TEORIA DAS PROBABILIDADES A estatística descritiva (ramo da estatística) permite caracterizar, de uma forma resumida, um conjunto de dados. Existe, no entanto, um outro ramo da estatística que permite ampliar a investigação e obter generalizações aplicáveis a indivíduos que não tenham sido observados e que se designa por estatística indutiva ou inferencial. Amostra aleatória População Amostra Estatísticas (conhecidas) Parâmetros (desconhecidos) Inferência estatística Os métodos de inferência estatística permitem: • Estimar as características desconhecidas (parâmetros) de uma população (por exemplo a percentagem de votos em determinado partido); • Testar se determinadas hipóteses sobre essas características desconhecidas são plausíveis (por exemplo, se o que afirma determinado partido acerca da percentagem de votos que irá ter é provável ou não). ©Raul Laureano 1 Assim, as características de uma população designam-se por parâmetros e as de uma amostra por estatísticas. As estatísticas que permitem inferir das características da amostra para a população designam-se por estimadores (todos os estimadores são estatísticas, mas nem todas as estatísticas são estimadores). A inferência estatística pode ser: • Dedutiva, no caso de se estender as conclusões da população para a amostra. Neste caso, como as premissas de que se parte são verdadeiras então também a dedução o será; • Indutiva, no caso de se estender as conclusões de um grupo mais restrito (amostra) para um mais lato (população). Neste caso está sempre associado um certo grau de erro, uma margem de incerteza, medido com o auxílio da Teoria das probabilidades. TEORIA DAS PROBABILIDADES – é a teoria matemática que se ocupa dos métodos de análise que são comuns ao estudo dos fenómenos aleatórios, seja qual for o campo a que pertençam (Murteira et al., 2002, p. 52) FENÓMENOS ALEATÓRIOS – fenómenos que por estarem sujeitos a múltiplas influências casuais não podem ser representados e explicados com base em modelos matemáticos determinísticos. A teoria das probabilidades pretende precisamente proporcionar um modelo – modelo probabilístico – que permita descrever e interpretar os fenómenos aleatórios, ou seja, acontecimentos influenciados pelo acaso. Na base da teoria das probabilidades está o conceito de Experiência aleatória. ©Raul Laureano 2 EXPERIÊNCIA ALEATÓRIA – qualquer processo que dá origem a resultados observáveis e em que os resultados, embora podendo ser descritos no seu conjunto, não são determináveis a priori, ou seja, são incertos devido à influência de factores casuais (múltiplos, desconhecidos e/ou não controláveis). Características de uma experiência aleatória: • O conjunto de resultados possíveis é conhecido antecipadamente; • Não é possível prever exactamente o resultado individual de cada uma das experiências; • Embora não se possam prever os resultados individuais de uma experiência, devido à sua irregularidade, quando a experiência é repetida um número elevado de vezes verifica-se uma regularidade estatística no conjunto dos resultados; • Possibilidade de repetição da experiência em condições similares. Há, no entanto, experiências que se podem realizar apenas uma vez (situações únicas). ESPAÇO DE RESULTADOS – conjunto de todos os resultados possíveis de uma experiência aleatória. Representa-se pela letra grega Ω (omega). O espaço de resultados pode classificar-se em: • Discreto, quando os resultados possíveis são finitos ou infinitos numeráveis; • Contínuo, quando os resultados possíveis são infinitos não numeráveis; • Qualitativo, quando os elementos de Ω se apresentam em escalas nominais ou ordinais; • Quantitativo, quando os elementos de Ω assumem valores numéricos. ©Raul Laureano 3 O espaço de resultados pode ser definido em: • Compreensão Ω = { x : 0 < x < 12} • Extensão Ω = {1, 2,3, 4,5, 6, 7} Exemplos de experiências aleatórias e de espaços de resultados: • Lançamento de uma moeda e observação do lado que fica para cima Ω = { F ,C } • Lançamento de um dado e registo do número de pontos obtidos Ω = {1, 2,3, 4,5, 6} • Tiragem de uma carta do baralho e anotação do naipe Ω = { E , C ,O , P } • Registo do número de sinistros por apólice do ramo automóvel durante uma anuidade Ω = {0,1, 2,...} ou Ω = ℕ0 ou Ω = { x ∈ ℕ 0 : x ≥ 0} • Observação da duração de um determinado componente electrónico Ω = { x ∈ ℝ : x > 0} • Registo da hora de chegada de um fax à central de comunicações Ω = { x : 0 ≤ x ≤ 24} • Registo da hora de entrada e de saída de um cliente de uma loja que abre às 9h e encerra às 19h Ω = {( x , y ) : 9 < x < y < 19} • Registo do número de equipas vencedoras em casa na próxima jornada da liga de futebol Ω = {0,1, 2,3, 4,5, 6, 7,8,9} ©Raul Laureano 4 ACONTECIMENTO – qualquer subconjunto do espaço de resultados é um acontecimento definido em Ω. Como qualquer conjunto é subconjunto de si próprio então Ω é um acontecimento. Acontecimento Elementar (um resultado individual) Composto ou complexo (mais de um resultado) Exemplo: Experiência aleatória: lançamento de um dado Espaço de resultados: Ω = {1, 2,3, 4,5, 6} Acontecimentos: • Saída da face par: o acontecimento composto A é A = { 2, 4, 6} • Saída de 6: o acontecimento elementar B é B = {6} • Saída de um número menor que 3: o acontecimento composto C é C = {1, 2} • Saída de um número menor ou igual a 6: o acontecimento certo D é D=Ω • Saída de 0: o acontecimento impossível E é E = { } = ∅ Assim: • ACONTECIMENTO IMPOSSÍVEL – acontecimento cuja totalidade dos elementos não esteja contido no espaço de resultados; • ACONTECIMENTO CERTO – corresponde ao Ω ©Raul Laureano 5 ACONTECIMENTO VERSUS RESULTADO – não se deve confundir acontecimento com resultado. Na verdade: • Acontecimento é algo que a experiência aleatória pode produzir mas que não se realiza necessariamente; • Resultado é algo que a experiência aleatória produziu (só faz sentido após a realização da experiência aleatória). Assim, definido um acontecimento A ⊂ Ω , se este se realiza ao efectuar a experiência aleatória (isto é, se o resultado da experiência é um ponto que pertence a A ), diz-se que ocorreu um sucesso. Se não se realiza tem-se o complementar de A ( A ou Ac ) e diz-se que ocorreu um insucesso. Deste modo, só após a realização da experiência aleatória se pode afirmar que certo acontecimento se realizou ou não. Sendo ω (ómega) um resultado, diz-se que A se realizou se ω ∈ A . Por outro lado, diz-se que o acontecimento A está contido no acontecimento B ( A ⊂ B ) se todos os resultados individuais que favorecem a ocorrência de A pertencerem também a B . E têm-se acontecimentos mutuamente exclusivos1 quando os acontecimentos não têm elementos em comum, ou seja, quando não se podem realizar em simultâneo. 