ATOS ATÍPICOS NA INFORMATIZAÇÃO E NECESSIDADE DE INSERÇÃO
DO PROCESSO ELETRÔNICO NO FUTURO CPC
José Carlos de Araújo Almeida Filho1
Delton R. S. Meirelles2
I. INTRODUÇÃO. II. A TEORIA DOS ATOS PROCESSUAIS E A
INFORMATIZAÇÃO JUDICIAL. OS ATOS ATÍPICOS. II.1. OS ATOS
INFORMÁTICOS
E
O
NOVO
SUJEITO
PROCESSUAL.
III.
REGULAMENTAÇÃO POR LEI ESTADUAL? IV. NECESSÁRIA INSERÇÃO
DA INFORMATIZAÇÃO JUDICIAL NO FUTURO CPC. V. CONCLUSÃO.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
I. INTRODUÇÃO
Um dos desafios das reformas legislativas processuais é conciliar
tradição/cultura jurídica com a realidade social contemporânea e as exigências de uma
sociedade em constante mutação. E, no atual cenário pós-moderno em que a
interdisciplinaridade e o intercâmbio das instituições judiciárias com a economia e a
tecnologia, o direito processual eletrônico se torna um dos campos mais sensíveis para
se identificar conflitos entre situações arraigadas e a expectativa pelas mudanças.
Neste contexto, o presente artigo analisa o problema dos atos processuais
eletrônicos que não foram devidamente regulamentados pela Lei nº 11419/2006,
verificando se a solução técnica mais adequada seria a edição de Leis Estaduais
específicas (mais sensíveis às peculiaridades locais) ou sua inserção no Projeto de
Código de Processo Civil, atualmente tramitando no Congresso Nacional.
A Lei 11.419 de 2006 apesar de trazer em si os ideais do Pacto Republicano II,
bem como uma ideia tangível para que se proceda ao ideal da razoável duração do
processo, de acordo com a Emenda Constitucional 45 de 2004, não se encontra
aperfeiçoada e contém uma série de deficiências em sua redação que culminam com a
atipicidade de atos processuais.
Cuida-se de problemática relevante, já que importa verificar se esta atipicidade,
de alguma forma, pode invalidar o nulificar o ato processual.
Para a análise do texto e a fim de se alcançar o pretendido, é preciso afirmar que
a ideia de atipicidade dos atos processuais está longe do apego ao formalismo. Mas
chama a atenção para que o legislador fique atento a termos nada ortodoxos, inseridos a
seu bel prazer e que podem gerar, dentro de uma teoria geral, interpretações
equivocadas.
Por outro lado, o futuro CPC não se preocupou, em um primeiro momento, com
o processo eletrônico (ou procedimento, como preferimos). Ao contrário, como se
observa das notas taquigráficas do Senado, ainda há uma enorme confusão no que tange
ao procedimento3.
1
Professor de Direito Processual Civil, na Universidade Federal Fluminense (UFF). Mestre em Direito
pela Universidade Gama Filho. Doutorando em Direito pela Universidad de Buenos Aires. Membro do
Instituto Brasileiro dos Advogados e pesquisador no Laboratório Fluminense de Estudos Processuais
(LAFEP), da UFF. Presidente do Instituto Brasileiro de Direito Eletrônico
2
Coordenador de Graduação (Faculdade de Direito/UFF). Professor adjunto do departamento de direito
processual da Universidade Federal Fluminense (SPP/UFF) e do Programa de Pós-Graduação em
Sociologia e Direito (PPGSD/UFF). Pesquisador do Laboratório Fluminense de Estudos Processuais
(LAFEP/UFF). Doutor em Direito (UERJ).
3
http://www.senado.gov.br/senado/novocpc/notas_taquigraficas.asp
Nos propusemos a analisar os atos atípicos, previstos na Lei 11.419 de 2006,
neste trabalho. E uma questão que se apresenta importante para o debate é: será que
estamos diante de um novo sujeito do processo? Ou, será que a informatização insere
em nosso sistema processual os atos processuais praticados pelo sistema? A uma
primeira vista parece-nos que sim.
Os atos processuais, que, antes, eram realizados pelos auxiliares da justiça, a
partir do advento da Lei 11.419, podem ser praticados pelo sistema informático e
independem de movimentação cartorária. Desta forma, passamos a acreditar que há,
sim, um novo sujeito do processo: o sistema.
Mas, como admitir que este novo sujeito do processo possa ser sancionado? A
resposta ainda não se apresenta de pronto e a legislação processual deveria estar
preocupada com esta nova prática dos atos processuais.
Ao deixar de lado a informatização judicial do processo, quando da redação do
PLS 166/2010, o sistema processual que está por vir falhou. Mas, na Câmara dos
Deputados, houve uma maior preocupação dos membros da Comissão do Novo CPC, a
fim de inserir um capítulo próprio para a informatização, incluindo-se, ainda, a
principiologia do sistema processual moderno, modificado a partir das novas
tecnologias inseridas no processo.
O Deputado Sérgio Barradas, ao apresentar relatório de sua atividades 4, deixou
expressa a preocupação com a informatização, especialmente no que tange ao princípio
da publicidade. No texto, destinado à prática dos atos processuais, relata do Deputado
que “as diretrizes mínimas a serem observadas na disciplina do processamento
eletrônico devem emanar da lei processual, para evitar a inobservância de garantias
fundamentais do processo e prerrogativas das partes e dos advogados. Acolhe-se a
sugestão encaminhada pelos professores Paulo Cézar Pinheiro Carneiro e Leonardo
Greco.”
Em matéria de informatização, a Câmara foi mais ousada e adentrou em temas
que a Comissão de Juristas do Senado preferiu não enfrentar.
A informatização judicial, diversamente do que se possa admitir, não traz um
estudo de termos informáticos ou se apresenta tão dissociada da realidade com a qual já
conviemos. Traz, por outro lado, uma discussão acerca de princípios – alguns novos,
alguns aos quais se pretende a relativização e amplia princípios já consagrados como o
da oralidade.
