UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS INSTITUTO DE ECONOMIA CE- 839 - INTRODUÇÃO À ADMINISTRAÇÃO PARA COMPUTAÇÃO 1º Semestre de 2008 Prof. Luiz Antonio T. Vasconcelos Caderno de Notas de Aulas e Textos para consulta. Org.: Profa. Maria Carolina de A. F. Souza e Prof. Luiz Antonio T. Vasconcelos Índice TEXTO 1: ADMINISTRAÇÃO CIENTÍFICA OU ADMINISTRAÇÃO DAS TAREFAS ............................................. 2 TEXTO 2. CONFISSÕES DE TOM PETERS .................................................................................................................... 15 TEXTO 3: NOBREGA, CLEMENTE. TAYLOR SUPERSTAR. EXAME 24/09/1997 (EDIÇÃO 645) .......................... 22 TEXTO 4: BASES PARA UMA ADMINISTRAÇÃO RENOVADA: AKTOUF, O. A ADMINISTRAÇÃO ENTRE A TRADIÇÃO E A RENOVAÇÃO. SP: ATLAS, 1996 ............................................................................................................ 27 TEXTO 5: ORGANIZAÇÃO DO PROCESSO DE TRABALHO NA EVOLUÇÃO DO CAPITALISMO ................. 29 TEXTO 6: SOBRE AS FUNÇÕES DO ADMINISTRADOR (DE ACORDO COM ALGUMAS DAS PRINCIPAIS CONCEPÇÕES) .................................................................................................................................................................... 41 TEXTO 7: NOTAS SOBRE A EVOLUÇÃO DA TEORIA DA ADMINISTRAÇÃO E A ESTRUTURA ORGANIZACIONAL ........................................................................................................................................................... 46 TEXTO 8: - ALGUMAS OBSERVAÇÕES SOBRE OS TIPOS DE ESTRUTURA ORGANIZACIONAL ................ 65 TEXTO 9: DRUCKER PETER F. OS NOVOS PARADIGMAS DA ADMINISTRAÇÃO. EXAME, 24/02/1999 (EDIÇÃO 682)........................................................................................................................................................................ 67 TEXTO 10: - REESTRUTURAÇÃO PRODUTIVA E MUDANÇAS ORGANIZACIONAIS: ESPAÇO PARA A GESTÃO DO CONHECIMENTO ...................................................................................................................................... 84 TEXTO 11: A ERA DA IGNORÂNCIA ............................................................................................................................. 94 TEXTO 12: O HOMEM COMO MEDIDA. ESPECIALISTA DESCREVE DADO, INFORMAÇÃO E CONHECIMENTO. .............................................................................................................................................................. 99 TEXTO 13: RUMO AO TEMPO DIGITAL ..................................................................................................................... 101 TEXTO 14: ASPECTOS FUNDAMENTAIS DAS NOÇÕES DE ORGANIZAÇÃO E ADMINISTRAÇÃO ........... 103 Texto 1: ADMINISTRAÇÃO CIENTÍFICA OU ADMINISTRAÇÃO DAS TAREFAS 2.1.Administração de acordo com tarefas individuais previamente determinadas (como propõe Taylor) a) Pontos de partida de Taylor - Os métodos de trabalho ainda não haviam sido codificados, ou sistematicamente analisados e descritos. A partir dessa constatação compara a administração científica (sua proposta) com o sistema de “iniciativa e incentivo” (que então vigorava). Argumentação: O engenho e a experiência de cada geração - de cada década - sem dúvida têm transmitido à seguinte os melhores métodos empregados. Esse conjunto de conhecimentos empíricos ou tradicionais pode ser considerado como o principal recurso e patrimônio dos artífices. Os administradores partem do pressuposto de que os trabalhadores sob suas ordens possuem esses conhecimentos tradicionais, dos quais grande parte escapa à administração. Isto é, admitem que seus conhecimentos estão abaixo daqueles que, em conjunto, possuem todos os operários sob suas ordens. O administrador experimentado deixa, assim, ao arbítrio do operário, o problema da escolha do método melhor e mais econômico para realizar o trabalho. Ele acredita que sua função seja induzir o trabalhador a usar em sua atividade, o melhor esforço, os conhecimentos tradicionais, a habilidade, a inteligência e a boa vontade - em uma palavra - sua iniciativa, no sentido de dar o maior rendimento possível ao patrão. O principal problema da administração pode ser, então, resumido em obter a melhor iniciativa de cada operário. Iniciativa no sentido mais amplo, para abranger todas as boas qualidades do trabalhador. Mas os administradores defrontar-se-iam com uma restrição para a solução desse problema. Na concepção de Taylor: “o trabalhador médio evita dar ao patrão toda a sua iniciativa; acredita que é contra seus interesses empregar sua melhor iniciativa e, em lugar de se esforçar para realizar a maior quantidade possível de trabalho da melhor qualidade, ele deliberadamente trabalha tão devagar quanto pode, ao mesmo tempo em que procura fazer acreditar aos superiores que trabalha depressa”. Para estimular a iniciativa do trabalhador, o diretor deve fornecer-lhe incentivo especial. Esse incentivo pode ser concedido de diferentes modos, como, por exemplo: - promessa de rápida promoção ou melhoria; - salários mais elevados, sob a forma de boa remuneração por peça produzida, ou por prêmio, ou por gratificação de qualquer espécie a trabalho perfeito e rápido; - menos horas de trabalho, melhores condições de ambiente e serviço do que são dadas habitualmente; 2 - sobretudo, esse incentivo especial deve ser acompanhado por tratamento pessoal e amistoso, tratamento que somente pode derivar de interesse verdadeiro, posto a serviço do bem-estar dos subordinados. - Somente quando é dado estímulo especial ou incentivo desse gênero é que o patrão pode esperar obter a iniciativa de seus empregados. - Em síntese, esse sistema poderia ser definido como aquele em que o trabalhador dá a melhor iniciativa e em compensação recebe incentivos pessoais de seu patrão. O bom êxito depende quase inteiramente de obter a iniciativa do operário e raramente essa iniciativa é alcançada. Em contraposição, propõe Taylor, na administração científica, a iniciativa do trabalhador (que é seu esforço, sua boa vontade, seu engenho) obtém-se com absoluta uniformidade e em grau muito maior do que é possível sob o antigo sistema. Em acréscimo a essa vantagem referente ao homem, os gerentes assumem novos encargos e responsabilidades. À gerencia é atribuída, por exemplo, a função de reunir todos os conhecimentos tradicionais que no passado os trabalhadores possuíram e então classificá-los, tabulá-los, reduzi-los a normas, leis ou fórmulas, grandemente úteis ao operário para execução do seu trabalho diário. Desse modo, além de desenvolver uma ciência, a direção exerce atribuições que envolvem novos e pesados encargos para ela. Em conclusão, um tipo de homem é necessário para planejar e outro tipo diferente para executar o trabalho. Para sintetizar: sob administração por iniciativa e incentivo o problema todo é praticamente o trabalhador; na administração científica, a metade do problema é a direção. Note-se que a idéia de tarefa é um dos mais importantes elementos na administração científica. O trabalho planejado antecipadamente constitui, desse modo, uma tarefa que precisa ser desempenhada não somente pelo operário, mas, em quase todos os casos, pelo esforço conjunto do operário e da direção. Na tarefa é especificado o que deve ser feito e também como fazê-lo, além do tempo exato concebido para a execução. O Como: (Um exemplo) “(...) Nosso dever consistia em providenciar que as 80 000 toneladas de barras fossem colocadas nos vagões na proporção de 47 toneladas por homem e por dia, em vez de 12½, como estavam sendo transportadas anteriormente. E, além disso, era também nossa obrigação cogitar que tal serviço fosse executado sem discussões graves e, de tal modo, que os operários se sentissem tão satisfeitos em carregar 47 toneladas em média como as 12½ na forma antiga”. Nossa primeira providência foi a seleção científica do trabalhador. Nesse novo sistema de administração é regra inflexível falar e tratar com um trabalhador de cada vez, desde que cada um possui aptidões próprias e contra-indicações especiais, e que não estamos lidando com homens em grupo, mas procurando aumentar individualmente a eficiência e dar a cada um a maior prosperidade. Assim, nosso primeiro cuidado foi procurar o homem adequado para iniciar o trabalho. Cronometramos e estudamos cuidadosamente os 75 carregadores, durante 3 a 4 dias, ao fim dos quais separamos quatro homens que pareciam ser fisicamente capazes de carregar barras de ferro na proporção de 47 toneladas por dia. Foi feito, então, o estudo apurado de cada um destes homens; investigamos seu passado, tanto quanto possível e ambições de cada um. 3 Finalmente, dos quatro, escolhemos um, como o mais apto para começar. Era um pequeno holandês, vindo da Pensilvânia, que costumava correr à tarde, de volta para casa, situada mais ou menos a uma milha, tão bem disposto, como quando chegava correndo para o trabalho de manhã. Soubemos que com o salário de $ 1,15 dólares, por dia, ele tinha conseguido comprar um pequeno terreno e se empenhava em construir uma casinha própria, trabalhando para isto, de manhã, antes de entrar na fábrica, e à tarde, depois de deixá-la. Tinha também fama de ser seguro, isto é, de dar muito valor ao dinheiro. Uma pessoa, com quem conversamos, disse-nos a respeito dele: Um centavo parece-lhe tão grande como uma roda de carroça. Chamaremos esse homem de Schmidt. O nosso problema, então, se limitava em conseguir de Schmidt o carregamento de 47 toneladas de barras de ferro por dia e que ele fizesse esse trabalho com satisfação. Procedemos da seguinte forma. Schmidt foi chamado à parte e falamos-lhe mais ou menos desse modo: - Schmidt, você é um operário qualificado? - Não sei bem o que o senhor quer dizer. - Desejo saber se você é ou não um operário qualificado. - Ainda não o entendi. - Venha cá. Você vai responder às minhas perguntas. Quero saber se você é um operário qualificado, ou um desses pobres diabos que andam por aí. Quero saber se você deseja ganhar $ 1,85 dólar por dia, ou se está satisfeito com $ 1,15 dólar que estão ganhando todos esses tontos aí. Se eu quero ganhar $ 1,85 dólar por dia? Isto é que quer dizer um operário qualificado? Então, sou um operário qualificado. Ora, você me irrita. Naturalmente que deseja ganhar $ 1,85 por dia; todos o desejam. Você sabe perfeitamente que isso não é bastante para fazer um operário qualificado. Por favor, procure responder às minhas perguntas e não me faça perder tempo. Venha comigo. Vê esta pilha de barras de ferro? Sim Vê este vagão? Sim. Muito bem. Se você é um operário qualificado, carregará todas estas barras para o vagão, por $ 1,85 dólar. Agora, então, pense e responda à minha pergunta. Diga se é ou não um operário qualificado. Bem, vou ganhar $ 1,85 dólar para por todas estas barras de ferro no vagão, amanhã? Sim, naturalmente, você receberá $1,85 dólar para carregar uma pilha, como esta, todos os dias, durante o ano todo. Isto é que é um operário qualificado e você o sabe tão bem como eu. Bem, tudo entendido. Devo carregar as barras para o vagão amanhã, por $ 1,85 dólares e nos dias seguintes, não é assim? Isso mesmo. Assim, então sou um operário qualificado. Devagar. Voce sabe, tão bem quanto eu, que um operário qualificado deve fazer exatamente o que se lhe disser desde manhã à noite. Conhece você aquele homem ali? Não, nunca o vi. 4 Bem, se você é um operário qualificado deve fazer exatamente o que este homem lhe mandar, de manhã à noite. Quando ele disser para levantar a barra e andar, você se levanta e anda, e quando ele mandar sentar, você senta e descansa. Você procederá assim durante o dia todo. E, mais ainda, sem reclamações. Um operário qualficado faz justamente o que se lhe manda e não reclama. Entendeu? Quando este homem mandar você andar, você anda; quando disser que se assente, você deve assentarse e não fazer qualquer observação. Finalmente, você vem trabalhar aqui amanhã e saberá, antes do anoitecer, se é verdadeiramente um operário qualificado ou não. Este diálogo pode parecer um pouco áspero. E, de fato, seria se aplicado a um mecânico educado ou mesmo a um trabalhador inteligente. Com um homem de mentalidade limitada como Schmidt, é realmente o adequado, visto que eficiente em prender sua atenção sobre o alto salário que ele desejava e, ao mesmo tempo, em desviá-lo do trabalho maior que, percebido, o levaria a considerar a tarefa como impossível. Qual seria a resposta de Schmidt se lhe falássemos do modo comumente usado no sistema de administração por iniciativa e incentivo? Dir-lhe-íamos nesse caso: “Schmidt, você é um carregador de barras de primeira ordem e conhece muito bem o seu serviço. Você tem carregado 12½ toneladas de barras por dia. Estudei demoradamente este trabalho de carregar lingotes e estou certo de que você poderá fazer muito mais do que até aqui tem feito. Acredita que, se você realmente quiser, carregará 47 toneladas por dia, em vez de 12½ toneladas?”. Não é preciso dizer qual teria sido sua resposta. Schmidt começou a trabalhar. Durante o dia todo e a intervalos regulares, o homem que o orientava com um relógio na mão lhe dizia: “Agora, levante o lingote e ande. Agora, sente-se e descanse. Agora, ande; agora, descanse”, etc. Ele trabalhava e descansava quando mandado, e às 5½ da tarde tinha colocado no vagão 47½ toneladas. Praticamente nunca falhou, trabalhando neste rítmo e fazendo a tarefa, que lhe foi determinada, durante os três anos que o autor esteve em Bethlehem. E, por todo este tempo, atingiu média pouco maior que $ 1,85 dólar por dia, enquanto antes nunca percebera acima de $1,15 por dia, que era o salário comum, nesta época, em Bethlehem. Assim, ele recebeu salários 60% mais elevados do que eram pagos a outros homens que não trabalhavam no sistema da tarefa. Uns após outros, os homens foram chamados e treinados para carregar lingotes na proporção de 47½ toneladas por dia, até que se transportaram todas as barras de ferro; ganharam então remuneração superior à dos outros trabalhadores da vizinhança. Todo tempo diário do trabalhador é absorvido fazendo o trabalho com as mãos, de modo que mesmo que tenha a educação necessária e hábitos de generalização, falta-lhe tempo e oportunidade para desenvolver estas leis, pois o estudo de uma simples lei, o estudo do tempo, por exemplo, requer a cooperação de dois homens - um que faz o trabalho e o outro que o mede com o cronômetro. E, ainda quando o operário chegasse a descobrir leis em assunto, no qual apenas existem conhecimentos empíricos, seu interesse pessoal far-lhe-ia guardar inevitavelmente suas descobertas, visto poder, graças a seus conhecimentos especiais, produzir mais que os outros e, assim, alcançar mais altos salários. Do exposto, nota-se que o pensamento de Taylor pode ser sintetizado em quatro princípios básicos conforme será explicitado no próximo item. 5 Para reflexão: pensando no contexto atual, como deveria ser, em sua opinião, o relacionamento entre as pessoas nas organizações, como você dialogaria com Schmidt visando obter um aumento de seu desempenho? A partir de suas reflexões escreva um novo diálogo. 2.2. Princípios Fundamentais de Administração Científica a) Problemas focalizados por Taylor Administração sem noção clara da divisão de suas responsabilidades com o trabalhador Inexistência de incentivos para melhorar o desempenho do trabalhador Muitos trabalhadores não cumpriam suas responsabilidades Decisões dos administradores baseavam-se na intuição e no palpite Não havia integração entre os departamentos da empresa Os trabalhadores eram colocados em tarefas para as quais não tinham aptidões Os gerentes pareciam ignorar que a excelência no desempenho significaria recompensas tanto para eles próprios quanto para os trabalhadores Conflitos entre capatazes e conflitos entre capatazes e operários a respeito da quantidade a produzir b) Princípios de administração Primeiro: Desenvolvimento de uma verdadeira ciência - desenvolver para cada elemento do trabalho individual uma ciência que substitua os métodos empíricos do trabalho reduzir o saber operário complexo e seus elementos estudar os tempos de cada trabalho decomposto para se chegar ao tempo necessário para operações variadas. Segundo: Seleção científica do trabalhador - selecionar cientificamente, depois de treinar, ensinar, e aperfeiçoar o trabalhador todo trabalho intelectual deve ser eliminado da fábrica e centralizado no departamento de planejamento separação entre trabalho de concepção e o de execução. A “ciência do trabalho” deve ser desenvolvida sempre pela gerência e nunca estar de posse do trabalhador. Terceiro - Cooperação íntima e cordial entre a direção e os trabalhadores. Cooperar cordialmente com os trabalhadores para articular todo trabalho com os princípios da ciência que foi desenvolvida aplicar a “ciência do trabalho” e controlar até mesmo os mínimos detalhes de sua execução Quarto: manter a divisão eqüitativa do trabalho e das responsabilidades entre a direção e o operário a direção incube-se de todas as atribuições, para as quais esteja mais bem aparelhada do que o trabalhador. Desses quatro princípios depreende-se que o poder de decisão nas mãos da direção, excluindo os produtores diretos da participação da concepção e do planejamento da produção. O operário deve apenas realizar as instruções sem questioná-las; afinal os planejadores já se dedicaram a pensar as melhores formas (mais produtivas) formas para a realização das tarefas. Além disso, pode-se destacar duas características do sistema Taylorista: Primeira: aparecimento da função hoje conhecida como analista de tempos e movimentos Segunda: individualização dos salários Em decorrência: 6 Papel do administrador - juntar todo o conhecimento tradicional adquirido pelo trabalhador e classificar, tabular e reduzir este saber a regras, leis e fórmulas, repassando-as ao trabalhador como “a melhor maneira de se executar uma operação” separação das especialidades do trabalhador do processo de trabalho. Papel da direção - dirigir, controlar e vigiar o trabalhador c) Técnicas da administração científica Fundamentos, até hoje não bem firmados- revolução mental, na maneira de encarar o trabalho e as responsabilidades em relação ao colega e à empresa; a produtividade resulta da eficiência do trabalho e não da maximização do esforço; a questão não é trabalhar duro e depressa, nem bastante, mas trabalhar de forma inteligente. Destacam-se como técnicas: - Estudos de tempos e movimentos - Padronização de ferramentas e instrumentos - Padronização de movimentos - Conveniência de uma área de planejamento - Cartões de instruções - Sistema de pagamento de acordo com o desempenho - Cálculo de custos Em síntese, o pensamento tradicional em administração tinha como referência o objetivo de constituir uma concepção administrativa global e orgânica da empresa, caracterizada pela coerência interna, sistematizando-a em “princípios gerais”. A figura a seguir ilustra os princípios da administração científica segundo Taylor SALÁRIOS ALTOS E CUSTOS BAIXOS SELEÇÃO E TREINAMENTO CIENTÍFICOS PESQUISAR PARA TRABALHAR MELHOR COOPERAÇÃO CORDIAL Fonte: Maximiano, A. C. A. Teoria Geral da Administração. São Paulo, Atlas, 1997 7 d) Pontos favoráveis e desfavoráveis Como pontos favoráveis pode-se destacar: o caráter precursor o êxito técnico Como pontos desfavoráveis destacam-se: o idéia clássica de equilíbrio o não levou em conta a evolução histórica o supervalorização dos conceitos e objetivos “eficiência” e produtividade o imagem irreal da organização (só analisou o lado formal) o sistema fechado o concepção irreal do homem (comparado à máquina) o não levou em conta o grupo social e o sistema político o omissão do contexto (interações sociais, influência do meio ambiente) e) Principais críticas - dos sindicatos de trabalhadores, da imprensa e de políticos: receio de que o aumento da eficiência provocasse o desemprego acusação de que a Administração Científica nada mais era do que uma técnica para fazer o operário trabalhar mais e ganhar menos causa de intensificação da exploração do trabalhador causa da desumanização do trabalhador na medida em que procura automatizar seus movimentos e retirar dele qualquer controle sobre o processo de trabalho de outras origens e naturezas: propostas para a engenharia/controle da produção e não para a administração da empresa visão esquemática da fábrica baseada exclusivamente nas relações formais (o capataz “tudo pode” e os trabalhadores “tudo obedecem”) o trabalhador age de forma individual baseado em seus interesses imediatos 2.3. Sobre Produção em Massa De alguma forma, os princípios da administração científica continuam presentes no contexto da produção em massa, apesar das novas exigências e necessárias “adaptações”, dadas suas características. 8 H. Ford: problemas focalizados [produção em massa: produtos não diferenciados em grande quantidade], princípios, objetivos e técnicas evolução de produção artesanal para a linha de montagem móvel e mecanizada utilização de peças e componentes padronizadas e intercambiáveis: cada peça ou componente pode ser montado em qualquer sistema ou produto final redução ao máximo do número de peças utilizadas trabalhador especializado e bem pago (acima da concorrência): o produto é dividido em partes e o processo de fabricação em etapas; cada pessoa ou grupo tem uma tarefa fixa dentro de um processo pré-definido “hiper” padronização do produto: durante longo tempo apenas carros da cor preta “hiper” conservadorismo: apenas em 1941 seus empregados puderam sindicalizar-se 2.4. Sobre a Escola das Relações Humanas Como conjunto de princípios de administração diferenciados em relação aos propostos pela Escola Clássica, cabe espaço à Escola de Relações Humanas como “escola” de pensamento em administração. O principal objetivo dessa abordagem foi o de ampliar o campo de estudo da escola tradicional (levando em conta outras organizações além da empresa); o homem passa a ser a principal variável do processo de produção. a) Princípios da Escola de Relações Humanas O homem é visto como fundamentalmente emocional e não um ser econômico-racional: as pessoas têm emoções e necessidades sociais que podem explorar melhor o comportamento no trabalho do que os incentivos de caráter pecuniário, por meio da formação de grupos informais no local de trabalho; As organizações são cooperativas, predominantemente sistemas sociais e não mecanicistas: as pessoas procuram satisfazer as suas necessidades emocionais por meio de formação de grupos informais no local de trabalho; As organizações são formadas por estruturas informais, regras e normas, bem como por práticas e procedimentos informais: estas regras informais, padrões de comportamento e de comunicação, status, normas e amizades são criadas pelas pessoas para satisfazer a suas próprias necessidades emocionais. Sendo assim, os processos informais são formas mais adequadas para influenciar o comportamento e desempenho individual, e em ultima análise, de organização, do que as estruturas formais e os mecanismos de controle por parte da hierarquia. b) Pontos Fortes: substituição da concepção errônea do homem – surgem variáveis como motivação, liderança e etc.; leva em conta a existência do grupo social; 9 troca a imagem formal da organização por uma imagem sociológica, isto é, a organização passou a ser vista como um conjunto de grupos sociais com uma vasta gama de relações e com vida social interna, que dão origem ao surgimento da organização informal. c) Pontos Fracos: manteve a idéia de equilíbrio natural embora sob outro enfoque (não leva em conta conflitos); encara a organização como sistema fechado. Não leva em conta a influência de grupos externos (p. ex. sindicatos); utiliza os métodos de investigação social com objetivos limitados, usando, às vezes, hipóteses extremistas. d) Proposições de Mayo 1ª Efeito Hawthorne. A qualidade do tratamento dispensado pela gerência aos trabalhadores influencia fortemente seu desempenho. Bom tratamento por parte da administração, reforçando o sentido de grupo, produz bom desempenho. O efeito positivo do tratamento da administração sobre o desempenho humano ficou conhecido como efeito Hawthorne devido ao nome do experimento. 2ª Lealdade ao grupo. O sistema social formado pelos grupos determina o resultado do indivíduo, que pode ser mais leal ao grupo do que à administração. Alguns grupos não atingem os níveis de produção esperados porque há entre seus membros uma espécie de acordo que define uma quantidade “correta”, que é menor, a ser produzida. 3ª Esforço Coletivo. Devido à influência do sistema social sobre o desempenho individual, a administração deve entender o comportamento dos grupos e fortalecer as relações com os grupos, em vez de tratar os indivíduos como seres isolados. A responsabilidade da administração é desenvolver as bases para o trabalho em equipe, o autogoverno e a cooperação. 4ª Conceito de Autoridade. O supervisor de primeira linha deve ser não um controlador, mas um intermediário entre a administração superior e os grupos de trabalho. O conceito de autoridade deve basear-se não na coerção, mas na cooperação e na coordenação. 2.5. Hierarquia das necessidades e fatores motivacionais a) Maslow e a hierarquia das necessidades . fisiológicas . de segurança: segurança do trabalho e benefícios sociais . sociais . de estima: reconhecimento . de auto-realização: concretização das potencialidades individuais b) Herzberg e os fatores motivacionais 10 Fatores higiênicos: devem ser atendidos para não causar insatisfação política de organização estilo de chefia; relacionamento com os operários; condições de trabalho; salário; relações interpessoais Fatores motivadores: realização pessoal; reconhecimento; natureza do trabalho; responsabilidade; perspectivas de carreira. c) MacGregor: Teoria X versus Teoria Y: Teoria X: a média das pessoas não gosta de trabalhar e evita, se possível; os empregados devem ser coagidos, controlados e ameaçados com punições - se se pretende que trabalhem de acordo com os padrões exigidos; a maior parte das pessoas evita a responsabilidade os trabalhadores põem a segurança acima de tudo e têm pouca ambição Teoria Y: a maior parte das pessoas encara o trabalho de forma tão natural como a alimentação e o descanso; os trabalhadores são capazes de exercer auto-direção e auto-controle; a média das pessoas aceita a responsabilidade se está comprometida com os objetivos a perseguir; a imaginação, criatividade e a capacidade para tomar boas decisões constituem qualidades de muitas pessoas, não sendo características exclusivas dos gestores. d) Comentário sobre a escola de Relações Humanas Na medida em que leva em conta somente o homem como se satisfazendo com bom trato e muita motivação e comunicação, torna limitada a concepção do homem não levando em conta os aspectos materiais (salário, etc.). Também acredita no equilíbrio desde que haja uma adequação entre os aspectos formais (racionais) e informais da organização. 2.6. Comentários sobre Taylorismo e Escola de Relações Humanas Em Taylor: Investigação e desenvolvimento de mecanismos para assegurar que todas as ordens sejam executadas ao “pé da letra". Empregado: forma particular de instrumento que deve ser rentável; um dos fatores de produção que deve dar seu máximo - "máquina de músculos", atraído pelo ganho material (visão mecanicista). 11 Na Escola de Relações Humanas: Investigação e desenvolvimento de mecanismos que permitam a manipulação e modificação de percepções , convicções e as atitudes das pessoas para canalizá-las no sentido desejado pelos dirigentes - a ligação da empresa a seus objetivos, a sua busca pelo máximo - considerado desejável e normal. Empregado: deve ser analisado e avaliado de forma a que se entenda seu "modo de funcionamento"modo de funcionamento da máquina humana - homem mecânico psicológico (visão mecanicista) . Nas duas visões: Função do Empregado - executar o que lhe é indicado, obedecendo a uma rotina de trabalho. Subjacentes a essa concepção: a convicção de que acumular constantemente mais riquezas e produzir bens são os pilares de uma incessante melhoria das condições de vida; Crença nas virtudes do mercado; Concepção individualista das pessoas e das organizações. O egoísmo de cada um seria mais bem satisfeito pelo crescimento geral das riquezas. Pilares: Disciplina, ordem, obediência e hierarquia; diferenças de status; separação dos papéis de planejamento (concepção) e execução (realização); individualismo (apesar da convergência dos objetivos); desconfiança com relação aos trabalhadores (apenas mais um fator de produção); crença em uma administração científica baseada em ferramentas sofisticadas, crença nas virtudes e a possibilidade de um crescimento indefinido. Enfim: Operário não deve ser consultado, nem participar acima de determinados limites (bem restritos), nem compartilhar informações, resultados, etc., Visto que não tem como participar de forma eficaz. 2.7. Sobre as “Escolas Modernas” (incluindo a Escola da Qualidade) a) Escolas Modernas objetivos: tentar superar e sintetizar as duas escolas anteriores, buscando responder à nova realidade das organizações através de um teoria geral. pontos fortes: tentativa de elaborar uma teoria geral da organização ampliação da ligação com outras ciências procura ter como meta uma análise da organização que permita fazer previsões a respeito de seu comportamento futuro pontos fracos: não conseguiram formular uma teoria já que seus modelos não puderam ser comprovados empiricamente (na verdade, nem houve preocupação em buscar isso) não levou em conta a influência do meio externo sobre o homem 12 prescreveu modelos “infalíveis” que quando seguidos levariam à tomada de decisões racionais elaborou modelos coerentes internamente mas que não conseguiam explicar a realidade b) Escola da Qualidade Conceitos fundamentais - Excelência: o melhor que se pode fazer, padrão mais elevado de desempenho. - Valor: ter mais atributos, de acordo com as necessidades dos clientes - Especificações: planejamento, definição de como o produto ou serviço deve ser. - Conformidade: produto ou serviço de acordo com as especificações do projeto. - Regularidade: produtos ou serviços idênticos; uniformidade. - Adequação ao uso: projetos de qualidade e ausência de deficiências no produto/serviço final. A qualidade total abrangendo todos os estágios do ciclo industrial Marketing: avalia o nível de qualidade desejado pelo cliente e o custo que ele está disposto a pagar Engenharia: transforma as expectativas e os desejos do cliente em especificações Suprimentos: escolhe, compra e retém fornecedores de peças e materiais Engenharia de processo: escolhe máquinas, ferramentas e métodos de produção Produção: a supervisão e os operadores têm uma responsabilidade importante pela qualidade durante a fabricação Inspeção e testes: verificam a conformidade do produto com as especificações Expedição: responsável pelas funções de embalagem e transporte Instalação e assistência técnica (serviço): ajudam a garantir o funcionamento correto do produto Os 14 Princípios da “Revolução na Administração” (Deming) 1 – Estabelecer a constância do propósito de melhorar o produto e o serviço, com a finalidade da empresa tornar-se competitiva, permanecer no mercado e criar empregos. 2 – Adotar a nova filosofia. A administração deve assumir suas responsabilidades e assumir a liderança da mudança. 3 – Acabar com a dependência da inspeção em massa. Deve-se eliminar a necessidade de inspeção em massa construindo a qualidade junto com o produto desde o começo. 4 – Cessar a prática de comprar apenas com base no preço. Em vez disso, deve-se procurar minimizar o custo total. É preciso desenvolver um fornecedor único para cada item, em um relacionamento de longo prazo fundado na lealdade e na confiança. 5 – Aprimorar sempre e constantemente o sistema de produção e serviço, para melhorar a qualidade e a produtividade e, dessa maneira, reduzir constantemente os custos. 6 – Instituir o treinamento no serviço. 7 – Instituir a liderança. 13 8 – Afastar o medo, para que todos possam trabalhar eficazmente pela empresa. 9 – Eliminar as barreiras entre os departamentos. Quem trabalha nas áreas de pesquisa, projeto, vendas e produção deve agir como equipe, para antecipar problemas na produção e na utilização que possam afetar o produto ou serviço. 10 – Eliminar slogans, exortações e metas para os empregados pedindo zero defeito e níveis mais altos de produtividade. Essas exortações apenas criam relações hostis, já que o principal nas causas da má qualidade e má produtividade é o sistema, que se encontra além do alcance da força de trabalho. 11 – Eliminar as cotas numéricas no chão de fábrica. Eliminar a administração por objetivos. 12 – Remover as barreiras que impedem ao trabalhador sentir orgulho pela tarefa bem feita. A responsabilidade dos supervisores deve mudar dos números para a qualidade. 13 – Instituir um sólido programa de educação e autotreinamento. 14 – Agir no sentido de concretizar a transformação. A transformação é o trabalho de todos. 2.7. Ao modo de uma conclusão preliminar A evolução do pensamento em administração se acha muito ligada a história econômica contemporânea do Ocidente e principalmente à grande empresa. Por um lado, a grande empresa estimulou o crescimento e renovação dos estudos em administração, por outro condicionou este desenvolvimento às suas necessidades, seus pontos de vista e sua escala de valores. Apesar da evolução, ainda hoje continuam: os medos no compartilhamento (perda de poder); busca de ferramentas e estruturas" miraculosas"; confiança ilimitada nas soluções técnicas (controle total da qualidade, certificações, 6 sigma, etc. ...); adesão a propostas neoliberais; empregados ainda considerados acima de tudo um custo; pouca disposição para investimentos em uma real qualificação; restrições à ampliação de uma maior participação (decisões e resultados). Desafio ainda a cumprir: revisar de forma efetiva os princípios da administração tradicional; embora haja avanços inegáveis ainda são muito limitados; ainda são "casos" e não rotina. 14 Texto 2. Confissões de Tom Peters Exame edição 755 05/12,2001 No 20o aniversário de lançamento de Vencendo a Crise, seu autor admite que "não tinha idéia do que fazia quando escreveu o livro" e que mentiu em alguns pontos. É Tom Peters em estado puro Há quase 20 anos era publicado In Search of Excellence (traduzido no Brasil com o título Vencendo a Crise), de Tom Peters e Robert Waterman. Em pouco tempo, as teses de seus autores, até então obscuros consultores da McKinsey, se tornaram uma espécie de mania. Por fim, viraram uma bandeira para as grandes empresas da década de 80. Vencendo a Crise talvez tenha sido o primeiro grande acontecimento editorial no mundo dos negócios. Era - pelo menos até pouquíssimo tempo - um cult. Na edição de dezembro da revista Fast Company, Tom Peters conta, em tom de confissão, como e por que decidiu escrever o livro. Diz também que mentiu em alguns pontos, o que faz dos bastidores de Vencendo a Crise uma história picante. "Ok. Eu confesso: nós falseamos os dados", teria dito ele ao editor Alan Webber. Num recente artigo da Business Week, Peters tenta limpar a própria barra. Diz que a expressão falsear não é dele, mas de Webber. "Eu não vou esquentar por causa disso", diz Peters. A seguir - na primeira pessoa - as surpreendentes confissões de Tom Peters. Vencendo a Crise não foi algo que planejei desde o início. A idéia do livro surgiu de uma reflexão menor colhida em meio ao lixo da empresa de consultoria McKinsey. Era um projeto de segunda categoria que nunca teve a pretensão de chegar aonde chegou. Essa é minha primeira confissão Hoje, quando conto a história do livro, prefiro dar a versão oficial - que não passa de um amontoado de asneiras: "Os Estados Unidos estavam sendo atacados pelo Japão, que fabricava automóveis de ótima qualidade. Então, Bob Waterman e eu resolvemos descobrir quais seriam os segredos da administração bem-sucedida". Nada mais falso. A verdade é que, em 1977, Ron Daniel, na época diretor da McKinsey, decidira lançar dois projetos. No mundo da McKinsey, tudo se resume a duas alternativas: estratégia ou organização. Como é a equipe de estratégia que dita as regras, o projeto foi batizado de BS (iniciais de business strategy, ou "estratégia de negócios", mas que são também a forma abreviada de bullshit, ou "conversa mole".) Fred Gluck, que substituiria Daniel na direção da McKinsey, assumiu a chefia do empreendimento. O projeto BS funcionava na sede da empresa e contava com consultores de primeira linha. E foi exatamente por causa disso que jamais produziu fruto algum, e desde então nunca mais se ouviu falar dele. Temos aqui, portanto, a primeira lição: nem sempre é possível confiar em gente com algum poder de decisão. Por outro lado, é impossível confiar na direção de uma empresa. Sua política tende para a acomodação, e com isso mata todos os projetos que valem a pena. Nessa época, Daniel estava envolvido em outro projetinho complicado. Ele procurava alguém que pudesse dar um parecer do ponto de vista da organização - que analisasse o lado da estrutura e das pessoas. E é aí que eu entro na história. Foi pura sorte. Durante sete anos, freqüentei a Stanford 15 Business School, doutorando-me em comportamento organizacional. Curiosamente, havia apenas quatro pessoas se graduando na mesma especialidade que eu - e o mais interessante é que éramos todos ex-engenheiros. Algo dentro de nós dizia que números e estatísticas por si sós não bastavam. E, assim, a tarefa foi delegada a este tolo, Tom Peters, e a seu amigo, também tolo, Bob Waterman. Ambos não passávamos de escória da McKinsey. Trabalhávamos no escritório de São Francisco. Nossa filial era famosa pelo prejuízo que dava e por seus funcionários esquisitos. Éramos o que a McKinsey tinha de mais próximo dos hippies - hippies de terno preto. Funcionávamos como o primo pobre da empresa. Em Nova York ficavam as estrelas do BS. Decidiram, então, que o primo pobre deveria se envolver no projeto. As expectativas são mais modestas, a pressão política é menor e a gerência interfere muito menos! (Conseqüentemente, a chance de bom resultado é maior.) "Minha segunda confissão: não tinha idéia do que fazia quando escrevi Vencendo a Crise. Não planejei nada. Não havia uma teoria que eu quisesse provar. Simplesmente saí por aí conversando com pessoas inteligentes, interessantes, gente da mais alta competência. Colocaram à minha disposição um orçamento que me permitia viajar de primeira classe e ficar em hotéis cinco-estrelas. Decidi procurar Karl Weick, cuja obra me influenciara profundamente. Fui depois a Oslo conversar com Einar Thorsrud, autor de estudos sobre empowerment em navios petroleiros. Estive no Tavistock Institute, de Londres, onde encontrei pensadores renomados em desenvolvimento organizacional. Eu havia sido contaminado pelo "mal de Douglas McGregor". Warren Bennis, outro herói meu, diz que tudo começou com o Doug, e acho que ele tem razão. Doug foi o sujeito que inventou a Teoria X e a Teoria Y. Basicamente, elas dizem que as pessoas são parte fundamental dos negócios, que não é possível motivá-las controlando-as ou tratando-as despoticamente. Todo mundo sabia que era verdade o que ele dizia, mas continuava a tratar o trabalhador como lixo - e depois não entendia por que o desempenho da empresa era tão ruim. (Caro leitor, você acha que esse tema ainda é pertinente hoje em dia? Claro que não! Afinal, a alta gerência aprendeu a lição, certo?) Resumindo: eu viajava pelo mundo, conversava, gravava reuniões. Foram centenas de entrevistas e reuniões, quilos de fitas para transcrever. Então, em 1979, o escritório da McKinsey em Munique me pediu que fosse até lá apresentar o resultado da pesquisa ao alto escalão da Siemens. Não há na face da Terra um grupo de estratégias mais organizado que o da Siemens, por isso eu não podia chegar e falar qualquer coisa que me viesse à cabeça. Na melhor tradição das empresas de consultoria, organizei uma apresentação com 700 slides. A reunião de Munique repercutiu na McKinsey dos Estados Unidos. Fui convidado a fazer uma apresentação para a gerência da PepsiCo, cujo presidente na época era Andy Pearson. Aproximava-se o dia da reunião. Numa certa manhã, sentei-me diante de minha mesa de trabalho no 48o andar do Bank of America Tower. Em seguida, fechei os olhos. Depois, me debrucei sobre um bloco de papel e escrevi oito coisas. Nunca modifiquei os princípios que escrevi naquela ocasião. Eu acabara de pôr no papel os oito princípios básicos de Vencendo a Crise. 