XXXII ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUCAO Desenvolvimento Sustentável e Responsabilidade Social: As Contribuições da Engenharia de Produção Bento Gonçalves, RS, Brasil, 15 a 18 de outubro de 2012. ANÁLISE COMPARATIVA ENTRE AS DEPRECIAÇÕES ECONÔMICA, CONTÁBIL E REAL Reinaldo Pacheco da Costa (USP) [email protected] Abraao Freires Saraiva Junior (USP) [email protected] O uso da depreciação na contabilidade e na engenharia econômica envolvem cálculos complexos e muitas vezes inter-relacionados. São discutidos neste artigo três tipos de depreciação: real, econômica e contábil, e seus principais dispositivoss de cálculo. Metodologicamente, o artigo é trabalhado a partir de uma pesquisa bibliográfica sobre publicações dos campos de Economia, Contabilidade, Engenharia Econômica e Engenharia de Produção, culminando na realização de um ensaio teórico-conceitual e na apresentação de exemplos didáticos para facilitar a compreensão dos três tipos de depreciação discutidos. Para o cálculo da vida econômica, propõe-se um cálculo original usando diferentes sentidos para a depreciação, de forma a expressar o adequado cálculo da reposição econômica de um bem de capital (investimento) com o seu uso Palavras-chaves: Depreciação contábil, depreciação econômica, depreciação real, vida econômica XXXII ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUCAO Desenvolvimento Sustentável e Responsabilidade Social: As Contribuições da Engenharia de Produção Bento Gonçalves, RS, Brasil, 15 a 18 de outubro de 2012. 1.1. 1. Introdução Depreciação é um termo que possui muitos significados e pode ser considerada como custo ou despesa decorrentes do desgaste, obsolescência ou do custo econômico dos ativos imobilizados (máquinas, veículos, móveis, imóveis e instalações) da empresa. As depreciações são conceitos ligados a desembolsos cujos efeitos ocorrerão ao longo de vários períodos futuros. Em termos contábeis, o cálculo da depreciação obedece aos critérios determinados pelo governo, através da Secretaria da Receita Federal, art.305 do RIR/99, que estipula diferentes prazos para depreciar máquinas, veículos, móveis e imóveis para aquelas empresas que auferem lucros e farão uso da depreciação como abatimento "artificial" dos seus resultados a oferecer à arrecadação tributária (Imposto de Renda Pessoa Jurídica - IRPJ). Para estabelecer o conceito econômico de depreciação, citemos dois insuspeitos economistas. Primeiro KEYNES ([1936] 1982; pg. 115): Quando um indivíduo obtém um investimento ou um bem de capital, adquire o direito ao fluxo de rendas futuras que espera obter da venda de seus produtos, enquanto durar este capital, feita a dedução das despesas correntes necessárias à obtenção dos ditos produtos [...]. Em contraste com a renda esperada do investimento, temos o preço de oferta do bem de capital [...], que por vezes se chama custo de reposição. A reposição dos investimentos deve ser atribuída aos produtos pela depreciação causada pelo seu uso. Estes valores devem ser provisionados pela empresa para obter de volta o valor atualizado do investimento ao se desfazer/vender este bem de capital. Em linguagem atual, poderíamos afirmar, junto a Keynes (1982), que o emprego de um bem de capital, durante certo período de tempo, acarreta dois custos econômicos: depreciação e juro do capital empregado. O segundo economista nos dá uma verdadeira aula de engenharia econômica há 150 anos, com este pequeno trecho sobre depreciação do capital fixo e a sua apropriação ao produto: “[...] Essa parte do capital constante [os meios de trabalho desgastados na produção] (grifo autores) cede valor ao produto na proporção em que perde, com seu valor de uso, o valor de troca”. As diferenças de “forma” (MARX, [1867] 1980, Livro II, Cap. VIII, p. 164). Costuma-se