empresa. “Já temos notícia de vários casos de parcerias entre os usuários surgidas por meio do Voccie. Inclusive a própria Químea, como usuária, está desenvolvendo parcerias”, conta o empresário. Podem participar do Voccie profissionais, empresas, estudantes, entidades e demais interessados por sustentabilidade e inovação. Também podem ser criados perfis de usuários que desenvolvam ações relacionadas aos temas. “Uma empresa que realiza coleta seletiva pode criar um perfil no Voccie para divulgar essa ação, independentemente do setor em que atua”, exemplifica Rocha. Rocha, da Químea, comemora os resultados da rede social criada pela empresa Locus • Janeiro/Fevereiro/Março 2010 47 c r i a t i v i d a d e Os bastidores do jogo Desafio Sebrae completa 10 anos e bate novo recorde de inscrições. Por trás do sucesso, uma numerosa equipe trabalha para conquistar futuros empreendedores D Divulgação Participantes do Desafio Sebrae Internacional 2009, realizado no Rio de Janeiro urante os próximos meses, cerca de 160 mil universitários brasileiros incluirão entre suas tarefas rotineiras a gestão de uma fábrica de instrumentos musicais. A nova atividade tem como pano de fundo um jogo virtual que conquistou, nos últimos nove anos, quase 600 mil estudantes: o Desafio Sebrae. Focados na competição, aqueles que participam do jogo talvez nem imaginem o trabalho – braçal e intelectual – envolvido na sua criação. Mas esse trabalho existe. E é enorme. O principal QG do Desafio Sebrae está ancorado na Incubadora da Coppe/UFRJ, no Rio de Janeiro (RJ), onde cerca de 20 pessoas se dedicam ao desenvolvimento do jogo. Além dessa equipe, cada unidade estadual do Sebrae destaca dois profissionais para trabalhar no Desafio. A incubadora é parceira do Sebrae desde a edição-piloto, em 2000. Naquele ano, apenas 800 universitários participaram do jogo, que tinha como tema a administração de uma empresa de objetos de mármore. O sucesso foi tanto que no ano seguinte o número de inscritos saltou para 15,3 mil. Após uma década de crescimento constante, mais um 48 Locus • Janeiro/Fevereiro/Março 2010 recorde foi cravado: 158.484 inscritos em 2010. “Não há iniciativa semelhante no mundo, que reúna um numero tão expressivo de participantes em 10 anos. Parte desse sucesso se deve ao fato de o Desafio Sebrae capturar a paixão pela competição e uni-la a outros interesses do público jovem”, afirma o diretor da Incubadora de Empresas da Coppe/UFRJ, Mauricio Guedes. Além da criatividade, o segredo do Desafio Sebrae parece estar no planejamento. Ao final de cada edição o jogo é avaliado e novas metas são traçadas, dando início a um processo de identificação de tecnologias e ferramentas inovadoras que possam ser incorporadas no ano seguinte. “Buscamos ferramentas que estimulem o espírito empreendedor de forma lúdica, tornando a participação no jogo uma experiência importante na aquisição de conhecimento”, explica Marcelo Cunha, assessor de marketing da Incubadora de Empresas da Coppe/UFRJ. Entre os aspectos inovadores, destaque para a verossimilhança alcançada pelo jogo. Enquanto um software instala na máquina dos competidores ambientes propícios à aquisição de informações e tomadas de decisão, outro processa informações e interpreta as consequências que o conjunto de decisões trouxe para o mercado. “Apesar de o jogo ser virtual, a sensação que temos é de estar administrando uma empresa de verdade. O mais importante é saber que o resultado depende do seu esforço, ou seja, do quanto você corre atrás de conhecimento para tomar essas decisões com mais segurança”, explica Bernardo Margotto Gonçalves, estudante de Engenharia Elétrica da Universidade Federal do Espírito Santo e membro equipe que venceu a última edição do Desafio. CULTURA r u n o M o r e s c h i B O Fascinante Império de Steve Jobs, de Michael Moritz l e i t u r a Editora Campus, 320 páginas Um mesmo homem teve papéis decisivos em três grandes revoluções recentes no mundo dos negócios ligados ao entretenimento: a dos computadores, a do cinema de animação e a da música digital. Seu nome é Steve Jobs, o gerente executivo da Apple. A história desse empreendedor criativo e audacioso é o tema do livro O Fascinante Império de Steve Jobs. Para escrever a obra, o autor Michael Moritz teve acesso irrestrito aos bastidores da Apple Computer. Jobs sempre fez questão de incentivar seus funcionários a pensarem da forma mais criativa possível. Com tantos sucessos no currículo, já estava na hora de lançarem uma biografia bem escrita sobre esse empreendedor nato. l e i t u r a Pelé – Minha vida em imagens Cosac Naify, 100 páginas, 109 ilustrações Pelé – Minha vida em imagens é uma merecida homenagem ao jogador brasileiro até hoje lembrado pela sua atuação nos campos e na vida pública. Originalmente lançada na Inglaterra, a obra na versão brasileira é um álbum com muitas fotografias e mais de 10 itens de colecionador. Entre as raridades, o ingresso do jogo de despedida de Pelé. Preste atenção nas fotografias famosas de Pelé, como a clicada pelo artista norte-americano Andy Warhol e a que mostra o craque e o boxeador Muhammad Ali se abraçando. V Í DEO Coleções Biografias - Os Inovadores 3 DVDs, Log On/ Culturamarcas