1 Também designados por acontecimentos incompatíveis ou disjuntos. ©Raul Laureano 6 ALGEBRA DE ACONTECIMENTOS Por analogia com a álgebra dos conjuntos pode-se ter: • UNIÃO DE ACONTECIMENTOS: a união de dois acontecimentos A e B ( A ∪ B ) é o acontecimento que se realiza quando pelo menos um deles se realiza, ou seja, é o acontecimento que se realiza sempre que A ou B se realizarem (ou um, ou outro, ou os dois). A B Ω • INTERSECÇÃO DE ACONTECIMENTOS: a intersecção de dois acontecimentos A e B ( A ∩ B ) é o acontecimento que se realiza quando ambos se realizam (os dois em simultâneo). A B Ω ©Raul Laureano 7 • DIFERENÇA DE ACONTECIMENTOS: A − B (ou A \ B ) é o acontecimento que se realiza se e só se A se realiza sem que se realize B. A B Ω Em particular, Ω − A designa-se por acontecimento contrário ou complementar de A e realiza-se se e só se A não se realiza. Representa-se _ _ por A ou Ac . Evidentemente, A ∩ A = ∅ e A ∪ A = Ω . A _ A = Ω− A ©Raul Laureano 8 • ACONTECIMENTOS INCOMPATÍVEIS OU MUTUAMENTE EXCLUSIVOS: Dois acontecimentos A e B dizem-se mutuamente exclusivos se e só se a realização de um deles implica a não realização do outro. A intersecção não é possível (acontecimento impossível). A B Ω Quer isto dizer que se A ∩ B = ∅ , então A e B são mutuamente exclusivos. • IMPLICAÇÃO DE ACONTECIMENTOS: a realização de A implica a realização de B se e só se qualquer elemento de A é elemento de B ( A ⊂ B ). • IDENTIDADE DE ACONTECIMENTOS: A e B são acontecimentos idênticos se e só se possuem os mesmos elementos. A = B significa que A ⊂ B e B ⊂ A , isto é, a realização de um deles implica a realização do outro. ©Raul Laureano 9 PROPRIEDADES DAS OPERAÇÕES • CUMUTATIVA: A ∪ B = B ∪ A ou A ∩ B = B ∩ A Sair num dado 2 ou 4 é o mesmo que sair 4 ou 2 • ASSOCIATIVA: ( A ∪ B ) ∪ C = A ∪ ( B ∪ C ) ou ( A ∩ B ) ∩ C = A ∩ ( B ∩ C ) Sair 2 ou sair (4 ou 6) é o mesmo que sair (2 ou 4) ou sair 6 • DISTRIBUTIVA: ( A ∩ B ) ∪ C = ( A ∪ C ) ∩ ( B ∪ C ) ou ( A ∪ B) ∩ C = ( A ∩ C ) ∪ ( B ∩ C ) Sair 2 e (par ou menor que 4) é o mesmo que sair (2 e par) ou (2 e menor que 4) • IDEMPOTÊNCIA: A ∪ A = A ou A ∩ A = A Sair 2 ou 2 é o mesmo que sair 2 Sair par e par é o mesmo que sair par _ _ • COMPLEMENTO: A ∪ A = Ω ou A ∩ A = ∅ Sair par ou ímpar é o mesmo que sair “tudo” Sair par e ímpar é o mesmo que sair “nada” • LEIS DE MORGAN: ______ o _ _ ( A ∪ B) = B ∩ A Não sair (2 ou 4) é o mesmo que não sair 2 e não sair 4 ______ o _ _ ( A ∩ B) = B ∪ A Não sair (2 e 4) é o mesmo que não sair 2 ou não sair 4 • ELEMENTO NEUTRO: A ∪ ∅ = A ou A ∩ Ω = A Sair 2 ou sair maior que 7 (impossível) é o mesmo que sair 2 Sair 2 e sair menor que 7 (certo) é o mesmo que sair 2 • ELEMENTO ABSORVENTE: A ∩ ∅ = ∅ ou A ∪ Ω = Ω Sair 2 e sair maior que 7 (impossível) é impossível Sair 2 ou sair menor que 7 (certo) é certo ©Raul Laureano 10 CONCEITOS DE PROBABILIDADES A teoria das probabilidades não ensina o modo atribuir uma probabilidade a um acontecimento (excepto os casos de P ∅ = 0 e P Ω = 1 , mas ensina a calcular as probabilidades de certos acontecimentos a partir das probabilidades de outros acontecimentos, normalmente mais simples do que os primeiros. A probabilidade de um acontecimento depende da interpretação que é dada ao conceito de probabilidade. PROBABILIDADE é uma medida do grau de incerteza atribuído à realização de acontecimentos, a qual é susceptível de várias interpretações (Murteira et al., 2002). Assim, consideram-se três conceitos de probabilidade: • PROBABILIDADE A PRIORI (CONCEITO CLÁSSICO) A probabilidade de um acontecimento A se realizar, designada por P A , é dada pelo quociente entre o número de casos favoráveis ao acontecimento – n ( A ) – e o número de casos possíveis – N . P A = n( A) = Casos favoráveis a A N Casos possíveis ou P A = # A #Ω ©Raul Laureano 11 Pressupostos: Conhecimento prévio ou a priori de todos os resultados possíveis da experiência; Igual probabilidade de todos os resultados possíveis da experiência aleatória. Exemplos: • Lançamento ao ar de uma moeda perfeita: Ω = { F ,C } A = {F} B = {C } P A = P B = 1 = 0,5 2 • Lançamento de duas moedas perfeitas: Ω = { FF , FC ,CF ,CC } A = { FC ,CF } sair só uma face, então P A = 2 = 1 = 0,5 4 2 B = { FF , FC } sair uma face na primeira moeda, então P B = 2 = 1 = 0,5 4 2 C = { FC ,CF ,CC } sair pelo menos uma coroa, então P C = 3 = 0, 75 4 ©Raul Laureano 12 Problemas deste conceito de probabilidade: E se os resultados não forem equiprováveis (por exemplo, moeda viciada)?; E se o número de casos possíveis não for finito e nem sequer numerável? • PROBABILIDADE A POSTERIORI (CONCEITO FREQUENCISTA) A probabilidade é o limite, quando existe, do quociente entre o número de sucessos e o número total de experiências realizadas, ou seja, é o limite de f A = n , em que n representa o número de vezes que se N verificou o acontecimento A e N representa o número de realizações da experiência aleatória: P A = lim f A ou N →∞ número de realizações de A (n) N →∞ número de experiências efectuadas (N) P A = lim Ou seja é o número para o qual tende a frequência relativa do acontecimento A quando se aumenta o número de vezes que a experiência aleatória é efectuada. Prova-se empiricamente que quando N aumenta há uma tendência para a estabilização da frequência relativa (lei dos grandes números). ©Raul Laureano 13 Exemplo: • Observação do sexo de um recém-nascido numa grande cidade: Ω = { Feminino , Masculino} Como esta experiência já se realizou muitas vezes sabe-se que a probabilidade de um recém-nascido ser do sexo feminino é de 0,48. Nados-vivos (N.º) por Sexo Período de referência dos dados Sexo 2005 HM 109457 H 56643 2004 N.º M 52814 HM 109356 H 56242 53114 M Nados-vivos (N.º) por Sexo - Anual; INE, Nados-Vivos A utilização do conceito clássico de probabilidade, em que os elementos do espaço de resultados são equiprováveis, levaria a cometer um erro, já que a probabilidade de um recém-nascido ser do sexo feminino seria de 0,5 (igual à probabilidade de ser do sexo masculino). Problema deste conceito de probabilidade: Por vezes as experiências não são repetitivas nas mesmas condições ou em condições semelhantes, então não é possível usar as frequências relativas (por exemplo vencedores em casa na primeira jornada da liga. ©Raul Laureano 14 Exemplos da Lei dos grandes números Soma dos pontos com dois dados: probabilidade e frequência relativa ao fim de 6000 lançamentos Probabilidade - Frequência relativa Soma dos pontos Probabilidade Frequência relativa 2 0,027778 0,027667 3 0,055556 0,052000 4 0,083333 0,085167 5 0,111111 0,111100 6 0,138889 0,131833 7 0,166667 0,173167 8 0,138889 0,136500 9 0,111111 0,113500 10 0,083333 0,086333 11 0,055556 0,053167 12 0,027778 0,029667 0,20 0,18 0,16 0,14 0,12 0,10 0,08 0,06 0,04 0,02 0,00 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 Soma dos pontos dos dois dados Probabilidade Frequência relativa