utilizar o termo depreciação também para representar esse “desgaste” econômico. Depreciação, portanto, tem mais de um sentido e pode ser dividida em três grupos: depreciação real, depreciação contábil e depreciação econômica. Este último significado se desdobra, pois tem sentido tanto econômico quanto financeiro e recebe efeito também pela depreciação contábil (inter-relacionamento entre conceitos). A depreciação real está relacionada com a vida física e a vida útil do ativo com efeitos no custo do investimento a ser considerado em vários tipos de análises, enquanto que a depreciação econômica está ligada à vida econômica “ótima” do ativo e é função de uma série de fatores, entre os quais o compromisso, ao longo da vida do ativo, entre custos operacionais crescentes manutenção e operação, e o custo de manter a propriedade do ativo decrescente (valor residual de mercado). Estes dois conceitos de depreciação, portanto, são estabelecidos por artefatos de engenharia econômica. A depreciação contábil, por sua vez, está ligada à apuração formal de lucros exigida pela legislação do país. É um artifício utilizado para transformar, economicamente, um “estoque” em “um fluxo”; ou, no caso de depreciação contábil, um investimento com vida contábil estabelecida em lei, em despesa anualizada. A tributação do país permite o artifício da depreciação contábil 2 XXXII ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUCAO Desenvolvimento Sustentável e Responsabilidade Social: As Contribuições da Engenharia de Produção Bento Gonçalves, RS, Brasil, 15 a 18 de outubro de 2012. para a apuração final dos lucros da firma. O lucro tributável retira da receita de uma empresa as despesas gerais (administração, comercialização, entrega de mercadorias), custos totais industriais (incluindo variações de estoques) e a depreciação (contábil) do capital fixo (investimento). Como o entendimento destes conceitos leva a cálculos complexos e algumas vezes interrelacionados, este artigo tem a finalidade de apresentar e discutir os principais conceitos de depreciação e algumas de suas importantes formas de cálculo. A partir de um ensaio teóricoconceitual, nos termos de Filippini (1997), são discutidos os três tipos de depreciação: real, econômica e contábil, além de seus principais dispositivos de cálculo através de exemplos didáticos. O último exemplo, original, propõe o uso de diferentes sentidos para depreciação de forma a expressar o adequado cálculo da reposição econômica de um bem de capital (investimento) com o seu uso. Além da corrente introdução, o artigo é estruturado a partir da metodologia utilizada no estudo. Em seguida, é realizado um ensaio teórico-conceitual sobre os tipos de depreciação e são apresentados exemplos didáticos. Finalmente, são expostas as conclusões dos autores. 2. Metodologia A primeira parte do estudo consistiu na realização de uma pesquisa bibliográfica que, no entendimento de Gil (2002, p.44), pode ser “desenvolvida com base em material já elaborado, constituído principalmente de livros e artigos”. A pesquisa bibliográfica realizada no corrente estudo envolveu a busca de publicações acadêmicas, dos campos da Contabilidade, da Economia, da Engenharia de Produção e da Engenharia Econômica, que abordassem o tema “depreciação”. De posse do arcabouço teórico prospectado, passou-se a realizar um ensaio teórico-conceitual sobre os tipos de depreciação. De acordo com Filippini (1996), o ensaio teórico-conceitual pode ser entendido como a realização de discussões conceituais a partir da literatura, revisões bibliográficas; e de modelagens conceituais, baseadas na percepção e experiências do(s) autor(es). Finalmente, para facilitar a compreensão da aplicação dos conceitos de depreciação, são apresentados exemplos didático-ilustrativos. 