1 UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE SAÚDE PÚBLICA DEPARTAMENTO DE EPIDEMIOLOGIA DISCIPLINA HEP - 5705 - EPIDEMIOLOGIA I 2006 Avaliando a Validade do Diagnóstico e de Testes de triagem Introdução Os procedimentos de diagnóstico são utilizados para dar subsídios à identificação das causas da presença de sinais e sintomas considerados anormais, eles abrangem entrevistas, exames físicos e testes laboratoriais. O objetivo dos exames de rastreamento (“screening”) é identificar, em uma população aparentemente saudável, indivíduos assintomáticos, mas que na verdade não são sadios ou apresentam maior risco para uma doença ou condição. Assim como os testes de diagnóstico, os testes de rastreamento podem ser entrevistas ou questionários, exames clínicos ou laboratoriais. Os indivíduos submetidos à triagem que apresentarem resultados anormais precisam ser novamente examinados por meio de um teste de confirmatório, de maneira a determinar se eles possuem a condição em questão. Em caso afirmativo, o tratamento apropriado deve ser iniciado. Nenhum teste de diagnóstico ou de rastreamento é completamente acurado. A validade (acurácia) de um teste é caracterizada, em parte, por duas propriedades: sensibilidade e especificidade. A sensibilidade mede a probabilidade de um indivíduo com a doença ser corretamente identificado como tal. A especificidade expressa a probabilidade de um indivíduo sem a doença ser corretamente identificado como não acometido pela mesma. Para conhecer a validade (acurácia) dos resultados do diagnóstico ou testes de rastreamento, é importante que se conheça a probabilidade de um resultado positivo ou negativo, corresponder verdadeiramente a presença ou ausência da doença. O valor preditivo positivo (VPP) é a probabilidade de um indivíduo com um resultado positivo possuir a doença especificada. O valor preditivo negativo (VPN) mede a probabilidade de 2 um resultado negativo do teste identificar, com acurácia, um indivíduo sem a doença. Esses dois indicadores dependem da sensibilidade do teste, de sua especificidade e da prevalência da condição ou doença na população de interesse. Os objetivos deste exercício são: • Calcular a sensibilidade, especificidade, valor preditivo positivo e negativo, avaliando o desempenho de um teste diagnóstico ou de triagem. • Examinar a inter-relação entre esses indicadores. • Calcular a sensibilidade e a especificidade líquida para examinar os efeitos de testes simultâneos ou em série. Questão 1: Um médico clínico geral de uma escola examinou uma população de 2.000 alunos na tentativa de detectar casos suspeitos de tracoma. Considere que a prevalência de tracoma na faixa etária de escolares seja de 10%, a sensibilidade do exame do médico clínico geral seja de 80% e sua especificidade de 80%. Todas as crianças rotuladas como "positivas", ou seja, suspeitas de tracoma pelo clínico geral da escola serão posteriormente encaminhadas para exames com o oftalmologista. A sensibilidade e especificidade do exame do oftalmologista é 90%. 1. Quantas crianças foram rotuladas como "positivas" pelo médico da escola ? 2. Quantas crianças foram rotuladas como "positivas" pelo oftalmogista ? 3. Qual é a sensibilidade líquida do exame seqüencial feito por ambos os examinadores? 4. Qual é a especificidade líquida do exame seqüencial feito por ambos os examinadores? 5. Qual é o valor preditivo positivo do exame feito pelo médico da escola? 6. Qual é o valor preditivo positivo do exame feito pelo oftalmologista? 7. Quantas crianças são examinadas por ambos, ou seja, pelo médico da escola e pelo oftalmologista? Embora isto seja improvável de ocorrer, suponha que a ordem do teste fosse invertida: primeiro as crianças são avaliadas pelo oftalmologista e aquelas julgadas como "positivas" serão examinadas pelo médico da escola. 3 8. A sensibilidade líquida e a especificidade líquida dos dois testes mudam? 9. Qual é o valor preditivo positivo do exame do médico da escola? Por quê ele muda? 10. Em qual ordem você examinaria os escolares de maneira a minimizar o número de crianças examinadas duas vezes? Esta opção de realização dos exames é a mais é prática? Por quê sim ou Por quê não? Suponha que o médico da escola e o oftalmologista trabalhem lado a lado para examinar as crianças. Em outras palavras, as crianças são examinadas pelo médico da escola e pelo cardiologista simultaneamente. 11. Como são definidas a sensibilidade e a especificidade líquida para testes simultâneos? 