Acaba de ser lançada uma caixa de DVDs com a história profissional de três nomes importantes do empreendedorismo e da criatividade: Henry Ford, fundador da Ford Motor e criador de um conceito de produção em massa que hoje conhecemos como Fordismo; Isaac Newton, cientista que formulou as leis da gravidade, e Bill Gates, criador da Microsoft que transformou o computador em instrumento pessoal. Uma atitude bem pensada foi colocar Newton ao lado de Ford e Gates. A persistência do cientista e seu empenho em provar suas teorias mostram que ele possuía de fato uma personalidade empreendedora. Ouça as canções do CD Sambolero, o novo álbum do pianista João Donato. Entre os vários gêneros que o artista domina no piano há samba, bolero e jazz. Im p e r a t i v o Veja o filme Guerra ao Terror, que conta a história de soldados norteamericanos na guerra do Iraque. Nem todo ano o Oscar deixa um blockbuster como Avatar de lado e premia filmes inteligentes como esse. Fuja do filme Lula – O Filho do Brasil. O roteiro não precisava ser tão novelesco. A história do presidente do Brasil sem o excesso de melodrama já é suficientemente emocionante. Locus • Janeiro/Fevereiro/Março 2010 49 o p i n i ã Divulgação Empreendedorismo, gestores públicos e a mulher de Cesar L Mauricio Guedes* *Mauricio Guedes é diretor da Incubadora de Empresas da Coppe/UFRJ e do Parque Tecnológico da UFRJ e vice-presidente da International Association of Science Parks (IASP). 50 o iderança, inconformismo, persistência e capacidade de planejar e assumir riscos são algumas das características atribuídas aos empreendedores. Erradamente é cultivada a ideia de que o empreendedorismo está associado exclusivamente ao setor privado, vinculando essas características à figura dos empresários. Mas o espírito empreendedor é tão necessário nas instituições públicas quanto nas empresas privadas. Talvez mais. No caso das empresas, o prejuízo causado por uma má gestão é pago pelos sócios; no setor público é pago por todos nós. Na área de Ciência e Tecnologia, o Brasil tem grandes exemplos de gestores públicos que fizeram do empreendedorismo sua marca. Zeferino Vaz, criador da Universidade de Campinas (Unicamp), costumava dizer: “O pior inimigo da boa universidade é a transigência com a mediocridade”. Baseado nessa premissa, Vaz lançou as bases daquela que se tornaria uma das maiores instituições de ensino e pesquisa da América Latina. No Rio de Janeiro, outro empreendedor foi responsável, ainda na década de 1960, pela criação dos programas de pós-graduação em Engenharia no Brasil: Alberto Luiz Coimbra. Determinado a romper paradigmas da universidade naquela época, ele foi aos Estados Unidos analisar os cursos oferecidos pelas principais instituições americanas. Em 1963, fundou a Coordenação dos Programas de Pós-graduação de Engenharia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (Coppe/ UFRJ), modelo que foi replicado com sucesso em diversas universidades do país. Um professor me contou que ao ser contratado pelo Coimbra, nos primórdios da Coppe, ouviu o seguinte conselho: “Acho que você de- Locus • Janeiro/Fevereiro/Março 2010 via comprar um par de tênis”. E diante da surpresa, a explicação: “Durante as férias você pode vir trabalhar de tênis”. A presença do Coimbra hoje na Coppe, rara e silenciosa, nos faz pensar nos desafios por ele enfrentados e revigora os princípios que são a alma da instituição. Vaz e Coimbra são dois expoentes de um universo de empreendedores públicos brasileiros. Suas ações empreendedoras se refletiram em organizações mais eficientes, modernas e inovadoras. Nesse time de campeões estão, entre outros, Osvaldo Cruz, Vital Brazil, Carlos Chagas, José Pelúcio Ferreira e, para não ficar somente nos que já se foram, eu escalaria, além do Coimbra, Lynaldo Cavalcanti, Carlos Alberto Schneider e Silvio Meira. Todos eles construíram instituições públicas que fizeram e fazem a diferença, deixando nelas a marca do empreendedorismo. O Brasil precisa de mais gestores e instituições públicas que adotem essa postura empreendedora. Precisamos de organizações dispostas a superar obstáculos, correr riscos, inovar e, assim, contribuir de fato para o desenvolvimento sustentável do país. Nos dias de hoje, em que às vezes fica parecendo que tem gente que acha que a única solução para a preservação da moralidade no setor público é a paralisia das organizações, não seria uma má ideia criar mais um tribunal. Um tribunal para controlar a eficiência e a eficácia das instituições públicas. Ah, e a mulher de Cesar? Pouco se sabe sobre ela (acabei de descobrir na internet que se chamava Pompeia Sula), mas parece que era honesta. É um bom começo, um pré-requisito, mas não é mais do que isso. Não sabemos se seria uma boa gestora pública. ambiente da inovação brasileira Janeiro/Fevereiro/Março 2010 no 59 • Ano XV Para tirar do papel Universidades produzem milhares de pesquisas com potencial para se transformar em produtos inovadores. Mas as questões relacionadas à propriedade intelectual ainda travam o caminho entre o laboratório e o mercado Negócios Em expansão, o mercado esportivo demanda Pesquisa e Desenvolvimento Investimento Como o cooperativismo de crédito pode alavancar MPEs