Quanto aos atos atípicos, trazemos como exemplo o art. 10 da Lei 11.419, de
2006. O termo distribuição ali inserido é de total falta de técnica legislativa. E assim se
afirma porque o advogado não distribui a inicial. O que o legislador pretendeu – e assim
devemos pensar a fim de eliminar os erros contidos no texto legal – foi admitir a
formação do processo com o protocolo eletrônico, dispensando-se a intervenção
cartorária. Mas, está longe de ser distribuição.
Desta forma, pretendemos que a academia seja, efetivamente, prestigiada, a
fimde se imprimir mais técnica jurídica ao texto legislativo. Ainda que haja afirmação
de a informatização ter nascido no seio do Poder Judiciário5, é momento de a academia
participar do processo legislativo e consertar os erros havidos na Lei 11.419, de 2006.
Ao menos, reduzir os atos atípicos, ou começar a trabalhar com uma nova teoria
geral dos atos processuais praticados por meios eletrônicos.
Um novo CPC se apresenta e é imperiosa a inserção do processo (ou
procedimento) eletrônico em seu contexto.
4
Encaminhado por e-mail. Em nosso poder.
Cf. Sérgio Tejada, in apresentação de ALMEIDA FILHO, José Carlos de Araújo Almeida. Processo
Eletrônico e Teoria Geral do Processo Eletrônico, 4ed., Forense: RJ.
5
II. A TEORIA DOS ATOS PROCESSUAIS E A INFORMATIZAÇÃO
JUDICIAL. OS ATOS ATÍPICOS.
Quando tratamos de uma teoria geral dos atos processuais, não podemos
dispensar a conceituação clássica, até mesmo para podermos avançar em matéria de ato
processual praticado por meio da informática.
O ato processual tem por objetivo adquirir, extinguir ou modificar direitos
processuais. Seguindo a linha de pensamento de Francesco Carnelutti, como bem
ressalta Jônatas Luiz Moreira de Paula6 “(...) o ato processual é espécie de ato jurídico e
é praticado em razão de uma relação processual. A processualidade do ato não se deve
ao seu cumprimento no processo, mas por criar efeitos no processo.” E, a partir da
informatização do processo, os atos processuais passam a ter uma nova conceituação,
uma vez que o próprio sistema automatizado os praticará, sem intervenção cartorária ou
atos dos auxiliares da justiça.
E é exatamente quanto a este ponto específico que passamos a tratar de uma
nova sistemática do processo. Mais: quando admitimos que um quarto sujeito do
processo possa ser identificado, os atos processuais passam a ter contornos diversos.
Nos termos da Lei 11.419, de 2006, a partir do momento em que se tem a possibilidade
de prática dos atos por meios informáticos, este quarto sujeito que pratica os atos é o
sistema informático de cada Tribunal, que, por sua vez, possui diversos contornos
dependendo da regulamentação do órgão do Poder Judiciário (art. 18, da Lei 11.419, de
2006).
Diferentemente do ato jurídico, o ato processual gerará efeitos endoprocessuais.
E se é certo que gera efeitos no processo, passamos a tratar de questão mais complexa,
porque o sistema passará a produzir atos processuais que são próprios dos auxiliares da
justiça, especialmente os de documentação. Reafirma-se, desta forma, a idéia de termos
atos atípicos inseridos na Lei 11.419, de 2006.
E assim insistimos porque, até a presente data, os atos são divididos em atos do
juiz, atos dos auxiliares da justiça e atos das partes. Relativamente aos atos dos
auxiliares da justiça, temos os de documentação e movimentação. Analisando, contudo,
o art. 10 da Lei 11.419, de 2006, passamos a admitir atos praticados pelo sistema, e, via
de consequência, a atipicidade na sua produção:
Art. 10. A distribuição da petição inicial e a juntada da contestação, dos recursos e das
petições em geral, todos em formato digital, nos autos de processo eletrônico, podem
ser feitas diretamente pelos advogados públicos e privados, sem necessidade da
intervenção do cartório ou secretaria judicial, situação em que a autuação deverá se dar
de forma automática, fornecendo-se recibo eletrônico de protocolo.
Analisando o art. 10 da Lei 11.419, passamos a identificar um dos atos atípicos,
como, por exemplo, a distribuição da petição inicial que pode(m) ser feita(s)
diretamente pelos advogados públicos e privados. O texto legislativo apresenta-se
equivocado e dissociado, porque, em verdade, e ao que tudo indica, o legislador
pretendeu trabalhar com formação do processo, mas esqueceu-se da regra contida no art.
263 do CPC7.
O legislador ao tratar da formação do processo na informatização judicial atribui
ao advogado a distribuição da petição inicial. E, por certo, não compete ao advogado a
6
PAULA, Jônatas Luiz Moreira de. Teoria Geral do Processo. São Paulo: Manole, 2002.
Art. 263. Considera-se proposta a ação, tanto que a petição inicial seja despachada pelo juiz, ou
simplesmente distribuída, onde houver mais de uma vara. A propositura da ação, todavia, só produz,
quanto ao réu, os efeitos mencionados no art. 219 depois que for validamente citado.
7
distribuição. Em se tratando de juízo único, por sua vez, sequer há que se cogitar de
distribuição, mas de registro.
Parece-nos, assim, que a ideia de inserir o termo distribuição referiu-se à
denominação vulgar do ato de protocolo. Um questionamento contudo se apresenta
importante: diante da atipicidade do ato, estaríamos diante de nulidade absoluta? Ou,
por outro viés, estaríamos, efetivamente, diante de ato inexistente?
A pergunta será positiva se os sistemas informáticos, que passam a figurar como
um novo sujeito do processo, permitirem, efetivamente, a prática de tais atos pelo
advogado. Claro que em matéria de distribuição, admitindo-se que a mesma possa ser
realizada pelo advogado, há, inclusive, a possibilidade de violação do princípio do juiz
natural, bem como a regra do art. 251 do CPC.
E nos apresenta tão clara a atipicidade do referido ato, contido no art. 10 da Lei
11.419, que o próprio art. 256 do CPC assevera que “a distribuição poderá ser
fiscalizada pela parte ou por seu procurador.” Ou seja, a distribuição é ato exclusivo do
Poder Judiciário, que, por sua vez, poderá ser fiscalizado pelo advogado ou pela parte.