16 Que lição podemos tirar disso? Não há nada como ser ingênuo. Eu estava com quase 40 anos e o Bob era um pouco mais velho. Entretanto, éramos ambos incrivelmente ingênuos quando escrevemos o livro. Parecíamos crianças diante do mundo das grandes empresas e perguntávamos as coisas mais elementares: por que vocês fazem assim? Por que estão sempre tropeçando na própria burocracia? Por que dificultam tanto o trabalho das pessoas? Há outro elemento nisso tudo que acaba passando despercebido. Parte da beleza do livro se deve ao fato de que só fomos capazes de escrevê-lo porque não estávamos preocupados com isso. Ele tem algo de zen. Defende a idéia de que só é possível gerenciar pessoas e controlá-las a partir do momento em que decidimos não fazê-lo. Sua tese era que, daquele momento em diante, o mundo havia mudado. O jogo era outro agora, o mundo se transformara. Nada jamais seria de novo do mesmo jeito. Quem quisesse tomar parte desse novo estado de coisas teria obrigatoriamente de ler o livro. Seria preciso aceitar suas idéias. Talvez não estivéssemos certos. Contudo, estávamos plenamente convictos de que o velho sistema estava errado. Confissão número três: é uma bobagem o que vou dizer, mas tudo bem - admito que falseamos os dados. Muita gente disse isso na época. Todo mundo queria saber como havíamos chegado à conclusão de que tais e tais empresas eram "excelentes". Pouco tempo depois, uma porção daquelas empresas entrava em um período de decadência que duraria anos, o que viria a se transformar também em uma enorme acusação: se essas empresas são excelentes, Peters, por que estão se saindo tão mal? É o tipo de pergunta que, para mim, peca por falta de entendimento. Vencendo a Crise partiu de um estudo feito com 62 empresas. Como chegamos a elas? Consultamos os parceiros da McKinsey e várias outras pessoas sérias e bem informadas que tinham grande penetração no mundo dos negócios. Perguntamos a elas: quem está inovando? Quem sabe trabalhar de verdade? Onde é que as coisas estão acontecendo? Que empresas estão sabendo aproveitar essas novidades? Essa abordagem direta gerou uma lista de 62 empresas que, por sua vez, resultou em entrevistas com vários de seus funcionários. Mas, sabendo como era a McKinsey, decidimos que era preciso apresentar medidas quantificáveis de desempenho. Com a aplicação das medidas, a lista caiu de 62 para 43 empresas. A General Electric, por exemplo, fazia parte da primeira lista, mas acabou excluída quando ela foi reduzida - o que mostra como é "estúpido" o insight puro e simples e como são "inteligentes" e teimosos os parâmetros de medição. Havia alguma empresa que, olhando retrospectivamente agora, não devia estar na lista? Sim: a Atari. Podemos dizer que o processo por nós utilizado era 100% correto? Claro que sim! Quem quiser conversar com pessoas inteligentes, capazes de passar princípios úteis e modernos, que faça então o que fizemos em nosso livro: comece pelo bom senso, confie em seus instintos, peça a opinião de pessoas "estranhas". Não se preocupe em provar nada logo de início. Vamos a mais uma confissão: quando disse que não sabia o que estava fazendo quando escrevi Vencendo a Crise, estava dizendo a verdade. Não pensava em escrever um livro que assinalasse o início de uma revolução. Mas é claro que eu tinha um propósito: me sentia profundamente irritado naquele momento. (E daí? Daí que quase toda inovação não surge da análise de mercado, e sim de gente terrivelmente irritada com as coisas do jeito que elas são.) E de quem eu estava com raiva? Primeiramente, de Peter Drucker. Hoje, todo mundo age como se ele fosse um desses sujeitos que enxergam muito mais que os outros. É só reler seu The Concept of Corporation ("O conceito de corporação"). Está tudo lá. Peter Drucker pode ser austríaco, mas é muito mais alemão que os alemães quando trata de hierarquia, de comando e controle e de operações empresariais sempre do topo para a base. Basta consultar a bíblia dos negócios segundo Drucker, e tudo se esclarecerá. As organizações são o que são! Ache seu lugar nelas e seja feliz! Essa era a ordem do 17 dia que nos havia sido transmitida. Portanto, para mim, Peter Drucker era o inimigo. Um inimigo de fibra, mas um inimigo. Com quem mais eu estava irritado? Com Robert McNamara. Ele havia sido professor assistente de contabilidade na Harvard Business School. Alguém o apresentara ao general Curtis E. LeMay, que na época comandava a Força Aérea americana. LeMay não sabia quantos aviões tinha, tampouco onde estavam estacionados. Então, McNamara calculou quantos aviões havia e onde estavam, fez um relatório e entregou-o a LeMay. De repente, ele criou sistemas onde não havia nenhum. Isso faz de McNamara o Peter Drucker do Pentágono. Quando estourou a Guerra do Vietnã, ele já era secretário de Defesa, e os sistemas reinavam absolutos. As pessoas haviam sido canceladas da equação. McNamara introduzira a tirania da mensuração. Portanto, Robert McNamara era o inimigo. Mas quem realmente me tirava do sério era a Xerox. David Kearns era o CEO da empresa na época, e eu fora contratado para dar consultoria ali. A Xerox era considerada a empresa do século, mas eu sabia que a história não era bem essa. Tudo o que havia de ruim podia ser encontrado lá: burocracia, a grande estratégia que nunca decolou, o foco servil nos números e a marginalização das pessoas, a reverência por MBAs - não importava de qual escola. Onde era possível errar, a Xerox errava. Claro que havia outras grandes empresas americanas no mesmo barco: Chase Manhattan Bank, Western Electric e a maior parte da clientela da McKinsey. A Xerox, porém, era o exemplo máximo de como tudo podia dar errado. Na época em que trabalhei lá, o sujeito a quem eu me reportava, um ex-sócio da McKinsey chamado Jack Crowley, elaborou um estudo intitulado "Análise de Penhasco", em que mostrava como a Xerox estava prestes a cair no precipício. O problema de David Kearns era que, como CEO, não queria ser o portador dessa má nova. Portanto, se alguém quiser resumir a mensagem do meu livro em uma única frase, pode dizer: a Xerox é um pé no saco. Vamos agora à minha quinta confissão: meu livro se opunha frontalmente ao pensamento de gestão que dominava o cenário dos negócios nos Estados Unidos em 1981. Mas essa não é a confissão. A confissão é que eu não radicalizei o bastante. Peter Drucker vendera à GM o conhecimento tradicional, que McNamara, por sua vez, implantara no Pentágono. Foi esse mesmo conhecimento que complicou a vida de David Kearns na Xerox. Tudo isso nos leva de volta a Frederick Taylor e à administração científica. Basicamente, o taylorismo pregava que todo trabalho podia ser reduzido a um conjunto simples, repetitivo e mecânico de atividades que até mesmo o trabalhador mais estúpido seria capaz de executar. Se tomarmos como ponto de partida o taylorismo, acrescentarmos a ele uma dose de druckerismo e uma pitada de mcnamarismo, teremos, no final dos anos 70, a grande empresa americana administrada por gente obcecada por quantificações. Tudo ficara reduzido a números e finanças. O CEO da GM declarara que o negócio da empresa não era a fabricação de carros, era fazer dinheiro. (Foi uma surpresa para os seus clientes, que iam ao mercado à procura de um carro - ou, melhor, de um estilo de vida -, e não para gastar dinheiro.) Isso talvez explique a ascensão da indústria automotiva japonesa, que certamente estava no negócio da fabricação de carros - e, principalmente, de carros que os clientes desejavam comprar, sobretudo porque eram baratos, de alta qualidade e econômicos. Mas voltemos à Xerox. A empresa havia contratado MBAs com 180 ou mais de QI que gastavam todo o seu tempo e energia discutindo "a elasticidade cruzada da demanda". Ao mesmo tempo, ficava satisfeita com as copiadoras de péssima qualidade que produzia. No entanto, não se dava muita importância ao produto, às pessoas nem mesmo à clientela. Tudo girava em torno de números. Em Vencendo a Crise, eu dizia que números não são tudo. Claro que o lucro é bom. Graças a ele é possível investir em coisas interessantes. Mas alguém tem de dar o sangue, alguém tem de mostrar paixão pelo que faz. 18 Um exemplo: uma das primeiras entrevistas que fizemos foi com John Young, que na época era presidente da Hewlett-Packard. Hoje, a HP fabrica computadores e vale 50 bilhões de dólares. Em 1976, valia pouco mais de 1 bilhão e se dedicava principalmente à fabricação de aparelhos médicos e de equipamentos de medição. Bob e eu fomos à sede da HP, em Palo Alto. Pedimos para falar com John Young. "Muito bem", disse a recepcionista. "Ele está lá dentro, é só virar à direita". Não tivemos de assinar nenhum papel nem usar crachá. Tudo o que fizemos foi entrar. Lá estava John, sentado em um cubículo, que compartilhava com sua secretária. Ele estava em mangas de camisa - nada demais no mundo de camisetas pós-pontocom, mas em 1977 a aparência daquele lugar e o modo como se trabalhava ali chamavam a atenção. John Young era defensor da administração peripatética: estava sempre andando de um lado para o outro. Lembro-me de ter censurado mentalmente o que via. Não parecia normal. Depois de conversar com John Young, estive com Tait Elder, da 3M, e René McPherson, da Dana. Todos eles eram líderes que operavam com base em pressupostos distintos dos prescritos pelas regras em vigor. Eu poderia resumir meu livro em três palavras: pessoas, clientes, ação. E como foi que conseguimos passar adiante essa idéia? Foi tudo graças aos ternos escuros que Bob e eu usávamos e também às nossas gravatas, típicas de empregados da McKinsey, e ao "consultês" falado na empresa. Vencendo a Crise é um livro que tem a cara da McKinsey. A capa é preta, o tipo de letra usado é convencional. Nossa mensagem, porém, era revolucionária. Minha próxima confissão: só terá algum sentido para os fãs do Oakland Raiders, um time de futebol de fins dos anos 70: devo tudo a Mark van Eeghen. (Quem não era fã do Oakland Raiders nunca viu Mark van Eeghen jogar. Que pena!) Ele era um jogador forte, enorme, que levantava uma nuvem de pó de 3 jardas sempre que corria para cobrir a retaguarda dos Raiders. Às vésperas de publicar 10 mil exemplares de nosso relatório, não tínhamos ainda uma foto para a capa. No início, havíamos decidido que usaríamos uma foto da Sports Illustrated. Depois concluímos que não podíamos surrupiar a foto da revista. Fomos então à sede dos Raiders e reviramos seus arquivos até encontrar a imagem perfeita: uma foto de Mark van Eeghen. A foto era o máximo sob vários aspectos. A legenda dizia: "Três jardas e uma nuvem de poeira". Nosso livro dizia a mesma coisa: ame seu pessoal, ame seus clientes. Não complique. Não inche o quadro de funcionários, mantenha a organização simples. Tire os burocratas do caminho. Preste atenção nas pessoas "reais", de unhas sujas. Assim eram os Oakland Raiders. Eram combativos, mas ninguém dava nada por eles. O dono da equipe, o renegado Al Davis, sempre dizia: "Ganhe, gente, só isso". Seu lema era: "Nada menos que a excelência". Creio que acertamos quando dissemos que estávamos em busca da excelência, e não da vantagem competitiva, do crescimento econômico, do domínio do mercado ou da estratégia da diferenciação. Tampouco buscávamos a maximização da geração de valor para o acionista. Era excelência o que queríamos. A "empresa", entretanto, é algo que tem a ver com o coração, com beleza e arte. Tem a ver com pessoas que se lançam na linha de frente. É paixão e busca abnegada de um ideal. É John Young sentado em seu cubículo trabalhando em mangas de camisa. Vencendo a Crise nos lembra que o negócio não é algo árido, tedioso e sombrio que se resume unicamente a números. A vida no trabalho pode ser intensa. Trabalhar com prazer não é exclusividade de Tiger Woods, Yo-Yo Ma ou Tom Hanks. É algo que também está ao nosso alcance. Minha sétima confissão: fizemos um livro perfeito. Não havia um erro sequer em Vencendo a Crise. Os oito princípios básicos que escrevi em 1980, que se tornaram os elementos-chave do livro, estavam corretos. Estavam corretos para 1982. "Onde é que está, então, a confissão?", pergunta o leitor. Bem, acontece que o livro está repleto de erros. Dissemos uma grande mentira - sem querer, mas mentimos. 19 Primeiro, explico por que o livro era perfeito: conseguimos estabelecer os pontos nos quais as pessoas precisavam refletir e trabalhar - em 1982. Se olharmos para o mundo daquela época, veremos que os oito pontos diziam o que tinha de ser dito, e ponto final. Dito isso, passemos às falhas. O caso da Atari foi uma delas. O dos laboratórios Wang, outra. Olhando em retrospecto, vemos que havia grupos inteiros de negócios em transformação bem diante de nossos olhos, e nós não percebemos. Eles simplesmente não eram importantes na época ou eram então muito superficiais para causar algum impacto. É o caso da tecnologia da informação. Dissemos muito vagamente que a TI cresceria em importância. Contudo, a idéia de se trabalhar à velocidade da internet e com meios que permitiriam a comunicação dentro das empresas e entre uma e outra organização passou batida por nós. Erramos ao não dar atenção à velocidade. Ignoramos a economia global. O livro foi feito pensando nos Estados Unidos. Nem sequer chegamos a Toronto ou a Tijuana, que dirá a lugares mais distantes? Não há um empreendedor no livro. Quem folheou o índice onomástico não encontrou o nome de nenhuma mulher e de nenhum negro. Reconheço que falhamos. Bem, passemos agora à grande mentira do livro - embora não tenha sido proposital. O inimigo de Vencendo a Crise era a pregação do "caminho único e perfeito". Tratava-se da prática da administração científica que dizia aos gerentes: "Encontre o caminho perfeito e seja vitorioso". O livro procurava destruir essa mentalidade de uma vez por todas. No processo, porém, acabamos por substituí-la pelo nosso kit pessoal de verdades divinas, nossa receita para a excelência eterna. Esquecemos de acrescentar um aviso muito importante: atenção! Nada é permanente. Tudo em excesso é veneno. E lembre-se: o mundo dos negócios é paradoxal. Para ser excelente, é preciso ser consistente. Quando se é consistente, fica-se vulnerável ao ataque. Sim, é um paradoxo. Agora, viva com isso! Hoje não me condeno. Creio que se uma pessoa lê um livro de negócios e começa a seguir tudo o que está escrito ali ao pé da letra ela só pode ser um perfeito idiota. Vencendo a Crise deve ser visto como uma garantia negativa, e não positiva. Uma garantia positiva faria a seguinte afirmação: siga estes oito princípios e você vencerá. Eu jamais diria isso - nem naquela época nem hoje. O que eu diria é o seguinte: se você ignorar estes oito princípios, jamais vencerá. A oitava confissão? Jamais escreveria hoje um livro sobre a busca da excelência. Não estou mais interessado nisso. Estou interessado em ser interessante. Não me importo se as empresas são ou não excelentes. Tampouco se persistem na excelência. O que me preocupa é saber o que podemos aprender hoje, observando as empresas e as pessoas envolvidas em projetos interessantes. O que é interessante está sempre mudando. Veja, por exemplo, como a Dell fabrica seus computadores: o espaço para armazenagem das peças de reposição ocupa 30,48 metros quadrados de uma fábrica que produz mais de 20 mil unidades por dia. Isso significa que tudo aquilo que ouvimos falar na linguagem mais chata do mundo - planejamento de recursos empresariais, gestão da cadeia de fornecedores - existe de fato e está mudando a forma de fazer negócios. Hoje eu escreveria um livro intitulado Em Busca do Estranho, da Curiosidade, da Licença para Explorar. Finalmente, minha última confissão. Ao analisar novamente os oito princípios básicos que servem para definir o conceito de excelência no livro, não vejo por que modificá-los. Entretanto, acrescentaria alguns elementos que pudessem torná-los mais aptos a enfrentar estes novos tempos. Observe quanto, e com que rapidez, as coisas mudaram desde que o livro foi lançado: o foco da obra eram pessoas, clientes, ação. Vinte anos depois, temos: idéias, liberação e velocidade. Não basta mais dar atenção exclusivamente às pessoas. As pessoas precisam dar atenção umas às outras. É o poder das boas idéias que pessoas apaixonadas, motivadas e envolvidas são capazes de gerar. 20 E os clientes? Claro que continuam muito importantes. Hoje, porém, seu leque de escolhas é maior do que nunca. Isso significa que as empresas também precisam conquistar sua liberação. O que importa é a liberdade para tentar coisas novas. É dar um passo para fora do convencional. Seus clientes estão interessados no que há de mais novo, de mais veloz e de melhor. Quando lancei Vencendo a Crise, a ação era algo importante, porque a norma vigente era a da análise paralisante. Portanto, a ação qualquer uma - era melhor do que "preparar, apontar, apontar, apontar..." Hoje, tudo tem a ver com velocidade. É "fogo, fogo, fogo". Eu acrescentaria dois novos princípios a Vencendo a Crise: 20 Anos Depois. O primeiro princípio novo? SDS, ou seja, só Deus sabe! Há 20 anos, sabíamos que a idéia de "um único caminho perfeito" estava errada. Achávamos também que éramos capazes de prescrever oito princípios que manteriam as empresas próximas da excelência. Hoje, se me perguntarem o que acho disso, diria "SDS!" Será que a Webvan foi uma boa idéia ou uma má idéia? Estaria destinada ao sucesso ou ao fracasso? SDS! Será que o acordo da HP com a Compaq se revelará uma estratégia brilhante ou será o último suspiro de dois dinossauros infelizes? SDS! Tudo são tentativas, processos em andamento, um conto evolucionista em tempo real. Segundo princípio: PSP, isto é, pesquise sem parar. Quer saber que tipo de velocidade é mais importante hoje? A do aprendizado. Neste exato momento, inúmeras pessoas estão preocupadas em organizar a confusão deixada pela débâcle das ponto-com. Daqui a 20 anos, olharemos para trás e acharemos tudo totalmente irrelevante. Por outro lado, a revolução da TI e da biotecnologia mal começou. Não há um substituto para quem deseja estar atualizado mais depressa. Para isso, é preciso sair por aí se informando sobre tudo que for possível. Tente coisas novas. Veja o que funciona. Observe o que não funciona. Aprenda. Apague. Faça de novo. 21 Texto 3: NOBREGA, Clemente. Taylor superstar. EXAME 24/09/1997 (Edição 645) A gestão científica de Frederick Taylor começou na fábrica, mas acabou por penetrar em todos os aspectos da vida e cultura do século XX. Apesar da rejeição que o taylorismo hoje inspira, o fato é que não conseguimos substitui-lo por algo melhor. Veja neste ensaio por que continua atual A Viking Press lançou em maio passado, nos Estados Unidos, um livro que está sendo cotado para o Prêmio Pulitzer, a maior distinção literária americana: The One Best Way: Frederick Winslow Taylor and the Enigma of Efficiency, de Robert Kanigel, 656 páginas.Trata-se de uma biografia de Frederick Taylor, o primeiro expert americano em racionalização e eficiência no trabalho. O que haveria de tão especial com um ideário de administração do início do século? É que tendo sido o primeiro "manifesto revolucionário" sobre o redesenho de processos de trabalho visando aumentos radicais de produtividade é, de longe, o mais bem-sucedido de todos até hoje. As pressões geradas pelo aumento da competição no mundo globalizado do final do século XX fizeram com que a busca frenética de aumentos em eficiência passasse a ser a prioridade número um de todo executivo. No entanto, ao contrário do que dão a entender propostas modernas, supostamente revolucionárias, o tema não é novo: surgiu em 1911 com a promessa de, já naquela época, alterar para valer as concepções predominantes no mundo do trabalho. Taylor prometeu e cumpriu. E cumpriu de uma forma e com uma abrangência tais, que ninguém poderia ter previsto. Taylor publicou sua idéias em 1911 num livro intitulado The Principles of Scientific Management. Ele era um homem comum. De família rica, mas não um intelectual especialmente brilhante. Sua influência na vida do século XX é, porém, comparável à de Henry Ford ou Thomas Edson. Peter Drucker, o guru supremo do mundo da administração, coloca-o ao lado de Freud e Darwin em importância, atribuindo às suas idéias um peso decisivo para a derrocada da proposta marxista. O taylorismo, ganhando vida própria, se revelou de certa forma uma idéia mais inteligente que o homem que a formulou. Jeremy Rifkin, autor de O Fim dos Empregos, diz em Time Wars: "Taylor fez da eficiência o modus operandi da indústria americana e a virtude central da cultura desse país... Ele teve provavelmente mais influência que qualquer outro indivíduo sobre a vida pública e privada de homens e mulheres no século XX". A idéia taylorista acabou extrapolando o mundo da empresa e penetrando em todos os aspectos da vida do século XX. Como um ácido que dissolve tudo, nada foi capaz de detê-la. A originalidade do livro de Kanigel está na ênfase que dá a essa dimensão pouco notada das idéias de Taylor: elas partiram do "chão de fábrica", mas alçaram vôo e acabaram condicionando obsessivamente a cultura do século. Os japoneses devoraram os escritos de Taylor na fase de reconstrução, no pós-guerra. Russos e alemães adotaram suas idéias. Tudo o que tenha a ver com maximização de recursos no tempo, em qualquer domínio, tem algo a aprender com Taylor - da Federal Express (entregas overnight) aos robôs das linhas de montagem informatizadas de hoje. No momento econômico neoliberal-globalizado que estamos vivendo, Frederick Taylor continua atual. Gerência científica? Sim, Taylor propôs a criação de uma "ciência da administração". Observando o que ocorria no "chão de fábrica" do início do século - aquele ambiente chapliniano de Tempos Modernos - ele teve o insight decisivo: é possível aplicar conhecimento ao trabalho. É possível 22 otimizar a produção descobrindo e prescrevendo a maneira certa de se fazer as coisas - "the one best way" - para atingir o máximo em eficiência. Pode parecer banal, mas revelou-se explosivamente inovador. Naquela época não havia nenhum pensamento por trás do ato de trabalhar. Trabalho era ação pura; trabalhava-se apenas. Não havia metodologia, só força bruta. Os gerentes limitavam-se a estabelecer cotas de produção, não se preocupavam com processos. Era só "o que", não "como". O taylorismo é o germe de todas as propostas que vieram depois para formatar racionalmente o ato de se produzir qualquer coisa. Gerar resultados por intermédio de pessoas. Administrar. Pessoas? Taylor era ambivalente com relação ao papel das pessoas, e parte do fascínio e da natureza polêmica de suas idéias vem daí. Ele via a função do gerente como claramente separada da função do trabalhador. Trabalhador faz, gerente pensa e planeja. O manager descobre e especifica "the one best way"; o trabalhador executa, e só. O executor do trabalho, sendo totalmente passivo no processo, tinha de se submeter ao sistema. Nas palavras do próprio Taylor, o importante era o sistema, não o homem. Ele bem que poderia ter escrito um livro com o título: As Pessoas em Segundo Lugar, Talvez em Terceiro ou Produtividade Através do Sistema, Não das Pessoas. Taylor é o pai de todos os processos de automação. Reconheço que isso é meio chocante para nós, acostumados ao discurso "participativo/não hierárquico/sem camadas" dominante em administração hoje, mas não cheguemos a conclusões apressadas. A idéia taylorista revelou outras nuances que acabaram se complementando em um corpo muito sólido. Sua importância decorre de um fato simples: ela dá certo. Da concepção de operação do McDonald?s para entregar a seus clientes centenas de milhões de Big Macs a cada ano ao advogado que contabiliza aos centavos o tempo que dedica a cada cliente; da universidade ao estádio de futebol; do hospital ao partido político; das igrejas às organizações não governamentais, o taylorismo é algo profundamente entranhado em nossa maneira não só de administrar, mas de viver. Ao mesmo tempo em que rejeitava qualquer possibilidade de contribuição inteligente por parte do trabalhador, Taylor enfatizava que ele - trabalhador - seria o grande beneficiário do seu sistema "científico". Sendo mais produtivo graças a esse mesmo sistema, ganharia mais e se engajaria no processo de produzir não só com as mãos, mas também com o coração. Para Taylor, seria possível construir o melhor dos mundos: capital e trabalho de mãos dadas. Era o oposto do antagonismo marxista; a utopia taylorista é essa. Sua idéia era um experimento com a natureza humana. Tratava-se, na verdade, de uma visão, um estado de espírito aplicável a todos os aspectos da vida. Sua convicção era a de que todos podiam ganhar e que a colaboração (antítese do antagonismo da luta de classes) surgiria naturalmente, uma vez que estivessem em vigor os métodos de sua administração "científica". Para Taylor, o trabalhador não precisava pensar, mas teria de participar, senão nada funcionaria. Assim, no centro da idéia taylorista há uma enfática proposta de participação do trabalhador. Mas participação no resultado, não na formulação dos processos ou das decisões que levariam a esses melhores resultados. O trabalhador para Taylor não precisaria (nem deveria) ser inteligente; só precisaria obedecer. Pensar era para o "gerente científico". 23 O paradoxo é o mesmo que hoje atormenta os executivos: funcionários que só obedeçam passivamente não são mais o bastante para a empresa moderna que, de fato, precisa de outro tipo de gente. Apesar disso, não há nenhuma alternativa que torne viável, para além do blablablá habitual, a famosa participação de todos nas decisões, sem distinção hierárquica. Os mais capazes continuam a ser aqueles mais bem pagos, justamente por assumir a responsabilidade de identificar o "one best way". Um bom "gerente científico" hoje, como sempre, vale ouro. A "empresa inteligente", com todo o charme que esse rótulo possa ter, continua sendo em grande medida um ícone retórico, bom para inspirar livros e seminários, mas sem correspondência no mundo real, não por rejeição à idéia em si, mas por absoluta falta de mecanismos práticos para articulá-la e implementá-la. Assim, com toda carga de rejeição que o paradigma taylorista inspira, o fato é que não conseguimos substituí-lo de verdade por algo melhor. Pelo menos, não por enquanto. Encaremos: o taylorismo, em sua essência, ainda dá resultado. Intuímos que é preciso superá-lo, mas nos faltam ferramentas. Peter Drucker, numa entrevista à revista Wired (agosto de 1996), falou sobre a idéia, hoje popular, de se encarar a organização como uma banda de jazz, na qual todos escrevem a partitura enquanto tocam. "Soa bonito, mas ninguém realmente descobriu uma maneira de fazer isso", diz Drucker. Esse é o problema. Reparem nessa enxurrada de modismos em administração. Da década de 80 para cá são incontáveis as propostas "revolucionárias" que apareceram com a promessa de promover viradas radicais nas performances das empresas. Da qualidade total à reengenharia de processos. Da empresa voltada para o cliente aos times multifuncionais. Tudo isso se originou como reação à devastação perpetrada pelos produtos japoneses nos mercados ocidentais, a partir da segunda metade da década de 70. Mas o sucesso japonês tinha muito mais a ver com Taylor do que com "cliente em primeiro lugar", se é que o leitor me entende. No seu primeiro momento foi algo muitíssimo mais vinculado a sistemas otimizados de produção (alta qualidade com baixo custo) do que com qualquer outra coisa. Taylor puro. Pessoas em primeiro lugar? Não, pessoas comprando o meu produto em primeiro lugar. E meu produto é campeão porque é bom e barato, graças ao meu sistema de produção. As empresas continuam perseguindo um modelo idealizado de gestão participativa que unanimemente todos reconhecemos como essencial: apenas não sabemos como implantá-lo. Supostos exemplos revolucionários acabam se revelando belas ferramentas de autopromoção e marketing pessoal para seus autores, quando examinados sob a lupa fria da lógica do resultado consistente ao longo do tempo. Gestão participativa funciona por espasmos: às vezes dá certo por períodos. Na maior parte do tempo, não dá. Vá à sua estante e pegue o livro Vencendo a Crise (In Search Of Excellence) de Tom Peters e Robert Watermann. Examine a famosa lista das empresas consideradas excelentes em 1980. Parece que nem todas continuaram tão excelentes assim. Muitas passaram por torturantes infernos astrais mercadológicos, e as que conseguiram sair o fizeram graças a um receituário clássico: a busca da eficiência no sentido mais puramente taylorista. Ou será que alguém imagina que as centenas de milhares de demissões nas "ex-excelentes" aconteceram por decisão de algum mecanismo de gestão participativa? Enquanto isso, enquanto não resolvemos nossas culpas, e com as decisões do dia-a-dia a nos pressionar desumanamente, acabamos por esquecer as Qualidades Totais e Reengenharias e voltamos a dar ênfase a um processo muito mais antigo, e também essencialmente taylorista: o planejamento estratégico voltou à moda. Sim, aquele antigo processo em que se usa a inteligência para coletar, processar e interpretar a informação e, em seguida, definir os caminhos da empresa. 24 Essa inteligência não está no "chão de fábrica", apesar de poder passar por lá. Seu exercício continua sendo basicamente um processo elitista de responsabilidade de poucos, e esses poucos geralmente transitam por ambientes bem mais acarpetados que o chão da fábrica. Não porque queiramos, mas porque nada se revelou melhor. Executivo é pragmático. Tem de gerar resultado. Vale a pena enfatizar o paradoxo: reconhecemos a necessidade de um salto para outra dimensão. Gostamos de idéias participativas, elas são modernas e democráticas, mas na prática continuamos com Taylor. A inteligência continua separada da execução. Essa é a nossa esquizofrenia, batizada por Kanigel de enigma da eficiência. E já que não conseguimos superar nossas culpas com as demissões em massa que a reengenharia prescreve, estamos lendo hoje livros sobre... humm... liderança, o "novo" mantra competitivo das empresas realmente "feitas para durar". Liderança, leitor, é aquela capacidade que alguns managers têm de fazer com que seus subordinados se sintam felizes implementando as decisões que eles, managers, tomam sozinhos. Taylor deve estar dando boas risadas no túmulo. O manager seria o "cientista" que disseca processos de trabalho para otimizá-los. Com todo o simplismo que isso implica (a ingênua visão científica do início do século não se sustentaria por muito tempo), a obsessão de Taylor levou-o a colocar o sistema em prática. Cronômetro e prancheta. Registro e análise de tempos e movimentos. Otimização de processos (quase escrevo "reengenharia de processos", mas parece que essa denominação é protegida por copyright). Taylor montou seu sistema mediante o aprendizado na prática. Foi trabalhar como operário para aprender e entender. Elaborou-o por décadas, antes de publicá-lo. Ficou nacionalmente famoso em 1910 quando um grupo poderoso de estradas de ferro solicitou licença ao governo federal americano para aumentar os preços das passagens, mas teve o pedido negado. A resposta que ouviram foi: "Vocês podem economizar mais que o que vão ganhar com o aumento solicitado, se usarem os métodos de um gênio da Filadélfia chamado Frederick Taylor". O New York Times abriu manchete em 10 de novembro de 1910: "Estradas de Ferro podem economizar $ 1,000,000 por dia. Scientific management faz isso. Aumento de preços é desnecessário". A América entrava em euforia com a descoberta da eficiência. De repente, Taylor e seus métodos estavam em toda parte mas, apesar dos resultados, a polêmica andava sempre junto. O tayloris-mo sempre foi associado a algo desu-mano, que não levava em conta as necessidades individuais do trabalhador, vendo-o apenas como peça de um sistema em que ele não podia interferir. Empresários o adotavam, mas intelectuais e ideólogos à direita e à esquerda o repudiavam por razões diferentes, identificando demônios opostos na mesma visão. Tampouco no movimento sindical Taylor encontrou apoio. Seja como for, o fato permanece: o taylorismo é uma idéia central de nossa época, um dos pilares do poderio americano no século XX. O pragmatismo das relações econômicas legitimou-o na prática e deixou as discussões mais intelectualizadas em segundo plano. A produtividade aumentou, a qualidade de vida do trabalhador médio - que passou realmente a participar do resultado do que produzia - hoje não tem comparação com os padrões que vigoravam no início do século. A "alienação" do trabalhador diminuiu, contradizendo o dictum marxista, que acabou caindo no vazio. Drucker atribui tudo isso explicitamente à influência de Taylor, a quem considera o mais importante e mais injustiçado intelectual americano deste século. 25 O taylorismo sempre teve um componente paradoxal. Ninguém proporia, hoje, a aplicação literal de seus princípios como solução para os impasses do mundo complexo e plural do fim do século XX. Todos sabemos que temos de superá-lo, só não sabemos o que colocar em seu lugar. * Clemente Nobrega, autor do livro Em Busca da Empresa Quântica, é físico e diretor de marketing da Amil Assistência Médica. 26 Texto 4: Bases para uma administração renovada: AKTOUF, O. A Administração entre a Tradição e a Renovação. SP: Atlas, 1996 Bases e Orientações de um Pensamento Gerencial Renovado Pontos Principais Novas formas de pensar a gestão de empresas versus os princípios das escolas tradicionais Ponto de partida: crítica às difundidas 3 vantagens da divisão técnica do trabalho: ganho de tempo; especialização e aumento da habilidade e estímulo à propensão a inovar. Implicações negativas decorrentes da proposta "homem certo no lugar certo” moldar a pessoa ao que é exigido pelo posto de trabalho aumento da produtividade e tornar o funcionário intercambiável função do RH: seleção rigorosa do empregado-tipo para a tarefa-tipo. Inadequação dessas propostas no cenário concorrencial atual no qual pesam como fatores de competitividade: qualidade, criatividade, eliminação de todo tipo de desperdício, etc. importância da flexibilidade. O novo contexto requer: Superar as condições de trabalho alienado busca do sentido no trabalho (mais que "trabalhar para viver", entender o todo) empregado como partícipe ativo); Empresa como lugar de compartilhamento (gestão cultural) fundamental a decisão dos dirigentes ferramentas: círculos de qualidade, grupos de expressão, etc. vontade do empregado em compartilhar questão da comunicação (compartilhar). Mas: ainda prevalecem os mecanismos restritivos ao desenvolvimento de um ambiente favorável ao compartilhamento: anulação da comunicação; colusão; complementaridade; duplo constrangimento; recusa de simetria; resposta tangencial, supercodificação. (exemplo positivo: empresa Cascades). Fundamental: assumir que pessoas não podem ser geridas cientificamente trabalho do administrador como prática social requisitos básicos para o administrador hoje saber compreender antes de agir e utilizar sua reflexão e seu julgamento apoiado em conhecimentos e experiências interiorizadas, ricas e variadas, mais do que em "instrumentos" prontos. saber suscitar o interesse e capitalizar os "recursos" mais adaptáveis, inovadores, criativos e enriquecedores que existem: os empregados importância da qualidade e inovação 27 importância do conhecimento, sem eliminar a importância da especialização e da experiência profissional. Práticas e Saberes em Gestão: Capacidade de "ler" situações, de efetuar sínteses, combinações, associações, a fim de compreender o que se passa e desencadear um processo de reações adaptadas, inteligentes (como em Morgan) cumprir os papéis informacionais, decisórios e interpessoais (propostos por Mintzberg), mas, fundamentalmente: compreender antes de agir para a empresa: aprender a se desenvolver sob várias lógicas e não mais segundo uma única. Competência essencial do administrador: gerar um clima e condições que suscitem adesão e mobilização no conjunto da empresa. Requer: mudanças profundas duplo movimento de rupturas e aberturas, de forma a abandonar convicções e princípios cristalizados sobre o bem administrar e estar aberto a uma gestão que favoreça o compartilhamento, com menores assimetrias permitir, o quanto possível, a apropriação, pelos empregados, de tudo aquilo que constitui a empresa trata-se da sobrevivência da empresas e não de sentimentalismo, de favores ou presentes aos empregados Administração Renovada nas escolas Reconhecer que a maioria das ferramentas da gestão de empresas pode ser útil e eficaz desde que adaptadas a diferentes contextos e sirvam a um estado de espírito diferente, mais participativo. Superar a perspectiva técnica e limitada e a valorização excessiva tantos dos estudos de caso quanto de abstrações matemáticas e cálculos ao invés de aproximar-se de experiências mais sérias; pretender ser administrador só a partir da escola, mesmo MBAs, sem ter "arregaçado as mangas". Superar a tentação de ter como confortável eixo as "receitas feitas", valorizar as ferramentas de reflexão avançar no sentido de entender o que se passa. Valorizar diferentes teorias de forma a desenvolver "aptidões de formalização e conceituação" e de poder confrontar essas teorias com suas próprias teorias implícitas empresas não podem esperar que seus quadros lhe cheguem totalmente prontos, mesmo que profissionais saídos das melhores escolas de gestão. Desafios para o ensino da gestão voltada para uma renovação adaptada e coerente: integrar a aquisição de conhecimentos sólidos e experiência concreta; integrar ao ensino saberes mais amplos e mais rigorosos que as técnicas e ferramentas dos especialistas em gestão esforço intelectual e cultura geral como base da criatividade e da inovação; . . . integrar a preocupação com a ética na gestão, a preocupação com as conseqüências diretas e indiretas das atividades da empresa sobre as pessoas, sobre a sociedade e sobre a natureza; evidenciar os porquês e os como (e a racionalidade) de uma gestão baseada no compartilhamento, trazer à tona e dar o devido espaço a proposições "esquecidas", tais como as de: Taylor: colaborar, dividir benefícios, pagar melhor, preocupar-se com os operários. 