Fonte: Murteira, Ribeiro, Silva e Pimenta (2003, p.68) ©Raul Laureano 15 Evolução da frequência relativa da "coroa" em 100 lançamentos n 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 21 22 23 24 25 fn 1,000 0,500 0,667 0,750 0,600 0,667 0,571 0,625 0,556 0,500 0,455 0,500 0,538 0,500 0,467 0,438 0,412 0,389 0,421 0,450 0,476 0,455 0,435 0,417 0,400 n 26 27 28 29 30 31 32 33 34 35 36 37 38 39 40 41 42 43 44 45 46 47 48 49 50 fn 0,385 0,407 0,429 0,448 0,433 0,452 0,438 0,424 0,441 0,457 0,472 0,486 0,474 0,462 0,450 0,439 0,452 0,465 0,455 0,467 0,457 0,447 0,458 0,469 0,480 n 51 52 53 54 55 56 57 58 59 60 61 62 63 64 65 66 67 68 69 70 71 72 73 74 75 fn 0,490 0,481 0,491 0,481 0,473 0,482 0,491 0,500 0,508 0,500 0,492 0,484 0,476 0,469 0,462 0,470 0,478 0,485 0,478 0,471 0,465 0,472 0,479 0,473 0,480 n 76 77 78 79 80 81 82 83 84 85 86 87 88 89 90 91 92 93 94 95 96 97 98 99 100 fn 0,487 0,494 0,487 0,494 0,488 0,481 0,488 0,494 0,500 0,494 0,488 0,483 0,489 0,483 0,489 0,495 0,489 0,495 0,500 0,505 0,500 0,495 0,490 0,495 0,500 Fonte: Murteira, Ribeiro, Silva e Pimenta (2003, p.67) 1,0 Frequência relativa da coroa 0,9 0,8 0,7 0,6 0,5 0,4 0,3 0,2 0,1 0,0 0 10 20 30 40 50 60 70 80 90 100 Número de lançamento (n) ©Raul Laureano 16 • PROBABILIDADE SUBJECTIVA (CONCEITO PERSONALISTA) “A probabilidade subjectiva constitui uma aproximação quantitativa à credibilidade que se atribui a um acontecimento” (Murteira et al. 2002, p.69). Ou seja, exprime o grau de credibilidade que um indivíduo, com o conhecimento que possui da situação, associa a certo acontecimento. É neste sentido que, em geral, a palavra probabilidade aparece na linguagem corrente. Exemplo: • A taxa de desemprego no próximo ano vai cair para 5%. Como sou especialista em economia posso dizer que tal acontecimento tem uma probabilidade de 0,8. ©Raul Laureano 17 AXIOMAS E TEOREMAS DA TEORIA DAS PROBABILIDADES Recordando, probabilidade é uma medida do grau de incerteza atribuído à realização de acontecimentos. MEDIDA DE PROBABILIDADE é uma função P que a cada acontecimento A , A ⊂ Ω , faz corresponder um número real: P A . A probabilidade do acontecimento A ( P A ) verifica os três axiomas2: 1. P A ≥ 0 para todo A ⊆ Ω 2. P Ω = 1 3. P A ∪ B = P A + P B se A∩B = ∅ (se A e B são mutuamente exclusivos) Generalizando a n acontecimentos: n i =1 P ∪ Ai = n ∑ P Ai i =1 se Ai ∩ A j = ∅ para i ≠ j (se A1 , A2 ,..., An mutuamente exclusivos) 2 Axiomas são proposições (fundamentais) não demonstráveis. ©Raul Laureano 18 A probabilidade do acontecimento A ( P A ) verifica os seis teoremas3: 1. P A = 1 − P A 2. P ∅ = 0 para qualquer acontecimento A definido em Ω sendo ∅ o acontecimento impossível 3. P A − B = P A − P A ∩ B a probabilidade da diferença entre dois acontecimentos é igual à diferença entre a probabilidade de um deles e a intersecção de ambos. 4. P A ∪ B = P A + P B − P A ∩ B a probabilidade da união de dois acontecimentos é igual à soma das respectivas probabilidades, deduzida da probabilidade da intersecção de ambos com três acontecimentos P [ A ∪ B ∪ C ] = P [ A ] + P [ B ] + P [C ] − P [ A ∩ B ] − P [ A ∩ C ] − P [ B ∩ C ] + P [ A ∩ B ∩ C ] 5. P A ≤ P B se A ⊂ B se A está contido em B então a probabilidade de A é menor ou igual à probabilidade de B 6. P A ≤ 1 Note-se ainda, por exemplo, que: P B = P A ∩ B + P A ∩ B ; P B = P A ∩ B + P A ∩ B ; P A ∩ B = P A ∩ B ∩ C + P A ∩ B ∩ C ; P A ∩ B = P B − P A ∩ B . 