Mas, jamais, poderá a parte ou o advogado distribuir a petição inicial.
Como se vê, trata-se de ato processual de registro e movimentação, cujo sujeito
do processo a praticá-lo é o auxiliar. Denota-se o grave erro legislativo. No entanto, os
atos processuais de registro e movimentação não perdem a sua natureza, como tal, por
serem automatizados. Contudo, deixarão de ser considerados atos dos auxiliares da
justiça e passarão a ser considerados atos eletrônicos. Não muda a forma do ato, mas o
seu agente. O que também não significa dizer que os serventuários perderão sua
importância neste novo cenário que se apresenta.
Analisaremos, com o fim de alavancar a teoria da atipicidade dos atos
processuais praticados por meios eletrônicos, a penhora online. Trata-se, efetivamente,
de penhora? E, em sendo penhora, poderia a mesma ser realizada por outro sujeito, que
não o auxiliar da justiça?
As perguntas se apresentam porque temos uma nova ideia de atos processuais,
sujeitos do processo e a artibuição de cada um destes sujeitos no processo.
A penhora online não é penhora e tampouco poderia ser realizada pelo
magistrado. Em verdade, penhora é ato de execução, cujo sujeito do processo a praticálo é o auxiliar da justiça.
Desta forma, temos atipicidade e sujeito diverso.
O art. 143, I, do CPC é claro ao afirmar que a penhora é ato do oficial de justiça,
ao passo em que os atos dos juízes encontram-se dispostos no art. 162 e não se
vislumbra a possibilidade de efetivar o ato penhora.
Sem adentrar na discussão se o bloqueio e posterior convolação em depósito
judicial, praticado pelo sistema informatizado do Banco Central, o Bacen Jud, é
penhora, precisamos analisar se este ato, efetiviamente, pode ser praticado pelo
magistrado.
A nossa resposta, de início, é pela impossibilidade, até mesmo diante da regra
contida no art. 655-A, do CPC:
Art. 655-A. Para possibilitar a penhora de dinheiro em depósito ou aplicação
financeira, o juiz, a requerimento do exeqüente, requisitará à autoridade
supervisora do sistema bancário, preferencialmente por meio eletrônico,
informações sobre a existência de ativos em nome do executado, podendo no
mesmo ato determinar sua indisponibilidade, até o valor indicado na execução.
(Incluído pela Lei nº 11.382, de 2006).
§ 1o As informações limitar-se-ão à existência ou não de depósito ou aplicação
até o valor indicado na execução. (Incluído pela Lei nº 11.382, de 2006).
§ 2o Compete ao executado comprovar que as quantias depositadas em conta
corrente referem-se à hipótese do inciso IV do caput do art. 649 desta Lei ou
que estão revestidas de outra forma de impenhorabilidade. (Incluído pela Lei nº
11.382, de 2006).
§ 3o Na penhora de percentual do faturamento da empresa executada, será
nomeado depositário, com a atribuição de submeter à aprovação judicial a
forma de efetivação da constrição, bem como de prestar contas mensalmente,
entregando ao exeqüente as quantias recebidas, a fim de serem imputadas no
pagamento da dívida. (Incluído pela Lei nº 11.382, de 2006).
§ 4o Quando se tratar de execução contra partido político, o juiz, a
requerimento do exeqüente, requisitará à autoridade supervisora do sistema
bancário, nos termos do que estabelece o caput deste artigo, informações sobre
a existência de ativos tão-somente em nome do órgão partidário que tenha
contraído a dívida executada ou que tenha dado causa a violação de direito ou
ao dano, ao qual cabe exclusivamente a responsabilidade pelos atos praticados,
de acordo com o disposto no art. 15-A da Lei no 9.096, de 19 de setembro de
1995. (Incluído pela Lei nº 11.694, de 2008).
Da análise do artigo, verifica-se que compete ao juiz, a requerimento da parte,
requisitar informações, e, ainda, que os possíveis valores não se encontram amparados
pela impenhorabilidade.
Na prática, o sistema Bacen Jud procede, de imediato, ao bloqueio em contacorrente do executado, sem sequer atentar para a regra contida no artigo em questão.
Atípico, pois, é o ato do magistrado que penhora – ou bloqueia – o valor, especialmente
quando não se procede à análise de se tratar ou não de bem impenhorável.
Mas, por outro lado, poderá o juiz, por força do referido dispositivo, “no mesmo
ato determinar sua indisponibilidade, até o valor indicado na execução”. Contudo,
estamos diante de um ato de execução que é próprio do auxiliar da justiça, porque a
indisponibilidade do bem se convolará em penhora. E esta penhora está sendo realizada
pelo magistrado.
II.1. OS ATOS INFORMÁTICOS E O NOVO SUJEITO PROCESSUAL
No que tange à forma, os atos processuais continuarão sendo de distribuição,
registro e movimentação. Segundo Leonardo Greco,8 “o escrivão é quem forma os autos
do processo, isto é, o volume do processo. Ele ainda é responsável, ao receber a petição
inicial, por dar-lhe uma capa e nela lançar todos os dados do processo; carimbar,
numerar e rubricar todas as folhas do processo; promover a juntada de todos os atos que
forem praticados, através dos termos de juntada, de conclusão, de vista etc.”
Ainda que a Lei 11.419, de 2006, tenha inserido a informatização plena no
sistema processual e o PLS 166/2010, preveja a prática de atos por meios eletrônicos,
não se alterou, de forma alguma, o art. 1419 do CPC, replicado pelo art. 131 do PLS
166/201010 e mantido na Câmara pelo PL 8046/2010.
8
9
10
GRECO, Leonardo. Instituições de Processo Civil. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2010. vol. I.