28 Texto 5: Organização do processo de trabalho na evolução do capitalismo Déa Lúcia Pimentel Teixeira Maria Carolina A.F. de Souza Professoras no Instituto de Economia da Universidade Estadual de Campinas- SP Publicado em RAE/FGV, out/dez 1985 Resumo: Introdução; As condições de surgimento do trabalho assalariado; A organização do processo de trabalho industrial na etapa do capitalismo monopolista; As normas de organização do processo de trabalho na fase atual do capitalismo; Considerações finais 1. Introdução A análise da evolução da organização do processo de trabalho dissociada do paralelismo com a evolução do capitalismo torna-se sem sustentação, à medida que deixa de considerar aspectos fundamentais que vão influenciar diretamente na forma, conteúdo o direção que o processo assume ao longo do tempo. Tais aspectos, ao serem trazidos à tona, poderão melhor explicar os avanços (e recuos) que a organização da classe dos trabalhadores percorre desde a sua constituição, isto é, a partir da separação dos produtores de seus meios de produção; movimentos esses intimamente ligados às variáveis que determinam o próprio desenvolvimento do sistema capitalista de produção. Destaque será dado neste artigo ao traçado do paralelismo entre os dois movimentos, (o do capitalismo e o da organização do processo de trabalho), a fim de que possa servir de referência, tanto para os leitores que priorizam o enfoque das teorias da administração - e que normalmente não a atem ao aspecto econômico ao tratar do assunto, quanto aos que privilegiam o enfoque econômico a que, em geral, não realçam os aspectos referentes ao nível das unidades empresariais. Não se tem pretensão, neste sentido, de esgotar a questão, mas procura-se evidenciar que a análise, ao ser realizada de forma a associar os dois campos de estudos, torna-se mas fecunda e clara. 2. As Condições de Surgimento do Trabalho Assalariado O regime capitalista de produção pressupõe a generalização da produção para a troca. Com a expansão desta - entendida como expressão da diferenciação da divisão social do trabalho - ocorre também a separação definitiva dos produtores diretos de mercadorias dos seus meios de produção. Expropriados, passam a ser possuidores de urna única mercadoria - sua força de trabalho. Proletarizados, são convertidos em trabalhadores assalariados. Simples operadores dos instrumentos de produção que não mais lhes pertencem. 29 Para participar do processo de troca, para ter existência social, o produtor precisa então levar sua mercadoria ao mercado, onde esta irá defrontar-se com todas as demais mercadorias. Seu possuidor a leva "livremente" ao mercado o vende-a por tempo determinado, forma única de continuar sobrevivendo. Não se aliena definitivamente dela, pois só agindo assim pode continuar participando da troca. Caso contrário, nada mais teria a oferecer. Alienando-se de sua mercadoria única nada mais seria que um escravo - ele próprio mercadoria. Isso significa que alguém, o comprador, proprietário do dinheiro e dos meios de produção, adquire o direito de usar essa força de trabalho pelo tempo acordado. Caracteriza-se, assim a dicotomia proprietários dos meios de produção/proletários. Os proprietários da força de trabalho, os trabalhadores, submetem-se, porque dessa maneira integramse eles próprios no mercado. Só assim podem ter acesso à mercadoria dinheiro - representado neste caso pelo salário - passaporte único às demais mercadorias, o que lhes permite a sobrevivência. Nesse sentido, percebe-se que o salário, expressão do valor da força de trabalho, não importa os meios pelos quais seja estabelecido, não "deveria" descer a níveis que ameacem a própria sobrevivência e reprodução da classe trabalhadora dada a importância para o capital, que a submete, mas que dela necessita (até mesmo enquanto exército de reserva), para continuar sua trajetória de valorização e acumulação. Pelo menos até a sua fase atual, o capitalismo não conseguiu se descartar definitivamente da força de trabalho, embora a substituição de trabalho vivo, por trabalho morto seja mais e mais acelerada. O trabalho torna-se então alienado, vazio de sentido para o trabalhador, dado que o resultado de sua atividade passa a ser propriedade de outro. Nesse ponto, é bastante oportuna a seguinte citação: "O antigo possuidor de dinheiro marcha adiante como capitalista, segue-o o possuidor da força de trabalho como seu trabalhador, um cheio de importância, sorriso satisfeito e ávido por negócios; o outro, tímido, contrafeito, como alguém que levou a própria pele ao mercado e agora não tem mais nada a esperar, exceto o - curtume"1. Revela-se aqui todo o significado do fato de a força de trabalho ser transformada em uma mercadoria a mais, no mundo da produção capitalista, em que os produtos do trabalho não mais pertencem a seus produtores, anônimos participantes de um espetáculo no qual entram em cena sem nem mesmo perceber e no qual têm de permanecer independentemente de sua vontade. Sua sobrevivência está agora delimitada por decisões que vão, cada vez mais afastando-se de seu domínio, às quais, por meios mais ou menos violentos, acabam sendo obrigados a acatar. A “liberdade", não conquistada senão que imposta, que lhes permite colocar sua força de trabalho à venda, significa a subordinação completa, definitiva, do trabalho ao capital. Esse, sim, impondo as regras e condições aos personagens que a ele são atrelados. O conflito é inerente e intransponível. Ingenuidade querer eliminálo. Mantendo-se intocadas as características do cenário em que se insere. Cabe agora questionar sobre as condições que permitiram o surgimento desse trabalho assalariado. Vale dizer, em que situação a força de trabalho acaba por ser transformada em mercadoria, condição básica para o modo capitalista de produção.2 De início, convém ter em mente que o desenvolvimento do capital comercial representa condição necessária, mas não suficiente. Quais são então as outras variáveis que levam a que o desenvolvimento do capital comercial e a expropriação dos meios de produção dos produtores diretos redundem no trabalho assalariado e não em outra forma qualquer de subordinação? Se é fato que o capital comercial comanda a expulsão dos homens do campo, expropriando-os de suas terras, e fazendo com que se encaminhem para as cidades - onde serão obrigados a se submeter ao trabalho assalariado - é fato também que na antigüidade o mesmo comportamento do capital comercial redundou não no trabalho assalariado, mas sim no escravismo. Ocorre que o comportamento é o mesmo, mas as características das estruturas sociais sobre as quais atua são totalmente diferenciadas. Por outro lado, o surgimento do trabalho assalariado supõe a generalização da produção para a troca. Mas esta sozinha, não pode explicar a proletarização dos produtores. Há que haver outras 30 características que viabilizem o desenrolar do processo especificamente em direção ao modo de produção capitalista.3 Essas características estão presentes, ou decorrem da crise do regime feudal, que, dada sua estrutura social, permitiu o surgimento de pequenos produtores independentes. A expropriação e a proletarização dos produtores diretos caracteriza-se como momento essencial do surgimento do regime de produção capitalista. O produtor direto, transformado em trabalhador livre, produz não mais para si próprio, mas sim para o proprietário dos meios de produção. Tem-se, portanto, o desenvolvimento do capital comercial associado à existência de pequenos produtores independentes - depois expropriados dos seus meios de produção - gerando (não sem violência) uma massa de trabalhadores "livres". Isto vai ocasionar a polarização: possuidores dos meios de produção/proletários. A força de trabalho destes últimos será transformada em mercadoria vendida em troca de salário. Trabalho, então, assalariado. Pode-se agora visualizar o cenário que possibilitou o surgimento da manufatura, como forma avançada de organização da produção com relação ao trabalho (cooperado ou não) e ao putting-out.4 No entanto, tal forma não é ainda a predominante. Coexiste com as formas anteriores, mas não as revoluciona. Na manufatura já se verifica a separação do produtor direto dos seus meios de produção, porém nessa fase a habilidade manual do trabalhador ainda é o fator básico do processo de produção. É ele quem determina o ritmo de produção e comanda o processo de trabalho, visto que detém os conhecimentos do processo. Ora, isso significa que não há ainda uma subordinação completa do trabalhador ao capital. No que diz respeito à execução do trabalho, ele produz usando os meios de produção do empregador, mas este não tem como impor-lhe um ritmo ou mesmo determinar como as tarefa devem ser feitas. Vale dizer, não tem condições de coordenar e controlar o processo de produção. A manufatura, de um lado, introduz uma forma superior de cooperação no trabalho, o que possibilita redução do tempo de trabalho necessário para a produção de um determinado produto. Portanto, já ocorre um aumento, limitado, da produtividade do trabalho, e um aumento do trabalho excedente. De outro lado, propicia a divisão técnica do trabalho - parcelarização das tarefas - e a especialização das tarefas, o que virá a representar a desqualificação técnica do trabalho e, portanto, a redução do valor da força de trabalho. Essa etapa representa um avanço no sentido da proletarização do trabalhador. Mas as ferramentas, embora especializadas, continuam sob o manejo e o controle do produtor direto. A subordinação ao capital é apenas formal, visto que a rapidez, a força e a habilidade manual do trabalhador é que vão terminar o ritmo e o volume da produção. Ou seja, o trabalhador, com sua força de trabalho, é o sujeito ativo no processo de produção: seu trabalho ainda exige técnica e habilidade manual. Se bem que os instrumentos de trabalho não mais lhe pertençam, ele os comanda. A manufatura, então, ainda impõe limites para a expansão do capital. A manufatura exige um trabalhador especializado. Isso requer tempo para a formação e a especialização, e, por isso, há uma limitação do número disponível desses trabalhadores. Isso lhes dá certo poder de barganha diante do proprietário dos meios de produção, impondo um "freio" ao processo de redução do valor da força de trabalho, dos salários. Na manufatura, pois. não se consegue uma regulação organizada dos salários. Soma-se a essa limitação o fato de que é o trabalhador quem impõe o ritmo de trabalho. Isso dificulta o aumento da produtividade do trabalho. Apesar da presença de tais fatores limitantes, consegue-se, entretanto, a extração da mais-valia absoluta, via prolongamento da jornada de trabalho. A extração da mais-valia relativa, porém, não é, até então, possível, dado que o aumento da produtividade está limitado pelas características das relações capital/trabalho então vigentes, sendo ainda regulado pelo próprio trabalhador, na medida em que o ritmo do trabalho é por ele determinado. Como é então superado esse obstáculo (ponto de vista do capital)? Ou, como são 31 alteradas as relações capital/trabalho predominantes nessa fase? Ou, ainda, como se submete definitivamente o trabalho ao capital? Como "enquadrar" a nascente classe operária? Isso é conseguido, de maneira geral, fazendo-se uso da violência, garantida ou acobertada pelo estado, e de uma legislação que regula não só a disciplina, como também a tomada de trabalho e os salários. O relato de como uma das usinas de aço dos EUA conseguiu “superar" a resistência dos trabalhadores é significativo nesse sentido. Com a introdução dos altos fornos, a produção de ferrogusa, primeiro estágio da produção de aço, aumentou muito mais rapidamente do que a capacidade dos trabalhadores em transportá-lo. O uso do trabalho manual, então, impedia a expansão da produtividade, tornando necessária a sua substituição por máquinas. Para impedir a resistência do Sindicato dos Trabalhadores do Aço (com o qual eram feitos os contratos de trabalho) a essa disposição, o gerente da fábrica resolveu tomar algumas medidas. Mandou cercá-la de muros cobertos de arame farpado e equipados de plataformas para sentinelas e buracos para rifles. Foram construídas também, no interior dos muros, barracas para abrigar os furadores de greve e solicitados 300 guardas. A seguir, toda a força de trabalho foi dispensada e a fábrica paralisou as operações (o objetivo explícito do lockout era esfacelar o sindicato) e o gerente anunciou que a partir de então a fábrica não mais iria efetuar contratos com o sindicato. Quatro meses de conflitos. Dezenas de homens morreram e, ao final, com a intervenção do governo do estado e federal favoráveis à empresa, os grevistas foram derrotados. A fábrica retomou as atividades operando com os trabalhadores que haviam furado a greve e o sindicato. naquela empresa, estava definitivamente esfacelado. O gerente da fábrica escreve então ao proprietário: "Nossa vitória é, agora completa e muito satisfatória. Não creio que venhamos a ter problemas de trabalho novamente." Outros empregadores, estimulados pelo sucesso da ação desse gerente, passaram a adotar atitudes semelhantes de forma tal que, em 1898, o Sindicato dos Trabalhadores do Aço contava com menos de 10 mil associados, enquanto em 1982 havia tido 25 mil. Em 1910, toda a indústria de aço dos EUA operava já totalmente "livre" do sistema de contratos com o sindicato, definitivamente extinto.5 Com o apoio da legislação, os trabalhadores são de definitivamente submetidos, e as características da manufatura - parcelização das tarefas, diferenciação das ferramentas, coletivização do processo de trabalho, superados os limites apontados, vão possibilitar o surgimento da indústria mecanizada. Esta, por sua vez, vai permitir a definitiva desqualificação do trabalho, passando o operário de sujeito ativo no processo, a sujeito passivo. Por isso ele é abrigado a ajustar-se ao ritmo da máquina: "Na manufatura e no artesanato, o trabalhador se serve de ferramenta; na fábrica ele serve à máquina. Lá é dele que parte o movimento do meio de trabalho; aqui ele precisa acompanhar o movimento. Na manufatura, os trabalhadores constituem membros de um mecanismo vivo. Na fábrica, há um mecanismo morto, independente deles, ao qual são incorporados como um apêndice vivo" .6 A Revolução industrial torna possível adaptar à máquina a ferramenta antes empunhada pelo homem. A máquina pode, agora, executar trabalhos anteriormente executados de forma manual. A habilidade manual deixa de ser necessária; o trabalhador hábil, especializado, criativo, nos padrões anteriores, deixa de ter importância. A atividade do operário passa a ser a de vigiar e acompanhar as operações executadas pela máquina. 0 que se precisa, nesta etapa, são trabalhadores que sigam o seu ritmo. A divisão do trabalho, que anteriormente se dava em função das características do homem, passa a ter como base as características das máquinas. Há crescente dependência do trabalho ao capital. Na medida em que não há mais necessidade de aptidões especiais, podem ser incorporados novos participantes ao mercado de trabalho, inclusive mulheres e crianças. Supera-se, então, a antiga limitação do número de trabalhadores especializados, o que vem a concorrer para a possível redução de salários e dependência do trabalhador: “Com a ferramenta de trabalho transfere-se também a virtuosidade em seu manejo, do trabalhador para a máquina. A eficácia da ferramenta é emancipada das limitações pessoais da força de 32 trabalho humano. Com isso, supera-se o fundamento técnico sobre o qual repousa a divisão de trabalho na manufatura. No lugar da hierarquia de operários especializados que caracteriza a manufatura, surge, por isso, na fábrica automática, a tendência à igualação ou nivelamento dos trabalhos, que os auxiliares da maquinaria precisam executar. No lugar das diferenças artificialmente criadas entre os trabalhadores parciais surgem de modo preponderante as diferenças naturais de idade e sexo” .7 O que caracteriza a Revolução industrial não é a máquina em si, mas a sua generalização, ou seja, a maquinaria. Resulta esta não só da evolução técnica ocorrida na manufatura mas também, e principalmente, do fato de que foi possível, por um lado, obter uma acumulação anterior, via expropriação dos produtores diretos, transformando-os em trabalhadores livres. Por outro lado, com a expansão dos mercados, há necessidade de aumentar a escala de produção, o que é facilitado com a introdução da máquina. Enfim, essa generalização vai permitir que se supere a habilidade técnica do homem, e, em conseqüência torna-se possível transferir o controle do processo produtivo das mãos do operário para as dos capitalistas, ou seus prepostos, o que contribui decisivamente para o seu sucesso. "O segredo do sucesso da fábrica, o motivo da sua adoção, é que ela tirava dos operários e transferia aos capitalistas o controle do processo de produção. Disciplina e fiscalização podiam reduzir, os custos, na falta de uma tecnologia superior” .8 O fato de a produtividade não ser mais controlada pelo homem, mas sim pela máquina, vai levar a uma redução no tempo de trabalho, e, por conseguinte, do valor da força de trabalho. Consegue-se, dessa forma, reduzir os custos dos produtos, o que permite - do ponto de vista de cada empresa individualmente - reduzir o valor de seu produto para melhor competir com os rivais no mercado, visando a obtenção de um lucro extraordinário. Este, evidentemente, poderá desaparecer à medida que o processo se generalize, a não ser que cada empresa faça uso de outras mecanismos de concorrência o que de fato ocorrerá. Com a generalização da máquina, torna-se possível a extração não só da mais-valia absoluta. como também da mais-valia relativa. Isto é, ao prolongamento da jornada de trabalho (caso não haja leis que a regulem), pode-se associar aumento de produtividade e redução de salários, redundando em aumento de trabalho não pago, tendo como limite, como já foi assinalado, as necessidades básicas do trabalhador. Um mínimo que possa garantir sua sobrevivência e reprodução na medida dos interesses do capital. A fase seguinte da capitulação da classe trabalhadora perante o capital (e não se pode aqui falar de capitulação final, dado que o processo continua evoluindo até o momento), dá-se a partir do momento em que à generalização da máquina associa-se a uma sofisticação tecnológica fruto da constante e crescente necessidade de expansão, do capital, o que o torna intrinsecamente "progressista". A máquina passa, dessa forma, a produzir, ela própria, máquinas que até então eram produzidas de forma manual e manufatureira (bens de produção, agora produzidos pela própria máquina). Os instrumentos de trabalho passam a ser os agentes ativos do processo de produção. Os trabalhadores nada mais têm a fazer se não adaptar-se às necessidades das máquina. Não têm mais controle sobre o processo de produção. Subordinados definitivamente à máquina, perdem o poder de barganha. Submetem-se ao capital e às suas regras. A "habilidade" é, então, dada pela capacidade (ou paciência) de adaptar-se a tarefas rotineiras e repetitivas: "Mesmo a facilitação do trabalho torna-se um meio de tortura, já que a máquina não livra o trabalhador do trabalho, mas seu trabalho de conteúdo" .9 O trabalhador qualificado da manufatura é agora substituído pelo trabalhador semiqualificado, cujo mérito maior é o de ajustar-se perfeitamente à máquina. A unidade trabalhador - ferramenta não existe, substituída que foi, de início, pela máquina individual e, posteriormente, pelo conjunto delas - a maquinaria. O processo é irreversível. A tendência é de exacerbação (a automação é sua fase atual). 33 Como a expansão do capital não pode cessar, assumindo sempre novas e mais "racionais" formas, busca-se substituir, cada vez mais, trabalho vivo por trabalho morto. A maquinaria mais que economiza trabalho vivo, suga-o, seja estendendo a jornada de trabalho, seja aumentando de diversas formas o trabalho não pago. Essa é a regra, fruto da "necessidade" de crescente valorização do capital. Os elementos objetivos da produção preponderam sobre os elementos subjetivos. O proprietário dos meios de produção - o já agora capitalista - tem, pois, o controle total e não só formal do processo de produção. Controle este crescentemente ostensivo, seja de formas físicas, seja de formas mascaradas, que se amplia à medida que se amplia o uso de métodos mecanizados e automatizados de produção.10 O antagonismo inerente às relações entre trabalho e capital aparece realçado, gerando movimentos de ambas as partes, que visam do lado dos trabalhadores eliminar, ou pelo menos atenuar, a opressão. A prática política da classe operária (quando consegue emergir) começa a ganhar importância crescente no confronto dos interesses. Do lado dos capitalistas, os movimentos e ações visam perpetuar ou expandir a atuação de subordinador. Movimentos também antagônicos. 3. A Organização do Processo de Trabalho na Etapa do Capitalismo Monopolista Enquanto o sistema de "fábrica" foi responsável pela introdução do princípio de separação entre trabalho manual e intelectual no processo de trabalho, a organização da “gerência científica” (ou administração científica), por meio de taylorismo,11 incumbiu-se de retirar dos operários, e transferir para os capitalistas, o controle de cada fase e atividade dentro do processo de trabalho, como também de seu modo de execução, baseado até então em um conhecimento prático advindo da experiência e tradição do ofício. A viabilização da administração científica do processo de trabalho, com sua função ao mesmo tempo gerencial (administração das condições materiais da produção) e coercitiva (disciplinação do trabalho), no entanto só foi alcançada após longo processo de concentração e centralização de capitais que possibilitou a absorção dos custos inerentes ao aumento da escala de produção, a introdução de inovações tecnológicas e a manutenção de equipes administrativas. O taylorismo constitui-se num método para aumentar a produtividade do trabalho por meio de: padronização das atividades que o compõem; contenção dos custos operacionais; melhor aproveitamento do tempo de execução do trabalho, tornando-o, pois, mensurável e melhor controlável pelo capital. Esse método - e o próprio autor o reconhece - muito pouco cria em termos técnicos de execução do trabalho quando comparado com a perícia dos antigos artesãos. Foram estes criadores e detentores da maneira de realizar o trabalho que, historicamente, a transmitiram aos "novos" operários do "novo" sistema fabril. Assim, essencialmente, não se objetiva o aperfeiçoamento da divisão técnica do trabalho, mas sim da divisão, social do trabalho introduzida pela capitalismo e indispensável à sua "viabilização” . Considerando a existência de desperdícios e “anarquia” nas formas de produção vigentes nas empresas de sua época, Taylor propõe a aplicação de princípios básicos que contribuíram para a reorganização do trabalho em moldes de absoluto domínio da "gerência científica", preposta do capital, que atua portanto em prol e em seu nome. E foi a mecanização que propiciou tal sujeição, uma vez que se constitui num 34 meio de produção de mais-valia, ao desvalorizar a força de trabalho, prolongar a jornada e intensificar o trabalho. Segundo Taylor, a administração deve incumbir-se de analisar o processo de trabalho em seus mínimos detalhes, propor e testar novas formas de realizá-lo e transmiti-las aos operários em forma de padrões hierárquicos rígidos de execução, assegurados pela elaboração de normas, instruções, regras de procedimento, prêmios, sanções etc. Deve também escolher e treinar o " melhor homem" para realizar cada tarefa do processo de trabalho, atendendo às disposições previamente estabelecidas por meio de previsões e planejamento. Em síntese, tais princípios podem ser resumidos em dois aspectos fundamentais que possibilitam e legitimam a total transferência do controle do processo de trabalho (pela imposição de uma rigorosa maneira de execução predeterminada), para as mãos "da direção capitalista através do estudo dos fundamentos da organização do processo de trabalho. 1. Dissociar o processo de trabalho das especialidades dos operários, pois a atividade da administração consiste em dividir o trabalho em tarefas, de tal forma que o conhecimento do processo de produção, como um todo, pelos operários, e sua habilidades desenvolvidas nesse sentido tornam-se totalmente supérfluos à execução fragmentada do trabalho. 2. Separar as fases de concepção e execução do trabalho, entregando à administração o monopólio do saber, que passa a ser distribuído conveniente e dosadamente aos operários, então transformados em exclusivos executantes. Justifica-se em procedimento devido ao tempo de estudos necessários à melhor organização do processo de trabalho que, portanto, não podem ser assumidos pelos operários, por falta de formação e tempo. Assim, é lhes destinada a função de executar, uma vez que a “ciência" do trabalho só pode ser utilizada por quem possui tempo e formação paz tanto. Em função disso, o processo de trabalho torna-se revestido de processos complexos, uso de laboratórios, cálculos e previsões estatísticas que, em última análise, constituem um método de classificação e sistematização que aspira à "cientificidade". Dessa forma, possibilita-se impor um rendimento padronizado ao trabalho, além de imbuir seus preceitos de uma "normalidade" e "neutralidade" próprias da atividade científica, a fim de que sejam respeitados e aceitos como tal. Se o primeiro aspecto viabiliza o aperfeiçoamento do processo de fragmentação e a desqualificação do trabalho, o segundo contribui para o barateamento da mão-de-obra e o controle do processo de trabalho pela gerência (isto é, pelo capital), legitimado "cientificamente" pelo pretenso aspecto de racionalidade que se propõe alcançar. Nos termos de Simone Weil,12 "Taylor substitui o chicote pelos escritórios e pelos laboratórios, com a cobertura da ciência". Em conseqüência, consuma-se o processo promovido pelo capitalismo de fazer com que o trabalho seja posse do capital. É a própria Simone Weil que assim o descreve: "O patrão tem não apenas a propriedade da fábrica, das máquinas, o monopólio dos processos de fabricação e dos conhecimentos financeiros e comerciais a respeito de sua fábrica, como ele ainda pretende ter o monopólio do trabalho e dos tempos de trabalho. O que é que resta para os operários? Resta-lhes a energia que permite fazer um movimento, o equivalente à força elétrica; e ela é utilizada exatamente como se utiliza a eletricidade” .13 Marx, em sua obra O Capital, afirma que o processo de trabalho na sociedade capitalista ocorre sob o controle do capital e que os processos de produção são incessantemente transformados sob o ímpeto da principal força norteadora dessa sociedade: a acumulação de capital. 35 E qual será a função da “gerência científica” dentro desse processo de evolução do capitalismo? É, certamente, contribuir para essas transformações, com seus métodos operacionais de ativação da produção de mais-valia, por meio de uma adequada estratégia que possibilita a intensificação da dominação do capital e a constituição de um trabalho rentável por um trabalhador submisso, uma vez que assegura a legitimidade e normalidade da forma hierárquica administrativa das empresas modernas. A interpretação que se faz da "gerência científica”, quando se examina seus efeitos, não pode (ou não deve) centrar-se, portanto, em seus aspectos técnicos e humanistas que, na realidade, são parciais e ocultam ou escamoteiam a verdadeiro sentido da função administrativa. Os primeiros (criação do analista de tempos e movimentos, do apontador, fragmentação do trabalho, especialização, individualização dos salários etc.), porque atendem somente à lógica, interesses e necessidades do capital. E os últimos (recomposição do processo de trabalho, motivação do trabalhador do processo decisório, etc.), porque respondem apenas ao surgimento de obstáculos relativos ao melhor funcionamento e desempenho (crescimento da rentabilidade) das organizações (aumento do absenteísmo, sabotagem, desinteresse dos operários, etc.). Essa análise, portanto, não questiona o aspecto fundamental da subdivisão e fragmentação do trabalho que permitem, tanto a perpetuação do domínio do capital quanto à possibilidade de crescente extração da mais-valia (pelo aumento da intensidade e ritmo do trabalho e pela introdução de novas tecnologias poupadoras de trabalho), transformada em "ciência". Nesse sentido torna-se oportuno citar, mais vez, Simone Weil que explica para os operários: "Desde seu nascimento, a racionalização (nome que se dá à administração “científica”) foi antes, essencialmente, método para se trabalhar mais do que um método para se trabalhar melhor. ( ... ) Taylor não procurava um método de racionalizar o trabalho, mas um meio de controle dos operários, e se achou ao mesmo tempo o meio de simplificar o trabalho, são duas coisas totalmente diferentes.14 E Robert Linhart conclui: "Numa análise do modo de produção capitalista „puro‟, a „organização científica‟ do trabalho de Taylor é a que se encontra melhor colocada para encarnar o processo de trabalho capitalista, reconduzido à sua essência”.15 4. As Formas de Organização do Processo de Trabalho na Fase Atual do Capitalismo O taylorismo e o fordismo que o segue - introduzindo as correias transportadoras, que determinam o ritmo do trabalho, e o salário diário, que aumenta o controle sobre a força de trabalho, pois possibilita recrutar e dispensar facilmente a mão-de-obra, na medida em que isto se fizer necessário ao capital sofreram modificações ao longo do século 20. E a polêmica ainda atual refere-se ao significado das novas formas de organização do trabalho, propostas nas últimas décadas: antitaylorismo ou neotaylorisrno? Examinando-se essas novas formas de organização do trabalho, desde a Escola de Relações Humanas surgida nas primeiras décadas do século 20, logo após o taylorismo - com suas propostas de humanização do trabalho (motivação do trabalhador com símbolos psicossociais visando a sua melhor integração ou adaptação ao processo de trabalho), até as mais recentes forma de reagrupamento das etapas do processo de trabalho (Job enrichment ou Job enlargement, grupos semi-autônomos)16 e de incentivo ao aumento da participação de trabalhadores nas decisões empresariais (comissões de fábrica, delegados sindicais, círculos de controle de qualidade etc.), pode-se perceber a ausência de questionamentos ao aspecto fundamental da natureza das relações de trabalho. Assim, não se rompe com Taylor. O objetivo é o mesmo: dar uma conotação científica à arte de organizar e comandar. 36 As novas formas completam as antigas, ou melhor, significam um aperfeiçoamento das relações capitalistas de produção, pois procuram despojá-las do caráter despótico de gerenciamento de conflitos através de transformações: no conteúdo do trabalho (extinção de parte da linha de montagem. recomposição da extrema fragmentação do trabalho etc.), nas formas de autoridade (direção com participação, por objetivos, representação de trabalhadores em diferentes níveis etc.), nos processos de integração da força de trabalho (promoção de identidade de interesses, esquemas de formação permanente e de perfil de carreira para todos etc.), e em outros aspectos. É o novo discurso do capital, constituído por novo estilo de administração capitalista, que se atualiza em função das necessidades imposta em cada etapa de acumulação do capital e em cada estágio das forças produtivas. As alterações então ocorrem à medida que a organização repressiva do trabalho passa a se constituir em obstáculo à ampliação crescente da produtividade, em função das condições econômico-sociais específicas dos países ocidentais em seus respectivos estágios de industrialização. Dependem, ainda da configuração assumida pela correlação de forças existentes entre as classes sociais, das tecnologias utilizadas pelo capital e da forma de legitimação por ele proposta: mas nunca questionam realmente as bases que alicerçam o modo de produção capitalista. Enfim, significam adaptações dos processos de trabalho na produção em massa às novas condições de controle da força de trabalho e as novas necessidades impostas pela configuração da estrutura de produção internacional, e, portanto, as novas condições de reprodução da dominação do capital, objetivando a continuidade do processo de acumulação na fase da produção em série e da produção por processamento contínuo. Na afirmação de Braverman, "A necessidade de ajustar o trabalhador ao trabalho em sua forma capitalista, de superar a resistência natural intensificada pela tecnologia mutável e alternante, relações socais antagônicas e a sucessão de gerações, não termina com a „organização científica do trabalho‟, mas se torna um aspecto permanente da sociedade capitalista."17 Com esse objetivo, escolas e teorias de administração têm-se sucedido com o sentido de instrumentalizar o capital, fornecendo-lhe técnicas administrativas que possibilitem melhor controle e rendimento dos processos de produção e da força de trabalho utilizados, e subsídios para elaboração de políticas de emprego e para as negociações trabalhistas, contribuindo na busca do equilíbrio das forças sociais envolvidas.18 5. Considerações Finais Procurou-se mostrar neste texto, bastante sintetizado, as diversas transformações pelas quais passa o processo, trabalho na sociedade capitalista, desde os momentos iniciais de sua constituição como trabalho assalariado, até sua total subordinação ao capital, sempre vinculando-se fundamentalmente às necessidades advindas das peculiaridades de cada fase de desenvolvimento do próprio sistema. As formas de vinculação alteram-se, ajustam-se, convertem-se em mais, ou menos, violentas em função das características de cada momento, mas sempre buscando perpetuar a autoridade do capital sobre a trabalho. Para tanto, a divisão do trabalho tornou-se cada vez mais hierarquizada, formalizada e impessoal. As tarefas, cada vez mais parcelizadas, fragmentadas; o trabalho, desqualificado e alienado. O processo acelera-se aparentemente ad infinitun. Do feudalismo ao capitalismo monopolista foram necessários séculos, da maquinaria ao robôs, anos. O caráter expansionista do capital assim o exige. Surge então a questão: até que ponto estender-se-á essa dominação do capital sobre o trabalho? E mais: que modalidades ainda será capaz de assumir? 37 Verificou-se que o processo de produção torna-se cada vez mais mecanizado e, mesmo, automatizado. Mas, em paralelo, e como conseqüência o antagonismo entre as classes envolvidas exacerba-se. Para contorná-lo e garantir a dominação são usadas nova formas de dominação. O chicote das primeiras fases é substituído pela sala do psicólogo nas grandes empresas (pergunta-se: qual o mais apavorante?). As técnicas do taylorismo são substituídas pelas modernas práticas de aparência democrática, pretensamente participativas e de cunho social. Mudam os métodos de sujeição; muda até mesmo a percepção que os trabalhadores deles têm, mas o objetivo continua o mesmo. Negocia-se tudo, menos esse ponto, vital que é, para a própria manutenção do sistema capitalista: a natureza das relações de trabalho, isto é, a dominação do capital objetivando o crescimento da produtividade e a ampliação da acumulação. Se as aspirações do trabalhador mudam, se evoluem em função de sua forma de organização e participação nos órgãos de classe, busca-se adequá-los ao trabalho, através das modernas técnicas de gerenciamento que escamoteiam a subordinação. Enfatiza-se, assim, na atualidade, mais que nunca, o papel social da empresa. Mas a questão continua. Qual será o perfil da organização produtiva com a introdução cada vez mais acelera. da automação? Se o trabalho morto avança mais e mais sobre o trabalho vivo, liberando trabalhadores, para onde estes irão? A reciclagem, as novas funções, que o próprio avanço da tecnologia cria, serão suficientes para absorvê-los, se elas próprias poderão ser rapidamente automatizadas também? E note-se que não é apenas o setor secundário que apresenta semelhante tendência; os setores primário e terciário já evidenciam sinais crescentes de automação. Incumbir-seiam, então, as micro, pequenas e médias empresas da função de intensificar a absorção de mão-deobra? Ou a liberação do trabalho configurar-se-ia na redução da jornada de trabalho e na ampliação do lazer? E qual seria o papel a ser assumido pelo estado na atual configuração da sociedade capitalista, principalmente nos seus segmentos periféricos? Contribuir para manter a sobrevivência e reprodução da classe trabalhadora gerando novas ocupações de uso intensivo da mão-de-obra, ou assegurando a transferência dos ganhos do uso intensivo da máquina para aumentar a participação dessa classe nos bens gerados pela sociedade? Questões e questões que podem (e devem) ser suscitadas embora a elaboração de uma análise conclusiva seja inviável, pois implicaria previsões e avaliações sobre os possíveis desdobramentos desses processos em curso. Relativamente, porém, às transformações ocorridas na administração do processo de trabalho na sociedade capitalista, a análise realizada permite que seja bastante taxativo em certos aspectos. Principalmente nos países mais industrializados começa-se a perceber que as formas mas despóticas de subordinação do trabalho ao capital passam a se constituir em obstáculos ao desenvolvimento da organização mais eficiente do processo de produção. Intensifica-se, assim. a busca de modernas técnicas de gestão, como, por exemplo, a utilização das tão em moda "receitas" de gerenciamento do estilo japonês (teoria Z, círculos de controle de qualidade etc.), que estão sendo aplicados nos EUA e em outros países, inclusive no Brasil. O intuito é tentar assimilar da administração japonesa o caráter humanista atribuído às suas técnicas e aplicá-lo no Ocidente. Portanto, do ponto de vista administrativo, a maior crítica que a essa transposição deve ser feita não é a que se refere aos seus impedimentos culturais (bastante superficiais) e nem aos relativos às condições de constituição e evolução do capitalismo japonês (aspectos mais procedentes), mas sim a que diz 38 respeito ao caráter humanista dessas técnicas apresentadas como inovadoras mas que apenas buscam renovar os métodos de dominação, evitando sua obsolescência. Se, enfim, como afirma Max “ (. . . ) toda produção capitalista, à medida que ela não é apenas processo de trabalho, mas ao mesmo tempo processo de valorização do capital, tem em comum o fato de que não é o trabalhador quem usa as condições de trabalho, mas, que, pelo contrário, são as condições de trabalho que usam o trabalhador: só, porém, com a maquinaria é que essa inversão ganha realidade tecnicamente palpável. Mediante sua transformação em autômato, o próprio meio de trabalho se confronta, durante o processo de trabalho, com o trabalhador como capital, como trabalho morto que domina e suga a força de trabalho viva”,19 o que resta ao trabalhador ante o contexto atual, onde já se planeja e introduz na produção autômatos que o substituem, mesmo em certas funções vitais até então por ele desempenhadas? Afinal, a redundância do trabalho vivo e sua divisão técnica estão, mais que nunca, presentes e associadas a uma crescentemente aprofundada divisão social do trabalho. Notas 1 Marx, Karl. O capital. São Paulo:Abril Cultural, 1984, v. 1, t.1 cap. 4, p. 145. 