3. Ensaio teórico-conceitual 3.1 Análises econômicas vs tipos de depreciação Façamos primeiro um exame de cada tipo de depreciação considerando seus conceitos relativos à duração temporal (vida) e a algumas importantes análises econômicas, financeiras e contábeis que podem ser daí derivadas, como mostra o Quadro 1: tipos de Depreciação VIDA DO ATIVO FÍSICA ÚTIL uso funcional CONTÁBIL REAL ECONÔMICA CONTÁBIL ECONÔMICA lucro substituição, renovação e reparo Quadro 1 - análise do tipo de depreciação vs vida do ativo Fonte: Autores 3 XXXII ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUCAO Desenvolvimento Sustentável e Responsabilidade Social: As Contribuições da Engenharia de Produção Bento Gonçalves, RS, Brasil, 15 a 18 de outubro de 2012. A depreciação contábil utiliza a vida contábil para no cálculo do desconto do lucro tributário determinado por regulamentos do órgão arrecadador do país. No caso brasileiro, por exemplo, o lucro aqui referido trata-se do Lucro Líquido Antes dos Impostos Incidentes sobre Renda (LLAIR). O cálculo é obrigatório para a efetiva determinação do lucro a ser tributado que permite o abatimento da depreciação dos ativos fixos. É a transformação, para o Fisco, dos investimentos em custos/despesas. A depreciação real utiliza os conceitos de vida útil e vida funcional, definidos como o período de tempo em que o bem de capital (investimento) continua desempenhando satisfatoriamente suas funções (ainda dentro da vida física). A vida útil depende do projeto do equipamento, da operação adequada, da manutenção, do obsoletismo, etc. Exemplos de tomada de decisão gerenciais que envolvem a depreciação real são os de cálculo da vida útil de um equipamento quando cai a demanda de seus produtos - típica depreciação funcional. Outro cálculo de depreciação real como veremos mais adiante, é o de como apropriar o custo do uso do bem de capital (investimento) nos produtos. Neves (1982) define a vida econômica de um equipamento como o momento ótimo para substituir determinado equipamento por outro similar nas mesmas condições de operação e de custos iniciais, corrigindo-se, a desvalorização da moeda, ou seja, efeitos da inflação e do câmbio, por exemplo. 3.2 Tipos de depreciação A depreciação contábil é um abatimento (fluxo) no lucro tributável devido ao investimento realizado (estoque de capital) permitido pela legislação em vigor. Os outros sentidos de depreciação (real e econômica), cujos cálculos são estabelecidos pela engenharia econômica, impactam análises que vão desde: i)- cálculo do custo do investimento nos produtos e serviços utilizado, por exemplo, para apoiar a formação de preços e o cálculo do valor econômico adicionado (economic value added - EVA); ii)- cálculo para apurar a rentabilidade de produtos e serviços; e iii)- cálculo do custo uniforme equivalente mínimo, que faz o cálculo da vida econômica ao analisar a substituição, renovação e reposição de ativos fixos. 3.2.1. Depreciação contábil A tributação do país permite o artifício da depreciação contábil para a apuração real dos resultados da firma industrial. Para o cálculo do lucro tributável com finalidade de pagamento de IRPJ, permitem-se retirar da receita bruta (descontada dos impostos indiretos) despesas gerais (administração, comercialização, entrega de mercadorias), custos totais industriais (incluindo variações de estoques) e depreciação (contábil) do capital fixo (investimentos). Para fins tributários, a somatória de todo o Capital Fixo – equipamentos e máquinas-, ainda não depreciados contabilmente, representa o Ativo Fixo de determinado período (anual, por convenção). A depreciação contábil consiste em lançamentos feitos em cada período, de forma a distribuir a perda do valor do ativo durante sua vida útil. Supondo um grau constante de utilização de um bem de