Art. 141. Incumbe ao escrivão:
I – redigir, em forma legal, os ofícios, mandados, cartas precatórias e mais atos que pertencem ao seu
ofício;
II – executar as ordens judiciais, promovendo citações e intimações, bem como praticando todos os
demais atos, que lhe forem atribuídos pelas normas de organização judiciária;
III – comparecer às audiências, ou, não podendo fazê-lo, designar para substituí-lo escrevente
juramentado, de preferência datilógrafo ou taquígrafo;
IV – ter, sob sua guarda e responsabilidade, os autos, não permitindo que saiam de cartório, exceto:
a) quando tenham de subir à conclusão do juiz;
No entanto, não é esta a redação imposta pelo art. 10 da Lei 11.419, de 2006,
como vimos, e parece-nos haver a criação de um escrivão virtual. Também não
podemos conceber desta forma, sob pena de inexistência de responsabilidade pela
prática dos atos de documentação. Ao analisarmos, por sua vez, o art. 14 do CPC,
percebemos que todos os sujeitos do processo são passíveis de sanções.
Quando analisamos a atipicidade dos atos processuais a partir da análise
sistêmica da Lei 11.419, passamos, então, a conviver com o quarto sujeito do processo,
ou, o sistema. E quando estamos diante de atos atípicos, praticados por meio eletrônico,
ou adotamos integralmente o princípio da instrumentalidade das formas, ou passamos
para uma teoria de atos inexistentes.
Inicialmente, cabe-nos a análise clássica dos sujeitos do processo:
Juiz (órgão jurisdicional)
Sujeitos parciais
Sujeitos do Processo
Autor – Réu – Terceiros
partes
Sujeitos Auxiliares – escrivão, oficial de justiça
Sujeitos Probatórios – não têm interesse na causa –
testemunhas e peritos
Ministério Público – fiscal da lei ou parte
Advogado – art. 133 da CR e Lei 8906/94
b) com vista aos procuradores, ao Ministério Público ou à Fazenda Pública;
c) quando devam ser remetidos ao contador ou ao partidor;
d) quando, modificando-se a competência, forem transferidos a outro juízo;
V – dar, independentemente de despacho, certidão de qualquer ato ou termo do processo, observado o
disposto no art. 155.
Art. 131. Incumbe ao escrivão:
I – redigir, em forma legal, os ofícios, os mandados, as cartas precatórias e mais atos que pertencem
ao seu ofício;
II – executar as ordens judiciais, promover citações e intimações, bem como praticar todos os demais
atos que lhe forem atribuídos pelas normas de organização judiciária;
III – comparecer às audiências ou, não podendo fazê-lo, designar para substituí-lo escrevente
juramentado;
IV – ter, sob sua guarda e responsabilidade, os autos, não permitindo que saiam do cartório, exceto:
a) quando tenham de subir à conclusão do juiz;
b) com vista aos procuradores, à Defensoria Pública, ao Ministério Público ou à Fazenda Pública;
c) quando devam ser remetidos ao contador ou ao partidor;
d) quando, modificando-se a competência, forem transferidos a outro juízo;
V – dar, independentemente de despacho, certidão de qualquer ato ou termo do processo, observadas
as disposições referentes a segredo de justiça;
VI – praticar, de ofício, os atos meramente ordinatórios.
Estamos, ou não, diante de um novo sujeito? E, se estamos diante de um novo
sujeito, podemos, ainda assim, aplicar a teoria da instrumentalidade das formas?
Sim. Parece-nos que a primeira vista, diante de tudo quanto analisado até o
presente momento, há um novo sujeito processual. Indefinido, ainda, mas praticando
atos que passam a gerar efeitos. Esse novo sujeito do processo, adotando-se, neste
momento, a terminologia de sistema, não se encontra adstrito a qualquer das
modalidades de prática dos atos processuais pelos sujeitos do processo.
Mas é sujeito que recebe o protocolo da petição inicial, registra, distribui e
autua. Mesmo assim, será que ainda podemos adotar o princípio da instrumentalidade
das formas? Ou estaríamos diante de atos inexistentes praticados no processo?
O Prof. Cândido Rangel Dinamarco,11 seguindo as linhas do pensamento de
Liebman, adota a tese da deformalização do processo, por entender que, apesar da
norma inserida no art. 154 do CPC (que consagra o princípio da instrumentalidade das
formas), nosso processo seja extremamente formal.
A teoria do Prof. Dinamarco encontra resistência em José Carlos Barbosa
Moreira,12 quando afirma que a técnica processual é imprescindível. Ao escrevermos
sobre o pedido no sistema do common law e o princípio da adstrição,13 inserimos o
pensamento do Prof. Barbosa Moreira, desta forma:
(...)Contudo, esta desformalização encontra grande oposição em alguns
processualistas, dentre eles no Prof. José Carlos Barbosa Moreira, cf. A Justiça no
Limiar do Novo Século, recebida por meio eletrônico, que afirma: e, por maior
relevância que possam assumir outros meios de solução de conflitos, seria perigoso
apostar muito na perspectiva de um desvio de fluxo suficiente para aliviar de modo
considerável a pressão sobre os congestionados canais judiciários. Somem-se a isso
fatores como a crescente complexidade da vida econômica e social, o incremento
dos contactos e das relações internacionais, a multiplicação de litígios com feição
nova e desafiadora, a fazer aguda a exigência de especialização e de emprego de
instrumentos diversos dos que nos são familiares, e ficará evidente que não há como
fugir à necessidade de mudanças sem correr o risco de empurrar para níveis
explosivos a crise atual, em certos ângulos já tão assustadora.
A deformalização pregada por Dinamarco e criticada por Barbosa Moreira tem seu
ápice na informatização. Não nos parece dissociada da idéia de deformalização a prática
de atos processuais por um sujeito, denominado sistesma (informático)¸ que produz
efeitos. E, é claro, a partir do momento em que houver qualquer falha na prestação da
tutela, por ato do sistema (informático), não haverá a quem responsabilizar.
Deformalizado está o processo, com a informatização.
E, sem dúvida, ainda que fosse interessante, a fim de provocar maior atenção do
legislador, não se deveria adotar a instrumentalidade das formas q uando o ato fosse
praticado por este novo sujeito. Por outro lado, se atingida a finalidade, não haveria o
porquê de se anular o ato, ainda que, a uma primeira vista, trata-se de ato inexistente.
11
12
13
DINAMARCO, Cândido Rangel. Fundamentos do Processo Civil Moderno. 4. ed. São Paulo:
Malheiros, 2000. v.I.