2 Essa é a questão proposta por Dobb, Mayrice*. A evolução do capitalismo. São Paulo: Abril Cultural, 1981. p. 160. "Dizer hoje que o capitalismo pressupõe a existência de um proletariado já se tornou lugar comum. Mas o fato de que a existência de tal classe depende de determinado conjunto de circunstâncias históricas raras vezes mereceu atenção no passado em mãos de autores que dedicaram boa soma de análise à evolução de capital sob suas várias formas e ao desabrochar do espírito capitalista - talvez porque os estratagemas dos prestamistas lombardos e dos corretores de fundos públicos de Amsterdã dêem elementos para uma narrativa mais cheia de encantos do que o relato de como os pobres eram marcados a fogo e enforcados, e os aldeões perseguidos e despojados do que tinham.” 3 Cf. Oliveira, Carlos Alonso. Considerações sobre a formação do capitalismo. Dissertação de mestrado. Campinas: Unicamp, 1977, p.12. 4 Sistema de organização da produção que se diferencia do artesanato na medida em que o artesão não é mais o proprietário da matéria-prima e não pertence mais à corporação de ofício, uma vez que passa a trabalhar "fora da cidade". O comerciante torna-se o proprietário da matéria-prima e o organizador do sistema de produção, enquanto o artesão dele recebe a matéria-prima, transforma-a e entrega-lhe o produto final. 5 Apud Stone, Katherine. The origins of job structures in the steel industry. Edwards, Richard C. et alii Labor market segmentation. D.C:. Hearth and Company, 1973. p. 34-5 (trecho traduzido pelas autoras). 6 Marx, Karl. op. cit. v.1, t.2, cap. 13, p. 43. 7 Max, Karl. op. cit. v.1, t.2, cap. 13, p. 4 1. 8 Marglin, Stephen A. Origem e funções do parcelamento das tarefas. "Para que servem os patrões? “ In: Gorz, A., (org.) Crítica da divisão do trabalho. São Paulo: Martins Fontes, 1980. p. 58. 9 Max. Karl. op. cit. v.1, t.2, cap. 13. p. 43. 10 O trabalho de Katherine Stone, já citado, descreve e analisa com detalhes, as formas de vinculação do trabalhador a cada fase do desenvolvimento dessa indústria, até atingir sua forma tipicamente capitalista. É. nesse sentido, um valioso estudo de caso, cuja leitura vem facilitar o entendimento do tema aqui desenvolvido. 11 Nome tomado de autor pioneiro (Frederick W. Taylor) na elaboração de princípios de reorganização do processo de trabalho, no final do século XIX, consubstanciados em uma de suas obras, escrita em 1911, Princípios de administração científica, traduzido e publicado pela Editora Atlas. Para os iniciantes no assunto, o volume da Coleção Primeiros Passos da Editora Brasiliense, de autoria de Luzia M. Rago e Eduardo F.P. Moreira, O que é taylorismo, apresenta uma bem elaborada síntese e uma bibliografia sobre o assunto, assim como os manuais existentes sobre a teoria geral da administração. 39 12 Em conferência pronunciada para um auditório constituído por operários, em 1937, na França e publicada sob o título “ A racionalização”, no livro de Bosi, Ecléa. org. Simone Weit- A condição operária e outros estudos sobre a opressão, Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1979 p. 119. 13 Id. ibid. p. 125. 14 Id. ibid. p. 121. 15 Linhart, R. Lenine, os camponeses e Taylor. Lisboa: Iniciativas Editoriais, 1977. p. 89. 14 Técnicas que vêm sendo utilizadas recentemente em vários países, principalmente nos mais industrializados, em empresas que produzem sob a forma de linha de montagem e que consistem, basicamente, na ampliação e no rodízio das tarefas dos operários. 17 Braverman, Harry. Trabalho e capital monopolista. Rio de Janeiro: Zahar, 1980. 9. 124. 18 Neste sentido, inúmeros autores além dos já mencionados têm analisado, com multa pertinência, as formas de organização dos processos de trabalho no sistema capitalista, tais como Friedman, G. O trabalho no sistema capitalista. São Paulo: Perspectiva, 1983; Gorz. A. O depotismo de fábrica e suas conseqüências, e Pignon, D. & Querzola J. A. Ditadura ou Democracia na Produção. In: Crítica da divisão do trabalho. São Paulo: Martins Fontes, 1980; Laino. A. Controle fabril: poder a autoridade do capital. Petrópolis: Vozes, 1983; Motta, Fernando C.P. Participação e co-gestão – novas formas de administração. São Paulo: Brasilliense, 1982; Palloix, C. O processo de trabalho do fordismo ao neofordismo e Sohn-Rethel, A. A Economia Dual da Transição. In: Erber, F. S (org). Processo de Trabalho e Estratégias de Classe. Rio de Janeiro: Zahar, 1982; Tragtenberg, M. Administração, Poder e Ideologia. São Paulo: Moraes, 1980. 19 Marx, Karl op. cit. v. 1, t.2, cap. 13, V. 43-4. 40 Texto 6: Sobre as Funções do Administrador (de acordo com algumas das principais concepções) Elaborado por Jorge Luiz R. R. Ramos a partir dos trabalhos: Maximiano, A. C. A. Teoria Geral da Administração. São Paulo: Atlas, 1997; _________ . Introdução à Administração. São Paulo: Atlas, 1995 1. O Papel dos Gerentes na Administração Elaborado por Jorge Luiz R. R. Ramos a partir de Maximiano, A. C. A. Teoria Geral da Administração. São Paulo: Atlas, 1997; _________ . Introdução à Administração. São Paulo: Atlas, 1995. Os gerentes ou administradores são os vetores da gestão ou administração; são eles que gerem, administram as mais diversas atividades de qualquer organização, de forma que uma das formas de se entender o que é administração é através da descrição das atividades desses atores. Não é por outro motivo que diversos autores dedicaram-se ao estudo das atividades gerenciais, tendo esse assunto despertado sempre atenção como objeto de estudo. Mesmo fora da esfera da Administração, vários historiadores, filósofos e cientistas dedicaram-se ao estudo da atuação dos dirigentes nas organizações, sejam elas países, empresas ou agremiações religiosas. De forma bastante esquemática, de acordo com os propósitos deste texto, pode-se identificar dois “modelos” de administração nos quais os papéis gerenciais são bastante distintos. Em um primeiro modelo, que se pode chamar “convencional”, o gerente é a personagem principal do processo administrativo, cabendo unicamente e ele a administração das organizações, sendo que aos subordinados cabe tão somente a obediência as normas e diretrizes definidas pelos gerentes; nesse caso, administração e gerentes são sinônimos. Contrastando com essa visão existem “novos modelos” de administração, onde cabe a todos os integrantes de uma organização determinados papéis gerenciais, e onde esses papéis vão além das funções clássicas do processo administrativo. Nesse caso, existe a percepção de que a administração está sempre presente na rotina das pessoas e dos grupos de trabalho das organizações, que constantemente assumem responsabilidades na execução de suas tarefas. Cabe, então, aos gerentes a coordenação do processo decisório e a criação e manutenção de condições favoráveis a realização das tarefas. Ambos os modelos serão melhor apresentado a seguir. 1.1. a escola do processo administrativo O grande personagem dessa escola é Henry Fayol que com o livro “Administração Geral e Industrial” lançou suas bases. O papel dos gerentes corresponde ao observado no modelo “convencional” de administração e é definido em termos de cinco funções: planejar (examinar o futuro e traçar planos de ação a médio e longo prazos), organizar (montar uma estrutura humana e material que permita a realização dos empreendimentos objetivados), comandar (manter o pessoal em atividade), coordenar (reunir, unificar e harmonizar os esforços) e controlar (cuidar para que tudo se realize de acordo com os planos e ordens).Em geral essas funções aparecem sintetizadas no difundido PODC: PLANEJAR; ORGANIZAR; DIRIGIR; CONTROLAR Da perspectiva de Fayol, a empresa (organização) é um sistema racional de regras e autoridade, o que explica sua visão acerca do papel dos gerentes, que são os responsáveis pela manutenção da racionalidade e da autoridade dentro de uma organização. Os gerentes devem, dessa forma, tomar decisões, estabelecer metas, definir diretrizes e atribuir responsabilidades aos integrantes da organização, de modo que as atividades de planejar, organizar, comandar, coordenar e controlar 41 estejam em uma seqüência lógica. Para Fayol, os colaboradores precisam de ordens para saber o que fazer, suas ações precisam de coordenação e suas tarefas de controle, sendo justamente esse o papel dos gerentes. Essa visão fica bastante evidente nos princípios que, para Fayol, devem ser considerados pelos gerentes e nos deveres necessários para que um desempenho satisfatório seja atingido no exercício das atividades gerenciais. Esses princípios e deveres são uma síntese do pensamento do autor. São 14 os princípios, listados a seguir: divisão do trabalho, autoridade e responsabilidade, disciplina, unidade de comando, subordinação do interesse individual ao geral, remuneração eqüitativa, centralização, cadeia escalar (hierarquia), ordem, eqüidade no tratamento, estabilidade pessoal, iniciativa, e espírito de equipe. Os deveres são 16, a saber: preparar e executar os planos; cuidar para a coerência da organização humana e material com os recursos e requisitos da empresa; estabelecer autoridade construtiva, competente, enérgica e única; harmonizar atividades e coordenar esforços; tomar decisões de forma simples, nítida e precisa; selecionar de forma eficiente o pessoal; definir obrigações; encorajar a iniciativa e o senso de responsabilidade; recompensar justa e adequadamente os serviços prestados; usar sanções contra falhas e erros; manter a disciplina; subordinar interesses individuais aos gerais; manter unidade de comando; supervisionar a ordem; 42 ter tudo sobre controle; combater o excesso de burocracia. 2. Novas interpretações da atividade gerencial São muitos os autores e as abordagens que, em seu conjunto, constituem aquilo que foi chamado, no início deste texto, de “novos modelos” de administração. Como não convém aos objetivos deste texto a apresentação a apresentação de todos essas abordagens, será aqui apresentada uma pequena, e esquemática, síntese de dois elementos que fazem parte da construção de um referencial mais amplo relativamente ao papel dos gerentes nas organizações. 2.1. O papel dos gerentes segundo Mintzberg Mintzberg discorda de Fayol quanto a visão de que a atuação dos gerentes restringe-se ao planejamento, organização, direção, controle e coordenação. Essas funções teriam relação tão somente com o processo administrativo, cabendo aos gerentes muitas outras funções além dessas. Mintzberg classificou as funções gerenciais em 10 papéis – conjunto organizado de comportamentos que pertencem a uma função ou posição identificável –, agrupados em 3 grupos diferentes: papéis de decisão, papéis interpessoais e papéis de informação. O primeiro grupo refere-se aos papéis de decisão. Nesses papéis cabe aos gerentes atuar como empreendedor (iniciador e planejador das mudanças controladas), como controlador de distúrbios (aquele que lida com situações que estão ao menos parcialmente fora do controle gerencial, como imprevistos, crises ou conflitos), como administrador de recursos (alocação dos recursos disponíveis tendo em vista os objetivos da organização) e como negociador (é o gerente quem representa sua organização em processos de negociações com outros agentes – sindicatos, clientes ou credores, por exemplo). Nos papéis interpessoais, cabe aos gerentes atuar como figura de proa (símbolo e representante da organização, atuando como “relações públicas”), como líder (papel que permeia todas as atividades dos gerentes) e como ligação (conjunto de relacionamentos que os gerentes devem manter, principalmente com seus pares, vinculando suas equipes com outras, na busca de um maior intercâmbio de recursos e informações dentro da organização). Por fim, o terceiro grupo de papéis refere-se à obtenção e transmissão de informações. Nesse sentido, cabe aos gerentes o papel de monitor (aquele que busca informações que permitam a ele entender o que se passa dentro de sua organização e no meio ambiente), de disseminador (de forma complementar ao papel anterior, não basta entender o que se passa, é necessário disseminar as informações apreendidas), e de porta-voz (aquele que leva as informações de dentro da organização para o meio ambiente, quando isso é necessário). Mintzberg não tem a intenção de negar o papel dos gerentes assim como entendido pela escola do processo administrativo. No entanto, para ele essa escola não contempla todo o conjunto de papéis que os gerentes exercem: as funções clássicas do processo administrativo diluem-se e combinam-se no desempenho dos papéis apresentados por Mintzberg, principalmente quando há administração de recursos e tomada de decisões. Ou seja, para realizar cada uma das atividades de planejar, organizar, dirigir, controlar e coordenar é preciso que os gerentes combinem, ao mesmo tempo, em sua atuação, vários dos papéis apresentados; por exemplo, o controle de um grupo de trabalho que tem por objetivo a elaboração de um projeto qualquer requer do responsável uma combinação de papéis como controlador de distúrbios, administrador de recursos, líder, monitor, entre outros. O autor destaca ainda que a personalidade e os valores pessoais influem decisivamente na forma que os gerentes executam 43 suas função, da mesma forma que variáveis como níveis hierárquicos, especialidade e tamanho da organização também pode influenciar os papéis que mostrem-se mais relevantes no dia a dia dos gerentes. 2.2. Drucker e a crítica à unidade de comando Para Drucker, a forma de funcionamento das organizações modernas nem sempre permitem que a unidade de comando seja mantida. Não é raro que os funcionários de uma grande empresa tenham que se reportar a dois ou mais chefes, em uma situação que impede a unidade de comando, um dos princípios da escola do processo administrativo. Torna-se então essencial que os funcionários saibam exercer um determinado tipo de gerência onde não controlam nem são controlados. Nesse caso, deve-se considerar que todos são ou podem ser gerentes, sendo o processo administrativo distribuído por toda a estrutura, não obstante os gerentes continuarem a desempenhar papéis de autoridade, responsabilidade e decisão. A administração e a gerência devem ser vistos como conceitos distintos, dado que a administração está presente em qualquer atividade onde recursos são despendidos para a consecução de objetivos, ao passo que a figura do gerente só aparece quando algum tipo de direção ou comando faz-se necessário. Adicionalmente, a função de direção (de subordinados), pode ser substituída por conceitos como cooperação, participação ou delegação. 3. As Funções dos Gerentes da Nova Era Prahalad, C.K. A atividade dos Gerentes da Nova Era no Emergente Panorama Competitivo. Hesselbein, F., Goldsmith, M., Beckhard, R. A organização do Futuro Contexto: 1.Do cômodo ao competitivo 2.Do local ao global 3.Do “gostar de mim” para o “gostar de quem?” 4.Das Fronteiras setoriais nítidas às indefinidas 5.Da estabilidade à volatilidade 6.Dos intermediários ao acesso direto 7.Da integração vertical aos especialistas 8.De uma herança intelectual única à múltipla Gerentes devem gerar recursos em suas organizações para: 1.Conceber e executar estratégias complexas (peso das relações com os stake holders) 2.compartilhar e proteger a propriedade intelectual (peso dos ativos invisíveis) 3.Administrar a interface público/privado (peso das regulamentações e poder da opinião pública) 4.Proporcionar liderança intelectual e administrativa (peso da capacidade de ir além do exercício das funções cotidianas) O novo contexto requer: aprendizado; capacidade de compartilhar; capacidade de desenvolver acordos de colaboração; flexibilidade e agilidade. 44 Para tanto, trabalho crítico dos gerentes envolve: Criar uma agenda competitiva e compartilhada para toda a organização Concentrar-se em mudar a dinâmica dos setores de mercado e em alavancar os recursos da empresa Criar um sistema flexível capaz de reestruturar recursos para tratar de oportunidades emergentes Desenvolver uma capacidade global Características requeridas dos gerentes: Raciocínio sistêmico Competência intercultural Treinamento intensivo e contínuo Padrões pessoais de comportamento Gerente da Nova Era: não poderá ser um mero executor; deverá ser um pensador 45 Texto 7: Notas sobre a Evolução da Teoria da Administração e a Estrutura organizacional Maria Carolina de A. de Souza1 Introdução O objetivo deste trabalho é fazer uma revisão das diversas tendências pelas quais passou a teoria da administração e como o tema “Estrutura Organizacional” é por elas abordado. O texto está dividido em dois itens além desta introdução. No primeiro, faz-se uma rápida revisão das principais escolas de Administração e no segundo, são apresentados alguns dos principais trabalhos voltados para o estudo da estrutura e/ou características gerenciais. Um dos pontos que mais têm merecido destaque na literatura na área de administração de empresas é análise da estrutura organizacional, principalmente no que diz respeito à identificação de variáveis que influenciam na sua formação. A estrutura administrativa, da qual depende qualquer decisão, é formada por pessoas e relações entre as diversas atividades da empresa. Em nível horizontal, essas relações representam as funções; no sentido vertical representam os níveis hierárquicos que a compõem. A teoria organizacional preocupa-se em mostrar que, de maneira geral, o desenvolvimento e o funcionamento e os resultados de uma organização são influenciados por uma série de fatores externos, tais como as condições do ambiente concorrencial em que atua, e internos, incluindo as características pessoais de seus dirigentes. Na maioria das vezes os dirigentes não têm poder de mudança sobre as variáveis estruturais (externas à empresa), mas podem exercer influência sobre as variáveis internas, contribuindo para agilizar ou retardar mudanças. A forma e o grau de dependência relativamente a essas variáveis são diferentes de empresa para empresa, variando em função do setor, poder de mercado, tipo de tecnologia, processos produtivos, etc. Ou seja, no que se refere à administração, não se pode pretender leis gerais e universais, além disso vale observar que várias das mais difundidas pesquisas em administração foram desenvolvidas em empresas com interesse muito maior na solução de um problema específico do que na possível contribuição que poderiam representar para a formação de uma teoria2. Dado um mesmo leque de variáveis que compõem um determinado cenário, diferentes expectativas e comportamentos empresariais levam a escolhas estratégicas distintas. Nas mesmas condições estruturais podem se verificar variados resultados, assim como resultados semelhantes podem ser alcançados com combinações diferentes de variáveis. Decisões que dizem respeito ao posicionamento da empresa, tais como diversificação, expansão ou redução de linha de produtos, estruturação do processo produtivo, centralização ou descentralização do processo de tomada de decisões, comportamento diante de mudanças no ambiente, maior ou menor aversão ao risco e à incerteza, refletem as características gerenciais dos dirigentes. 1 Agradecimentos à revisão e valiosas contribuições de Daniela Salomão Gorayeb Muitas das pesquisas realizadas na área de Administração são encomendadas por empresas que buscam, ao financiá-las, a solução de um problema específico. À medida que os resultados dos trabalhos em empresas são bem sucedidos e vão sendo divulgados, outras empresas têm acesso a eles, e o interesse cresce. Não raras vezes, uma pesquisa desenvolvida no interior de uma única organização, acaba sendo o ponto fundamental de uma corrente de pensamento em administração. A pesquisa de Elton Mayo (8) é um exemplo característico. Foi desenvolvida no interior de uma organização, evidenciou várias falhas nos princípios propostos pela escola clássica, e acabou por ser o pilar sobre o qual se desenvolveu a Escola de Relações Humanas, que representou muito mais um avanço do que uma oposição à clássica. 2 46 A atividade do empresário exige inovação, iniciativa, planejamento do uso de recursos com vistas não só ao presente, mas à situação futura da empresa, o que significa dizer que ser empresário é muito mais gerir a empresa do que fundá-la. Segundo Cole, “ação empresarial é a desenvolvida por um indivíduo ou grupo de indivíduos, visando a criar, manter ou expandir um ente social que produz bens econômicos com o fim de obter um lucro”. A diferenciação entre empresas, que conduz a vantagens competitivas depende de constantes inovações em tecnologia, produtos e processos produtivos, assim como na maneira de ver e administrar os processos organizacionais. O fato de uma empresa permanecer no mercado durante um período relativamente longo, pode, então, ser considerado reflexo não só de condições favoráveis do ambiente em que está inserida, mas também das características da administração. São essas que, de alguma forma, permitem superar as ameaças e explorar as oportunidades identificadas no ambiente, formulando estratégias que atenuem as fragilidades da empresa e acentuem, na forma de vantagens competitivas, seus pontos fortes. A incapacidade da direção em definir uma estratégia e adaptar-se com agilidade e criatividade às constantes mudanças do ambiente pode representar obstáculo mais forte que ameaças externas à continuidade da empresa no mercado. 1 - O Desenvolvimento da Teoria Organizacional 1.1. O enfoque da Escola clássica O objetivo básico dessa escola, representada principalmente por Taylor e Fayol, foi o de constituir uma concepção administrativa global e orgânica da empresa, caracterizada pela coerência interna. Neste sentido, propunha uma distribuição racional do trabalho, como meio de se alcançar uma especialização eficiente e uma estrutura de autoridade para manter o controle e a coordenação. Apesar de ter como pontos favoráveis o caráter precursor e o êxito técnico, uma análise crítica de suas proposições evidencia alguns pontos falhos nos chamados princípios da administração tradicional. Talvez porque, na maior parte, foram extraídos da experiência pessoal de seus autores, adquirida basicamente em trabalhos realizados para solucionar problemas específicos da grande empresa da época, que tinha como principais problemas o aumento da produtividade e a produção em grande escala para viabilizar as grandes plantas instaladas nesse período. Apesar de postular a universalidade de seus princípios, a teoria clássica da administração não apresenta em seu arcabouço condições para tal universalização, uma vez que foi elaborada a partir de amostra limitada, em número e espécie, de organizações, essencialmente grandes empresas industriais. Seus pressupostos englobam: a) Concepção mecanicista do homem, isto é, seu comportamento pode ser explicado em um esquema simples de ação-reação, sendo comparável à máquina. Passível de substituição imediata, caso não se ajuste à função que lhe é atribuída; b) Divisão do trabalho que leva à máxima especialização possível e, portanto, segundo a concepção dessa escola, à máxima produtividade; c) Consideração da estrutura como sistema exclusivamente formal e hierárquico. A autoridade tem como única base a hierarquia. As linhas de autoridade e comunicação seguem apenas essa hierarquia. d) Incentivos ao operário, basicamente em salário. Não leva em conta problemas de motivação, inter-relação entre o que o indivíduo faz na empresa e fora dela, influência de sindicatos, etc. Centrada na resolução dos problemas internos das empresas, e baseada praticamente no empirismo, a teoria clássica da administração não leva em conta a influência do meio ambiente, omitindo quase que por completo o contexto. A organização é vista como um sistema fechado supervalorizando o conceito de produtividade e buscando a maximização dos objetivos econômicos. 47 1.2. O enfoque da Escola de Relações Humanas Representou uma ampliação do campo de estudo da escola clássica, na medida em que, de um lado, procurou analisar outras organizações, não se restringindo à organização industrial e, de outro, passa a encarar o homem como o principal fator para o processo de produção. A visão clássica da organização que considerava apenas seus aspectos formais é amplamente criticada pelos teóricos da escola de Relações Humanas, para quem a organização deve ser vista como um conjunto de grupos sociais que interagem entre si, caracterizando o que pode ser chamado de estrutura informal, onde variáveis como motivação e liderança exercem um papel fundamental. A escola de Relações Humanas não significou uma negação da clássica, mas sim o que poderia ser chamado de uma atualização que buscava responder às novas necessidades das organizações. De fato, os princípios ditados pela clássica, e adotados intensamente pelas empresas, frutificaram, no que diz respeito ao aumento da produtividade. Entretanto, algumas das medidas aplicadas, tais como a máxima especialização no trabalho, embora tenham apresentado notáveis resultados, a médio prazo provocaram efeitos colaterais como monotonia e insatisfação no desempenho das tarefas, o que resultou em queda de produtividade. Em paralelo, o operariado evolui enquanto classe social. Os sindicatos passam a ter um maior poder de barganha. O próprio Estado passou a se preocupar com o problema, surgindo as primeiras legislações trabalhistas. Nesse clima, os pilares da escola clássica vão se tornando mais fracos, e surge o questionamento da validade da aplicação irrestrita do enfoque tradicional, e a urgência de se armar novos esquemas para administrar a empresa, levando em conta o homem social em oposição ao "homo economicus" como até então era visto. Esse quadro foi extremamente propício para que as idéias da escola Relações Humanas se consolidassem. Suas recomendações passaram a ser aplicadas, não como substitutas das medidas anteriormente adotadas, mas em conjunto com elas, como um meio de "suavizá-las". Em última instância, a produtividade como o principal objetivo continuava a ser prioritária. Os meios para atingir tal objetivo é que sofreram modificação. Eram agora baseados na cooperação entre grupos, participação dos grupos nas decisões referentes a seu trabalho, tendo sempre como fundo a relevância dos desejos e necessidades individuais. Evidentemente, a tentativa era a de fazer com que o homem se ajustasse aos critérios da organização, mas por sua própria vontade e não como a imposição clara do enfoque clássico. Apesar da aparente contradição, as duas escolas não são oponentes como já foi mencionado. Ambas vêem a organização como um sistema fechado, privilegiam a maximização da eficiência, e têm como preocupação básica a determinação dos meios mais adequados para atingi-la. A escola Relações Humanas, portanto, não nega a clássica. Procura, isto sim, acrescentar novos elementos na análise, principalmente no que diz respeito à relevância da estrutura informal para a organização. Em síntese propõe: organização formal + organização informal = organização real. A principal contribuição dessa nova corrente foi a ampliação dos limites da análise organizacional, embora tenha deixado alguns pontos em branco. De um lado, ao não considerar a influência do ambiente. De outro, ao não abordar os conflitos como inevitáveis, uma vez que o choque de interesses entre patrão e operário é inerente ao sistema capitalista e não pode ser eliminado pela utilização de manobras gerenciais. Ou seja, os conflitos foram considerados circunstanciais e passíveis de pronta solução, desde que houvesse uma adequação entre os aspectos formais e informais da organização. O quadro a seguir3 apresenta uma síntese das diferenças entre as duas abordagens. 48 Síntese das Diferenças entre as Duas Abordagens Escola Clássica Relações Humanas Concepção do Homem Homem Máquina Homem Unidade Concepção da motivação "Homo econcomicus” Motivação complexa Valor Concepção do indivíduo na Indivíduo isolado empresa Indivíduo integrado Concepção da autoridade Autoridade formal Autoridade como fenômeno sociológico Concepção da indivíduo/empresa Inexistência de conflito Importância determinante do conflito relação socialmente As diferenças entre as duas concepções permitem notar a ampliação dos limites da teoria organizacional, que passa a se preocupar também, com fatores tais como: liderança, comunicação e motivação. Permanece, todavia, um espaço em branco, na medida em que, alguns aspectos essenciais para a compreensão do comportamento das organizações em geral, e da empresa especificamente, não foram analisados pela escola de Relações Humanas. Não foi observada a influência que a relação sindicato/operário teria sobre a relação operário/empresa. O conceito de liderança participativa, na prática acabou por se transformar em paternalismo, talvez em função da ausência de um maior aprofundamento na análise dos conflitos (condições materiais, realização no trabalho, etc.). O salário também passa a ser, não a recompensa por um esforço, mas sim, o pagamento por um sacrifício. A escola de Relações Humanas, embora sua contraposição ao tradicionalismo da escola clássica, conservou intacto o pragmatismo desta última, significando menos uma revolução que uma adaptação aos novos tempos e situações, e não uma mudança radical de conceitos. As idéias dessa escola evoluíram para a denominada sociologia industrial, que parte do pressuposto que existe na indústria um agudo conflito de interesses que se expressa em todas as dimensões da organização. Propõe-se a equacionar esses por meio de uma atuação sobre o grupo, assumindo que esse exerce importante influência sobre o comportamento do indivíduo. A atuação proposta envolve a utilização de métodos participativos e não de imposição. Outro aspecto relevante para a sociologia industrial é a motivação. Kliksberg3 resume o complexo motivacional em: 1) Motivações Positivas (Naturais): - o papel do trabalho como processo estruturador da personalidade; - o papel do trabalho como forma de realização e expressão pessoal; - o papel do trabalho como meio de vinculação social. 2) Motivações Negativas (Coercitivas): - o salário; 3 Kligsberg , 1971. 49 - a estabilidade; - outras vantagens naturais. O processo de motivação deve visar essencialmente ao primeiro grupo, a fim de que a produtividade se eleve. Um exemplo foi a substituição de incentivos individuais por coletivos, o que veio a favorecer o papel do trabalhador como meio de conexão social. Entretanto, tais medidas não podem ser consideradas válidas para todas as situações. Em um sistema no qual o salário mínimo mal permite a subsistência, e no qual a oferta de trabalho é superior à demanda, ou ainda em uma situação de crise, seria no mínimo ingenuidade classificar-se salário e estabilidade como fatores motivacionais negativos. Pelo contrário, esses passam a ser os principais itens reivindicados pelos assalariados. A sociologia industrial preocupou-se ainda com a relação entre o trabalho e o não trabalho, acreditando que, na medida em que o operário consiga um grau de satisfação nas suas atividades recreativas haverá um reflexo favorável sobre a produtividade no trabalho. Isso leva a que, a partir de determinado nível de salário, o empregado passe a querer dispor de mais tempo livre. Outro tema abordado pela sociologia industrial é o relativo à liderança. Esta passa a ser abordada com maior flexibilidade, podendo adquirir várias feições, dependendo de cada situação particular. Sob essa abordagem a liderança poderia assumir as seguintes formas: Liderança Autocrática - direção baseada exclusivamente no poder formal, aplicando medidas coercitivas (dispensas, sanções, etc.), como meio básico para resolver os conflitos. Desconhecendo o grupo como entidade social, os contatos são feitos somente no nível do indivíduo isoladamente. Liderança Laissez Faire - a direção seria totalmente informal e elástica, as comunicações livres; uso intenso de medidas paternalistas, não considerando, porém como a anterior, o grupo como entidade social. Liderança Democrática - direção orientada a obter a identificação do grupo com os objetivos da organização; comunicação livre, mas orientada para o trabalho e os objetivos do grupo e da organização, considerando o grupo como entidade social. Os efeitos de cada um dos tipos de liderança são resumidos por Kliksberg4 conforme quadro a seguir. Efeitos de cada um dos Tipos de Liderança segundo Kliksberg Tipo de Liderança Efeitos sobre a Efeitos sobre a Efeitos sobre identificação com os organização social desenvolvimento objetivos do grupo pessoal Autocrática Nula Competitivo Retrocede Laissez-faire Nula Anárquico Não o promove Democrática Alta Cooperativo Avança o Os estudos e pesquisas que fundamentaram a evolução da Sociologia Industrial, ao contrário das demais abordagens, desenvolveu-se basicamente dentro de Institutos de Pesquisas e de faculdades, o 4 Kliksberg, 1971. 50 que, em certa medida, diminui o grau de subordinação aos interesses das grandes organizações. Guiada pelo objetivo de chegar a explicações fundamentais e verdadeiras dos fenômenos, propõe situar a “verdade científica” em primeiro plano, e procura considerar o trabalho humano como um fenômeno complexo, que só será compreensível quando se analisa cada uma de suas particularidades, construindo ao mesmo tempo uma síntese integradora das conclusões. Vale ainda mencionar como um desdobramento dessa escola a abordagem de Simon. Ao contrário dos enfoques que propunham ações visando a maximizar os resultados, essa abordagem propõe que o processo de tomada de decisões deve ser desenvolvido sob o que Simon chama de racionalidade limitada, isto é, o "homem administrativo", em contraposição ao "homem econômico". Para Simon, a organização refere-se ao complexo sistema de comunicações e inter-relações existentes em um agrupamento humano. Tal sistema proporciona a cada membro do grupo parte substancial das informações necessárias, objetivos e atitudes que entram nas suas decisões, propiciando-lhes, igualmente, um conjunto de expectativas estáveis e abrangentes quanto ao que os outros membros do grupo estão fazendo e de que maneira reagirão ao que ele diz e faz. Essa linha de pensamento é caracterizada por uma argumentação de coerência interna e tem como objetivo resultados "satisfatórios", ao invés de maximização, levando em conta somente as variáveis mais importantes para sua decisão. Esta por sua vez é que determina o comportamento organizativo. Simon destaca a diferença das características do ambiente interno relativamente ao ambiente externo, explicitando a natureza estabilizadora do primeiro, em face da incerteza e da instabilidade do segundo. Dada a incapacidade dos agentes em tratar com a incerteza, assumem particular importância a estabilidade de regras e os procedimentos capazes de propiciar âncoras ao processo decisório dos agentes. A instabilidade de regras e de procedimentos internos contribuiria para aumentar ainda mais a incerteza. Não se trata de pregar o apego rígido às rotinas preestabelecidas, mas sim à estabilização mínima de regras básicas (como por exemplo, que a aprendizagem demanda tempo e que as decisões só podem ser avaliadas a partir da obtenção dos resultados) que garantam, para os agentes internos, foco, direção e, principalmente, comprometimento da alta direção. Enfim, após uma breve análise das teorias apresentadas, deve-se levar em conta suas limitações, dado que a evolução dessas abordagens está profundamente ligada ao próprio desenvolvimento das empresas. A escola clássica, por exemplo, surgiu em função dos grandes conglomerados que se formavam na época, e que precisavam de novos conceitos em termos de administração, que lhes garantissem maior racionalidade visando a maior produtividade e eficiência na acumulação de capital. A própria concepção do homem, em termos de hierarquia de necessidades, está ligada às condições sociais de então. O homem mal tinha condições de resolver seu problema básico de sobrevivência, portanto, não tinha como evoluir em reivindicações de caráter mais social. Nesse contexto, a concepção do "homem econômico" era funcional no que se refere ao problema da estratificação social anterior: empresa paternalista/proprietário do capital/fator trabalho. Tentava-se assim eliminar o conflito que poderia surgir. Na medida em que os fatores sociais passam a exercer maior pressão, surge a concepção do "homem social", e mais tarde, com o início da era dos computadores, o "homem racional", sempre procurando ajustar as necessidades do homem, enquanto fator trabalho, às necessidades do sistema econômico. 