3 Teoremas são proposições obtidas por dedução lógica a partir dos axiomas e/ou outros teoremas. Os axiomas e os teoremas dão corpo à teoria das probabilidades. ©Raul Laureano 19 APLICAÇÃO Em determinada população, 9,8% das pessoas adquirem a revista A, 22,9%, a revista B, e 5,1% adquirem ambas. Admite-se que a medida de probabilidade é a proporção dos indivíduos da população que adquirem as revistas (interpretação frequencista). Considerando os seguintes acontecimentos: A – adquirir a revista A B – adquirir a revista B Determine: a) A probabilidade de adquirir somente a revista A. _ Corresponde ao acontecimento A ∩ B = A − B P A − B = P A − P A ∩ B = 0, 098 − 0, 051 = 0, 047 b) A probabilidade de uma pessoa ao acaso adquirir pelo menos uma das revistas. P A ∪ B = P A + P B − P A ∩ B = 0, 098 + 0, 229 − 0, 051 = 0, 276 c) A probabilidade de não adquirir nem a revista A, nem a revista B. P A ∩ B = P A ∪ B = 1 − P A ∪ B = 1 − 0, 276 = 0, 724 ©Raul Laureano 20 PROBABILIDADE CONDICIONADA, PROBABILIDADE DA INTERSECÇÃO E ACONTECIMENTOS INDEPENDENTES Dados dois acontecimentos A e B definidos em Ω com P A ≠ 0 e P B ≠ 0 , a probabilidade de que A se realize sabendo que B já se realizou representa-se por P A | B 4 – probabilidade de A dado B – e é dada pelo quociente: P A ∩ B P B P A | B = Assim, corresponde à restrição do espaço de resultados global ( Ω ) ao sub-espaço B , ou seja, ao cálculo da proporção entre a parte de A comum a B sobre o total de B . Trata-se do cálculo de uma probabilidade tendo subjacente outra, ou seja, estamos perante uma probabilidade condicionada por outra. Então, a probabilidade da intersecção dos acontecimentos A e B é: P A ∩ B = P A | B . P B ou P A ∩ 4 B = P B | A . P A já que P B | A = P A ∩ B P A Por vezes a probabilidade condicionada aparece também representada por P [ A / B ] . ©Raul Laureano 21 Axiomas e teoremas das probabilidades na probabilidade condicionada – todas as propriedades já apresentadas são válidas quando se utiliza um mesmo acontecimento condicionante. Assim, temos por exemplo: • P A | C ≥ 0 • P Ω | C = 1 • P ( A ∪ B ) | C = P A | C + P B | C − P A ∩ B | C • P A \ B | C = P A | C − P A ∩ B | C •… Se o conhecimento da realização de B em nada afecta a probabilidade da realização de A e vice-versa, então os acontecimentos A e B dizem-se acontecimentos independentes e virá: P A | B = P A P B | A = P B P A ∩ B = P A . P B (condição para a independência) Assim, dois acontecimentos de probabilidade não nula são independentes se e só se a probabilidade da intersecção igualar o produto das respectivas probabilidades. Esta conclusão generaliza-se para mais acontecimentos. No entanto, é preciso ter em consideração que se os vários acontecimentos forem independentes entre si (conjuntamente), então também o são dois a dois; mas se forem independentes dois a dois, podem não ser independentes entre si. Note-se que se A e B são independentes então A e B ; A e B ; e A e B também são independentes. ©Raul Laureano 22 ACONTECIMENTOS INDEPENDENTES E ACONTECIMENTOS MUTUAMENTE EXCLUSIVOS • Dois acontecimentos dizem-se independentes quando o acontecimento de um não condiciona a ocorrência do outro. • Dois acontecimentos dizem-se mutuamente exclusivos quando não ocorrem simultaneamente. Os acontecimentos "ir trabalhar" e "estar a chover" são à priori acontecimentos independentes, na medida em que