MOREIRA, José Carlos Barbosa. A Justiça no Limiar do Novo Século. In conferência pronunciada
em 22.10.1992, em São Paulo, no Congresso de Direito do Trabalho, promovido pela Associação dos
Magistrados da Justiça do Trabalho da 2ª Região. Cedido o texto pelo autor, também disponível na
Revista Forense 319:69/75.
ALMEIDA FILHO, José Carlos de Araújo. “O pedido no sistema do common law e o princípio da
adstrição”. In Revista de Processo, 118, Coord. Teresa Arruda Alvim Wambier, São Paulo: RT, 2005.
Por outro lado, ao admitirmos que a Lei 11.419 de 2006 é procedimental, caberia
aos Estados a sua regulamentação?
III. REGULAMENTAÇÃO POR LEI ESTADUAL?
Vista a necessidade de se estabelecer um marco regulatório para os atuais atos
processuais eletrônicos atípicos, passa-se primeiro ao problema da competência
legislativa para normatizá-los.
A história jurídico-processual brasileira é marcada pelo centralismo legislativo,
excepcionada pela experiência federativa da República Velha, em que a primeira
Constituição republicana limitava a competência legislativa exclusiva do Congresso
Nacional ao direito processual da Justiça Federal (art. 34, 23º), permitindo aos Estados
instituir seus próprios códigos processuais. Desde a ascensão de Vargas até os dias
atuais presencia-se um sistema jurídico estabelecido pela União, a despeito das
peculiaridades regionais de uma nação continental como a nossa14.
Mesmo a atual Constituição Federal, instituída num ambiente mais aberto a
experiências locais, não alterou demasiadamente o quadro tradicionalmente
estabelecido: rechaçou a Justiça municipal (presente nos debates constituintes) e
manteve a competência legislativa da União para legislar sobre direito processual (art.
20, I). Entretanto, admitiu a competência legislativa concorrente dos Estados para
“procedimentos em matéria processual” (artigo 24, XI) e “criação, funcionamento e
processo do juizado de pequenas causas” (artigo 24, X).
Distinguir processo de procedimento, no plano conceitual, aparentemente não
traz tantas dificuldades. Em linhas gerais, tem-se o processo como a relação jurídica
(conjunto de atos e vínculos gerados pelos diversos sujeitos que dele participam) e o
procedimento como a forma de seu exercício15. Entretanto, nas vezes em que o Supremo
Tribunal Federal foi provocado a se manifestar sobre a constitucionalidade de algumas
leis estaduais sobre o tema, posicionou-se no sentido da federalização, por entender
serem normas processuais:
1. A exigência de depósito recursal prévio aos recursos do Juizado
Especial Cível, criada pelo art. 7º da Lei Estadual (AL) nº 6.816/07,
constitui requisito de admissibilidade do recurso, tema próprio de
Direito Processual Civil e não de “procedimentos em matéria
processual” (art. 24, inciso XI, CF).
STF. Plenário. ADI 4161 MC/AL, rel. Min. Menezes Direito,
29.10.2008. Info nº 526
Mostra-se insubsistente, sob o ângulo constitucional, norma local que
implique criação de recurso. Esta ocorre no âmbito da competência
para legislar sobre direito processual, não estando abrangida pela
competência concorrente do inciso XI do artigo 24 da Constituição
Federal.
STF. 2ª Turma. AI nº 210068/SC. Rel. Min. Marco Aurélio,
28/08/1998
Há autores que defendem a centralização legislativa argumentando sobre a importância de que “todos
os cidadãos, residentes ou pessoas de outras nacionalidades ou domicílios, saibam, em qualquer Estado
em que estiverem e no Município em que se encontrarem, qual a disciplina legal correspondente”
(BASTOS, Celso Ribeiro & MARTINS, Ives Gandra. Comentários à Constituição do Brasil:
promulgada em 5 de outubro de 1988. Volume 3, Tomo 1. São Paulo: Saraiva, 1998, pp. 246-248)
15
Entre outros, GRECO, Leonardo. Instituições de Processo Civil. Rio de Janeiro: Forense, 2010. p 254.
14
COMPETÊNCIA LEGISLATIVA – PROCEDIMENTO E
PROCESSO – CRIAÇÃO DE RECURSO – JUIZADOS ESPECIAIS.
Descabe confundir a competência concorrente da União, dos Estados e
Distrito federal para legislar sobre procedimento em matéria
processual – artigo 24, inciso XI – com a privativa para legislar sobre
direito processual, prevista no artigo 22, inciso I, ambos da
Constituição Federal. Os Estados não têm competência para a criação
de recurso, como é o de embargos de divergência contra decisão de
turma recursal.
STF. 2ª Turma. AI-AgR n° 253518/SC, rel. Marco Aurélio, j.
09/05/2000.
2. Lei estadual que dispõe sobre atos de Juiz, direcionando sua
atuação em face de situações específicas, tem natureza processual e
não meramente procedimental.
3. Pedido de declaração de inconstitucionalidade julgado procedente.
STF. Plenário. ADIn nº 2257/SP. Rel. Min. Eros Grau, 06/04/2005.
3. Invade a competência da União norma estadual que disciplina
matéria referente ao valor que deva ser dado a uma causa, tema
especificamente inserido no campo do Direito Processual. Ação direta
de inconstitucionalidade julgada parcialmente procedente.
STF. Plenário. ADIn nº 2655/MT. Rel. Min. Ellen Gracie, 09/10/2003
1. O quanto respeite ao valor da causa consubstancia matéria de
direito processual, adstrita à lei federal, nos termos do disposto no
artigo 22, inciso I, da Constituição do Brasil.