2. Abordagens com ênfase na Estrutura Organizacional Para a escola clássica, os componentes básicos da estrutura organizacional são a divisão do trabalho, a hierarquia e a unidade de comando, isto é, a estrutura formal. Tais elementos bem conjugados é que levariam à maximização de resultados, objetivo básico da empresa nessa concepção. A escola de relações humanas, por sua vez, não se preocupa em analisar a estrutura formal, uma vez que seu 51 enfoque está dirigido fundamentalmente para os elementos informais da organização o seu efeito sobre o seu desempenho. Em última instância, o objetivo continua sendo o mesmo da escola clássica: o de maximização de resultados. As abordagens que se sucedem não chegam a formar o que se pode caracterizar efetivamente como escola de pensamento, como as duas anteriores, podendo ser englobadas, como faz Kliksberg sob a denominação Teoria das Organizações. Dadas as restrições apresentadas, fica clara a importância de uma abordagem que se preocupe em analisar a empresa., situando-a em um contexto mais dinâmico e mais flexível, visto que as organizações, hoje, tornaram-se grandemente variadas, e a teoria deve acompanhar tal variação para que possa realmente conhecê-las, analisá-las e nelas atuar. Nas análises mais modernas, a empresa passa a ser enfocada como sendo constituída de um conjunto de indivíduos, desempenhando diferentes papéis e ocupando diferentes posições, utilizando-se recursos humanos, tecnológicos e econômicos para atingir seu objetivo. Os estudos mais recentes procuram mostrar que, embora as organizações apresentem características que podem fazer parte de uma teoria geral, há aspectos que são específicos, mutáveis, e, portanto, têm de ser estudados caso a caso, não sendo passíveis de generalização. Nesse novo quadro é que se insere a maior preocupação com a análise da estrutura das empresas, que é uma das variáveis principais envolvidas neste trabalho, e que se inclui no rol daquelas que não podem ser universalizadas e taxadas de "ideais". Procura-se mostrar, nessas análises, que a estrutura não é um fim em si mesma, mas sim um meio para se alcançar objetivos. Nesse sentido, necessita ser flexível diante de mudanças ocorridas, não só internas, mas também no ambiente competitivo, no qual a empresa está inserida. A forma da estrutura, portanto, deve ser uma resposta às “pressões” internas e externas e, após definida, passará a exercer influência sobre a atuação da empresa. Diante disso, as perguntas básicas em termos de estrutura passam a ser não só: como dividir o trabalho necessário? Como estabelecer cargos? Como relacioná-los e agrupá-los em uma unidade administrativa? Como alocar autoridade entre esses cargos? Há que questionar também: Qual tipo de estrutura é mais adequada para cada empresa especificamente? Quais variáveis podem atuar sobre ela? Sobre quais ela, por sua vez, pode atuar? Nesse aspecto, torna-se útil uma breve revisão sobre os estudos de Burns e Stalker, Joan Woodward, Lawrence e Lorsch, Lansley, Sadler e Webb, Richard Hall e Eduardo Vasconcelos, sobre os quais cabe uma revisão dos principais pontos que irão formar a base conceitual e o modelo sobre os quais estará apoiado o presente estudo. 2.1. Estrutura, Tecnologia e Ambiente Burns e Stalker (9), a partir de pesquisa voltada para a análise dos efeitos que inovações tecnológicas e mudanças no ambiente exercem nos padrões de administração, definem e diferenciam dois tipos "ideais" de estrutura - o mecânico e o orgânico, que são abordados como ocupando os pontos extremos de uma escala. O mecânico teria como características a maior ênfase na especialização, coordenação entre os sucessivos hierárquicos por parte de um escalão superior, escala hierárquica no que diz respeito ao controle, autoridade e comunicação reforçada por um fluxo de informações que caminha dos níveis inferiores para o topo da hierarquia onde a coordenação final é realizada. Em suma, a estrutura do tipo mecânica seria basicamente hierárquica dentro dos padrões da escola clássica, sendo adequada a 52 organizações tradicionais, inseridas em ambiente estável, com tarefas relativamente rotineiras e definidas, onde o elemento humano, por pressuposto, prefere executar tarefas previamente programadas do que aquelas que exijam maior criatividade. O padrão orgânico, em contraposição, ajustar-se-ia melhor a empresas inseridas em um ambiente dinâmico, onde as tarefas não podem ser programadas com muita antecedência, exigindo por parte dos dirigentes maior flexibilidade e criatividade no processo de administração da empresa. Assim, a unidade de comando é substituída por uma estrutura reticular de controle, autoridade e comunicação. Isto é, a direção da comunicação ao invés de vertical é lateral, consistindo mais de conselhos e consultas do que ordens. O centro de autoridade não é único e pode estar localizado em qualquer ponto da estrutura, dado que se pressupõe que a autoridade emana não necessariamente da cúpula administrativa exclusivamente, mas sim de quem detém o conhecimento relevante de determinada função. É pressuposto, por outro lado, que as pessoas, nesse padrão de estrutura, preferem trabalhar levando em conta o risco e grau de incerteza do ambiente, o que delas exige maior criatividade na execução das funções, dado que estas não são rotineiras. O padrão orgânico, portanto, apresentaria maior flexibilidade, em relação ao mecânico, no processo de tomada de decisões, uma vez que necessitaria estar mais voltado para o ambiente e suas possíveis mudanças. O modelo de Burns e Stalker foi amplamente utilizado por vários autores que, embora apontando suas possíveis restrições, fizeram dele a base de suas próprias pesquisas. Para o caso deste estudo, interessa particularmente a pesquisa realizada por Lansley, Sadler e Webb (10) na qual analisam a relação entre estrutura administrativa e estilo gerencial, e sua influência na eficácia organizacional. Para tanto elaboraram dois modelos: um relativo à estrutura e outro relativo a estilos gerências. O modelo de estrutura foi desenvolvido a partir do trabalho de Burns e Stalker, embora apontando algumas restrições, tanto em termos práticos quanto teóricos. Algumas das empresas pesquisadas, por exemplo, apresentaram características de estrutura mecânica e orgânica ao mesmo tempo. Por outro lado, assinalaram, também, o contraste entre a enorme complexidade e variedade dos padrões reais de administração, e a simplicidade do modelo proposto por Burns e Stalker. Tendo em vista a elaboração de seu próprio modelo, Lansley, Sadler e Webb apresentam uma listagem das características dos dois tipos de estruturas enumeradas por Burns e Stalker: Mecânica a) maior ênfase na especialização; b) concentração nas tarefas individuais como se tivessem um fim em si mesmas; c) coordenação entre os sucessivos níveis hierárquicos por parte da cúpula administrativa; d) definição precisa dos direitos e obrigações e métodos técnicos associados a cada tarefa; e) a transformação de direitos, obrigações e técnicas em responsabilidades de uma posição funcional f) estrutura hierárquica de controle, autoridade e comunicação; g) reforço da estrutura hierárquica por um fluxo de informações de baixo, para o topo da hierarquia onde a coordenação final é realizada; h) tendência para interação vertical, isto é, entre superiores e subordinados; i) tendência para que as operações e comportamento no trabalho sejam governados por instruções e decisões emitidas pelos superiores; 53 j) insistência na lealdade para com a empresa e obediência aos superiores como uma condição de relacionamento; k) maior importância e prestígio à resolução de problemas internos à empresa do que a de conhecimentos generalizados. Orgânica a) a natureza contributiva do conhecimento especial e experiência para as tarefas comuns da empresa; b) a natureza criativa da tarefa individual vista como parte integrante do contexto global da empresa; c) o ajustamento e contínua redefinição das tarefas individuais, através de interação com outras; d) o senso de responsabilidade não é confinado a um campo limitado de direitos, obrigações e métodos; e) compromisso para com a empresa, mesmo quando está em crise; f) uma estrutura reticular de controle, autoridade e comunicação; g) onisciência não imputada ao cabeça da empresa; o conhecimento relevante da tarefa pode ser localizado em qualquer lugar do sistema; esta localização transforma-se no centro da autoridade de fato; h) direção lateral de comunicação ao invés da vertical. também salienta-se mais a consulta do que o comando; Entre as pessoas de diferentes níveis i) a comunicação consiste de informações e conselhos, ao invés de instruções e decisões; j) o compromisso para com as tarefas da empresa é mais valorizado do que a lealdade e obediência; k) importância e prestígio às filiações e experts externos à empresa. Essas características são enquadradas por esses autores em três dimensões a saber: controle, integração e vinculação com o contexto. O controle refere-se ao grau de liberdade na execução das atividades pelos membros da organização. Em um extremo, tais atividades estão sujeitas a uma revisão e controle estreitos, por parte da cúpula da organização. No outro, são mais o resultado do exercício de liberdade e de um processo de discussão e consulta. Este aspecto reflete-se nos itens d, e, f, g, h, i, da estrutura mecânica o nos itens f, g, h, i, da estrutura orgânica. A integração refere-se ao grau de coordenação das atividades, dos membros da organização, em relação aos objetivos gerais, itens a, b, c, da mecânica. e a, b, c, d, e, da orgânica. A vinculação com o ambiente refere-se ao grau de orientação da organização para os assuntos internos, ou a suas relações com o ambiente, itens j e k da estrutura mecânica e orgânica. Lansley, Sadler e Webb utilizam em sua pesquisa somente as duas primeiras dimensões. O controle refere-se aos métodos empregados pela organização, para assegurar-se de que as atividades sejam desempenhadas de acordo com o que a alta direção julga mais conveniente. O fator integração, por sua vez, indica de que maneira são reguladas as relações entre as tarefas e pessoas que as executam. A partir dessas duas dimensões, sugerem que as empresas de acordo com seu tipo de estrutura podem ser classificadas em 4 tipos conforme o modelo a seguir: 54 Classificação das Empresas de Acordo com seu Tipo de Estrutura O modelo de Lansley, Sadler e Webb é mais complexo que o de Burns e Stalker, na medida em que Elevada Integração Orgânica Burocrática Elevado Controle Anárquica Mecânica origina duas categorias suplementares: burocrática (alto controle e alta integração) e anárquica (baixo controle, baixa integração). Para a análise dos estilos gerenciais os autores recorrem a duas dimensões: orientação para a tarefa (produção) e orientação para as pessoas, a partir das quais sugerem cinco possíveis estilos, conforme o gráfico: Análise dos Estilos Gerenciais: Duas Dimensões Elevada Orientação para Tarefas Reduzida Orientação para Pessoas Elevada Orientação para Pessoas Reduzida Orientação para Tarefas 55 Numa primeira orientação (Elevada orientação para tarefas, reduzida para pessoas), a fim de alcançar resultados com eficiência, o administrador procuraria organizar o trabalho de forma tal, que o elemento humano interfira o mínimo possível. No caso em que a preocupação maior do administrador seja a de alcançar resultados através de um bom relacionamento com e entre subordinados (Elevada orientação para pessoas e reduzida para tarefas), ele seria levado a concentrar a atenção no elemento humano, visando a um ritmo agradável de trabalho. Na posição intermediária (orientação média para a pessoas e para a produção), a fim de alcançar resultados, administrador procuraria o equilíbrio entre a consecução de atividades e a manutenção do moral das pessoas. Num dos extremos (baixa orientação para a produção e para pessoas), o administrador faz o esforço mínimo que seja suficiente para realizar o trabalho requerido. Por último, no extremo oposto, alta orientação para as pessoas e para a produção, o administrador procura alcançar os objetivos, a partir da dedicação do pessoal, e dentro de um relacionamento de confiança e respeito, mas sem perder a consciência de interdependência pessoa/produção. Com base nesses moldes, Lansley, Sadler e Webb estudaram 50 empresas, 25 gráficas e 25 de construção civil, com objetivo de analisar a relação entre estrutura organizacional e estilo gerencial, e sua influência sobre o desempenho das empresas. O desempenho é abordado em termos do que os autores classificam de humanos e econômicos, utilizando-se os seguintes critérios como medidas dessa variável. Desempenho em termos humanos: satisfação com o trabalho e com a empresa; informação, isto é, o grau de percepção do processo de comunicação; mudança, isto é, o grau de percepção de mudanças por parte dos integrantes da organização. Desempenho em termos econômicos: - lucratividade; - crescimento das vendas. No caso das empresas gráficas, as que apresentavam estrutura burocrática, com alta orientação para a tarefa, tenderam a ser mais eficientes. No caso das empresas de construção civil, verificou-se que as empresas de melhor desempenho eram aquelas com alta orientação para as pessoas e para as tarefas. Em termos de estrutura, verificou-se uma tendência para que firmas bem sucedidas estivessem entre as de estrutura orgânica ou anárquica, isto é, com baixo controle. Entretanto, a combinação de estilo e estrutura não forneceu bom indicador para desempenho. Isso pode ser justificado pelo fato de que as empresas da indústria de construção são muito mais heterogêneas que aquelas da indústria gráfica, cada uma requerendo diferentes formas de estrutura organizacional. Em decorrência, no caso da amostra dessa indústria, torna-se necessário analisar a adequação da estrutura em função da natureza da tarefa e do grau do controle e integração que ela 56 envolve. Nesse sentido, Lansley Sadler e Webb sugerem uma classificação para as tarefas, quanto à necessidade, controle e integração. A classificação das tarefas no que diz respeito às exigências organizacionais relativamente a controle e integração encontra-se no quadro a seguir. Classificação das Tarefas Tarefas que podem ser rotinizadas Interdependência de tarefas relativamente alta (1) Controle + integração + (exemplo - indústria automobilística) (Programáveis) Interdependência de tarefas relativamente baixa (2) Controle + Integração – (exemplo: central telefônica) Tarefas que não podem ser facilmente rotinizadas Interdependência de tarefas relativamente alta (3) Controle – integração + (exemplo: equipe de produção em televisão) (não programáveis) Interdependência de tarefas relativamente baixa (4) Controle – integração – (exemplo: associação arquitetos) De acordo com os autores há muitas possíveis razões pelas quais empresas não desenvolvem estruturas adequadas, isto é, que reflitam as necessidades da tarefa, entre as quais podem-se ressaltar duas: A possibilidade de que as coações impostas pelo tamanho da empresa sejam mais fortes que as coações impostas pela natureza da tarefa. Isso seria refletido pela tendência para ser mais burocráticas ou mecanicistas (alto controle), enquanto as menores são mais orgânicas ou anárquicas, indiferentemente da natureza das tarefas. Outro motivo pode ser o que Child (11) chama de escolha estratégica, isto é, a estrutura seria acima de tudo o reflexo de preferência da alta gerência da organização sem maior relevância às coações que seriam impostas pelo tamanho ou natureza da tarefa. Os resultados da pesquisa de Lansley, Sadler e Webb confirmam as constatações de outros estudos (principalmente os da abordagem contingêncial) no que se refere à influência de fatores ambientais sobre a relação entre estrutura e eficácia. Isto é, apresentaram evidências de que empresas inseridas em um mesmo ambiente podem ou não apresentar uma estrutura comum e "ideal" em termos de eficácia. De fato, no caso das empresas gráficas constatou-se que as que apresentavam estrutura do tipo burocrática (alto controle, alta integração) eram as de melhor desempenho, e no caso da indústria de 57 construção, mais heterogênea, as empresas de maior sucesso eram as que apresentavam estrutura organizacional adequada à natureza da tarefa por elas desenvolvidas. Isso significa que para as empresas dessa indústria, ao invés de um único modelo, foram identificados vários tipos de estrutura que se mostraram perfeitamente adequados, para um mesmo desempenho. No que diz respeito à relação entre estilo gerencial e eficácia, a única evidência consistente foi a de que baixo desempenho estava associado à baixa orientação para tarefas e pessoas, enquanto alto desempenho estava associado com alta orientação para tarefas e pessoas em ambas as indústrias pesquisadas. A conclusão básica dessa pesquisa coincide com a de Lawrence & Lorsch (12) de que não há um meio "ideal" de organizar um empreendimento. A organização está sujeita à contingência e à própria natureza das atividades que desenvolve. Isso implica em que não existe um "pacote" prontamente aplicável, qualquer que seja a organização e a circunstância. Fica claro que as contribuições teóricas e empíricas das diversas correntes de pensamento em administração têm indiscutível validade, devendo, porém, serem utilizadas com o devido cuidado e adaptadas quando for necessário, quando se trata de aplicá-las em realidade diferente daquela em que se originaram. Hall 13 analisa a estrutura da organização em termos de três dimensões: complexidade, formalização e centralização. A complexidade identifica-se com o "tamanho" de estrutura e é composto de: - diferenciação vertical ou hierárquica - refere-se ao número de níveis hierárquicos, isto é, o número de postos entre o administrador principal e os operários. - diferenciação horizontal - refere-se à divisão de trabalho, tendo como indicador o número de departamentos ou setores em que se subdivide a empresa. Está ligada ao conceito de amplitude de controle da escola clássica. A diferenciação, vertical e horizontal, traz à empresa problemas de controle, comunicação e coordenação. De maneira geral pode-se dizer que quanto maior a diferenciação, maior a potencialidade para dificuldades na administração dessas variáveis. O conceito de diferenciação horizontal pode ser encontrado também na obra de Lawrence e Lorsch, para quem a diferenciação (entendida como a divisão das organizações em partes para desenvolver suas atividades) é um dos componentes básicos para se entender a estrutura das organizações. O grau de formalização representa o uso de regras e normas por uma organização. Hall utiliza a definição de Pugh (14) para quem a formalização é a extensão na qual regras, procedimentos, instruções e comunicações são escritos, incluindo também o conceito de padronização (a extensão na qual há regras ou definições que pretendem cobrir todas as circunstâncias e que se aplicam invariavelmente a qualquer organização). Para Hall, o grau de formalização está ligado à maneira como os membros da empresa são vistos pela alta administração. Se as pessoas são vistas como capazes de tomar decisões e com autocontrole, o grau de formalização geralmente é menor. Pode-se supor, inclusive, que a formalização está ligada a uma centralização no processo de tomada de decisões. Se as decisões são tomadas por poucas pessoas no alto escalão da empresa, são utilizadas regras e supervisão fechada como meio de assegurar o desempenho que é exigido dos funcionários. A centralização diz respeito à distribuição do poder em uma organização. Isto é, define quem tem direito de tomar decisões. Pode ocorrer uma aparente distribuição de poder, mas na verdade as decisões sobre as quais os subordinados têm autonomia estariam delimitadas por um conjunto de regras e políticas, definidas na cúpula da organização. 58 Ocorre em dois níveis: - vertical - que define em que nível hierárquico são tomadas as decisões e são realizados o controle e revisão da execução dessas decisões; - horizontal - que define a distribuição de poder entre as áreas funcionais da empresa (aproximando-se do conceito de integração utilizado por Lawrence e Lorsch). A partir dessas características de estrutura enunciadas por Hall pode-se elaborar um gráfico das possíveis formas que a organização pode assumir, levando-se em conta as características, centralização e formalização. Possíveis Formas de Organização Elevada Formalização 2 1 Elevada Centralização 3 4 Onde: (1) Altamente centralizada, altamente formalizada-burocrática centralizada (2) Pouco centralizada, altamente formalizada-burocrática descentralizada (3) Pouco centralizada, pouco formalizada-colegiado, altamente descentralizada (4) Pouco formalizada, altamente centralizada-autocrática altamente centralizada No tipo (1) - as decisões podem ser tomadas pelos níveis inferiores, mas dentro do quadro de regras e normas rigidamente estabelecidas pela alta administração. Problemas não especificados por essas políticas têm de ser levados aos níveis superiores. No tipo (2) - muitas decisões são tomadas nos níveis inferiores, mas dentro das regras e normas que o autor chama de políticas, definidas pela cúpula da empresa. No tipo (3) - muitas decisões são tomadas pelos níveis inferiores, sem restrições de políticas; somente algumas devem ater-se ao arcabouço de políticas pré estabelecido. 59 No tipo (4) - poucas decisões são tomadas nos níveis inferiores, e mesmo essas precisam ser justificadas aos níveis superiores. As decisões mesmo nos níveis superiores são tomadas sem base em políticas, uma vez que estas não são previamente estabelecidas. As variáveis utilizadas nesse modelo correspondem, em certo grau, às variáveis utilizadas por Lansley, Sadler e Webb. Nesse sentido, o componente centralização vertical de Hall corresponderia à definição da variável controle, utilizada pelos primeiros, enquanto a centralização horizontal corresponderia à definição da variável integração. A pesquisa de Joan Woodward (15) de início teve como objetivo investigar se empresas que adotavam um padrão de administração, moldados nos princípios da Teoria Clássica, tendiam a apresentar um melhor desempenho em relação àquelas que não se utilizavam delas. Foram analisadas diversas variáveis estruturais e seu comportamento em cada uma das empresas pesquisadas. Foi constatado, então, que empresas com sistemas de produção similares tendiam a apresentar estruturas organizacionais similares. Tal fato levou a concluir que havia uma relação entre variáveis tecnológicas de produção (referindo-se aos processos de produção) e a forma da estrutura, e que a utilização dos princípios administrativos só se mostraria eficiente quando aplicados, levando-se em conta a natureza do processo de produção. A comprovação de tal relação, porém, foi aliada à análise da influência de outras variáveis tais como: idade da empresa, experiência e personalidade dos empresários na formação da estrutura. Não houve, todavia, um maior aprofundamento nesse sentido. Em termos da relação entre estrutura e ambiente, cabe citar o trabalho de Lawrence e Lorsch (16). Ressaltaram a importância de se analisar a relação entre os aspectos a nível interno da empresa e as condições do ambiente, principalmente as relativas ao mercado em que se insere. Introduzem para a análise dois conceitos básicos: o de diferenciação na orientação e no formalismo da estrutura e o de integração que diz respeito à colaboração existente entre os diversos departamentos da empresa. Analisando o comportamento dessas variáveis em diferentes empresas, procuraram identificar e explicar as diferenças básicas entre empresas eficientes e menos eficientes, inseridas em uma mesma indústria, ou em indústrias diferentes. Salientam que em termos de análise de empresas, o importante é ter em mente que não existe um método único e ideal de estrutura para administrar as organizações. Assim, por exemplo, empresas de alto desempenho podem ajustar-se ao modelo clássico de organização, em que o processo de tomada de decisões é concentrado nos dirigentes de cúpula. A tentativa de descentralizar o processo, nesse caso, pode ser infrutífera. O importante, afirmam, é formar uma estrutura que atenda à demanda do ambiente. Em um ambiente estável, as diversas unidades da empresa não precisam ser altamente diferenciadas e, sendo assim, seu mecanismo formal integrador seria representado pela própria hierarquia administrativa. Segundo os autores, qualquer tentativa de usar a abordagem de diferenciação e integração deveria começar por um estudo diagnóstico da empresa e de seu ambiente, em dois estágios, sendo que o primeiro compreenderia o exame da natureza das tarefas e das partes do ambiente, e o segundo, a análise das características estruturais e suas possíveis relações com as características do ambiente. Cabe ainda, em termos de literatura voltada para análise da estrutura organizacional, citar o trabalho de Child (17), que introduz o conceito de escolha estratégica em relação à formação da estrutura. Embora variáveis como tecnologia, ambiente e tamanho das empresas exerçam indiscutível influência sobre a formação da estrutura, as análises voltadas para o estudo dessas influências, de maneira geral, falham, uma vez que não reconhecem o exercício da escolha pelos tomadores de decisão das organizações, a partir de sua percepção e de uma avaliação crítica dos riscos e oportunidades que o ambiente apresenta em determinado momento. 60 A partir do conceito de estratégia de Chandler (18) “determinação dos objetivos básicos de longo prazo, adoção dos cursos de ação e alocação dos recursos necessários para alcançá-los” e do conceito de coalisão dominante de Cyert e March (19), “grupo que detém o poder em um determinado período de tempo”, a abordagem da escolha estratégica dirige a atenção para a influência das decisões e escolhas daqueles que possuem o poder de decidir na organização, e até mesmo de alterar determinadas condições ambientais que, em outras análises, são consideradas variáveis independentes sobre as quais a organização não tem poder algum, afetando diretamente a estrutura e seu desempenho. A concepção da escolha estratégica leva a que se reconheça um processo de decisão no qual riscos e oportunidades são analisados em função do poder exercido pelos tomadores de decisão, à luz de valores pessoais. Implica em que o grau de associação que os diferentes fatores contextuais têm com as variáveis estruturais não possa ser expresso por simples equações matemáticas. É essencial levar em conta a influência que exerce a opção dos dirigentes frente às coações do ambiente. Por outro lado, não há como negar a influência que as características administrativas dos dirigentes exercem sobre a forma que a estrutura organizacional assume, em termos de delegação de autoridade, sistema de informações, grau de formalização e maior número de níveis hierárquicos e departamentos. Quanto a estudos focados na análise da estrutura organizacional cabe ainda mencionar o trabalho de Vasconcelos (20) , centrado na análise da estrutura em Institutos de Pesquisas. O autor aborda a estrutura a partir de três componentes: o sistema de responsabilidades, o sistema de autoridade e o sistema de comunicações. Os dois primeiros são abordados no estudo de Hall anteriormente mencionado, inseridos na variável centralização. Quanto ao terceiro elemento, o sistema de comunicações, na visão de Hall, seria componente do que ele denomina de organizacional. A consideração da comunicação como componente da estrutura justifica-se na medida em que está intimamente ligada a uma das variáveis fundamentais em termos de estrutura, qual seja, o grau de formalização. 2.2. Considerações sobre os estudos abordados Como se procurou mostrar ao longo do texto, a teoria da administração vem acompanhando a evolução do sistema capitalista, buscando responder às novas situações que surgem à medida que as empresas tornam-se mais complexas. Assim, as diversas escolas aparecem não para contradizer as anteriores, mas antes, como conseqüência de um processo de contínua adaptação e manutenção da funcionalidade aos objetivos da empresa. Verifica-se isso inclusive nas abordagens mais modernas que, embora criticando os princípios da escola clássica, têm ainda como preocupação fundamental, nem sempre manifestada, explicitamente, o aumento da produtividade. Na medida em que a teoria acompanha o desenvolvimento das organizações, o que ocorre é que os objetivos permanecem os mesmos. O que muda são apenas os conceitos e medidas indicados para atingi-los. Outra limitação da teoria organizacional é o caráter da universalidade que cada escola pretende para seus princípios. Tal universalização é indevida. Até porque, muitas vezes os "princípios" de uma abordagem são formulados a partir dos resultados de uma única experiência, em uma única organização. Como então pretender generalizar tal solução? É perder de vista que as organizações, embora tenham certas características comuns, apresentam aspectos diferenciados entre si, sofrendo influências variadas, sendo sujeitas, portanto, a diferentes necessidades. Veja-se, por exemplo, o caso da abordagem de D.O. (Desenvolvimento Organizacional) que surgiu basicamente da necessidade de se resolver os problemas que a excessiva fragmentação das tarefas produtivas e o alto nível de burocratização (formalização) das organizações modernas (e que antes foram encaradas como soluções para resolver outro tipo de situação) acabaram por ocasionar. Os 61 reflexos recaem primeiramente no comportamento do trabalhador, seja em nível administrativo ou operacional. Teme-se que venha a significar diminuição do nível de produtividade. À medida que o grau de formalização aumenta, as tarefas tornam-se cada vez mais fragmentadas, mecanizadas e rotinizadas, surgem problemas de motivação e a produtividade tende a diminuir. Nesse ponto, tornam-se adequadas soluções do tipo "enriquecimento de tarefas" que visam amenizar tais efeitos negativos. Ao final mostram-se eficazes, pelo menos em curto prazo mas que nem por isso podem ser generalizados, para qualquer situação e para qualquer tipo de organização. Quanto ao padrão de gestão, deve-se reconhecer que em boa parte dos casos, o padrão “mecânico” de organização – estruturas altamente hierarquizadas e departamentalizadas – não atende mais às necessidades, emergindo um novo padrão – o orgânico. Padrão esse que não é novo; o que é novo é a sua transformação em padrão, assentado na busca da flexibilidade, a partir da delimitação menos rígida de fronteiras entre departamentos e níveis hierárquicos. Nesse âmbito, se, de um lado, a fluidez das formas de organização se transformou num imperativo, voltado ao aumento da capacidade de percepção das mudanças no ambiente e do aumento da capacidade de resposta a elas, de outro, a coordenação e o controle permanecem como elementos centrais para imprimir coerência e direção. Esse é o desafio: mudar (ser flexível), mas com coordenação e controle, sob o risco da anarquia e da perda do sentido e direção da empresa. Aparente contradição, visto que ao mesmo tempo em que aumenta a necessidade de descentralização e da fluidez de posições, aumenta a necessidade de coordenação e controle, evidenciando a importância do estabelecimento de estratégias. 2.3. O Fator Humano na estrutura das organizações Pode-se iniciar este item recorrendo a uma afirmação de Shaughnessy(1) : “se a tarefa da direção de uma empresa estiver além da capacidade de uma pessoa para realizá-la, deverá ser compartilhada com outras, dado que organizar é questão de dividir o trabalho entre pessoas, cujos esforços terão de ser coordenados. Isso também diz respeito aos objetivos específicos para a organização como um todo e a cada uma de suas sub unidades, determinando, em termos amplos, as atividades e decisões necessárias para executar esses objetivos". De acordo com esse autor, deficiências na organização de uma empresa podem manifestar-se em sintomas tais como: - Os departamentos e seções podem não estar capacitados a contribuir para os objetivos da empresa, de forma a justificar seus custos; inversamente, os objetivos podem ser desempenhados de maneira insatisfatória por causa da relutância em se organizar uma seção ou departamento (por exemplo um departamento de custos ou de pesquisas de mercado), cuja existência é um pré-requisito para se alcançar resultados finais adequados; - As funções podem estar coordenadas em bases pouco satisfatórias, em se tratando da empresa como um todo; pode estar faltando, por exemplo, uma diretriz uniforme no recrutamento ou nos salários, cuja ausência leva a problemas entre os departamentos; - Fracasso no que tange à coordenação de atividades interdepartamentais; como conseqüência, as economias globais podem ser sacrificadas e podem surgir estrangulamentos na fluência dos trabalhos, enquanto cada departamento atua independentemente dos outros; - As decisões podem ser lentas e de baixa qualidade seja porque os agentes estão sobrecarregados, seja porque as informações que se requer para tomar decisões não estão prontamente em disponibilidade, seja porque as decisões estão sendo tomadas em lugar ou níveis errados. 62 A necessidade de recursos humanos varia de empresa para empresa e, em uma mesma empresa, dependendo de seu porte, estágio de desenvolvimento, tempo de permanência no mercado, etc. Por exemplo, será de pouca valia a contratação de administradores profissionais altamente qualificados para uma pequena empresa cujo empresário pretenda continuar centralizando todas as decisões e não tenha definido claramente os objetivos que pretende de fato alcançar com tal contratação 5. Vale dizer, se de um lado é necessário avaliar a adequação das pessoas "chaves” na empresa, às variáveis mencionadas, de outro, não se pode ignorar o fato de que o desempenho da empresa também depende dos elementos humanos de que dispõe. Como a estrutura, por sua vez, pode ser um dos fatores básicos para a explicação do desempenho da empresa, é necessário analisá-la enquanto variável, levando em consideração a influência que o fator humano exerce em sua formação. Por meio dos produtos finais resultantes dos processos decisórios das diferentes empresas que integram um determinado segmento, são disputados os espaços no mercado, a preferência dos possuidores de poder de compra. Só com o resultado dessa disputa (concorrência) cada empresa sabe se ao final foi selecionada, isto é, se suas decisões e estratégias foram acertadas. Ora, as decisões são tomadas, a partir do eixo definido pela estratégia, por pessoas, conjunto de recursos internos que interagem na estrutura, os valores da empresa, que lhe dão identidade e aos quais cabem com diferentes graus de responsabilidade e autonomia as decisões ao longo da estrutura hierárquica. Nesse sentido, fica clara, para além dos discursos empresariais, a validade da argumentação que propõe que os recursos humanos (como os demais) devem ser valorizados como integrantes do conjunto de ativos mais relevantes para a empresa. A proposição justifica-se, pois, como afirma Penrose (1959), enfatizando a relevância das pessoas e da rede de relacionamentos, formais e informais por elas construídos, os recursos representam fontes de “economias de expansão”; vantagens especiais no processo de expansão da firma. Uma simples análise de diversos organogramas ainda que retratassem de forma fiel e atualizada as respectivas estruturas administrativas de cada empresa não seria suficiente, uma vez que, no máximo, traria informações sobre a estrutura formal, isto é, determinar-se-ia quem responde a quem, quais as linhas formais de autoridade, quais os níveis hierárquicos. Seria falha, no entanto, na medida em que não permitiria que se detectassem as interdependências entre as diversas áreas, os limites de atuação entre subordinado e superior, as tarefas reais de cada pessoa envolvida no processo decisório, enfim a totalidade do que se quer entender por estrutura administrativa e seus reflexos no comportamento da organização. BIBLIOGRAFIA KLIKSBERG, Bernardo. El Pensamiento Organizativo. Buenos Aires, Depalma, 1971. Idem, op. Cit. Cap. 9. Idem, op. Cit. p. 362. Idem, op. Cit. p. 462. Idem, op. Cit. pp. 467/468. 5 De maneira geral, as pequenas empresas são administradas por uma só pessoa (ou um grupo muito pequeno), normalmente o proprietário, isto é, não se verifica ainda a dissociação entre propriedade e administração. Isso implica centralização no processo de tomada de decisão, e que o sócio/gerente representa papel de vital importância para a continuidade do empreendimento. Os objetivos do empresário e da empresa acabam por confundir-se. Aqui o caráter que a autoridade assume passa a ser extremamente importante. Fazendo-se uso dela é que se busca conseguir que tais objetivos, determinados pelos conceitos de uma só pessoa, sejam aceitos e compartilhados pelos demais membros da organização, definindo assim o maior ou menor grau de cooperação do grupo para o seu alcance. 63 SIMON, Herbert, A. O Comportamento Administrativo. Rio de Janeiro. FGV, 1979. Cap.4. ETZIONI, Amitai. Organizações Modernas. São Paulo. Pioneira, 1967. MAYO, Elton. In: Kliksberg Bernardo, op. Cit. p. 375. BURNS, Thomas & STALKER, GM. The Managment of Inovation. London, Tavistock Publ. 1961. LANSLEY, P; SADLER, P. & WEBB, T. Organization Structure, Management Style and Company Performance. Omega. 1974. 2 (4). CHILD, John. Organizational Performance: The role of Estrategic Choice. Sociology, 1972 (6). LAWRENCE, P. & LORSCH, J. As Empresas e o Ambiente. Petrópolis, Vozes. 1973. HALL, Richard. Organizations: Structure and Process. 2ª ed. Englewood-Clifs, Prentice Hall. 1977. PUGH, D.W; HICKSON, D. J. & HINNINGS,C. R. The Context of Organization Structures. Administrative Science Quartely. 14 pp. 91/114. 1969 (14), p. 91.114. WOOD, Joan. Organização Industrial: Teoria e Prática. Trad. de Geni Garcia Goldschmidt. São Paulo, Atlas. 1977. LAWRENCE, P. & LORSCH, Jay. op. cit. CHILD, John. op. cit. CHANDLER, Alfred. Strateg and Structure, Chapters in the Industrial Enterprise. Cambridge, MIT. 1978. CYERT, R. M. & MARCH, J. M. A Behavioral Theory of the Firm. Englewood Cliffs, Prentice Hall. 1963. VASCONCELOS, Eduardo. Contribuição ao Estudo da Estrutura Administrativa. São Paulo. USP-FEA. 1972. 