12. Qual é a sensibilidade e a especificidade líquida para os dois testes? Como eles comparam a sensibilidade e a especificidade líquida para testes seqüenciais? B. Pontos de corte para Diabetes Muitos testes clínicos e/ou laboratoriais (ex: pressão sanguínea, colesterol sérico) revelam-se muito mais uma medida contínua do que uma variável dicotômica. Para esses testes é necessário definir pontos de corte, a seleção de um ponto de corte específico pode depender das características da doença, disponibilidade do tratamento e outros fatores. Um teste de seleção para diabetes foi efetuado em 580 homens através de uma única dosagem de glicose sangüínea. Subseqüentemente, a presença ou ausência de diabetes foi determinada, independentemente, em todos os indivíduos da população utilizando um teste de tolerância a glicose. Os resultados são apresentados na tabela seguinte. Nesta tabela, um teste positivo ou negativo é definido como glicemia acima ou abaixo de um valor específico, respectivamente. Desta maneira, por exemplo, 68 diabéticos tiveram valores de glicemia acima de 100 mg % e 2 apresentaram glicemia abaixo deste valor. 13. Examine a tabela abaixo e calcule a sensibilidade e especificidade da determinação da glicemia para três níveis diferentes de glicose sérica. (Escolha um nível alto de glicose, um intermediário e um baixo) 4 14. Verifica-se algum padrão que relaciona as mudanças na sensibilidade e especificidade com o aumento do ponto de corte da glicemia? Se você estiver classificando uma população, qual glicemia você escolheria como ponto de corte para considerá-lo" positivo"? Por quê? Quais fatores são importantes na determinação de um ponto de corte para um teste de diagnóstico? Número de testes positivos e negativos segundo níveis glicêmicos específicos, em 70 diabéticos e 510 não diabéticos Glicemia (mg %) Diabéticos (n=70) Não Diabéticos (N=510) Teste + Teste - Teste + Teste - 80 70 0 504 6 90 69 1 473 37 100 68 2 381 129 110 65 5 263 247 120 62 8 162 348 130 60 10 90 420 140 52 18 45 465 150 45 25 20 490 160 39 31 7 503 170 37 33 2 508 180 35 35 1 509 190 31 39 1 509 200 26 44 0 510 C. Classificação Múltipla e Mudanças na Prevalência: Efeitos nos Valores Preditivos Desde de 1989, todo sangue doado no Brasil tem sido testado com a finalidade de averiguar a presença de anticorpos contra o Vírus da Imunodeficiência Humana (HIV), causador da Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (SIDA). O método ELISA 5 (“enzyme-linked immunosorbant assay”) tem sido desenvolvido para esta seleção e comercializado por três companhias. Todos os testes licenciados apresentaram sensibilidade e especificidade maior que 99% na avaliação anterior à concessão da licença. Estes testes também têm sido usados por clínicos para fins diagnósticos. Se uma amostra de sangue é inicialmente positiva para o teste de anticorpo-HIV, são realizados mais dois testes utilizando o ELISA. Se ambos os testes forem positivos, o sangue é descartado e a amostra é posteriormente avaliada usando o Wertern Blot, um teste muito específico. A prevalência de HIV varia consideravelmente entre diferentes populações: Doadores de sangue para cruz vermelha 0,0004 Homens homossexuais em Baltimore 0,30 Usuários de droga na cidade de NY 0,55 Hemofílicos 0,70 15. Assumindo 99,0 % de sensibilidade e uma especificidade de 99,0 %, qual são os valores preditivos positivo e negativo do teste ELISA nas populações acima? Quais seriam estes valores se a sensibilidade e a especificidade fossem apenas de 90,0 % ? 16. Como os valores preditivos positivo e negativo comportam-se quando a prevalência da doença aumenta? Em uma população com uma determinada prevalência de doença, o que acontece com o valor preditivo positivo se for utilizado um teste com elevada sensibilidade e especificidade? E com relação ao efeito no valor preditivo negativo? 17. Se as amostras inicialmente positivas são analisadas novamente usando o mesmo teste, como devem comporta-se a sensibilidade e especificidade líquida dessas amostras se comparadas àquela apresentada na primeira aplicação do teste? 18. Quando as amostras inicialmente positivas são novamente testadas, qual é o efeito no valor preditivo positivo do ELISA? 6 Outra Maneira de Calcular o Valor Preditivo O valor preditivo positivo (VPP) também pode ser calculado da seguinte maneira: VPP = (sens) (prev) (sens) (prev) + (1-espec) (1 - prev) E o valor preditivo negativo (VPN) também pode ser calculado da seguinte maneira: VPN = VPP = (sens) (1-prev) (spec) (1-prev) + (1-sens) (prev)