STF. Plenário. ADIn nº 2052/MT. Rel. Min. Eros Grau, 06/04/2005
Assim, enquanto não se firmar jurisprudência mais favorável à estadualização,
cada vem mais se prejudica sua devida interpretação. Com isso, merece ser transcrita a
crítica de LEONARDO GRECO:
a Constituição de 1988 esboçou uma tentativa de flexibilizar os
procedimentos processuais, ao incluir na competência legislativa concorrente
da União, dos Estados e do Distrito Federal a ‘criação, funcionamento e
processo do juizado de pequenas causas’ e os procedimentos em matéria
processual (art. 24, incisos X e XI). Quanto aos juizados especiais, a
legislação federal, quase exaustiva, tem sido complementada por leis
estaduais. Mas quanto aos procedimentos em matéria processual o
dispositivo constitucional caiu no vazio, porque qualquer inovação
procedimental vai necessariamente afetar direitos subjetivos processuais, que
seriam da competência legislativa privativa da União. Ademais, os códigos
de processo foram redigidos na vigência de Constituições que não previam
essa flexibilização e, assim, são exaustivos quanto aos procedimentos
processuais.
Estou convencido de que não só a flexibilização dos ritos, mas
especialmente a descentralização de muitos atos processuais das mãos do
juiz para outros sujeitos (auxiliares da Justiça e advogados) e o avanço
tecnológico seriam grandemente favorecidos pela transferência da
competência legislativa em matéria processual das regras de competência
privativa da União (artigo 22) para as da competência concorrente (artigo
24)16.
Mas permanece a questão: uma lei estadual que regulamentasse o processo
eletrônico em âmbito local padeceria de inconstitucionalidade formal? Por outro lado,
como se distinguem a prática de atos eletrônicos como atividade administrativa,
procedimento ou sistema de garantias (acesso à Justiça, tutela efetiva, publicidade etc.)?
Ao analisarmos a pretensão inserida no Pacote Republicano, quanto à
informatização judicial no Brasil, observamos que o art. 1º do Projeto de Lei
5.828/2001, não tratava, como se imagina, de processo eletrônico, mas de
procedimentos eletrônicos:
Capítulo I
Da Informatização do Processo Judicial
Art. 1º O uso de meio eletrônico na tramitação de processos judiciais,
comunicação de atos e transmissão de peças processuais será admitido nos
termos desta Lei.
§ 1º Aplica-se o disposto nesta Lei, indistintamente, aos processos civil,
penal e trabalhista, bem como aos juizados especiais, em qualquer grau de
jurisdição.
§ 2º Para o disposto nesta Lei, considera-se:
I – meio eletrônico qualquer forma de armazenamento ou tráfego de
documentos e arquivos digitais;
II – transmissão eletrônica toda forma de comunicação à distância com a
utilização de redes de comunicação, preferencialmente a rede mundial de
computadores;
III – assinatura eletrônica as seguintes formas de identificação inequívoca do
signatário:
a) assinatura digital baseada em certificado digital emitido por Autoridade
Certificadora credenciada, na forma de lei específica;
b) mediante cadastro de usuário junto ao Poder Judiciário, conforme
disciplinado pelos órgãos respectivos.
Assim, no Brasil não se está diante de processo eletrônico, mas de verdadeiro
procedimento eletrônico. E a distinção é substancial, porque neste caso há o grave e
sério problema de repartirmos o processo através da legislação concorrente entre os
Estados, permitindo-se que cada um, na prática, legislasse sobre processo, porque os
conceitos se misturam e se mesclam. A posição do Prof. Leonardo Greco, em debates
havidos pela Internet, diverge, já que o mesmo entende que processo e procedimento se
encontram intimamente ligados, não havendo mais a necessidade de discutirem-se os
conceitos.
IV. NECESSÁRIA INSERÇÃO DA INFORMATIZAÇÃO JUDICIAL NO
FUTURO CPC
De toda a análise procedida neste texto, passados seis anos desde a promulgação
da Lei 11.419, admitimos necessária a inserção, com maior amplitude, da
informatização no futuro CPC. Aprimorar, e, mesmo, consertar os erros legislativos
contidos na norma. Avançar em matéria de informatização e admitir não ser possível os
sistemas serem um novo sujeito no processo.
16
GRECO, Leonardo. “A Reforma do Poder Judiciário e o Acesso à Justiça”, p. 596/597.
A prática tem se apresentado diversa da norma. O art. 10, contendo atos
flagrantemente atípicos, não são praticados pelo sistema, mas manuseados pelos
servidores. E não apenas mais os auxiliares da justiça, como os técnicos da informação.
A tecnologia da informação é uma realidade e o momento para inserção de atos
processuais por meios eletrônicos no futuro CPC apresenta-se de extrema importância.
O futuro CPC insere, todavia, mais um auxiliar da justiça, ou seja, os
assessores. Antes, prática já usual, mas não normatizada, os assessores passarão a
realizar atividades próprias dos magistrados, como podemos visulizar no relatório do
Deputado Sérgio Barradas.
Há, assim, a proposta de criação do assessor judicial que passa a ser uma
novidade em nosso sistema17. Mas, ainda, em matéria de informatizção, convivemos
com a atipicidade dos atos processuais, quando, diante do momento histórico, se poderia
tratar do tema com mais especificidade.
Estamos, portanto, diante de uma sistemática que envolve o novo sujeito
do processo, o qual pratica atos e não se encontra adstrito aos demais sujeitos do
processo e tampouco passível de qualquer sanção administrativa ou processual.
O PL 8046/2010 pode – e entendemos que deve – dispensar capítulo
próprio ao processo judicial eletrônico, sob pena de emergir um novo CPC, já em uma
fase em que senão todos, mas quase todos os Tribunais não desejam mais a utilização
do papel. A resistência encontrada no Senado, na redação do PLS 166/2010, deveria ser
superada, agora, em sua redação pela Câmara dos Deputados, que, inclusive,
apresentou-se mais democrática no que tange às audiências públicas.
Há o risco de um futuro Código de Processo Civil ser promulgado em um
novo cenário, diverso do modelo atual, porque a maioria dos Tribunais sequer adotam o
modelo tradicional do processo, todo em papel. A informatização tem sido aplicada
diariamente e o Poder Judiciário vem, paulatinamente, aprimorando seus magistrados.
O futuro CPC, por sua vez, eliminaria enormes distorções, como, por
exemplo, a modificação do rito do Juizado Especial no Tribunal de Justiça do Estado do
Rio de Janeiro. E, quanto a este ponto, insistimos, novamente, na revogação do art. 18
da Lei 11.419, de 2006.