64 Texto 8: - Algumas Observações sobre os Tipos de Estrutura Organizacional Estrutura funcional - reduz a coordenação entre as funções da empresa, pois a ênfase sobre especialidades estreitas distrai a atenção sobre o resultado global da empresa. As pessoas focalizam seus esforços sobre seus próprios meios e não sobre os objetivos globais da empresa. uma das principais limitações da estrutura funcional é que ela carece de mecanismos próprios de coordenação do fluxo de trabalho. a tendência natural é levar os problemas de coordenação para os níveis mais elevados da organização. A estrutura funcional, principalmente quando o trabalho operacional não é especializado - tende a ser muito burocratizada. a atividade tende a ser mais formalizada, o que requer uma estrutura administrativa mais elaborada (mais analistas para formalizar o trabalho), hierarquia com maior número de níveis e mais executivos. Estrutura por produtos ou serviços/serviços - muito encontrada em empresas de larga-escala e com multilinhas de produtos/serviços. geralmente, as empresas que adotam esta estratégia organizacional foram originalmente organizadas funcionalmente. Na estrutura por produtos/serviços, a empresa se diferencia em função dos resultados. isso facilita o emprego da tecnologia, das máquinas e equipamentos, do conhecimento etc., permitindo uma intensificação de esforços e de coordenação. Estrutura matricial - ao utilizar um sistema de comando múltiplo, requer o suporte de toda a organização empresarial. trata-se de uma escolha estrutural extremamente útil e válida quando ocorrem três condições básicas e simultâneas, a saber: condição 1: pressão externa para focalização dual da tarefa a ser executada. para focalizar sua atenção e energia para os objetivos escolhidos, as empresas agrupam as pessoas e recursos em diferentes unidades organizacionais com limites definidos e um chefe comum e que se concentram em uma atividade que identifica seu propósito com o restante da empresa: os membros de cada unidade desenvolvem uma maneira distinta de pensar e trabalhar e se relacionam com os outros para compartilhar sua tarefa e dar sua contribuição à tarefa empresarial. Problemas como: - especialização técnica e inovação (orientação interna) - atendimento às necessidades e exigências específicas dos consumidores e usuários (orientação externa) enfatizam a necessidade de estabelecer um equilíbrio de poder entre: - gerentes funcionais (voltados para os recursos e especialidades técnicas) - gerentes de projeto (voltados para os produtos e serviços solicitados pelos clientes) condição 2: pressões para aumentar a capacidade de processar informações. como a empresa realiza uma tarefa complexa que cada indivíduo jamais poderia executar sozinho, ela precisa estabelecer e manter uma cadeia de canais de comunicação entre seus participantes para assegurar a coordenação. Três aspectos críticos que exigem maior capacidade de processamento da informação dentro da empresa: - incerteza ambiental 65 - complexidade organizacional - interdependência de pessoas e grupos condição 3: pressões para utilização compartilhada de recursos. o tamanho de uma empresa pode capacitá-la a conseguir recursos em grande quantidade. mas sempre existe a necessidade de alcançar economias de escala e elevado desempenho em termos de custos e benefícios. isso provoca pressões para otimizar a utilização dos recursos. deve ser possível alocá-los e deslocá-los com flexibilidade de uma tarefa para outra, de acordo com as necessidades da empresa. mudanças ambientais mais rápidas exigem maior velocidade de resposta por parte da estrutura organizacional às novas exigências. a matriz permite rápidos deslocamentos e utilização compartilhada dos recursos disponíveis. 66 Texto 9: DRUCKER Peter F. Os Novos Paradigmas da Administração. EXAME, 24/02/1999 (Edição 682) Um dos pais da moderna teoria da administração argumenta que boa parte do que se ensina e se acredita com relação à teoria da administração está errada ou seriamente desatualizada. Se você quiser prosperar neste mundo em rápida transformação, é melhor prestar bastante atenção ao que ele está dizendo À medida que nós avançamos e nos aprofundamos na economia do conhecimento, os pressupostos básicos de boa parte do que se ensina e se pratica em nome da administração vão ficando totalmente desatualizados. Como todo executivo experiente já sabe, poucas políticas se conservam atuais por 20 ou 30 anos. Tampouco conserva sua atualidade por mais tempo do que isso a maioria das premissas referentes à economia, aos negócios e à tecnologia. No entanto, a maioria de nossos pressupostos relativos às empresas, à tecnologia e à organização data de pelo menos 50 anos. Eles já perderam sua atualidade. Em conseqüência, estamos pregando, ensinando e praticando políticas que destoam cada vez mais da realidade e que, por isso mesmo, são contraproducentes. Este ensaio procura reexaminar esses pressupostos e essas práticas. As premissas básicas relativas à realidade constituem os paradigmas de uma ciência social. Elas determinam qual será o foco de atenção da disciplina. Também determinam, em grande medida, o que é deixado de lado, visto como exceção irritante. Se as premissas estiverem erradas, tudo o que as segue estará errado. Para uma disciplina social, como é a administração, as premissas são bem mais importantes do que são os paradigmas para uma ciência natural. O paradigma - isto é, a teoria geral prevalecente - não exerce impacto sobre o universo natural. Quer o paradigma afirme que o Sol gira em torno da Terra ou, ao contrário, que a Terra gira em torno do Sol, isso não tem efeito sobre o Sol ou a Terra. Mas uma disciplina social como a administração trata do comportamento de pessoas e instituições humanas. O universo social não possui "leis naturais" como as que governam as ciências físicas. Assim, é sujeito a mudanças contínuas. Isso significa que as premissas que eram válidas ontem podem tornar-se inválidas, ou até mesmo totalmente enganosas, num piscar de olhos. É nesse ponto que estamos hoje na disciplina da administração. Quais são as premissas que estão conduzindo a administração no caminho errado? Subjacente à ortodoxia atual, por exemplo, está uma premissa que é defendida por praticamente todos os teóricos da administração e pela maioria de seus praticantes, desde os primórdios da reflexão sobre organizações - ou seja, desde Henri Fayol, na França, e Walter Rathenau, na Alemanha, por volta de 1900. Desde aquela época, é dado como certo que existe uma forma correta de organização. Fayol ditou o princípio de que existe uma estrutura correta para toda empresa manufatureira: uma divisão funcional em engenharia, manufatura, vendas, financeiro e pessoal, cada divisão a ser administrada separadamente, indo unir-se às outras apenas no nível do executivo-chefe. Essa é apenas uma entre sete premissas subjacentes relativas à organização que estão desatualizadas: 1. Existe apenas uma maneira certa de organizar uma empresa. 2. Os princípios da administração se aplicam apenas às organizações empresariais. 67 3. Existe uma única maneira correta de administrar pessoas. No passado, a maneira correta era o controle de cima para baixo - a centralização. Mais tarde, a descentralização entrou em voga. Hoje, a abordagem de equipe é vista como a ideal. 4. Tecnologias, mercados e finalidades são fixos e raramente se superpõem. Ou seja, cada indústria possui uma tecnologia específica e um mercado específico. 5. O âmbito da administração se restringe aos ativos e funcionários de uma organização. 6. O trabalho da administração é "gerir a empresa", e não centrar sua atenção no que acontece fora da empresa. Ou seja, o foco da administração é interno, não externo. 7. As fronteiras nacionais definem o ambiente da empresa e da sua administração. Até o início da década de 80, todas essas premissas eram suficientemente próximas da realidade para ser úteis. Neste ensaio vou procurar mostrar por que cada uma delas é hoje incorreta, desatualizada ou ambas as coisas. Deixar de abandoná-las em face da realidade em rápida transformação pode levar sua empresa à falência ou sua carreira ao fracasso. 1. A disciplina da administração Hoje em dia costumamos pensar na administração como sendo administração de empresas. Essa premissa tem origem mais ou menos recente. Até a década de 30, o punhado de escritores e pensadores que se preocupavam com a administração - começando por Frederick Winslow Taylor (1856-1915), mais ou menos na virada do século, e terminando com Chester Barnard, logo antes da Segunda Guerra Mundial - presumia que a administração de empresas não passava de subdivisão da administração geral. Para eles, o termo "administração" se aplicava a qualquer tipo de organização, não apenas às empresas. Uma organização era uma organização, e as organizações diferiam entre si apenas na mesma medida em que uma raça de cão difere de outra raça. A primeira aplicação consciente e sistemática dos princípios da administração não se deu numa empresa. Foi a reorganização do Exército dos Estados Unidos feita em 1901 por Elihu Root (18451937), o secretário da Guerra de Theodore Roosevelt. O primeiro congresso de administração - em Praga, em 1922 - foi organizado não por empresários, mas por Herbert Hoover, então secretário de Comércio americano, e Thomas Masaryk, historiador mundialmente famoso e presidente-fundador da recém-criada República da Checoslováquia. A identificação da administração com a administração de empresas começou apenas com a Grande Depressão, que gerou hostilidade em relação às empresas e desprezo por seus executivos. Para não ser contaminada pela associação de sua imagem com a de empresas, a administração no setor público foi rebatizada de administração pública e proclamada uma disciplina distinta - com seus departamentos universitários, terminologia e hierarquia profissional próprios. A moda mudou, entretanto, no período do pós-guerra. Em 1950, "empresas" e "negócios" já haviam voltado a ser palavras bem-vistas, em grande medida devido ao desempenho da administração de empresas americana durante a Segunda Guerra Mundial. Hoje, nossa teoria está finalmente alcançando essa realidade. Isso se pode constatar pelos seguintes fatos: Muitas escolas de administração de empresas foram rebatizadas de escolas de administração. A crescente oferta de cursos de administração de organizações sem fins lucrativos por essas mesmas escolas. 68 O surgimento de programas de administração executiva que recrutam executivos de empresas e de outras organizações não-empresariais. A criação de departamentos de administração pastoral em escolas de teologia. Mas a premissa de que a administração é administração de empresas continua existindo. Assim, é importante afirmar - em alto e bom som - que a administração não é administração de empresas, assim como a medicina, por exemplo, não é obstetrícia. Por que é importante acabar com a distinção artificial entre organizações empresariais e nãoempresariais? Porque é muito pouco provável que o setor que mais cresça nas sociedades desenvolvidas do século XXI seja o das empresas. Na verdade, as empresas não têm sido o setor que mais cresce nas sociedades desenvolvidas do século XX. Hoje, uma proporção muito menor da população economicamente ativa dos países desenvolvidos trabalha em empresas do que acontecia há 100 anos. Naquela época, praticamente todas as pessoas que compunham a população ativa ganhavam a vida em atividades econômicas (em sua maioria agrícolas). Os setores que mais cresceram nos países desenvolvidos no século XX não foram o das empresas, mas sim o governamental, o dos profissionais liberais, o da saúde e o da educação. Essa tendência vai se manter e se intensificar no século XXI. Assim, o setor social sem fins lucrativos é aquele em que a administração é mais necessária hoje em dia. É ali que a administração sistemática, baseada na teoria e guiada por princípios, pode render os maiores resultados em menos tempo. Basta pensar nos enormes problemas com que o mundo defronta pobreza, saúde, educação, tensões internacionais -, que a necessidade de soluções administradas se torna clara. 2. A única organização correta? A preocupação com a administração e seu estudo começou com o repentino surgimento de grandes organizações. Um exército permanente foi a novidade do final do século XIX. Empresas e órgãos públicos governamentais, empregando quadros de funcionários públicos, foram outras grandes organizações que surgiram mais ou menos na mesma época. E, desde o início, há mais de um século, o estudo da organização se baseia em uma premissa: a de que existe ou deve existir uma única forma "certa" de organização. Essa idéia de que existe um modelo que serve para todas as organizações persiste até hoje. A estrutura organizacional das empresas foi estudada pela primeira vez na França, por volta da virada do século, por Henri Fayol, presidente de uma das maiores - mas totalmente desorganizada - empresas da Europa, uma mineradora de carvão (mas ele só publicou seu livro em 1916). O que aconteceu na Europa repetiu-se nos Estados Unidos: os primeiros teóricos da administração foram empresários praticantes - John D. Rockefeller pai, J.P. Morgan e, especialmente, Andrew Carnegie (que exerceu o impacto mais duradouro e ainda merece ser estudado). Um pouco mais tarde, Elihu Root aplicou a teoria da organização ao Exército americano. Não foi coincidência o fato de Root ter sido assessor jurídico de Carnegie. Era a época em que as organizações empresariais em escala realmente grande estavam começando a aparecer, e seus administradores tiveram de desenvolver sua disciplina à medida que as empresas avançavam. Não havia textos a consultar, não havia consultores. De certo modo, eles aprenderam uns com os outros. Por volta de 1895, Georg Siemens (1839-1901), fundador, em 1870, do Deutsche Bank, adotou os conceitos organizacionais de seu amigo Fayol para salvar a companhia Siemens Electric. A 69 Siemens tinha sido fundada por seu primo Werner von Siemens (1816-1892), mas estava acéfala depois da morte dele - e ia mal das pernas. A Primeira Guerra Mundial deixou clara a necessidade de uma estrutura organizacional formal. Administrar dezenas de milhões de soldados e reorientar economias inteiras em torno da produção para a guerra tornou indispensável a organização formal. A guerra mostrou, porém, que a estrutura funcional defendida por Fayol (e Carnegie) não era a organização adequada para empreendimentos enormes. A administração altamente centralizada que propalavam simplesmente não funcionava nessa escala. O processo decisório tinha de ser redirecionado para escalões mais baixos da organização. Assim, imediatamente após a Primeira Guerra Mundial, primeiro Pierre S. du Pont (1870-1954) e depois Alfred Sloan (1875-1966) desenvolveram a descentralização. Esta não demorou a transformarse no mantra da administração, o único caminho visto como correto. E agora, nos últimos anos, passamos a defender a equipe como a organização correta para praticamente qualquer coisa. Mas já deve ter ficado claro que a organização certa é algo que não existe. Existem apenas organizações, cada uma das quais possui pontos fortes distintos, limitações distintas e aplicações específicas. O que já ficou claro, sim, é que a organização não é um absoluto. É uma ferramenta para tornar as pessoas produtivas quando trabalham em conjunto. Como tal, uma estrutura organizacional é adequada para determinadas tarefas em determinadas condições e determinadas épocas. Por exemplo, ouve-se falar muito hoje em dia sobre o "fim da hierarquia". Isso é bobagem pura e simples. Em qualquer instituição é preciso que haja uma autoridade final, ou seja, um "chefe" - alguém que, numa situação de perigo comum, tome a decisão final e possa esperar ser obedecido. (É provável que toda instituição enfrente uma situação desse tipo, cedo ou tarde.) Se o navio está afundando, o capitão não convoca uma reunião - ele dá ordens. E, para que o navio possa ser salvo, é preciso que todos obedeçam a essas ordens, que todos saibam exatamente aonde devem ir e o que devem fazer, e que o façam sem discussão, sem "participação". A hierarquia, e a aceitação dela sem questionamentos por todos na organização, é a única esperança de salvação numa crise. Mas a organização correta para lidar com crises não é a organização apropriada para lidar com todas as tarefas. Às vezes a abordagem de equipe é a resposta certa. De fato, na indústria farmacêutica a abordagem de equipe foi aplicada com sucesso muito antes do atual entusiasmo por ela. Desde mais ou menos 1950, primeiro na Suíça e depois nos Estados Unidos, as empresas farmacêuticas vêm usando equipes para desenvolver e lançar novos medicamentos. Assim que é desenvolvida a ciência básica, o pessoal médico, de manufatura, financeiro, de marketing e especialistas em patentes trabalham em conjunto, em equipes de desenvolvimento. Depois de atingido seu objetivo, a equipe só se desfaz quando o medicamento já está no mercado. No entanto, dentro dessas mesmas empresas, outros projetos - como, por exemplo, a conversão de um remédio vendido com receita médica em produto vendido sem receita - são conduzidos pela organização funcional convencional. Henri Fayol tomou como pressuposto básico a "empresa manufatureira típica". Nos anos 20, Alfred Sloan organizou cada uma das divisões descentralizadas da GM exatamente da mesma maneira. Trinta anos mais tarde, na maciça reorganização da empresa americana General Electric, o mesmo princípio foi aplicado: o de que existe apenas uma maneira de organizar o trabalho. Uma pequena unidade de algumas dúzias de pesquisadores, contratados unicamente para desenvolver projetos para a Força Aérea americana, seria organizada quase exatamente do mesmo modo que um departamento enorme que empregava vários milhares de pessoas e produzia uma torradeira ou um gerador elétrico. O pequeno grupo de desenvolvimento chegava a ser onerado com gerentes de manufatura, pessoal, financeiro e relações públicas. 70 Em qualquer empreendimento - provavelmente até mesmo na empresa manufatureira típica de Fayol existe a necessidade de uma série de estruturas organizacionais diferentes que coexistam. Considere-se a tarefa cada vez mais difícil de administrar as dívidas em moeda estrangeira. Ela requer centralização total. Nenhuma unidade da empresa pode ser autorizada a lidar com suas próprias dívidas em moeda estrangeira. Mas, na mesma empresa, o atendimento ao cliente, especialmente em áreas de alta tecnologia, requer autonomia local quase total, indo muito além da descentralização tradicional. Cada um dos funcionários que prestam atendimento precisa ser o "chefe", com o resto da organização seguindo suas orientações. Assim, existem diferenças enormes em estrutura organizacional, segundo a natureza da tarefa. Apesar disso, há princípios de organização que são universais. Um deles, com certeza, é que a organização deve ser transparente. As pessoas precisam conhecer e compreender a estrutura organizacional na qual vão trabalhar. Isso soa óbvio, mas muito freqüentemente não é respeitado na maioria das instituições, até mesmo na instituição militar. Levou algo como 20 anos, por exemplo, para a Força Aérea americana realmente compreender quem deve dar a última palavra sobre quando um novo avião está pronto para voar. Acabou ficando claro que o verdadeiro responsável era o chefe da equipe de sargentos, não o coronel que comanda as equipes de reparos. 3. Estruturas organizacionais múltiplas Como já mencionei, alguém na organização precisa ter a autoridade necessária para assumir o comando em momentos de crise. Também é um princípio geral válido para organizações de todos os tipos que qualquer membro da organização deve se submeter a apenas um "senhor". É sábio o velho provérbio da lei romana segundo o qual um escravo que tem três senhores é um homem livre. É um princípio muito antigo das relações humanas que ninguém deve ser sujeito a um conflito de lealdades - e ter mais de um senhor gera exatamente esse tipo de conflito. É aí que erram as chamadas equipes "bandas de jazz", tão bem-vistas hoje em dia. O membro que é engenheiro, por exemplo, reporta-se ao líder da equipe, mas também se reporta ao chefe de sua função específica. A mesma coisa acontece com o membro financeiro: ele deve lealdade tanto ao líder da equipe quanto ao chefe financeiro geral da organização. É um princípio estrutural correto ter o menor número possível de camadas, ou seja, ter uma organização o mais "achatada" possível - mesmo porque a primeira lei da teoria da informação nos diz que "cada relê dobra o ruído e reduz a mensagem pela metade". Uma decorrência disso é que todos os indivíduos terão de aprender a trabalhar ao mesmo tempo em diferentes estruturas organizacionais. Para algumas tarefas, terão de trabalhar em equipe. Para outras, vão trabalhar numa estrutura de comando e controle. O mesmo indivíduo que é chefe em sua própria organização é parceiro numa aliança ou até mesmo sócio minoritário numa joint venture. Pense nos seguintes termos: o executivo do futuro vai precisar de uma caixa de ferramentas repleta de estruturas organizacionais. Ele terá de selecionar a ferramenta apropriada para cada tarefa específica. Isso significa que ele terá de aprender a usar cada uma dessas ferramentas e entender qual delas funciona melhor para cada tarefa. E quando, durante o desempenho da tarefa, ele deve passar de um tipo de organização a outro? Essa análise talvez se faça mais necessária para a organização atualmente vista como politicamente correta: a equipe. 71 Hoje, a premissa mais generalizada é que existe apenas um tipo de equipe - podemos chamá-la de "banda de jazz" -, em que cada participante faz o que ele, ou ela, sabe fazer, mas, juntos, produzem música de alta qualidade. Na realidade, existem pelo menos meia dúzia - talvez uma dúzia - de equipes muito diferentes, cada uma com sua própria área de aplicação, cada uma com suas próprias limitações e dificuldades, cada uma exigindo uma administração diferente. Eis alguns exemplos de equipe: A equipe funcional de modelo antigo é o tipo que prevalece nas lojas de departamentos. As diferentes seções - de compras, vitrines, promoção e publicidade, vendas - não trabalham juntas, e nenhum de seus integrantes jamais desempenha a tarefa de um membro de outra seção, exceto em raros momentos de crise. A vantagem dessa equipe é que cada membro pode ser treinado para uma função específica, como é feito com os arremessadores, batedores e apanhadores num time de beisebol. E cada membro pode ser medido e avaliado em comparação com metas claras e específicas. Seus pontos fracos são: rigidez, demora para modificar qualquer coisa e o perigo de que cada grupo esteja voltado exclusivamente a sua própria função. Ele fará seu próprio trabalho bem, mas não se preocupará com o desempenho global da organização. Outro tipo de equipe é aquele exemplificado pela alta direção das grandes empresas alemãs. Normalmente, cada um de seus integrantes tem uma área de responsabilidade claramente definida, na qual ele (ainda são muito raros os casos em que é "ela") é o chefe. Essa área pode ser funcional engenharia - ou geográfica - por exemplo, a América do Norte. Normalmente, a pessoa encarregada de uma área desse tipo nem sequer consulta seus colegas sobre as decisões que vai tomar em sua área; ela apenas as relata. Mas existe um "coordenador", freqüentemente uma pessoa eleita pelo conselho de administração. Ele também tem uma área que é sua especialidade, mas, além disso, pode dar a última palavra, especialmente quando o grupo apresenta discordâncias internas. É um pouco como o regente de uma boa orquestra: é ele quem dá a partitura que será tocada. Mas cada músico toca seu próprio instrumento. Existem muitos outros tipos de equipe. Estamos apenas começando a estudá-las e a definir os pontos fracos e fortes de cada uma, as áreas em que cada uma funciona ou não funciona. Mas, a não ser que decifremos, e rapidamente, para qual tipo de trabalho uma equipe é adequada e para qual ela não é adequada, as equipes passarão a ser desacreditadas, vistas como apenas mais uma tendência passageira. Qual é o papel do executivo-chefe em tudo isso? Duvido que alguém queira afirmar que realmente sabemos organizar o mais alto cargo executivo, quer seja numa empresa, numa universidade, num hospital ou até mesmo numa igreja moderna. Falamos sem parar em equipes, e todos os estudos chegam à conclusão de que o mais alto cargo executivo requer uma equipe. Mas é nesse ponto que a retórica se distancia inteiramente da realidade, e que nós praticamos o mais radical culto à personalidade dos executivos-chefes super-homens: Bill Gates, Jack Welch, Louis Gerstner. Mas como essas pessoas foram escolhidas, quem vai suceder-lhes - e por meio de que processo? Quais são as salvaguardas que garantem que o sucessor será a melhor pessoa para ocupar aquele cargo? As pessoas dão pouca atenção ao processo sucessório, mas é ele, na verdade, o teste final da boa administração. Com relação a esse ponto, uma organização não-empresarial se saiu muito melhor. A primeira tentativa consciente de lidar com o problema sucessório foi feita pelos criadores da Constituição dos Estados Unidos. Eles descobriram e colocaram no papel, pela primeira vez na história humana, como garantir uma sucessão ordenada sem os assassinatos, envenenamentos, conspirações e golpes de Estado que manchavam a história das sucessões reais. Embora eu não conheça nenhum caso de execução de rivais nas sucessões na direção de empresas, tampouco conheço qualquer sistema que garanta a sucessão bem-sucedida no mundo empresarial ou organizacional. A Constituição garantiu que sempre haveria 72 um executivo-chefe escolhido por um processo de seleção legítimo e aguardando nos bastidores, sem constituir ameaça ao presidente em exercício, como eram os príncipes herdeiros do passado. O vicepresidente que sucede a um presidente que morre no exercício do cargo pode ou não ser a melhor pessoa para ocupar o cargo. Mas sua legitimidade e autoridade nunca são postas em dúvida. 4. O único jeito certo? Em seu livro O Lado Humano da Empresa (1960), Douglas McGregor afirmou que as direções das empresas têm de optar entre duas, e apenas duas, maneiras diferentes de administrar pessoas: a "teoria X" e a "teoria Y". A primeira parte da premissa de que as pessoas não querem trabalhar - logo, precisam ser coagidas e controladas. A segunda presume que elas realmente querem trabalhar e precisam apenas da motivação adequada. McGregor dizia que a teoria Y é a única válida. Eu havia dito mais ou menos a mesma coisa um pouco antes em meu livro Prática da Administração de Empresas, lançado em 1954. A visão prevalecente continua sendo a de que as pessoas realmente precisam ser administradas, quer de uma maneira, quer de outra - mas está errada. Alguns anos mais tarde, Abraham H. Maslow (19081970) mostrou em seu livro Eupsychian Management, de 1962 (reeditado em 1998 sob o título Maslow on Management), por que tanto McGregor quanto eu estávamos completamente enganados. Ele demonstrou conclusivamente que diferentes pessoas precisam ser administradas de diferentes maneiras. Eu me converti imediatamente a seu modo de pensar. As provas que Maslow apresenta para fundamentar sua visão são avassaladoras. Até agora, porém, muito poucas pessoas prestaram atenção ao que ele tem a nos dizer. Todas as outras premissas sobre pessoas em organizações e sua administração se baseiam nessa premissa fundamentalmente errônea de que existe apenas uma maneira correta de administrar pessoas. Uma dessas premissas é que as pessoas que trabalham para uma organização o fazem em tempo integral e dependem dela para seu sustento. Outra premissa é que as pessoas que trabalham para uma organização são subordinadas, das quais se espera que façam o que lhes é mandado e praticamente nada mais. Há 70 anos, quando essas premissas primeiro foram formuladas, durante e no final da Primeira Guerra Mundial, elas se aproximavam suficientemente da realidade para ser consideradas válidas. Hoje em dia, são todas insustentáveis. Uma minoria muito grande da força de trabalho - que cresce sem parar - é composta de funcionários que não trabalham em regime de período integral. Eles trabalham para firmas terceirizadas, que podem ser desde firmas de faxina até empresas de processamento de dados. As grandes montadoras de automóveis e caminhões montam veículos que, cada vez mais, são feitos de peças fabricadas por fornecedores, de modo que a maior parte do trabalho embutido em seu produto é feita por pessoas que não trabalham diretamente para elas. A mesma coisa se aplica à área dos computadores. Outros integrantes da força de trabalho da organização podem ser indivíduos que trabalham por períodos contratuais fixos; esse é freqüentemente o caso das pessoas de maior conhecimento especializado, logo, as que têm maior valor. Mesmo quando empregadas em tempo integral, cada vez menos pessoas são subordinadas, mesmo quando ocupam cargos de nível bastante baixo. Cada vez mais, são trabalhadores de conhecimento. O trabalhador de conhecimento não pode ser administrado como subordinado: é um sócio. Pode ser sócio júnior ou sênior, mas não é subordinado ou superior. 73 Essa diferença não é superficial. Depois de ultrapassar a etapa do aprendizado, o trabalhador de conhecimento precisa saber mais sobre seu trabalho do que seu chefe sabe - se não, qual seria sua utilidade? A própria definição de trabalhador de conhecimento é a de alguém que sabe mais sobre seu trabalho do que qualquer outro integrante da organização. Por exemplo, o engenheiro que faz o atendimento a um cliente não sabe mais sobre o produto do que o gerente de engenharia. Mas sabe mais sobre o cliente - e isso pode ser mais importante do que o conhecimento do produto. O meteorologista que trabalha numa base aérea ocupa um cargo muitíssimo inferior ao do comandante da base aérea. Mas sua utilidade vem do fato de ele saber infinitamente mais sobre a previsão do tempo do que o comandante sabe. Assim, um executivo não está apenas sendo cortês quando se refere a um funcionário como "sócio". Está apenas admitindo um fato real. O vice-presidente de marketing pode ter subido toda a hierarquia de vendas e saber muito sobre o assunto, mas sabe pouco sobre pesquisa de marketing, política de preços, embalagem, atendimento ao cliente, previsão de vendas. Assim, é impossível para ele dizer aos especialistas do departamento de marketing o que devem fazer. Nesse sentido, esses especialistas são sócios, não subordinados. A mesma coisa se aplica ao administrador de um hospital ou ao médico diretor do hospital com relação aos funcionários que trabalham no laboratório clínico ou na unidade de fisioterapia. Em outras palavras, o relacionamento entre eles se assemelha muito mais àquele existente entre o regente da orquestra e os músicos que tocam os diferentes instrumentos. O regente pode nem saber tocar um violino, mas o êxito de seu trabalho depende da qualidade de seus sócios, os músicos. E, assim como uma orquestra pode sabotar o mais capaz dos maestros - especialmente se ele também for o mais autocrático -, uma organização do conhecimento não terá dificuldade em sabotar até mesmo o mais capaz dos superiores, especialmente se for o mais autocrático deles. O que isso significa é que mesmo os funcionários em tempo integral precisam ser administrados como se fossem voluntários. Nesse ponto, a grande empresa típica tem muito a aprender com o Exército da Salvação ou com a Igreja Católica. A motivação dos funcionários, especialmente dos funcionários de conhecimento, é a mesma dos trabalhadores voluntários. Como é sabido, os voluntários ganham mais satisfação com seu trabalho do que os funcionários pagos, precisamente pelo fato de não receberem salário. Eles precisam sobretudo de um desafio. Precisam conhecer a missão da organização e acreditar nela. Precisam de treinamento contínuo. Precisam ver resultados. A conclusão implícita é que os funcionários precisam ser administrados como se fossem sócios - e não apenas em teoria. A definição de sociedade é que todos os sócios são iguais. Também faz parte da definição de sociedade que os sócios não podem receber ordens. Eles têm que ser persuadidos. Cada vez mais, portanto, a administração de pessoas é um trabalho de marketing. E no marketing não se começa perguntando "o que queremos?" Começa-se perguntando: "O que a outra parte quer? Quais são seus valores? Quais são suas metas? O que ela vê como sendo resultados?". E isso não é a teoria X, nem a teoria Y, nem qualquer outra teoria específica de administração de pessoas. É algo que vai além dessas teorias e que envolve o alinhamento das metas dos funcionários com as da organização e vice-versa. Nos países desenvolvidos, como os Estados Unidos, a administração de pessoas vai ganhar importância cada vez maior, na medida em que a única vantagem competitiva que esses países ainda podem esperar ter é a produtividade de seus trabalhadores de conhecimento. A produtividade do trabalhador de conhecimento ainda é baixíssima. Ela provavelmente não melhorou nos últimos 100 ou mesmo 200 74 anos - pela simples razão de que ninguém empreendeu a tarefa de tentar melhorá-la. Todo o trabalho que temos feito com a produtividade tem sido feito com o trabalhador manual. Para isso será preciso, sobretudo, mudar nossos pressupostos relativos ao que constitui administração. Não se "administram" pessoas, como se presumia anteriormente. Lideram-se pessoas. Para maximizar o desempenho delas, a solução é capitalizar sobre seus pontos fortes e seu conhecimento, e não procurar forçá-las a adequar-se a modelos previamente definidos. 5. O fim das fronteiras tecnológicas Nos primórdios da Revolução Industrial, quando a indústria têxtil foi criada a partir de antigas indústrias familiares, presumia-se - e era uma premissa totalmente válida - que a atividade tinha sua tecnologia própria e singular. A mesma coisa se aplicava à mineração de carvão e às outras indústrias que surgiram no final do século XVIII e primeira metade do século XIX. Essas tecnologias não se superpunham muito. O alemão Werner von Siemens (1816-1892) construiu uma das primeiras organizações industriais em grande escala. Para isso, baseou-se no fato de compreender seu funcionamento. Em 1869, para conquistar uma vantagem na tecnologia utilizada por sua indústria, contratou o primeiro cientista formado em universidade para inaugurar um moderno laboratório de pesquisas. Desses laboratórios de pesquisas nasceram as indústrias químicas e elétricas alemãs, que assumiram a posição de liderança mundial porque desenvolveram a melhor tecnologia. Da compreensão dessa necessidade da indústria - a pesquisa específica - nasceram todas as outras grandes empresas líderes mundiais em outras áreas não ligadas à química: automotiva, telefônica e, mais tarde, a farmacêutica e a dos computadores. Durante o século XIX e a primeira metade do século XX, era possível dar como certo que as tecnologias estranhas a uma indústria exerceriam impacto mínimo sobre aquela indústria. Quem conhecesse bem sua própria tecnologia prosperava. Não havia necessidade de técnicos siderúrgicos para se manterem atentos aos avanços na área da aeronáutica, por exemplo, ou gráfica. Essa especificidade por indústria formou a base daquele que viria a ser provavelmente o mais bemsucedido de todos os grandes laboratórios de pesquisas dos últimos 100 anos, o Bell Labs. Fundado no início da década de 20 como parte da AT&T, até o final dos anos 60 o Bell Labs produziu praticamente todos os novos conhecimentos e todas as novas tecnologias de que a indústria telefônica precisou. Mas essa atenção exclusiva a sua própria indústria acabou custando caro ao Bell Labs - e à sua empresa mãe. A maior conquista científica do Bell Labs foi o transistor. As principais utilizações do transistor estavam fora do sistema telefônico, e a direção do laboratório tinha pouco interesse ou conhecimento do que se passava fora de sua área. Resultado: a grande invenção do Bell Labs foi vendida a todos os interessados pela quantia pífia de 25 000 dólares. O fato de a Sony, a Intel e a Compaq serem grandes empresas hoje se deve em grande medida à miopia do Bell Labs, já que elas e centenas de outras empresas bem-sucedidas ganharam muito dinheiro com o transistor. O Bell Labs simplesmente não percebeu que o mundo havia mudado e que os muros tecnológicos que antes separavam as indústrias haviam caído por terra. Hoje, se você quiser sobreviver, tem de esquecer a grande sacada do velho Siemens. A premissa inicial correta hoje é que as tecnologias que provavelmente vão exercer o maior impacto sobre uma empresa e sua indústria são tecnologias externas a seu próprio campo. 75 Assim, as coisas que revolucionaram o sistema telefônico, tais como o sistema de comutadores digitais ou o cabo de fibra óptica, não saíram do Bell Labs. Saíram de tecnologias que não tinham nada a ver com telefonia. Diferentemente das tecnologias do século XIX, as tecnologias de hoje não percorrem caminhos paralelos e distintos. Elas se cruzam a toda hora. Como elas se cruzam, os muros que antes definiam as indústrias caem por terra. Antes, as empresas competiam dentro de um mesmo setor. Hoje, são setores que competem com setores. O aço compete não apenas com o alumínio, mas com o plástico produzido por companhias petrolíferas e químicas. Os computadores começaram como ferramenta de engenharia e mais tarde viraram aparelhos para armazenar dados. Hoje, são tanto parte da indústria das comunicações quanto é a AT&T. Foi só depois da Segunda Guerra Mundial que se tornou claro que as utilizações finais não estão ligadas exclusivamente a um determinado produto ou serviço. Essa tendência começou com a invasão do plástico na área antes ocupada pelo aço e pelo vidro. Acabamos por compreender que a necessidade é única, mas que o meio de satisfazê-la é diversificado. A administração de empresas que se esquecer disso não durará muito neste mundo. Até o fim dos anos 20, a notícia era basicamente monopólio do jornal, invenção do século XVIII que teve seu crescimento maior no início do século XX, com a alfabetização universal e a criação de gráficas velozes. Hoje, a necessidade de notícias é satisfeita não só por tinta impressa sobre papel, mas também pela televisão, pelo rádio e pela Internet. Embora o Wall Street Journal domine tranqüilamente o mercado de notícias comerciais e de negócios diárias em formato impresso, ninguém pode dizer que ele monopolize essa área. É bom que os administradores compreendam as implicações de tudo isso para eles. A informação não é exclusiva de nenhuma indústria ou ramo específico. Ela tampouco tem uma só finalidade, e nenhuma finalidade requer apenas um tipo específico de informação. Uma implicação disso é que os não-clientes são tão importantes quanto os clientes, quando não mais, porque são clientes potenciais. Muito poucas instituições são fornecedoras de uma parcela tão grande quanto 30% de um mercado. Em outras palavras, existem muito poucas instituições para as quais os não-clientes não representam pelo menos 70% de seu mercado potencial. E, no entanto, muito poucas instituições sabem qualquer coisa sobre os não-clientes - algumas delas nem sabem que eles existem, muito menos quem são. E um número menor ainda delas sabe por que eles não são clientes. No entanto, é com os não-clientes que as transformações sempre se iniciam. O declínio acelerado das lojas de departamentos americanas nas décadas de 70 e 80 não foi provocado pelo abandono dos clientes. Os 30% de donas de casa americanas que eram clientes permaneceram fiéis às lojas, mas o novo grupo de mulheres trabalhadoras de boa instrução que estava surgindo no país não adotou o hábito de freqüentar as lojas de departamentos. Essas mulheres não tinham tempo para isso. Como não eram clientes, as lojas de departamentos não deram atenção a elas. Mas quando elas passaram a formar a maior parte da classe média abastada, já era tarde demais para as lojas de departamentos conquistarem sua lealdade. Ao preocupar-se apenas em satisfazer a sua clientela constante, essas cadeias varejistas acabaram atendendo a uma clientela em processo de extinção. Nossa experiência mostra que o cliente nunca compra o que o fornecedor vende. O valor, para o cliente, sempre é algo fundamentalmente diferente daquilo que o fornecedor vê como valor ou qualidade. Essa máxima se aplica tanto a empresas quanto a universidades ou hospitais. Considerem-se as megaigrejas evangélicas, que crescem rapidamente nos Estados Unidos desde 1980 e que, com certeza, constituem o mais importante fenômeno social americano dos últimos 30 anos. Hoje, já existem cerca de 20 000 dessas igrejas. Enquanto as igrejas tradicionais vêm decaindo sem parar, as megaigrejas não param de crescer. Elas estão crescendo porque perguntaram "O que é valor para as 76 pessoas que não freqüentam a igreja?" e encontraram as respostas que as igrejas mais antigas haviam deixado de oferecer. Descobriram que o valor, para o consumidor de serviços de igreja, é algo muito diferente daquilo que as igrejas ofereciam tradicionalmente. O maior valor para os milhares de pessoas que hoje lotam as megaigrejas, tanto nos dias de semana quanto aos domingos, é uma experiência que, muito mais do que ritual, é espiritual. Finalmente, a administração terá de aprender que a compreensão do mercado começa pela compreensão de como os consumidores distribuem sua renda disponível - coisa que os economistas vêm dizendo há 100 anos. Quando foi lançada a televisão, no início da década de 50, o maior executivo da indústria eletrônica japonesa afirmou (num discurso feito em Nova York em 1952) que "o Japão não terá televisão por muitos, muitos anos ainda; os japoneses simplesmente não têm dinheiro para comprar televisores". Dois anos mais tarde, a penetração da TV no Japão era quase tão grande quanto nos Estados Unidos. Cinco anos depois, toda residência japonesa, por mais humilde que fosse, já contava com seu aparelho de TV. O fato de não disporem de renda extra não impediu os japoneses de comprar TVs. Para eles, não se tratava de mais um produto qualquer. Eles passaram a destinar uma parte cada vez maior de sua receita à compra de televisores, porque a TV lhes dava acesso a um mundo do qual estavam isolados havia séculos. Não era um produto, e sim todo um novo modo de vida. O aparelho de fax foi inventado nos Estados Unidos, tanto assim que até hoje todos os fabricantes de fax pagam royalties ao inventor americano original. No entanto, essa manufatura é dominada por empresas japonesas. Os fabricantes americanos perderam uma chance de faturar com o fax porque não haviam compreendido aquilo que o advento da televisão mostrou aos japoneses. Os americanos fizeram pesquisas de mercado que mostraram que as pessoas não pagariam o alto custo das máquinas de fax originais apenas para poupar dinheiro com o correio. Mas os japoneses, recordando o que acontecera com a TV, compreenderam que os consumidores mostram uma disposição quase infinita de transferir receita disponível para telecomunicações, mesmo que isso signifique economizar em outras áreas de suas vidas. Eles lançaram o aparelho de fax, e poucas coisas na história econômica do mundo tiveram uma aceitação tão rápida e universal quanto ele. A moral da história é que nem a tecnologia, nem sua utilização final constituem bases para uma política de administração. As bases desta devem ser os valores dos consumidores - no caso acima citado, o fascínio e a preferência deles pela comunicação veloz proporcionada pelo fax, em detrimento do serviço postal, mais lento. 