não se trabalha menos quando chove, nem quando não chove. Não são mutuamente exclusivos, pois podem ocorrer simultaneamente. Em regra, dois acontecimentos não podem ser simultaneamente independentes e mutuamente exclusivos. Contudo a excepção é o caso em que um dos acontecimentos é impossível (um acontecimento impossível é sempre independente e mutuamente exclusivo de qualquer acontecimento possível). Se P A > 0 e P B > 0 então: • Se os acontecimentos forem mutuamente exclusivos verifica-se que P A ∩ B = 0 e, portanto, não podem ser independentes já que para isso teríamos que P A ∩ B = P A . P B > 0 (o que não acontece); • Se os acontecimentos forem independentes então P A ∩ B = P A . P B > 0 e, portanto, não podem ser mutuamente exclusivos já que para isso teríamos que P A ∩ B = 0 . Só seriam independentes se um acontecimento tivesse probabilidade nula. ©Raul Laureano 23 Exemplos (Ramos, 2004): Cem indivíduos foram classificados segundo dois atributos: sexo e grau de preconceito Grau de preconceito Elevado Baixo Total Sexo Feminino Masculino 50 25 10 15 60 40 Total 75 25 100 a) A probabilidade de escolher um indivíduo com elevado preconceito será: P E = 75 = 0,75 100 b) A probabilidade de escolher um indivíduo do sexo masculino com elevado grau de preconceito será: P M ∩ E = 25 = 0,25 100 c) Probabilidade de escolher um indivíduo do sexo feminino sabendo que tem elevados preconceitos: P F ∩ E P F | E = = P E 50 100 75 100 = 50 = 0,6(6) 75 d) Escolher uma pessoa com baixos preconceitos sabendo que é do sexo feminino: P B ∩ F P B | F = = P F 10 100 60 100 = 10 = 0,1(6) 60 e) Verifiquemos que P E ∩ F ≠ P E . P F e, portanto, que E e F não são acontecimentos independentes: P E ∩ F = 50 = 0,5 100 P E . P F = ©Raul Laureano P E = 75 = 0,75 100 P F = 60 = 0,6 100 75 60 . = 0,45 100 100 24 Considere-se um baralho de 52 cartas. a) Retiram-se sucessivamente duas cartas do baralho, com reposição. Qual a probabilidade de saírem duas cartas de espadas? A - sair espadas na 1ª extracção B - sair espadas na 2ª extracção P A ∩ B = P A . P B = 13 . 13 = 1 = 0,0625 52 52 6 Como a extracção é feita com reposição a probabilidade de sair uma carta de espadas na segunda tiragem não é afectada pelo facto de ter saído uma carta de espadas na primeira tiragem, portanto os dois acontecimentos são estatisticamente independentes. b) Suponha agora que a extracção é feita sem reposição. Neste caso a probabilidade de sair uma certa carta de espadas na segunda tiragem já é afectada pelo facto de ter saído uma carta de espadas na primeira tiragem. Logo os dois acontecimentos não são estatisticamente independentes e portanto virá: P A ∩ B = P A . P B | A = 13 . 12 = 1 = 0,0588 17 52 51 c) Se por exemplo, extrairmos três cartas em vez de duas considerando o acontecimento C, "saída de espadas na terceira tiragem", então a probabilidade de ocorrerem espadas na 1ª, 2ª e 3ª extracção sendo esta sem reposição virá: P A ∩ B ∩ C = P A . P B | A . P C | A ∩ B = = 13 . 12 . 11 = 11 = 0,0129 52 51 50 850 Se a extracção fosse com reposição então os acontecimentos seriam independentes, pois a ocorrência de espadas na primeira extracção não afectaria a probabilidade de saída de espadas na segunda extracção e a saída de espadas nas duas primeiras não alteraria a probabilidade de ocorrência de espadas na terceira extracção. Assim, P A ∩ B ∩ C = P A . P B . P C = 0,0156 ©Raul Laureano 25