O TJERJ, por meio do Ato Executivo TJ nº5877/2010, ao dispor sobre a
instalação do Juizado Especial Cível, modifica o rito da Lei 9099/95, ao afirmar:
17
Do assessor judicial
Art. O juiz poderá ser auxiliado por um ou mais assessores judiciais, notadamente:
I – na elaboração de minutas de decisões ou votos;
II – na pesquisa de legislação, doutrina e jurisprudência necessárias à elaboração de seus
pronunciamentos;
III – na preparação de agendas de julgamento e outros serviços a serem realizados.
§ 1º. O assessor judicial poderá, mediante delegação do juiz, proferir despachos.
§ 2º. Lei específica disciplinará a criação e o provimento desses cargos, podendo ainda atribuir ao
assessor judicial outras competências compatíveis com sua função.
“Justificativa. A necessidade de produção de decisões em larga escala, muitas vezes em processos
repetitivos, levou à consagração, na prática forense, da figura do assessor judicial. O juiz passou a ser, em
grande medida, o gestor de uma equipe, formada pelos integrantes do gabinete e da secretaria. Daí a
necessidade de se regular a figura, já consagrada na prática forense, do assessor judicial, a quem cabe
assessorar o juiz na elaboração de minutas de decisões e votos, na realização de pesquisas e na preparação
de agendas e outros serviços. O assessor deve, também, ser autorizado, por delegação do juiz, a proferir
despachos. A criação e o provimento desses cargos, porém, deve ficar a cargo de leis específicas, muitas
delas a serem elaboradas pelos Estados, que poderão também atribuir a esses assessores outras
competências, desde que compatíveis com a função que exercem. Acolhe-se proposta de Lúcio Delfino e
Eduardo José da Fonseca Costa.”
Art. 11. Uma vez cadastrada no sistema, a parte só poderá apresentar petições e
documentos pelo sistema eletrônico.
Parágrafo único. Na hipótese prevista no caput, a contestação e documentos
destinados às audiências serão apresentados eletronicamente até o horário de
sua realização, vedado o recebimento destes em papel, ressalvado o disposto no
§ 5º do art. 11 da Lei nº 11.419/06.
Ou seja, impede-se à parte que se apresente na audiência com
documentos em papel. Impede-se, por exemplo, acaso a parte compareça e formule
acordo, com atos constitutivos da empresa demandada, o exercício de um seu direito. E,
por via reversa, impede, mesmo, a possibilidade de acordo, que é uma das bases do
sistema dos Juizados, porque a defesa deverá ser apresentada antes mesmo da audiência.
Em troca da celeridade, princípios processuais estão sendo demolidos
com a idéia da informatização judicial regulamentada pelos órgãos do Poder Judiciário.
E a redação do art. 18, cuja análise merece o destaque da norma, é de toda prejudicial:
Art. 18. Os órgãos do Poder Judiciário regulamentarão esta Lei, no que couber,
no âmbito de suas respectivas competências.
A atipicidade da Lei 11.419/2006, ao contribuir para a existência de total
atipicidade, provoca, ainda, uma outra discussão, diante da análise do art. 92 da
Constituição da República Federativa do Brasil:
Art. 92. São órgãos do Poder Judiciário:
I - o Supremo Tribunal Federal;
I-A o Conselho Nacional de Justiça; (Incluído pela Emenda Constitucional nº
45, de 2004)
II - o Superior Tribunal de Justiça;
III - os Tribunais Regionais Federais e Juízes Federais;
IV - os Tribunais e Juízes do Trabalho;
V - os Tribunais e Juízes Eleitorais;
VI - os Tribunais e Juízes Militares;
VII - os Tribunais e Juízes dos Estados e do Distrito Federal e Territórios.
A questão que nos causa maior preocupação, a exigir uma reformulação
do processo eletrônico com o futuro CPC diz respeito à possibilidade que a norma
facultou de os próprios juízes regulamentarem a Lei. São os juízes órgão do Poder
Judiciário.
Premente se apresenta a reformulação da informatização judicial e o
momento é agora, com a reforma plena do CPC.
Podemos, então, pensar, efetivamente, em um novo modelo, inclusive
com a possibilidade de em matéria de informatização, permitir aos Estados que
legislem. Claro, contudo, que esta competência não poderia ultrapassar os limites do
CPC, bem como não poderia restringir as garantias processuais. A legislação estadual
poderia eliminar as distorções do que se resolveu denominar Torre de Babel Eletrônica.
VI. CONCLUSÃO
Com o fim de eliminar distorções, especialmente no que tange a
possibilidade de regulamentação pelos órgãos do Poder Judiciário, bem assim a
discussão entre processo e procedimento, e, ainda, eliminarem-se os atos atípicos, o
momento parece-nos oportuno. A Lei 11.419 de 2006 é um grande avanço em nosso
sistema processual, e, quanto a este dado, parece-nos indubitável.
Contudo, estamos passando por uma fase em que há diversos sistemas
trabalhando em nosso país, e cada Tribunal regulamentando a norma sem uma
preocupação maior com o todo. No caso específico do TJERJ, o que observamos é uma
regulamentação que afeta ao próprio procedimento.
A técnica legislativa, como já tratamos por diversas vezes, não foi precisa
e admitir que o advogado possa distribuir a petição inicial (art. 10, da Lei 11.419/2006),
nada mais é, sabemos, que o ato de protocolo da peça. Contudo, não deixa de ser atípico
o ato pela redação imposta.
A timidez relativa no que se refere à informatização, na tramitação de um
novo CPC, poderá culminar com um sistema processual pensado e estruturado para uma
realidade construída no papel, ao passo que a grande maioria dos Tribunais sequer
admitem peticionamento físico, adotando-se, exclusisvamente, a informatização.
Delinear regras de procedimento, no CPC, com uma dinâmica
processual, eliminando-se os erros da Lei 11.419, é a garantia de um código que não
necessitará de reformas por construções jurisprudenciais.
Nossas reformas processuais caminharam de acordo com a jurisprudência
pátria e ocasionaram uma série de mudanças legislativas. Mal se conseguia implementar
uma reforma, nova norma se apresentava para corrigir os erros da reforma anterior.