6. O fim do comando e controle A administração, tanto na teoria quanto na prática, trata da entidade legal, do empreendimento individual, quer este seja uma empresa, um hospital, uma universidade ou uma organização assistencialista. O conceito tradicional de administração se baseia no comando e controle, e comando e controle são definidos em termos legais. O executivo-chefe de uma empresa, o bispo de uma diocese, o administrador de um hospital, todos exercem autoridade de comando e controle dentro dos limites legais de sua instituição, mas não fora dela. O presidente da General Motors pode dizer a centenas de milhares de pessoas o que fazer. Não pode dar ordens a ninguém fora da GM. Foi há quase 100 anos que pela primeira vez ficou claro que a definição legal não basta para administrar um grande empreendimento. Para conseguir rendimento máximo a um custo mínimo, a administração precisava organizar o processo econômico em toda a cadeia de produção. Precisava exercer autoridade além dos limites legais de sua própria organização. Costuma ser atribuída aos japoneses a invenção do keiretsu, o conceito de administração pelo qual os fornecedores de uma 77 empresa são ligados a seu cliente principal no que diz respeito ao planejamento, desenvolvimento de produtos, controle de custos e assim por diante. Assim, embora a direção da Toyota possa não exercer autoridade legal sobre um fornecedor de pára-choques, as duas administrações trabalham em cooperação estreita para combinar a produção, o controle de custos e as pesquisas. Na verdade, porém, o keiretsu é uma criação muito mais antiga, e americana. Ela remonta a mais ou menos 1910 e ao homem que primeiro percebeu o potencial do automóvel de virar uma grande indústria: William C. Durant (1861-1947). Foi Durant quem criou a General Motors, adquirindo montadoras menores e bem-sucedidas, como a Buick, e fundindo-as em uma única grande empresa automotiva. Alguns anos depois, Durant se deu conta de que precisava incluir os principais fornecedores em sua corporação. Ele começou a comprar e fundir com a General Motors um fabricante de acessórios após outro. Terminou, em 1920, por adquirir a Fisher Body, maior fabricante nacional de carrocerias de automóveis. Com essa aquisição, a General Motors passou a ser dona dos fabricantes de 70% dos componentes de seus automóveis - e se tornou de longe a mais integrada das grandes empresas mundiais. Durante vinte e poucos anos, a GM desfrutou de uma vantagem de custos da ordem de 30% em relação a todas as suas concorrentes, incluindo a Ford e a Chrysler. Mas o keiretsu praticado por Durant colocou os fornecedores dentro do contexto legal da GM, sua zona de comando e controle. Durant havia planejado cuidadosamente para assegurar a competitividade das fornecedoras de autopeças de propriedade da GM. Cada uma delas (com a única exceção da Fisher Body) tinha de vender 50% de sua produção para fora da GM, ou seja, para montadoras concorrentes, como a Packard, a Studebaker e a Nash. Sem contar com um mercado garantido para metade de sua produção, as divisões da GM eram obrigadas a se manter sempre atentas a seus custos e sua qualidade. Mas, depois da Segunda Guerra Mundial, muitas das montadoras concorrentes desapareceram - e, com elas, desapareceu o fator de incentivo à competitividade das divisões de autopeças pertencentes integralmente à General Motors. Além disso, com a sindicalização dos trabalhadores da indústria automotiva, em 1936-37, os altos custos trabalhistas das unidades montadoras foram impostos às divisões de autopeças da GM, colocando-as em desvantagem de custos em comparação com as fornecedoras independentes e nãosindicalizadas. Desse modo, o keiretsu criado por Durant passou de vantagem tremenda para tremendo abacaxi. O erro de Durant foi trazer suas fornecedoras/sócias para dentro de sua órbita de comando e controle. A empresa seguinte a aplicar o keiretsu - e provavelmente a mais bem-sucedida nessa área até hoje - foi a inglesa Marks & Spencer, que, a partir do início da década de 30, integrou praticamente todos seus fornecedores em seu próprio sistema de administração, mas por meio de contratos, mais do que da posse direta dessas companhias. Foi o modelo da Marks & Spencer que os japoneses copiaram na década de 60, e foi esse que deu tão certo para eles. O keiretsu, quer seja japonês, britânico ou americano, é baseado no poder. A Sears, Roebuck, a Marks & Spencer ou a Toyota possuem poder econômico enorme, avassalador. O keiretsu não é uma parceria entre iguais. Cada vez mais, porém, a cadeia econômica está juntando parceiros genuínos. Isso se aplica à parceria entre uma empresa farmacêutica e a faculdade de biologia de uma grande universidade de pesquisas. Aplica-se às joint ventures por meio das quais a indústria americana ingressou no Japão, depois da Segunda Guerra Mundial. Hoje em dia, até mesmo uma empresa minúscula pode se tornar parceira genuína de uma empresa maior, e não apenas ser dependente desta. Tome-se o caso das parcerias existentes entre empresas 78 químicas e farmacêuticas e companhias que trabalham com genética, biologia molecular ou eletrônica médica. Essas companhias que atuam na área das novas tecnologias podem ser pequenas - muitas vezes, são pequenas mesmo. Pode lhes faltar capital, mas possuem tecnologia independente e não encontram dificuldade para se colocar em pé de igualdade com o parceiro maior. Elas são as parceiras principais quando o assunto é tecnologia. Elas, e não a empresa farmacêutica ou química muito maior, podem escolher com quem se aliar. A mesma coisa se aplica em grande medida à informática e também à área financeira. Quando essas companhias formam parcerias, a maior não necessariamente traz a menor para dentro de sua área de comando e controle. O que é preciso, portanto, é uma redefinição do âmbito da administração. A administração precisa englobar o processo inteiro. Para empresas, isso significa o processo econômico inteiro. É na área da saúde nos Estados Unidos que avançamos mais na administração do processo inteiro. A Organização do Atendimento à Saúde (HMO - Health Maintenance Organization) constitui uma tentativa - uma primeira e, por enquanto, não muito bem-sucedida - de colocar o processo inteiro de atendimento à saúde sob uma administração em sistema de parcerias. Essa administração não é "dona" de médicos. Não é "dona" de hospitais ou clínicas. Mas supervisiona todos eles, enquanto elementos que integram o fornecimento de atendimento à saúde em grande escala. A mesma coisa que a HMO está fazendo na área de atendimento à saúde terá de ser feita em muitas outras áreas (incluindo, imagino, a educação), sobretudo no campo das empresas. O que tanto o keiretsu quanto a HMO nos ensinaram é que a administração do futuro terá de ser operacional, e não apenas legal, em seu âmbito de ação. 7. Tirando o nacional do multinacional Ainda se presume, de modo geral, na disciplina da administração - e quase sempre se dá como certo em sua prática - que as fronteiras nacionais ainda definem o ambiente no qual as empresas operam. Essa premissa é subjacente até mesmo para a "multinacional" tradicional. Multinacional não chega a constituir novidade. Antes da Primeira Guerra Mundial, a produção mundial de bens manufaturados e serviços financeiros era multinacional em uma parte tão grande quanto a que é hoje. Em 1913, a maior empresa de um setor, quer este fosse manufatureiro, quer financeiro, tinha uma parcela tão grande de suas vendas feitas fora de seu país quanto as que obtinha vendendo dentro dele. O que mudou no mundo real, mesmo que ainda não tenha mudado nas premissas com as quais operam as administrações, é o fato de essas fronteiras nacionais terem perdido sua relevância. Examinemos a multinacional mais antiga. Na medida em que produzia fora de suas próprias fronteiras nacionais, ela produzia dentro das fronteiras nacionais de outro país. Simplesmente possuía uma empresa em outro país. Por exemplo, a maior fornecedora de material de guerra para o Exército italiano durante a Primeira Guerra Mundial foi uma companhia jovem e em rápida ascensão chamada Fiat, de Turim. A Fiat produzia os automóveis e caminhões de que o Exército italiano precisava. A maior fornecedora de material de guerra do Exército austro-húngaro na Primeira Guerra Mundial também era uma companhia chamada Fiat - em Viena. Ela fornecia todos os automóveis e caminhões usados pelo Exército austro-húngaro. Subsidiária de propriedade integral da empresa italiana, a Fiat austríaca era uma réplica da Fiat italiana, embora fosse várias vezes maior do que esta. Seus projetos vinham de Turim. Tudo o mais era fabricado ou comprado na Áustria. Todos os produtos eram vendidos na 79 Áustria. E todos os funcionários, incluindo o executivo-chefe, eram austríacos. Quando a Áustria e a Itália se tornaram inimigas na Primeira Guerra Mundial, tudo o que a Fiat austríaca precisou fazer foi mudar sua conta bancária. Excetuando isso, continuou funcionando como sempre funcionara. Era, na verdade, uma empresa separada. Hoje em dia, as multinacionais já não são organizadas dessa maneira. Até pouco tempo atrás, as duas subsidiárias européias da General Motors, a Opel, na Alemanha, e a Vauxhall, no Reino Unido, eram empresas separadas. Hoje, a GM tem uma companhia européia que desenha, produz e vende em toda a Europa e também é dirigida a partir de uma sede européia. A GM Europa também produz na América do Sul e na Ásia - e vende nos Estados Unidos. A GM Estados Unidos, por sua vez, desenha e fabrica cada vez mais produtos para a GM Europa, a GM Brasil, e assim por diante. Os motores podem ser produzidos em um país, as carrocerias em outro, a parte eletrônica num terceiro. Hoje, não apenas a empresa mas também os próprios carros são multinacionais. As seguradoras mundiais - a maior de todas elas hoje é a alemã Allianz - estão, cada vez mais, transferindo suas principais atividades, tais como o atendimento de pedidos de pagamento e, sobretudo, os investimentos, para instalações centrais que fazem o trabalho para todas as companhias do grupo, onde quer que estas se localizem. Cada vez mais, as indústrias posteriores à Segunda Guerra Mundial, tais como a farmacêutica e a de informática, nem sequer são organizadas em unidades nacionais e internacionais, como a GM e a Allianz ainda são. São administradas como um sistema mundial no qual cada uma das tarefas distintas pesquisa, projeto, engenharia, desenvolvimento, testes e, cada vez mais, manufatura e marketing - é organizada de maneira transnacional. É claro que essa nova realidade causa sérios problemas. Qual é a nacionalidade de uma transnacional? Isso está se tornando, cada vez mais, um problema também para algumas universidades, já que muitas delas, especialmente as americanas, formam parcerias com universidades européias ou asiáticas, ou abrem filiais nesses continentes. As universidades européias e asiáticas (especialmente japonesas), por sua vez, abrem filiais nos Estados Unidos ou formam parcerias com universidades americanas para trabalhar em conjunto em uma série de campos. Existem problemas novos e muito reais relativos a investimentos, impostos e propriedade. Em caso de guerra, essas questões criariam problemas tremendos relacionados ao tratamento de instituições estrangeiras. O que você faria se seu laboratório de pesquisa estivesse em um lado na guerra e a fábrica que produz aquela linha de produtos estivesse do outro? Também para a administração, as novas realidades criam problemas que ainda não foram resolvidos. Cada vez mais, as empresas - e não apenas as grandes - se organizam por áreas de trabalho, mais do que geograficamente. Quais são os relacionamentos entre essas diferentes unidades? Como elas trabalham em conjunto? Qual é a jurisdição de cada uma? Quem resolve os conflitos entre elas? São, todas, perguntas para as quais ainda não temos respostas satisfatórias. Mas sabemos qual é a nova realidade: a administração já não se pauta por fronteiras nacionais. O âmbito da administração não pode mais ser definido politicamente. As fronteiras nacionais vão continuar sendo importantes, mas como limites impostos à prática da administração, não como fatores que definem essa prática. 8. Colocando o mundo dentro da organização Todas as premissas tradicionais que examinei aqui se baseiam numa premissa ainda maior: a de que a área de atuação da administração é dentro da empresa; que o principal trabalho da administração é gerir a organização. 80 Hoje em dia isso tampouco é verdade. Essa premissa leva a uma distinção entre administração e espírito empreendedor, quando este sem aquela seria incompreensível. Ela traça uma distinção artificial entre as funções de administração e inovação. Essa divisão não faz sentido nenhum. Um empreendimento que não inova, quer se trate de uma empresa ou de qualquer outra instituição, não sobrevive por muito tempo. Isso se aplica até mesmo à mais antiga instituição do mundo, a Igreja Católica Romana. Ela é vista como a mais conservadora, e se orgulha de não ser dada a mudanças rápidas. Mas também ela já inovou com freqüência e mudou para acompanhar as transformações do mundo. Ela gerou os beneditinos, no século V, quando os bárbaros invadiram o Império Romano; os franciscanos e dominicanos, sete séculos mais tarde, quando as cidades ressurgiram na Idade Média; os jesuítas no século XVI, como resposta à Reforma protestante, e assim por diante. A implicação disso tudo para a administração é muito clara: as forças que exercem maior influência sobre as organizações vêm de fora delas, não de dentro. As novas ordens católicas surgiram não porque a organização católica precisava delas, mas porque os acontecimentos advindos na sociedade as tornaram necessárias. O movimento metodista no protestantismo explodiu quase espontaneamente em meados do século XVII, não por razões teológicas, mas como resposta à carência social das classes mais pobres na Grã-Bretanha e nos Estados Unidos. Essas religiões sobreviveram, em suma, porque inovaram em reação às transformações sociais. Deveria ter sido óbvio desde o início que administração e espírito inovador constituem apenas duas dimensões diferentes da mesma tarefa. Um empresário inovador que não aprender a administrar não vai durar muito tempo. Uma administração que não aprender a inovar, tampouco. Toda instituição - e não apenas as empresas - precisa embutir em sua administração cotidiana quatro atividades empreendedoras que percorrem caminhos paralelos: O abandono organizado de produtos, serviços, processos, mercados, canais de distribuição e assim por diante que não mais constituam uma alocação ótima de recursos. Essa é a primeira disciplina empreendedora em qualquer situação dada. Organizar-se em vista do aperfeiçoamento sistemático e contínuo (o que os japoneses chamam de kaizen). Ter em vista a exploração sistemática e contínua, especialmente, de seus êxitos. É preciso construir um amanhã diferente, baseado num hoje já testado e comprovado. Organizar a inovação sistemática - ou seja, criar um amanhã diferente, que torne obsoletos os produtos hoje bem-sucedidos e os substitua por outros. Sublinho que essas disciplinas não são apenas desejáveis. São condições para a sobrevivência nos dias de hoje. As ferramentas que moldamos originalmente para levar o exterior para o interior foram todas penetradas pelo foco interno da administração. Transformaram-se em ferramentas usadas para capacitar a administração a ignorar o exterior. Pior ainda, são usadas para fazer a direção acreditar que pode manipular o que é exterior e direcioná-lo para as finalidades da organização. Tome-se o caso do marketing. Esse termo foi cunhado há 50 anos para enfatizar que o objetivo e os resultados de uma empresa estão inteiramente fora dela. O marketing ensina que são necessários esforços organizados para levar uma compreensão do ambiente externo - da sociedade, da economia e do cliente - para o interior da organização e para transformá-la numa base para estratégia e políticas. 81 No entanto, o marketing raramente desempenhou essa tarefa grandiosa. Em lugar disso, transformou-se numa ferramenta de apoio às vendas. Ele não começa perguntando "Quem é o cliente?", mas sim "O que queremos vender?". É direcionado a conseguir que as pessoas comprem as coisas que você quer produzir. Isso significa virar as coisas pelo avesso. Foi assim que a indústria americana perdeu o ramo dos aparelhos de fax. A pergunta deveria ser: "Como podemos produzir as coisas que os consumidores querem comprar?". A ascensão da tecnologia de informática, nas últimas décadas, veio agravar essa focalização para dentro da administração, e não abrandá-la. Até agora, é bem possível que a informática tenha prejudicado seriamente a administração, porque ela é tão boa para conseguir informações adicionais do tipo errado. Baseada no sistema de contabilidade criado há 700 anos para registrar e reportar dados internos, a informática gera mais dados sobre o lado interno. Ela praticamente não produz informações sobre qualquer coisa que acontece fora da empresa. Praticamente todas as conferências sobre informação tratam exclusivamente de como obter mais dados internos. Ainda não tive notícia de nenhuma que tenha sequer levantado a pergunta: "De que informações externas precisamos, e como podemos consegui-las?". A administração não precisa de mais informações sobre o que está acontecendo internamente. Precisa de mais informações sobre o que está acontecendo lá fora. Ninguém até agora criou uma maneira de conseguir dados externos significativos de qualquer forma sistemática. No que diz respeito às informações externas, ainda nos encontramos, em grande medida, na etapa anedótica. Podemos prever que o principal desafio da informática nos próximos 30 anos será organizar o fornecimento sistemático de informações externas significativas. 9. O papel de uma administração orientada para fora A primeira tarefa da administração é definir quais os resultados existentes no empreendimento a seus cuidados. Como pode testemunhar qualquer pessoa que já se engajou nessa questão, ela é uma das mais difíceis e polêmicas, mas também uma das mais importantes. Portanto, é função específica da administração organizar os recursos da organização visando obter resultados fora dela. Assim, o novo paradigma no qual deve se basear a administração, tanto enquanto disciplina como enquanto prática, é que a administração deve definir os resultados que espera alcançar e depois organizar os recursos da organização visando obter esses resultados. A Kyocera, empresa japonesa que se tornou líder mundial na criação e desenvolvimento de novos materiais inorgânicos, define resultados como liderança em inovações. Mas sua maior concorrente mundial, a alemã Metallgesellschaft, define resultados principalmente em termos de posição no mercado. Ambas são definições racionais, mas geram estratégias muito diferentes. O paradigma se aplica não apenas a empreendimentos comerciais (empresas), mas também a universidades, igrejas, organizações humanitárias e governos. 10. Por que a administração é importante Neste artigo eu levantei muitas questões, mas evitei, propositadamente, tentar dar respostas. Mas há um insight muito simples e óbvio subjacente nessas perguntas: que o centro de uma sociedade, de uma economia e de uma comunidade moderna não é a tecnologia, não é a informação, não é a produtividade. O centro da sociedade moderna é a instituição administrada. Hoje em dia, a instituição administrada é a maneira usada pela sociedade para conseguir que as coisas sejam feitas. E a 82 administração é a ferramenta específica, a função específica, o instrumento específico para tornar as instituições capazes de gerar resultados. Em suma: a instituição não existe simplesmente dentro da sociedade e para reagir à sociedade. Ela existe para produzir resultados dentro da sociedade e para modificá-la. © 1998, Peter Drucker. Este artigo foi publicado originalmente na revista Forbes de 5/10/98. É uma versão condensada de um capítulo do livro Management Challenges in the 21st Century, de Peter F. Drucker, a ser lançado 83 Texto 10: - Reestruturação Produtiva e Mudanças Organizacionais: Espaço para a Gestão do Conhecimento Maria Carolina de A . F. de Souza Publicado na Revista NIFE, Unisant‟anna, ano 9, n. 8, março, pp 5-15, 2002 Resumo O cenário mundial nos anos recentes foi marcado pela intensificação do processo de internacionalização do capital financeiro e globalização dos mercados (compradores e fornecedores), com significativos efeitos no âmbito das economias nacionais, localidades, setores de atividades e empresas. No cenário interno da economia brasileira os impactos foram agravados em função da abertura comercial e do quadro recessivo que marcou boa parte da década 1990/2000, aguçando a percepção dos agentes quanto aos efeitos da maior instabilidade dos mercados e incerteza das decisões. A concorrência torna-se mais intensa e, por vezes, predatória, prejudicando não só a lucratividade das empresas envolvidas como a rentabilidade estrutural dos segmentos em que disputam espaços. Nessas circunstâncias, as mudanças nas organizações tornam-se inevitáveis, abrindo espaços para novos padrões organizacionais e novas formas de gestão, o que por sua vez requer novas competências e maneiras de identificá-las e valorizá-las de forma a que se tornem funcionais aos objetivos da organização. É nos novos espaços que assim surgem que se insere o reconhecimento da importância do conhecimento acumulado nas pessoas que interagem nas organizações, e, em decorrência a busca do que vem sendo chamado de gestão do conhecimento. Introdução O cenário mundial nos anos recentes foi marcado pela intensificação do processo de internacionalização do capital financeiro e mundialização dos mercados (compradores e fornecedores), com significativos efeitos no âmbito das economias nacionais, localidades, setores de atividades e empresas. No cenário interno da economia brasileira os impactos foram agravados em função da abertura comercial e do quadro recessivo que marcou boa parte da década 1990/2000, aguçando a percepção dos agentes quanto aos efeitos da maior instabilidade dos mercados, incerteza das decisões de produção e ameaça de entrada mesmo em estruturas até então consideradas sólidas e "bem protegidas". A maior difusão de informações e a disponibilidade de ampla gama de produtos, com marcas, "qualidade" e preços bastante diversificados, aumentaram visivelmente as possibilidades de escolhas de clientes e consumidores finais, tornando-as mais diversificadas, menos previsíveis e estáveis e por isso menos manipuláveis. Clientes e consumidores tornaram-se menos fiéis a fornecedores, produtos e marcas, o que contribuiu para acentuar o grau de insegurança dos agentes no processo decisório. Com o aumento da instabilidade nos mercados e da incerteza envolvida nas decisões, a concorrência tornou-se mais intensa e, por vezes, predatória, prejudicando não só a lucratividade das empresas envolvidas, como a rentabilidade estrutural dos segmentos em que disputam espaços. Nesse quadro intensificou-se, a despeito da maior percepção da incerteza, a necessária busca de novas oportunidades, principalmente nas grandes empresas, pela maior capacidade de investimentos em pesquisa e desenvolvimento. Em um ambiente com novas exigências, com novas formas de 84 concorrência, menos estável e do qual os agentes têm menor conhecimento, deixam de ser suficientes as formas e as referências tradicionais na definição de metas e objetivos básicos de longo prazo da empresa, na adoção dos cursos de ação, na alocação dos recursos necessários para atingir as metas e objetivos de forma que a empresa possa alcançar uma vantagem competitiva. Isso exigiu a reformulação das estratégias das empresas e da organização dos processos produtivos no interior das plantas e fora delas. Para se adaptar aos impactos do processo de reestruturação industrial, as empresas são obrigadas a rever e a reformular suas estratégias de inserção e de atuação no mercado Mudanças nas Formas de Organização A reação das empresas, em especial as de maior porte, aparece na multiplicação de programas de reestruturação visando a adequação às novas condições do ambiente concorrencial o que implica o desenvolvimento e adoção de ferramentas que permitam melhorar as previsões de forma a aumentar as possibilidades de agir antes da concorrência, visando preservar e conquistar posições no mercado. Entretanto, em um ambiente de acirrada concorrência e de intensas mudanças, (re)ações focadas na preservação ou mesmo ampliação da participação nos mercados atuais nem sempre são suficientes. Apesar da maior instabilidade, torna-se imperioso buscar e investir no novo, o que significa maior incerteza. Para tanto é necessário incluir nas rotinas empresariais o monitoramento contínuo do ambiente em que a empresa opera para perceber os sinais de mudança significativa, assim como formular e manter prontos para serem ativados planos para contingenciais. Não basta ser ágil e responder às mudanças, é tão ou mais importante desenvolver a capacidade de identificar, gerar e explorar novas oportunidades, construindo vantagens competitivas. Os novos desafios exigem a revisão das estratégias e da organização dos processos produtivos e administrativos com adoção de novas formas de gestão no interior das empresas estendendo-se para o conjunto de agentes com os quais interage (conjunto de relações). No âmbito da cadeia de interações e de interdependência dos agentes, as transformações no ambiente competitivo das empresas tiveram claros efeitos sobre as formas de organização das estruturas produtivas, renovando o conteúdo e impulsionando mudanças quantitativas e qualitativas das relações entre empresas - concorrentes, clientes e fornecedoras. Um dos principais desdobramentos foi a multiplicação de casos de grandes empresas que se tornaram grandes montadoras, concentrando-se nas atividades relacionadas ao desenvolvimento de novos projetos e design, e às operações de logística, comercialização e distribuição em torno de uma marca forte. Parte considerável da produção de peças e componentes e de serviços foi repassada para fornecedores, em muitos casos por meio de contratos de fornecimento global. Em algumas empresas, decisões mais radicais conduziram à venda de unidades de manufatura e montagem (como ilustram os diversos casos na indústria de eletroeletrônicos, informática e telecomunicações). A despeito do intenso processo de descentralização produtiva, o dinamismo do processo e a coordenação da complexa rede de inter-relações, networkings, que se forma, continuam sob o controle da grande empresa-mãe. Além disso, em paralelo às decisões de concentração nas atividades nucleares muitas dessas empresas envolveram-se em processos de fusão e diversos tipos de alianças estratégicas. Esses movimentos estratégicos, que ocorrem em um momento de acentuada restrição do mercado, integram o estágio mais recente do processo de reestruturação iniciado já na segunda década dos anos setenta e que, com diferentes desdobramentos se estende até hoje. As mudanças ao longo da cadeia de interações estenderam-se para as relações entre empresas e consumidores finais dos produtos. Afinal, são eles os avalistas da utilidade e da qualidade dos produtos e da competitividade das empresas, isto é, de seu esforço de produção e comercialização. Limites anteriormente bem delimitados ampliam-se e, 85 simultaneamente, tornam-se mais fluídos; a empresa permanece como unidade de acumulação, mas como parte integrante de um conjunto de inter-relações, como ilustra a figura a seguir. Empresa e seus inter-relacionamentos Governo Três níveis Empreendedores Inter-relações Inter-relações Inter-relações Inter-relações Inter-relações Inter-relações Inter-relações Inter-relações Inter-relações Recursos Humanos Inter-relações Inter-relações Inter-relações Inter-relações Inter-relações Inter-relações Inter-relações Inter-relações Inter-relações Empresa Comunidade Inter-relações Inter-relações Inter-relações Inter-relações Inter-relações Inter-relações Inter-relações Inter-relações Inter-relações Concorrentes Indiretos (Substitutos) Clientes e Consumidores Finais Inter-relações Inter-relações Inter-relações Inter-relações Inter-relações Inter-relações Inter-relações Inter-relações Inter-relações Fornecedores Concorrentes Atuais e Entrantes De Para Da mesma forma, tornam-se necessárias mudanças nas estruturas internas das empresas e a renovação das práticas de gestão. Com esse propósito, surgiram e multiplicaram-se, pela evidente funcionalidade, novas técnicas organizacionais abrangendo a administração e organização da produção com JIT, células de produção, tecnologias de grupo, forças-tarefa, engenharia simultânea, etc, políticas de recursos humanos com projetos de participação e integração dos recursos humanos no processo produtivo e de administração, programas de desenvolvimento, aprimoramento, qualificação da mão-deobra, etc., e, com grande ênfase, a organização da estrutura interna da empresa com redução dos níveis hierárquicos, redução das barreiras entre os níveis superiores e o chão-de-fábrica, divisão em unidades de negócios "independentes"- com objetivos específicos quanto à geração de lucros, ampliação da delegação de autoridade e descentralização de decisões - em geral sem prejuízo para os arranjos mais estáveis na esfera das decisões estratégicas, formas não convencionais de inserção na estrutura organizacional, etc. As configurações organizacionais e modelos de gestão resultantes são variados, de mudanças qualitativas mais ou menos profundas na gestão dos recursos humanos à gestão do conhecimento, e expressam as diferentes percepções quanto ao ambiente e sua tradução na formulação das estratégias. A evolução nem sempre ocorre naturalmente, particularmente no caso de estruturas rigidamente definidas e administradas, constituindo verdadeira barreira à efetivação das decisões estratégicas. No entanto, as formas resultantes das mudanças são funcionais às diretrizes das estratégias e aos objetivos das empresas - genericamente, preservar e ampliar a participação e o poder no mercado. 86 A funcionalidade desse intenso esforço de reorganização por parte das empresas explicita-se em metas como a eliminação de tempos improdutivos; redução de custos; melhoria da qualidade; aumento da flexibilidade organizacional - produtos, processos e nas relações de trabalho- escolhidos como instrumentos para alcançar o objetivo maior da empresa - taxa de retorno sobre o capital que permita a permanência continuada no mercado - ao qual estão submetidos, em maior ou menor grau, outros objetivos tácitos ou explicitamente declarados. Considerando-se esse objetivo, a própria empresa pode ser vista como um meio (um dos possíveis) para a valorização do capital, nesse caso específico via obtenção de lucro. O lucro aparece (ou não) como resultado de um conjunto de decisões estratégicas e operacionais acertadas (ou não) definidas no interior de uma estrutura - funções e inter-relações. Ou seja, a empresa pode ser vista como uma estrutura, um lugar de decisões, portanto um lugar de pessoas e suas inter-relações. 2. Recursos Humanos e Conhecimento Por meio dos produtos finais resultantes dos processos decisórios das diferentes empresas que integram um determinado segmento, são disputados os espaços no mercado, a preferência dos possuidores de poder de compra. Só com o resultado dessa disputa (concorrência) cada empresa sabe se ao final foi selecionada, isto é, se suas decisões e estratégias foram acertadas. Ora, as decisões são tomadas, a partir do eixo definido pela estratégia, por pessoas, conjunto de recursos internos que interagem na estrutura, os valores da empresa, que lhe dão identidade e aos quais cabem com diferentes graus de responsabilidade e autonomia as decisões ao longo da estrutura hierárquica. Nesse sentido, fica clara, para além dos discursos empresariais, a validade da argumentação que propõe que os recursos humanos (como os demais) devem ser valorizados como integrantes do conjunto de ativos mais relevantes para a empresa. A proposição justifica-se, pois, como afirma Penrose (1959), enfatizando a relevância das pessoas e da rede de relacionamentos, formais e informais por elas construídos, os recursos representam fontes de “economias de expansão”; vantagens especiais no processo de expansão da firma. A importância de investimentos no desenvolvimento dos recursos humanos é destacada também por Jonhson (1994) ao mostrar a mudança, ao longo do século passado dos fatores com peso no desempenho da empresa. A evolução ilustrada nas figuras a seguir (Jonhson 1994) evidencia as mudanças nos critérios para avaliar o desempenho da empresa , nos fatores (e peso a eles atribuído) considerados relevantes na determinação desse desempenho e na natureza das ações a serem desenvolvidas tendo em vista o alcance das metas. 87 Empregos, lucros, sociedade estável Excelência Competitiva Global* Desenvolver relacionamentos Simplificar o trabalho Treinar os trabalhadores e autogerência Remover restrições para eliminar variações, atrasos e excessos em todos os processos Resolução de problemas em tempo real para controlar prazos de execução, variações e satisfação dos clientes DESEMPENHO META AÇÕES INFORMAÇÕES PARA CONTROLE IMPERATIVOS Sensível e Flexível Sistema biológico para explorar oportunidades da informação TECNOLOGIA Estrutura do desempenho da empresa : economia global Fonte: JOHNSON, 1994 Em associação à maior preocupação, ou reconhecimento da funcionalidade em termos dos objetivos da empresa, com a valorização dos recursos no interior das estruturas organizacionais das empresas, o tema competências passa a ganhar realce em textos acadêmicos e em publicações voltadas para o mundo empresarial. Como conjunto de capacitações tecnológicas e comerciais da empresa, as competências de uma empresa - seu traço distintivo - permitem transformar recursos em serviços (Penrose, 1959), processo fundamental visto que enquanto recursos podem ser adquiridos, os serviços que podem ser gerados por eles dependem de fatores inerentes à empresa e sua organização, isto é de suas competências, que se identificadas e aproveitadas representam forte vantagem competitiva. Conforme ressaltado por Hamel e Prahalad (1997), competências devem ser tratadas como a raiz da competitividade da empresa, que assim pode ser vista como lugar privilegiado de desenvolvimento e de mobilização de competências e ativos específicos. A partir dessa raiz, o núcleo de competências dificilmente imitáveis que lhe atribui identidade, a empresa torna-se mais capaz de produzir diversas linhas de produtos, aumenta a mobilidade em torno desse núcleo e a agilidade de acesso, com coerência entre departamentos e objetivos, a diferentes mercados e a mudanças tendo sem grandes perdas de posições no mercado. A figura a seguir (Souza e Coelho, 2001), ilustra o lugar central das competências na estrutura da empresa. Tendo como eixo as competências, o fundamental, aquilo que diferencia uma empresa da outra, é o modo - ou estilo - pelo qual as atividades são administradas de maneira a que competências sejam traduzidas em vantagens competitivas. Para tanto, requer-se a adoção e integração de novos processos e ferramentas de gestão que favoreçam a experimentação, a aquisição de conhecimentos e sua difusão. Vale dizer, condições favoráveis para a comunicação, o aprendizado e o compartilhamento. 