capital, a depreciação contábil é função apenas do tempo. A depreciação contábil envolve o cálculo da depreciação do ativo imobilizado diretamente empregado na produção, e será apropriado como custo, pois os ativos que não forem usados diretamente na produção terão suas depreciações contabilizadas como despesa. A depreciação promove a capitalização das empresas para quando o objeto que está sendo usado ser substituído no seu descarte, fazendo a entidade 4 XXXII ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUCAO Desenvolvimento Sustentável e Responsabilidade Social: As Contribuições da Engenharia de Produção Bento Gonçalves, RS, Brasil, 15 a 18 de outubro de 2012. "poupar" recursos que seriam provavelmente distribuídos aos sócios ou acionistas, já que o lucro contábil da entidade, que será distribuído "monetariamente", foi reduzido por um efeito contábil "não monetário", através do desconto da depreciação, e assim, capitalizou a empresa no exato valor lançado nesta rubrica, através do lançamento a débito do patrimônio na Despesa com Depreciação. Mostremos a influência do IRPJ da empresa através do Exemplo Didático (1). Exemplo Didático (1): Uma empresa está estudando a aquisição de um equipamento que custa $100 mil. A receita líquida após impostos indiretos esperada é de $ 50 mil, e o custo operacional é de $ 20 mil por ano durante toda a vida física estimada em 8 anos, quando se calcula se o equipamento poderá ser vendido por $40 mil (valor residual). A vida contábil legal é de 5 anos. Montar a tabela de fluxo de caixa após IR (alíquota de IR = 30%), e calcular a taxa interna de retorno antes e depois do cálculo do IRPJ devido. O Quadro 2 monta a estrutura do fluxo de caixa após o IRPJ: Investimento 0 1 2 3 4 5 6 7 8 -100 40 Receita Custo Lucro Fluxo antes Depreciação Contábil Lucro líquida Bruto -100 Tributável 50 -20 30 30 -20 10 50 -20 30 30 -20 10 50 -20 30 30 -20 10 50 -20 30 30 -20 10 50 -20 30 30 -20 10 50 -20 30 30 30 50 -20 30 30 30 50 -20 30 70 70 Quadro 2 - Solução do exemplo didático 1 (valores em $1000) Fonte: autores IRPJ -3 -3 -3 -3 -3 -9 -9 -21 Fluxo após IRPJ -100 27 27 27 27 27 21 21 9 Ressalte-se que o fluxo de caixa livre após IRPJ não retira a depreciação, pois seria “dupla contagem” já que está sendo considerado o valor inicial do bem de capital (investimento) no início do fluxo. A depreciação entrou no cálculo apenas abatendo o lucro tributável para o cálculo do IRPJ devido. A taxa interna de retorno antes do imposto de renda é de 27% a.a., enquanto a taxa depois do imposto de renda seria de 18% a.a. Observação importante é que após os cinco (5) primeiros anos, o ativo foi depreciado contabilmente, mas continua ativo, pois sua vida útil foi estabelecida para os oito (8) anos, quando seria então vendido como valor residual. 3.2.2 Depreciação real A depreciação real refere-se à perda de valor (econômico) do ativo devido ao seu uso e inevitável desgaste. A depreciação real está ligada às vidas física, útil ou funcional que o Capital Fixo (Investimento) possui. Para Fadigas (2006; p. 23), “os elementos que constituem o ativo fixo da empresa – equipamentos, edifícios, instalações etc., sofrem uma perda de valor com o uso ou com o passar do tempo. Esta perda de valor não recuperada pelos serviços de manutenção é denominada de depreciação real”. A depreciação real pode ser por uso ou funcional. A depreciação “por uso” decorre da ação de elementos como: choque, vibração, abrasão etc.; deterioração – ação de componentes químicos como corrosão, decomposição química, etc.; 5 XXXII ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUCAO Desenvolvimento Sustentável e Responsabilidade Social: As Contribuições da Engenharia de Produção Bento Gonçalves, RS, Brasil, 15 a 18 de outubro de 2012. desgaste, deterioração, exaustão