O momento, contudo, não é para um código passível de diversas
reformas, mas um CPC moderno, atento às transformações do cotidiano, especialmente
em matéria de informatização.
Idealizar um agravo de instrumento, que deixaria de possuir a
denominação de instrumento, é medida que deve ser analisada pelo legislador. Com a
informatização, não se tem necessidade de formar instrumento para o agravo. Quando
muito, um agravo por hipertexto, indicando-se o link para acesso das peças processuais
necessárias ao conhecimento do órgão julgador.
A timidez legislativa deve ser, neste momento, superada. A academia
deve, como também insistimos, ser mais valorizada. Os centros de pesquisa estão
trrabalhando em prol de um processo eletrônico, com qualidade e mais segurança
(jurídica).
A estruturação do futuro CPC eliminará, admitimos, discussões acerca da
natureza da informatização, se processo ou procedimento.
Por outro lado, eliminando-se a discussão, impedir-se-ia a tentativa de
normas concorrentes (art. 24, I, da CR de 1988), como já ocorrera com a
vídeoconferência no Estado de São Paulo, antes da reforma do CPP. Ou seja, se estamos
diante de procedimento e com o fim de impedir uma afronta à tripartição dos Poderes, o
legislativo estadual poderia instituir normas procedimentais, mas, como já dito, em
matéria administrativa, com o fim de eliminarem-se os grandes problemas que
enfrentamos. A cada nova administração de um TJ, novas regulamentações.
Estabilizar e pacificar o andamento administrativo em termos de
informatização impediria o constante desgaste vivenciado pelos advogados e pelas
partes, além, claro, da insegurança de depararem-se com Juizados totalmente
eletrônicos, que têm causado diversos prejuízos e são várias as decisões decretendo a
revelia, violando-se, assim, o devido processo legal.
Mas é certo, também, que não se pode revogar a Lei 11.419, porque a
mesma continuará sendo aplicada aos processos penal e do trabalho.
Devemos, ainda, eliminar este novo sujeito do processo, que pratica atos
processuais. O sujeito que entendemos ser o sistema não poderá praticar atos
processuais, sob pena de inexistência de sancionamento processual ou administativo em
caso de falha. E admitimos que este sujeito praticando atos, possa causar problemas
quando os sistemas de informatização forem afetados por qualquer tipo de pane.
Determinados atos devem continuar sendo realizados pelos auxiliares da
justiça, como ocorre, por exemplo, no Superior Tribunal de Justiça, já que o registro, a
autação e a distribuição não ocorrem como a Lei 11.419 prevê, mas continuam os atos a
serem realizados pelos auxiliares da justiça.
Eis, assim, uma grande e nova oportunidade para a regulação de uma
norma inovadora, mas com problemas legislativos e de aplicação prática que podem
comprometer todo o futuro da informatização.
Que a pesquisa não termine por aqui e que os avanços em matéria de
prática dos atos processuais por meios eletrônicos sejam cada vez mais debatidos
academicamente.
BIBLIOGRAFIA
ALMEIDA FILHO, José Carlos de Araújo. Processo Eletrônico e Teoria Geral do
Processo Eletrônico, 4ed., 2012, Forense: RJ.
________________________________. “O pedido no sistema do common law e o
princípio da adstrição”. In Revista de Processo, 118, Coord. Teresa Arruda Alvim
Wambier, São Paulo: RT, 2005
BUFFA, Francesco. Il Processo Civile Telematico. La Giustizia Informatizzata. Milão:
Giuffrè, 2002.
CALMON FILHO, Petrônio. Comentários à Lei de Informatização do Processo
Judicial. Rio de Janeiro: Forense, 2007.
CINTRA, Antônio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO,
Cândido Rangel. Teoria Geral do Processo, 12. ed. São Paulo: Malheiros, 1996.
DINAMARCO, Cândido Rangel. Fundamentos do Processo Civil Moderno. 4. ed. São
Paulo: Malheiros, 2000. v.I.
_____________________________. A Instrumentalidade do Processo. 5. ed. São
Paulo: Malheiros, 1994
__________________________________. A Reforma da Reforma. São Paulo:
Malheiros, 2002
GRECO, Leonardo. Instituições de Processo Civil. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2010. vol.
I
___________________________. “A reforma do Poder Judiciário e o acesso à Justiça”.
In: Estudos de Direito Processual. Campos dos Goytacazes: Faculdade de Direito de
Campos, 2005.
MEIRELLES, Delton Ricardo Soares ; MELLO, Marcelo Pereira de. . A reforma da
Justiça do Trabalho e o embate Judiciário X Legislativo. Revista IMES. Direito, v. 14,
p. 30, 2008.
_______________________ ; _________________ . Juizados especiais: entre a
legalidade e a legitimidade análise prospectiva dos juizados especiais da Comarca de
Niterói, 1997-2005. Revista Direito GV, v. 12, p. 371-397, 2010
MOREIRA, José Carlos Barbosa. A Justiça no Limiar do Novo Século. In conferência
pronunciada em 22.10.1992, em São Paulo, no Congresso de Direito do Trabalho,
promovido pela Associação dos Magistrados da Justiça do Trabalho da 2ª Região.
Cedido o texto pelo autor, também disponível na Revista Forense 319:69/75.
_________________. O Novo Processo Civil Brasileiro. 7. ed. Rio de Janeiro: Forense,
1995.
________________. Temas de Direito Processual, Sétima Série. São Paulo: Saraiva,
2001.
PAULA, Jônatas Luiz Moreira de. Teoria Geral do Processo. São Paulo: Manole, 2002.
WAMBIER, Luiz Rodrigues (coord.). Curso Avançado de Processo Civil. V. I. 5. ed.
São Paulo: RT, 2002.
___________________. Sentença Civil. Liquidação e Cumprimento. São Paulo: RT,
2006.
___________________; WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Breves Comentários à 2ª
Fase da Reforma do Código de Processo Civil. 2. ed. São Paulo: RT, 2002.
__________;_________; MEDINA, José Miguel Garcia. Breves Comentários à Nova
Sistemática Processual Civil – 2. São Paulo: RT, 2006.
Download

Texto acerca dos atos atípicos - Prof. José Carlos de Araújo Almeida