ou manutenção excessiva dos ativos fixos; por acidentes ou combinação de fatores. Já a depreciação “funcional” decorre da obsolescência, por exemplo, ou de situações independentes do ativo fixo resultantes das alterações das condições normais de sua operação, levando a retirar de serviço, muitas vezes, equipamentos ainda de funcionamento satisfatório. A depreciação funcional também é resultante de inovações tecnológicas ou por inadequação ou insuficiência resultante de incapacidade produtiva do ativo fixo para executar os serviços, por várias causas (aumento ou queda da demanda; mudança de processos, etc.). É difícil determinar o valor da depreciação (econômica) real ao longo do tempo, pois somente nos casos em que há um mercado de equipamentos usados, como o de automóveis, por exemplo, é possível ter uma ideia da variação do seu valor, no tempo. Lembremos de Marx ([1867] 1980, Livro II, Cap. VIII, p. 164), que afirma que o desgaste do capital fixo “cede valor ao produto na proporção em que perde, com seu valor de uso, o valor de troca”. Dois exemplos de cálculo de depreciação real são apresentados: i)- cálculo da vida útil quando há queda de demanda; e ii)- cálculo da apropriação do custo de uso de um bem de capital ao produto, ou seja, do custo do investimento. Exemplo didático 2 (vida útil): uma linha de fabricação de equipamentos sofre uma redução de vendas e custos crescentes de manutenção, prevendo-se, para os próximos três anos, as receitas líquidas e os valores residuais do equipamento do Quadro 3, a seguir. Neste caso a vida útil se reduziria devido à queda de demanda e se trata de um sentido de vida econômica, também conhecido como problema da baixa sem reposição (CASAROTTO FILHO; KOPITTKE, 2010). Quadro 3 – Dados do exemplo didático 2 Fonte: autores Sabendo-se que hoje o valor de mercado é $ 300, e que a taxa de mercado é 6 % ao ano (supondo igual à taxa atrativa mínima), quando deverá ser encerrada a produção? Observe-se que foram usados os conceitos de valor residual de mercado ao longo da vida física e da queda da receita (diminuição da demanda ao longo do tempo), como mostra o Quadro 4: Período t (1+i) Receita Líquida Valor Residual VA receita VA valor residual VAL 0 1 2 3 1 1,06 200 250 189 236 425 1,12 150 200 133 178 500 1,19 90 120 76 101 498 300 0 300 300 Quadro 4 – Solução do exemplo didático 2 pelo método do valor atual líquido Sabemos que, usando o valor atual liquido (VAL) ou valor presente líquido (VPL), para as comparações, não precisaremos explicitar os investimentos feitos para igualar as durações de 6 XXXII ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUCAO Desenvolvimento Sustentável e Responsabilidade Social: As Contribuições da Engenharia de Produção Bento Gonçalves, RS, Brasil, 15 a 18 de outubro de 2012. tempo (SAMANEZ, 2009). Os cálculos podem ser facilmente sistematizados numa planilha, como mostra o Quadro 4. Vemos que a melhor alternativa (vida econômica útil que apresenta o melhor valor atual líquido), é dar baixa no fim do ano 2, pois neste período se apresenta o melhor VAL. Exemplo didático 3 (custo de uso de um bem de capital - custo do investimento): Conforme Fadigas (2006), o cálculo do custo de uso de um bem de capital se relaciona à questão da recuperação do capital investido. O emprego de um bem de capital durante um determinado período de tempo acarreta dois custos econômicos: depreciação e juros (remuneração) do capital investido. O custo de uso do bem neste período, conforme Fadigas (2006) é o custo anual equivalente (CAE) que independe da sequencia das depreciações, e sim do valor inicial, do valor final e da taxa de juros. Apresentemos a fórmula de cálculo do CAE: j (1 j ) n CAE (V0 Vn ) jVn (1 j ) n 1 Para Fadigas (2006), o CAE é composto de duas parcelas, sendo a primeira correspondente à prestação necessária para amortizar a parcela (V0 - Vn) que se depreciará no n-ésimo período de uso, e sendo a segunda os juros da parcela (Vn) que se mantém inalterada durante toda a vida do bem. Façamos um exemplo didático para mostrar como calcular o custo do investimento a ser apropriado ao produto/serviço, utilizando a fórmula de cálculo do CAE. Exemplo didático 4: Considere um produto (um software) que teve um investimento em análise e desenvolvimento total de $ 5.000.000 (Vn). O ciclo de vida considerado deste produto é de 10 anos (n) e a taxa de atratividade (tma) de 20% a.a. (mercado de alta rentabilidade), custo operacional unitário (cut) (embalagens etc.) de $1.500/unidade, e vendas de 5000 unidades por ano. Formar o custo total unitário (cut) do produto que soma o custo operacional unitário ao custo do investimento aplicado ou seja, responder: como considerar o investimento no custo de um produto? Utilizando a fórmula de cálculo do CAE, temos: Observe-se que o custo do investimento representa 18% do custo total do produto. 3.2.3 Depreciação econômica A depreciação econômica, por sua vez, está ligada à vida econômica de um ativo, ou seja, a vida efetiva de serviço igual ou menor do que a vida física máxima, que fornece o custo anual uniforme equivalente mínimo (FLEISCHER, 1973). A depreciação econômica é função de uma série de fatores, entre os quais estão, principalmente, do compromisso, ao longo da vida do ativo, entre custos operacionais crescentes - manutenção e operação, e custos decrescentes para manter a propriedade do ativo. Casarotto Filho e Kopittke (2010) mostra a definição de vida econômica tendo como exemplo dois tipos de ativos fixos: de eficiência decrescente e vida útil previsível; e de eficiência constante e vida útil imprevisível. No primeiro caso, com o passar do tempo, o ativo vai se desgastando pelo uso e os custos de manutenção vão aumentando, ao passo que o seu valor de venda no mercado vai diminuindo. Chegamos então a uma situação em que não é 7 XXXII ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUCAO Desenvolvimento Sustentável e Responsabilidade Social: As Contribuições da Engenharia de Produção Bento Gonçalves, RS, Brasil, 15 a 18 de outubro de 2012. economicamente interessante continuar usando o equipamento e, embora ele ainda tenha um desempenho adequado, devemos dar baixa do mesmo, isto é, cessar de operá-lo. Dizemos que ele atingiu o fim da sua vida econômica. Problemas deste tipo são designados como problemas de substituição. No segundo caso, o equipamento mantém a sua eficiência até que falha repentinamente, de modo imprevisível e aleatório. Como esta falha pode causar prejuízo, pode ser economicamente interessante substituí-lo antes que falhe (manutenção preventiva). Problemas deste tipo serão designados como problemas de reposição. Mostremos exercícios sobre a vida econômica através do exemplo didático 5. Exemplo didático 5 - Vida de mercado e vida econômica: Uma locomotiva da marca Z custa nova $ 1.000.000. Estima-se que os valores de mercado (valores residuais) e custos de manutenção são os mostrados no Quadro 5, a seguir. Supondo que a taxa de juros é 6% a.a., em que período (vida econômica) o equipamento deve ser substituído por outro novo, do mesmo modelo? Anos de uso [ t ] 0 0 Preço [$1000] 1000 1 Valor de mercado [$1000] 2 Custo de manutenção [$1000] (1 + i)t => i = 6% aa 3 4 5 6 7 1 800 30 2 3 4 700 600 500 50 60 80 5 6 7 400 100 300 120 200 200 1,97 152 61 278 309 75 2,21 90 90 368 300 66 1,12 1,25 1,4 1,57 1,76 VA de (1) 714 558 427 318 227 VA de (2) 27 40 43 51 57 Acumulado de (4) 27 67 109 160 217 VA (t) = 0 + 5 - 3 313 282 316 333 330 CAE (t) (6) 350 167 131 110 91 Quadro 5 - Solução do exemplo didático 5 (em $1000) Fonte: autores Utilizando o CAE, temos a vida econômica de 7 anos, e o valor econômico de $ 66.000 no ponto de valor mínimo. 3.3. Depreciações e o cálculo da reposição econômica Esta seção integra as análises considerando vida contábil, vida útil e vida econômica. Dois conceitos de depreciação se aplicam às máquinas e aos equipamentos em geral. O primeiro descreve a perda de valor do equipamento com o tempo. O segundo refere-se ao plano sistemático destinado a recuperar o capital investido no ativo fixo. Exemplificando os dois conceitos, suponhamos que uma determinada máquina seja adquirida por Vt ($). Decorridos t anos, a máquina, já bastante usada e a exigir cada vez mais manutenção e reparos, não consegue obter preço de venda superior a Vr($) no mercado. Diz-se que a máquina depreciou de Vt (custo ou investimento inicial) ao valor residual (Vr). Se o proprietário tiver colocado em um fundo um valor durante cada um dos t anos, será possível (pelo menos teoricamente) adquirir uma nova máquina ao cabo desse período (observemos que este conceito envolve o lado econômico e o lado financeiro, mas não o lado contábil-fiscal). Façamos análise do caso em que o valor residual de mercado entre na análise de forma a não só compor o lucro contábil por venda do veículo acima 8 XXXII ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUCAO Desenvolvimento Sustentável e Responsabilidade Social: As Contribuições da Engenharia de Produção Bento Gonçalves, RS, Brasil, 15 a 18 de outubro de 2012. do valor contábil, mas também que possa ser expresso o benefício fiscal da depreciação contábil no abatimento do lucro tributável. Exemplo didático 6 (vida contábil, valor residual de mercado e vida econômica): considere o pagamento do IR (alíquota de 25% - com abatimento da depreciação contábil no lucro tributável com vida de cinco anos). Observe que existem dois tipos de efeitos do pagamento do imposto de renda: i) - a depreciação do investimento pode ser abatida do Lucro Bruto; e ii) - pode existir lucro contábil pela venda do ativo fixo no período (COSTA, 1996). Dados do problema: Fator que transforma valor presente em série uniforme, dados o juro (i) e períodos (n). Lembremos que se trata do conceito de custo anual equivalente (CAE) ou conhecido como tabela price: O modelo de cálculo do CAE(n) pode ser representado, em termos discretos, conforme equação a seguir: Podemos reescrever a equação (1) introduzindo o desconto da depreciação no pagamento do IRPJ - devido ao investimento P(0); e acrescentando o pagamento do imposto de renda devido ao lucro tributável [P(0) - V(n)], pela venda do ativo no mercado. Para tal, calculamos, primeiramente, a valor presente: Esta última equação representa a transformação do valor presente, de cada ciclo, em custo anual equivalente - CAE. Lembrar que o desconto em questão somente se aplica a empresas geradoras 9 XXXII ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUCAO Desenvolvimento Sustentável e Responsabilidade Social: As Contribuições da Engenharia de Produção Bento Gonçalves, RS, Brasil, 15 a 18 de outubro de 2012. de Imposto de Renda sobre lucros. O Quadro 6 resume a aplicação do cálculo da vida econômica aos dados apontados, conforme modelo proposto, utilizando o critério do custo anual equivalente: (1) (2) (3) (4) (5) (6) VALOR AQUISICAO: DEPRECIACAO ANUAL: TAXA ANUAL (tma % a.a.): TAXA IR: ANO [t] VALOR DE MERCADO CUSTO DE MANUTENCAO 1 800 30 1000 20% ( 5 anos) 12% 25% 2 3 700 600 50 60 4 500 80 5 400 100 6 300 120 7 200 200 (7) = (5) / (1 + tma)t (8) = (6) / (1 + tma)t (9) = (1) * (2) (10) = (1)-t.(9) (11) = (9) (12) = (11) * (4) VP do valor de mercado 714 558 427 318 227 152 90 VP custo de manutencao Depreciacao contábil anual Valor Contabil Base imposto (benef fiscal) IR sobre depreciacao (receita) 27 200 800 200 50 40 200 600 200 50 43 200 400 200 50 51 200 200 200 50 57 200 0 200 50 61 90 0 0 0 0 0 0 (13) = (12) / (1 + tma)t (14) = (5) - (10) (15) = (14) * (4) VP de IR sobre depreciacao Lucro contabil IR sobre lucro contabil (custo) 45 0 0 40 100 25 36 200 50 32 300 75 28 400 100 0 300 75 0 200 50 (16) = (15) / (1 + tma)t VP de IR lucro contabil 0 20 36 48 57 38 23 RESULTADOS (em valores presentes) (1) (8) acumulado (12) (7) (16) (17) CAE (t) do VP (t) APÓS 1 ANO 2 ANOS 3 ANOS 4 ANOS 5 ANOS 6 ANOS 7 ANOS Valor aquisicao (+) valor manutencao acum (-) IR depreciacao (ganho) (-) valor mercado (+) IR s/ lucro cont (=) Valor presente (t) Custo anual equivalente 1000 27 50 714 0 263 294 1000 67 50 558 20 479 283 1000 109 50 427 36 668 278 1000 160 50 318 48 840 277 1000 217 50 227 57 997 276 1000 278 0 152 38 1164 283 1000 368 0 90 23 1300 285 Quadro 6 - Custo anual equivalente ($/ano) no período t Fonte: autores O cálculo do CAE mínimo nos mostra uma vida econômica de cinco anos. Pergunta que se impõe é: sempre a introdução do desconto da depreciação pode diminuir a vida econômica que corresponde ao mínimo CAE de um ativo, ou mesmo antecipá-la, como foi o caso em relação ao exercício anterior que não considerava o efeito contábil? O valor econômico sem dúvida diminui - o CAE em seu ponto de mínimo -, pois a parcela de desconto do IR sobre lucros devido à depreciação é sempre maior que a parcela de IR paga sobre lucro tributável devido à venda do ativo; salvo se houvesse um descolamento muito grande a favor do preço de mercado em relação ao valor contábil - o que é impossível, pois o Valor Contábil sempre “parte” do preço de aquisição P(0). 4. Conclusões O artigo discutiu, em termos teórico-conceituais, as diferenças entre os três tipos de depreciação: contábil, econômica e real. Além disso, através de exemplos didáticos, os principais dispositivos de cálculo relacionados com as depreciações foram abordados. Desta forma, o objetivo do estudo foi alcançado. O estudo apresenta, além de discussões sobre os tipos de depreciações e análises sobre o cálculo do lucro tributável usando a vida contábil, cálculos sobre vida útil, o custo do investimento apropriado a produtos/serviços e a influência do estímulo fiscal proporcionado pela legislação em 10 XXXII ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUCAO Desenvolvimento Sustentável e Responsabilidade Social: As Contribuições da Engenharia de Produção Bento Gonçalves, RS, Brasil, 15 a 18 de outubro de 2012. vigor na vida econômica de um ativo, que envolve a inter-relação de vários conceitos de depreciação (depreciação contábil, vida útil, valor residual e vida econômica). Com isto, foi demonstrado que a vida econômica pode ser antecipada com o cálculo adequado que inclui o efeito da depreciação contábil na substituição econômica de um ativo. Outra constatação é a de que este incentivo oferece a possibilidade de se operar com ativos de menor custo operacional, o que permitirá operações mais eficientes e econômicas. A consideração do estímulo fiscal dado pelo abatimento da depreciação de investimentos no pagamento do imposto de renda, portanto, deve ser levada em consideração na análise de substituição de ativos, com significativa melhoria de resultados tanto na produtividade sob o ponto de vista microeconômico quanto macroeconômico. Finalmente, idealiza-se que este estudo contribua como um referencial para outras pesquisas sobre depreciação, principalmente no que tange a interface da Engenharia de Produção com o campo da Engenharia Econômica. Referências CASAROTTO FILHO, N. & KOPITTKE, B.H. Análise de investimentos: matemática financeira; engenharia econômica; tomada de decisão; estratégia empresarial. 11.ed. São Paulo. Atlas, 2010. COSTA, R.P. O lado contábil da substituição econômica. 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