88 A maior atenção aos recursos humanos e seus inter-relacionamentos como fator relevante na construção das competências e no resultado final da empresa teve como natural desdobramento o foco crescente nas questões relativas à aprendizagem e ao conhecimento. Argumentos e proposições de autores precursores em pesquisas e estudos sobre esses temas, como Argyres mostraram-se atuais, foram retomados (nem sempre com os devidos créditos) e estimularam, à luz do novo cenário, novos estudos e pesquisas tanto por parte dos precursores quanto por novos estudiosos (entre outros, Senge, 1990, Argyres e Schon, 1996, Davemport e Prusak, 1998). Com o estreitamento dos períodos entre sucessivas mudanças e com o aumento da percepção quanto à incerteza em que são tomadas as decisões, o conhecimento acumulado - em grande parte de natureza tácita - e a capacidade de aprender e se adaptar a circunstâncias instáveis tornaram-se forte fator de diferenciação para seus detentores e, se devidamente valorizados, para a organização em que desenvolvem atividades. Pelas suas características, o conteúdo tácito do conhecimento específico de cada pessoa na empresa não é passível de transferência por meio de padronização dos procedimentos. Ao contrário de outros ativos tangíveis e transferíveis, os conhecimentos são intangíveis e alguns tipos não podem ser “comprados no mercado”, seu efetivo compartilhamento e sua difusão só podem ser concretizados pela vontade de quem o possui. Além disso, a acumulação de conhecimento requer tempo, fator exigido também para o compartilhamento e que de certa forma faz com que se mantenha um diferencial entre as partes envolvidas no processo. É no contexto do movimento de profundas mudanças e reestruturação associado à expansão e intensificação do uso das novas tecnologias da informação, "revolução informacional" (Lojkine, 1995) que marcou o cenário das empresas no período recente e ainda diante do desafio de equacionar as contradições objetivo/restrições internas ao compartilhamento do conhecimento, que ganha ênfase o 89 debate sobre a chamada gestão do conhecimento, em suas diversas faces, como forma de gestão organizacional. O fluxo de mudanças engloba: mudanças no ambiente mudanças nas estratégias mudanças na estrutura organizacional mudanças nas relações na empresa importância do conhecimento gestão do conhecimento. Como já mencionado, o tema não é novo, mas ganhou força no cenário atual devido ao maior conteúdo de conhecimento em processos (complexos e constantemente sujeitos a avanços tecnológicos) e produtos (cada vez mais sistemas associados a um amplo conjunto de serviços) de forma que o conhecimento tácito e as complementaridades entre atividades e empresas adquirem maior relevância, o que requer a definição de novas formas de gestão que não só levem em conta essa relevância, mas, e principalmente, que viabilizem o seu direcionamento para os objetivos da empresa. O caminho da transformação do conhecimento acumulado individualmente para um ativo estratégico da empresa, objetivo principal da gestão do conhecimento, passa pelo desenvolvimento da capacidade de cooperar internamente à empresa e externamente, no relacionamento com o conjunto de stake holders - todos aqueles de alguma forma envolvidos com a empresa. O uso intensivo de novas tecnologias de informação e comunicação pode contribuir, mas com certeza não é suficiente, haja vista o já mencionado caráter de "voluntariado" na cooperação e compartilhamento de conhecimentos. A esse respeito Leonard-Barton (1999) argumenta que o elemento chave da colaboração é a construção e manutenção de um espaço compartilhado (shared space). Não é possível criar “compreensões compartilhadas” sem um “espaço compartilhado” - espaço (ou o meio) no qual as pessoas estabelecem, utilizam e compartilham representações e modelos para as suas idéias. A autora afirma que não se trata de reunir um grupo para construir um projeto, mas antes de utilizar um projeto para constituir o grupo adequado. È o projeto que gera uma comunidade de interesse Para gerar um espaço favorável à colaboração e ao compartilhamento de conhecimentos, não basta juntar pessoas criativas; o importante é o estabelecimento de relacionamentos criativos. Nesse sentido, a tecnologia será funcional se utilizada para ampliar a necessária interação de pessoas, reconhecendo-se que valores derivados dos relacionamentos são tão importantes quanto valores individuais; o desenvolvimento de relacionamentos passa a um lugar central na gestão. Ambiente Organizacional e Gestão do Conhecimento: algumas reflexões A gestão do conhecimento deve ser mais que o processo formal e direcionado de pesquisa de informações úteis à empresa e às pessoas que nela interagem. É fundamental desenvolver formas para facilitar o acesso às informações e estimular seu compartilhamento no interior da empresa. Como já mencionado, não é algo novo; o grau de importância para o mundo dos negócios é que mudou. Esse processo não é semelhante e sequer adequado a todas as empresas, adverte Leonard-Barton (1999), mas sempre implica a criação de estoque de informação sobre as melhores práticas da empresa, a construção de redes de difusão e transferência de informação entre os diversos níveis, departamentos e atividades da empresa, criação de procedimentos formais que assegurem que o aprendizado e os conhecimentos adquiridos no desenvolvimento de um projeto sejam repassados para todos os que executam tarefas semelhantes. O compartilhamento requer um ambiente adequado de respeito e confiança, novas formas de participação e valorização do coletivo, inclusive nas avaliações e promoções. Entretanto, essas ainda não são as características mais freqüentes nos ambientes empresariais, nos quais, em muitos casos continua a predominar o trabalho fragmentado (mesmo que os trabalhadores estejam organizados em torno de células de produção), a difusão parcial e seletiva de informações, a exaltação ao trabalho em grupos, mas a avaliação individual, formas estritamente legais de participação, etc. 90 Ambiente de constrangimentos, imposições e seletividade explícita ou implícita, com constituição de "castas" de profissionais marcadas por elevadas assimetrias no tratamento restringem o compartilhamento do conhecimento. No entanto, se o conhecimento é considerado o ativo mais importante, o compartilhamento torna-se um objetivo importante visto que amplia a flexibilidade da empresa no que se refere a ajustes no quadro de funcionários. Se esse for o objetivo, o detentor de conhecimento específico resistirá a transmiti-lo, pois estará perdendo uma particular "vantagem competitiva". Ao mesmo tempo em que a capacidade de trabalhar em equipes, de se relacionar, de participar ativamente, de aprender e de compartilhar conhecimentos é considerada requisito cada vez mais fundamental do lado da empresa, a predominância de ambientes internos instáveis e não favoráveis ao aprendizado coletivo na organização induz à retenção de conhecimentos como mecanismo, mesmo que ilusório de preservação. Os gargalos no acesso às fontes de conhecimento no interior e fora da empresa limitam a capacidade de resolução de problemas e o necessário desenvolvimento de inovações, e, portanto, as condições de concorrência da empresa. Por outro lado, há que considerar que o conhecimento é dinâmico. Em um ambiente turbulento, forças podem rapidamente transformar-se em “ fraquezas ” provocando "gargalos" no fluxo de conhecimentos e perda de vantagens competitivas derivadas das competências. Comportamentos administrativos cristalizados podem retardar as necessárias mudanças nos rumos estratégicos, dificultar a adaptação às novas condições, comprometendo os resultados da empresa. Daí a importância da constante atenção e incentivo à aprendizagem e ao fluxo de novos conhecimentos, como elemento básico para o aumento e multiplicação das competências e da inovação. A respeito do caráter instável do ambiente interno que caracteriza a estrutura das organizações, no momento atual, vale a pena refletir sobre dois pontos essenciais: a natureza, ou "qualidade" do ambiente interno e o padrão de gestão. Quanto ao ambiente interno, Simon (1970) destaca a diferença relativamente ao ambiente externo, explicitando a natureza estabilizadora do primeiro, em face da incerteza e da instabilidade do segundo. O autor enfatiza, dada a incapacidade dos agentes em tratar com a incerteza, a importância da estabilidade de regras e procedimentos capazes de propiciar âncoras ao processo decisório dos agentes. A instabilidade de regras e de procedimentos internos contribuiria para aumentar ainda mais a incerteza. Não se trata de pregar o apego rígido às rotinas preestabelecidas, mas sim à estabilização mínima de regras básicas (como por exemplo, que a aprendizagem demanda tempo e que as decisões só podem ser avaliadas a partir da obtenção dos resultados) que garantam, para os agentes internos, foco, direção e, principalmente, comprometimento da alta direção. Quanto ao padrão de gestão, deve-se reconhecer-se que em boa parte dos casos, o padrão “mecânico” de organização – estruturas altamente hierarquizadas e departamentalizadas – não atende mais às necessidades, emergindo um novo padrão – o orgânico. Padrão esse que não é novo; o que é novo é a sua transformação em padrão, assentado na busca da flexibilidade, a partir da delimitação menos rígida de fronteiras entre departamentos e níveis hierárquicos. Nesse âmbito, se, de um lado, a fluidez das formas de organização se transformou num imperativo, voltado ao aumento da capacidade de percepção das mudanças no ambiente e do aumento da capacidade de resposta a elas, de outro, a coordenação e o controle permanecem como elementos centrais para imprimir coerência e direção. Esse é o desafio: mudar (ser flexível), mas com coordenação e controle, sob o risco da anarquia e da perda do sentido e direção da empresa. Aparente contradição, visto que ao mesmo tempo em que aumenta a necessidade de descentralização e da fluidez de posições, aumenta a necessidade de coordenação e controle, evidenciando a a importância do estabelecimento de estratégias. 91 Nos denominados setores tradicionais da economia, os desafios para as empresas estão associados ao inevitável desafio da incorporação das novas formas de organização – orgânicas. Para os denominados setores dinâmicos, que, de alguma forma, já adotavam padrões mais orgânicos, os desafios para as empresas são muito complexos, atrelados à necessária capacidade de inovar constantemente. Nesses setores é que são provocadas rupturas e que, numa velocidade crescente, criam-se novos desafios. . Enfim, na base das competências básicas no caminho da gestão do conhecimento, como nova ferramenta de gestão funcional aos objetivos da empresa, estão, dadas as características do atual contexto concorrencial, a aprendizagem, os conhecimentos e as experiências, dos quais uma das características mais evidentes é a cumulatividade. Pelo seu conteúdo tácito, o conhecimento só pode ser expandido no interior da empresa por vontade de seus detentores. A gestão do conhecimento tem como parte de seus objetivos a construção das condições necessárias para o reconhecimento (aceitação) no interior da estrutura empresa, como conjunto de recursos, funções e relacionamentos, da importância de compartilhar conhecimentos. A partir desse reconhecimento criam-se as bases para a a construção de uma "rede articulada de conhecimentos", por sua vez base de competências que deveriam representar fontes de agregação de valor para as pessoas, para a organização, para a sociedade. O verbo no condicional é fruto de uma reflexão estimulada pelo próprio desenvolvimento deste trabalho e que fica como desafio para a continuidade de estudos sobre o tema. Pensando-se a evolução das ferramentas de gestão do Taylorismo à Gestão do Conhecimento, do trabalho alienado ao conhecimento como vantagem competitiva (se houver disposição para o compartilhamento e não mais por imposição mais direta), permanece a marcada funcionalidade do amplo leque de ferramentas ao objetivo maior: busca de maior lucratividade pela diferenciação em suas diversa formas. Ora, os conhecimentos tácitos representam o recurso mais valioso, talvez o “ último ” sob domínio dos funcionários, em todos os níveis, de uma empresa. Se assim é, por que detentores de competências próprias e de conhecimentos tácitos compartilhariam com possíveis “ concorrentes ” no interior da empresa ? Esse é o desafio da gestão do conhecimento. Como alcançar o aceitação do compartilhamento, funcional aos objetivos da empresa, mas que pode ser visto, com legitimidade, como a perda de valiosa "arma", na luta em que se traduz a manutenção de espaços, posições e emprego, em ambientes ainda em contínua reestruturação e bastante instáveis do ponto de vista do emprego. Bibliografia ARGYRES, C.; SCHON, D.A. Organizational Learning II: Theory, Metthod, and Practice. Massachusetts: Addison-Wesley Publishing Company, 1996. DAVEMPORT, T. H.; PRUSAK, L. Conhecimento Empresarial: Como as Organizações Gerenciam o seu Capital Intelectual. Rio de Janeiro: Campus, 1998. . HAMEL, G. ; PRAHALAD, C.K. Competindo pelo Futuro. Rio de Janeiro: Campus, 1997. HAMMER, M.; CHAMPY, J. Reengenharia: Revolucionando a Empresa em Função dos Clientes, da Concorrência e das Grandes Mudanças na Gerência. Rio de Janeiro: Campus, 1994. JOHNSON, H.T. Relevância Recuperada – Empowerment– Delegando Poder Responsabilidade para Crescer. São Paulo: Pioneira, 1994. Leonard-Barton, D. Wellsprings of Knowledge. HBSP, 1999. Lojkine, J. Revolução Informacional. São Paulo: Cortez, , 1995 NONAKA, I.; TAKEUCHI, H. Criação de Conhecimento na Empresa. Rio de Janeiro : Campus, 1997. PENROSE, E. T. Teoria del Crecimiento de la Empresa. Madri: Aguilar, 1959. SENGE, P. M. A Quinta Disciplina : Arte, Teoria e Prática da Organização de Aprendizagem. São Paulo: Best Seller, 1990. SIMON, H..A. Comportamento Administrativo: Estudo dos Processos Decisórios nas Organizações Administrativas. Rio de Janeiro: FGV, 1970. 92 SOUZA, M.C.A.F., COELHO, J.M., BACIC, M. J. Os Desafios Impostos à Gestão das Pequenas Empresas no Novo Contexto Concorrencial. Anais (em CD-Rom) do VII Congreso de Instituto Internacional de Costos y II Congreso de la Asociación Española de Contabilidad Directiva. León: Universidade de León, 2001. STEWART, T. Capital Intelectual :A Nova Vantagem Competitiva das Empresas. Rio de Janeiro : Campus, 1998. 93 Texto 11: A Era da Ignorância Onde está a vida que perdemos vivendo? Onde está a sabedoria que perdemos no conhecimento? Onde está o conhecimento que perdemos na informação? T.S. Eliot (The Rock, 1934) POR FLÁVIO LOBO (Carta Capital, 06/12/2000, p.20-24) A oferta crescente de informação faz lembrar a corrida armamentista. Teorias motivacionais são sucedâneos na busca do sentido perdido do trabalho. Conhecimento agora é commodity e a tecnologia, o sentido da vida. Discípulos do consumo. Hoje, numa relação cada vez mais utilitarista, com o aprendizado as pessoas não têm tempo nem interesse em chegar à sabedoria. Escravo das máquinas. O trabalhador atual está preso a engrenagens bem mais sofisticadas. Diz a lenda que um dia, na China Medieval, um jovem subiu as montanhas ansioso por encontrar o grande mestre da espada. Quando finalmente chegou ao seu destino, o jovem perguntou ao mestre: “Mestre, se eu estudar muito, vou precisar de quanto tempo para dominar a arte da espada?” “Uns dez anos”, respondeu o mestre. “Mas mestre”, disse o jovem, “meu pai é velho e tenho que voltar para cuidar dele. Se eu me empenhar ao máximo, vou precisar de quanto tempo?” “Nesse caso, uns 30 anos”, previu o mestre. “Não estou entendendo... ou talvez eu não tenha me explicado bem”, retrucou o jovem, que, contendo sua perplexidade e uma certa irritação, dirigiu-se novamente ao mestre, tentando se explicar com clareza: “Quero dizer que estou disposto a todos os sacrifícios para aprender no menor tempo possível.” “Bem, sendo assim, acho que você vai ter que estudar e praticar durante 70 anos para dominar a arte da espada”, disse o mestre. Essa parábola, que faz parte da tradição zenbudista, ilustra uma concepção de aprendizado e de conhecimento que contrasta com as idéias e práticas que predominam hoje no dito “mundo globalizado”. Em especial no Brasil, onde as novidades ideológicas geradas nos centros do capitalismo, Estados Unidos à frente, costumam chegar envoltas numa aura quase mística. 94 QUARTA ONDA. Uma dessas novidades atende pelo nome de Era do Conhecimento – uma expressão, com ares de conceito, descendente da Revolução da Informática, da Era da Informação e da Terceira Onda do norte-americano Alvin Toffler e autores afins. Grande sucesso – em empresas, livros, cursos e palestras para executivos e profissionais up-to-date –, a expressão Era do Conhecimento é encontrável atualmente em mais de mil páginas em língua portuguesa na Internet. É indiscutível o impacto das novas tecnologias de comunicação na economia e na cultura. Geradas após um longo e intenso processo de acumulação de conhecimento científico, essas novas ferramentas têm mudado tanto, e com tal velocidade, a vida das pessoas, que é compreensível que causem perplexidade e certa fascinação. O problema surge quando a tecnologia transforma-se, de ferramenta, em personagem central de uma pretensa nova era, pautada mais pelas conveniências dos grandes agentes econômicos do que por necessidades propriamente humanas. ABRACADABRA. Hoje há um fluxo ininterrupto de inovações. Sempre sedutoramente embalados pela mídia, os lançamentos das indústrias de comunicação e informática trazem a cada dia novos desafios – grande parte dos quais totalmente inútil – para a capacidade cognitiva dos consumidores. A velocidade das transformações produz uma mistura de atordoamento, deslumbramento e medo. Um estado de espírito explorado com competência, de modo a aumentar o consumo dos novos produtos e introduzi-los em todos os setores da vida cotidiana. Expressões como Era do Conhecimento estão-se tornando códigos mágicos, espécie de abracadabra capaz de abrir caminho para todo tipo de inovação que tenha o álibi da atual mania tecnológica. Apologistas asseguram que, graças à tecnologia, o conhecimento virou uma commodity – algo que pode ser medido, armazenado, comprado e processado como grãos de soja ou dados numéricos. Uma definição que desumaniza o conhecimento a ponto de permitir que ele seja indistintamente compartilhado por cérebros ou circuitos eletrônicos. Há, no entanto, os que resistem a essa tendência. CONTRACORRENTE. O historiados Nicolau Sevcenko compara a competição entre as grandes companhias da indústria da informática com a corrida armamentista da Guerra Fria. A cada dia é anunciado um potencial maior de acesso à informação, como se isso fosse, por si só, uma vantagem qualitativa, independentemente da possibilidade de utilização desse potencial. E cada expansão da massa de informação oferecida por um competidor obriga os outros a expandi-la também. Para Sevcenko, a Internet funciona como simulacro de relações sociais: “A troca da rua e do contato direto pela tela do computador resulta numa grave perda das percepções local, ambiental, circunstancial e situacional”. O que, na propaganda, é mostrado como exagero bem-humorado, freqüentemente está próximo da realidade. Como no caso de um comercial de TV que, poucos anos atrás, vendia o guia simplificado de alguma nova versão de software. O comercial mostrava pessoas tentando usar o programa no ambiente de trabalho: a cada erro cometido, ouvia-se o irritante ruído emitido pela máquina e o funcionário, aterrorizado, era literalmente ejetado da cadeira (e do emprego). 95 OLHO DA RUA. Outro comercial, mais recente, de um telefone celular com acesso à Internet, mostra um executivo de meia-idade que perde o cargo para um jovem estagiário possuidor de tal aparelhinho milagroso. Ambas as peças publicitárias revelam o estado de espírito de medo e insegurança dos habitantes da nova era. Fala-se nas maravilhas do conhecimento, enquanto a grande maioria treme diante das mais banais exigências de treinamento técnico. Que, na realidade, para a maioria das funções, não chega a ser uma necessidade de treinamento, mas apenas de alguma prática, adquirível em poucos dias. Entretanto, no mercado de trabalho, em geral ainda se consideram essenciais os tais “conhecimentos de informática”. MEDO. A insegurança em relação ao desempenho, à manutenção do emprego e à sobrevivência está chegando a níveis sem precedentes, que espantariam nossos ancestrais que dependiam da sorte e da pontaria de cada dia para comer. E isso não apenas entre os milhões de brasileiros que de fato caminham no fio da navalha, mas, também, entre os graduados e pós-graduados que ocupam lugares privilegiados na briga de foice do mercado. Muitos dos protagonistas – ou vítimas – da Era do Conhecimento acabam transferindo seus temores para os filhos, incitados a se familiarizar com o computador cada vez mais cedo, inclusive na escola. Curioso é que a mesma ideologia que exige a presença precoce de computadores nas salas de aula, propaga a idéia de que os profissionais precisam ser cada vez mais qualificados, criativos, flexíveis, independentes. Para isso, precisariam de uma boa base cultural, sociabilidade, capacidade crítica e reflexiva – qualidades que dificilmente são adquiridas com treinamento técnico de rápida obsolescência, diante de telas luminosas. O maior risco de estreitamento do pensamento, entretanto, não reside na sedução exercida pela superfície visível da máquina, mas na lógica que a fundamenta. ENGODO. “Educação é basicamente formação, não informação”, lembra a Carta Capital o professor de Ciência da Computação Valdemar Setzer. Tomado de assalto pelo turbilhão informativo da pósmodernidade, muitos pais e educadores têm-se esquecido disso. Em entrevista publicada na revista Educação, em 1999, Setzer diz que o pior efeito da informática na infância e na adolescência é forçar o pensamento lógico-simbólico antes do tempo. “É um absurdo que se faça da educação um reflexo do que se pretende que os estudantes sejam quando se tornarem profissionais. E a idéia de que as pessoas que aprenderem a usar o computador mais cedo terão mais chances no mercado de trabalho é falsa, já que ao tentar acelerar o desenvolvimento intelectual limita-se a criatividade”, assegura Setzer. Mas será mesmo que o mercado quer profissionais criativos? PEÇAS. Hoje, a maioria dos estudantes, mesmo os dos melhores colégios e faculdades, é incapaz de fazer um comentário crítico, pessoal e razoavelmente articulado sobre um livro ou uma obra de arte. Mas quase todos usam computador, Internet e inglês de e-mail. Uma formação nesses moldes parece preparar os jovens para uma versão apenas mais sofisticada do antigo modelo do trabalhador como uma peça de engrenagem. Talvez a principal diferença entre o trabalhador de Tempos Modernos, de Chaplin, e o da dita Era do Conhecimento esteja no fato de que o homem pós-moderno é, antes de tudo, uma peça na engrenagem do consumo, não na da produção. 96 Numa análise das teorias motivacionais de gestão empresarial, o autor alemão Burkards Sievers diz que “a motivação só passou a ser um tópico quando o sentido do próprio trabalho desapareceu ou foi perdido. Como conseqüência, as teorias motivacionais têm-se transformado em sucedâneos na busca do sentido do trabalho”. A falta do sentido no trabalho revela uma ausência de sentido na vida. Nada surpreendente após a proclamação de tantas mortes: das ideologias, da política, das utopias, da história. LUTO. Há, portanto, um luto compreensível. Luto que é convivência com o vazio mal escondido sob a superfície do frenesi consumista, sobre o qual parece se ancercar a sociedade contemporânea, cuja porção afluente se banqueteia com os limitados recursos do planeta sem se incomodar com os olhos gordos e os corpos magros dos excluídos. “O consumo alienado torna-se para as massas um dever suplementar à produção alienada, um verdadeiro instrumento de busca da felicidade, um fim em si mesmo”, escreve o cientista político Gilberto Dupas em seu livro mais recente, Ética e Poder na Sociedade da Informação. Mas, afinal, como deveria ser um período histórico para merecer a designação de Era do Conhecimento? Numa tal era, supõe-se, o conhecimento seria valorizado. Haveria que se valorizar não só o conhecimento já existente, mas também a busca do conhecimento – o estudo, a experiência, a reflexão, o aprendizado. Em um período assim, as pessoas teriam tempo e seriam estimuladas para se dedicar a aprender. E, principalmente, seriam capazes de se envolver com seus objetos de estudo e teriam prazer em buscar e adquirir conhecimento. O verdadeiro prazer em aprender é, ao menos em parte, desinteressado: sente mais prazer quem tem uma vontade natural de aprender por aprender do que quem só busca o conhecimento imediatamente “útil”. Esta Era do Conhecimento, ao contrário, é marcada por uma relação cada vez mais utilitária com o conhecimento. O foco não está no conhecimento em si, mas na performance social que sua aquisição pode propiciar. Ao transformar conhecimento em commodity, a nova ordem econômica e mental faz do produto tecnológico o objeto de desejo. Assim, conhecimento estritamente utilitário, produção e consumo desenfreado compõem o círculo que faz girar compulsivamente o motor do capitalismo. Um círculo cujos múltiplos centros simbólicos são geringonças como os computadores e celulares ligados à Internet. Objetos percebidos como garantia de acesso à informação e, portanto, ao conhecimento (a confusão entre os dois é permanente), como emblemas da elite globalizada, como brinquedos sedutores, e – sendo também instrumentos de trabalho – como conexões permanentes, online, com a esfera produtiva. E como a Internet torna-se cada vez mais comercial, esses aparelhos oferecem acesso privilegiado ao consumo. O que mais se poderia desejar na Era do Conhecimento? ZAPPING. Busca do conhecimento, claro, ainda há. Tanto que as salas de aula de professores como Luiz Gonzaga Belluzzo vivem cheias. Mas o economista da Unicamp tem reparado que a maioria dos alunos anda cada vez mais seletiva em relação às informações: ficam o tempo todo separando o que interessa do que não interessa. 97 Reproduzindo a relação utilitarista com o conhecimento do Brazilian way of life, muitos estudantes têm o olhar ansioso dos que se ocupam permanentemente em discernir, mesmo antes de entender, o que deve do que não deve lhes ser útil. Na sala de aula, como na frente do TV ou do computador, os habitantes típicos da Era do Conhecimento querem “zapear” rapidamente, de programa em programa, de site em site, assunto em assunto, sem perder tempo, sem se ater muito em nada. Uma atitude coerente numa sociedade subordinada a um mercado em que o zapping também é regra. De produto em produto, de pessoa em pessoa. Tudo é descartável. “Freqüentemente os alunos me pedem para ensinar apenas uma parte – aquela que consideram útil – de uma teoria ou assunto. Aí tento explicar que, sem a compreensão do conjunto, não é possível entender uma das partes”, conta Belluzzo, com seu jeito tranqüilo, que faz lembrar o mestre chinês lá do início desta história. Notas Inteligência artificial. Na nova era tecnológica, o “conhecimento” armazenado, processado e transmitido por computador ganha mais importância que a experiência humana. E a humanidade atribuída às máquinas é subtraída do homem. Contraste. Ao contrário dos antigos egípcios, o homem de hoje, preso à aflição do “já”, não percebe o intemporal. 98 TEXTO 12: O HOMEM COMO MEDIDA. Especialista descreve dado, informação e conhecimento. Valdemar Setzer é professor titular de Ciência da Computação na USP, consultor do Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT) e da Itautec (empresa de informática do Grupo Itaú), e autor de dez livros sobre informática, Internet e sobre o uso de computadores na educação. No texto Data, Information, Knowledge and Competency, disponível em sua página na Internet (www.ime.usp.br/vwsetzer), Setzer propõe uma compreensão dos termos “dado”, “informação” e “conhecimento” bem diferente da que tem sido propagada pelos arautos da nova era tecnológica. Para Setzer, dados são abstrações formais quantificadas que podem ser armazenadas e processadas por computador. Informações são abstrações informais (não podem ser formalizadas segundo uma teoria matemática ou lógica) que representam, por meio de palavras, som ou imagem, algum significado para alguém. Informações podem ser armazenadas em computador, mas não podem ser processadas (para isso seria preciso quantificá-las, reduzindo-as a dados). O matemático explica que, enquanto dados são puramente sintáticos, informações contêm semântica. Apenas os primeiros podem ser processados no computador porque a máquina só “entende” sintaxe. Por isso, diz Setzer, “linguagem de computador” é uma expressão equivocada, uma vez que toda linguagem verdadeira inclui semântica. Na mesma linha de pensamento, conhecimento é uma abstração interna e pessoal gerada a partir da experiência. Nesse sentido, não pode ser completamente descrito, representado; caso contrário, seria apenas informação. Portanto, o conhecimento não pode ser armazenado nem, muito menos, processado por um computador. De acordo com o pensamento de Setzer – e de outros críticos das modernas teorias empresariais de conhecimento –, não faz sentido, portanto, falar de algo como “base de conhecimento” (knowledge base) no que se refere a computadores e muito menos chamar o conhecimento de commodity. A METADE PERDIDA. Ou isto ou aquilo: ou isto ou aquilo... e vivo escolhendo o dia inteiro! “Duas linhagens de pensamento sempre conviveram em nossa tradição cultural: uma baseada na lógica formal; a outra, no potencial do contraditório”, lembra o historiador Nicolau Sevcenko. Mas apenas a primeira linhagem – representada por expoentes como Aristóteles e Descartes – norteia o funcionamento do computador. A segunda vertente – à qual se filiam pensadores como Heráclito e Marx – é incompatível com a informática hoje existente. Por isso, ao utilizarem cada vez a microeletrônica como uma extensão do cérebro – principalmente quando o computador é ferramenta-chave na educação de crianças e adolescentes – as pessoas podem estar “formatando” seu pensamento segundo os padrões da máquina. Nesse caso, alerta Sevcenko, “é toda uma riquíssima dimensão da herança cultural que se perde”. “O código formal, usado pela informática, é analítico, associativo, indutivo, mas não incorpora a crítica e não permite, por exemplo, o questionamento político”, afirma o historiador. Atualmente, fala-se no surgimento de novas teorias formais que incluam a possibilidade do contraditório. E em computadores quânticos que poderão vir a ser capazes de operar a partir desses 99 códigos mais abrangentes. Por enquanto, entretanto, o que temos no fundo, por mais charmosos que sejam os programas, é o reducionismo da pura lógica binária. Um mero “ou isto ou aquilo”, como no título do belo poema de Cecília Meireles, de onde vieram os versos acima. 100 Texto 13: RUMO AO TEMPO DIGITAL O fluxo contínuo e linear dos relógios dá lugar à fragmentação e à simultaneidade dos computadores Por Guilherme Kujawski “A pressa é inimiga da perfeição.” Esse conhecido ditado, que já foi um estatuto em todos os manuais de recursos humanos, está fadado a sair de cartaz, pois os agentes do “turbocapitalismo”, crentes de sua predestinação histórica, estão impondo um outro clichê mais ajustado ao ritmo lépido da modernidade: “tempo é dinheiro” (ou no atual jargão, MMF, make money fast). O “tempo” dos novos empreendedores, no entanto, não é semelhante ao “tempo” dos antigos fordistas. Uma das provas dessa diferença pode estar na troca do sistema de trabalho de turnos – medido sistematicamente pelo relógio de ponto – por um novo sistema do tipo flex time, baseado em tabelas alternativas. Tudo leva a crer que a noção do tempo mecânico (o tempo dos relógios de pulso e das engrenagens de Berna) está começando a sair de moda, e a noção do real time – o tempo dos eventos imediatos acontecimentos simultâneos e ações sincronizadas – está ganhando cada vez mais popularidade. Incorporação “O tempo é uma construção social”, afirma a psicóloga e professora da Fundação Getúlio Vargas de São Paulo, Maria José Tonelli, que acaba de defender uma tese de doutorado intitulada Os Sentidos das Máquinas – Novas Tecnologias e a Aceleração no Cotidiano do Trabalho. “Depois de incorporar o tempo mecânico, a humanidade agora se prepara para incorporar o tempo digital”, diz a psicóloga. A antiga noção do tempo como uma sucessão de períodos indivisíveis parece estar sendo substituída rapidamente por uma idéia de tempo dos Mips (Milhões de Instruções por Segundo, a medida de capacidade dos computadores). Mas, se os avanços tecnológicos acompanham a chamada Lei de Moore (Gordon Moore, co-fundador da Intel, previu em 1965 que o poder de processamento de um chip de silício iria dobrar a cada 18 meses), a noção cotidiana da passagem de horas corre o perigo de seguir uma lei mais rígida. O tempo presente ficará exponencialmente mais concentrado e a própria idéia das etapas de crescimento e maturação deixará de fazer sentido. “Enquanto o tempo linear permite a reflexão, o tempo simultâneo digital é o tempo do reflexo”, compara Maria José. Longo Agora Nadando contra a onda da revolução da informática há um grupo de cientistas que defende com unhas e dentes a manutenção do tempo mecânico e linear. A Long Now Foundation – uma organização que reúne tecnocratas esclarecidos como Stewart Brand e Danny Hillis – propõe a criação de um relógio duradouro com a função de manter o compasso do tempo mecânico por mais dez mil anos. O programador Danny Hillis materializou o projeto ao construir uma máquina capaz de marcar com precisão a passagem do tempo até o ano 10000. Para garantir a realização da meta final sem percalços, 101 Hillis colocou um dígito a mais no mecanismo eletrônico do relógio (02000, 02001, 02002, etc.), tornando-o à prova de bugs de milênio. A meta da Long Now Foundation é convencer toda a humanidade a reabilitar os períodos de tempo mais longos, como a precessão dos equinócios (25784 anos), e ignorar os períodos mais curtos, como o intervalo entre duas férias de trabalho (um ano). Brand, que também é inventor e projetista, lembra em seu livro O Relógio do Longo Agora (Editora Rocco, 173 páginas) que os povos antigos respeitavam as gerações vindouras, preservando no tempo as vigas mestras da civilização. Moedinha A mudança da experiência temporal pode afetar processos físicos, culturais e até biológicos dos indivíduos. Se ainda não são claros os efeitos da introjeção do tempo mecânico, quanto mais do tempo simultâneo. E talvez seja prudente acreditar que a “sabedoria tecnológica”, baseada no acúmulo de informação, seja totalmente ineficiente na resolução de um problema básico da humanidade, que é criar um relacionamento responsável com o presente e o futuro. Felizmente, os efeitos colaterais da drástica mudança de padrão estão longe de ser sentidos, e o mundo pode respirar aliviado, pois ainda vai conviver muito tempo com os prazos de entrega, os milésimos de segundo das corridas de F-1 e com o estranho fato de as engrenagens perfeitas do relógio Big Ben serem ajustadas com moedas de um penny. NOTA Depois das horas. Relógio criado por grupo de cientistas marca períodos mais dilatados de tempo. 102 Texto 14: Aspectos fundamentais das noções de organização e administração Prof. Luiz Antonio T. Vasconcelos Resumo I) II) III) IV) A divisão do trabalho: Revolução Industrial e sistematização dos princípios administrativos; gênese da “Administração Científica”. A “segunda” e a “terceira” Revoluções Industriais: evolução da infraestrutura produtiva, mudanças nas formas de competição intercapitalista e impactos da chamada competitividade global sobre as estruturas e as estratégias das empresas e sobre as formas de administrá-las. Evolução da estrutura e da dinâmica organizacional das empresas: a divisão (horizontal e vertical) do trabalho como o princípio da organização da empresa; mudanças na estrutura técnica do capital; mudanças na estrutura do emprego. Inserção e dinâmica das empresas no mercado I) A divisão do trabalho: Revolução Industrial e sistematização dos princípios administrativos; gênese da “Administração Científica”. A evolução dos conceitos e práticas no campo da Gestão das Empresas está historicamente articulada à evolução das formas de produzir e organizar a produção. A análise do desenvolvimento destas formas permite visualizar os impactos das formulações teóricas sobre a proposição de técnicas e métodos de organização e controle do processo produtivo e, reciprocamente, os impactos dos resultados práticos da aplicação de tais técnicas e métodos sobre a teoria administrativa. A observação dos Quadros 1 e 2, que se seguem, permite a visão resumida dos principais marcos históricos da evolução das formas e ferramentas de gestão bem como das correspondentes formas estruturais das organizações empresariais. 103 Quadro 1 Fonte: Lojkine, Jean (94), página 32 Quadro da evolução das características das formas organizacionais do processo de produção "Mito mobilizador" que estimula e orienta os gerentes e supervisores 1. Divisão Horizontal do Trabalho 2. Divisão Vertical do Trabalho 3. Economia de Trabalho Vivo 4. Forma de controle Social 5. Tipo de regulação Econômica (relação oferta/demanda) 6. Tipo de regulação Sócio-Política Resumo Formas organizacionais do processo produtivo Taylorismo-Fordismo Niponismo 1. Parcelarização das tarefas 2. Divisão Concepção/ Execução 3. Mote: Volume crescente de produto para um mesmo efetivo de trabalhadores 4. Controle pelo alto e pelo tempo imposto (a cadeia "fordista") 5. Regulação pela oferta de massa (do produto e dos salários) 6. Direção autoritária (estatismo e burocracia). Convenções Coletivas, Estado-providência 1. Polivalência "Rigidez" 2. Polifuncionalidade 3. Mote: Diminuição do efetivo para um mesmo volume de produto 4. "Direção sob os olhos" (Ohno) e autocontrole do anterior pelo posterior 5. Regulação pela demanda diversificada 6. "Negociações contratuais descentralizadas" entre "atores autônomos". Democracia Salarial "Flexibilidade" 104 Quadro 2 Características da Base Produtiva: principais modificações recentes Fonte: Fonte: Lojkine, Jean (94) Revolução Industrial Revolução Informacional 1. Três grandes características 1.1. A especialização (com a oposição fundamental entre 1.1. Polivalência verdadeira (Polifuncionalidade) o trabalho manual e o trabalho intelectual) 1.2. A Estandartização (padronização de peças, processos, 1.2. Flexibilidade (variedade de usos possíveis das máquinas produtos, procedimentos) informacionais 1.3. A Reprodução rígida (continuidade mecânica) 1.3. Estrutura em redes descentralizadas Resumo: Encadeamento rígido e contínuo de máquinas e Resumo: Auto-regulação dos sistemas flexíveis engrenagens 2. Confronto dos dois sistemas sócio-técnicos 2.1. Forças produtivas materiais 1 (o instrumento de trabalho isolado e seu objeto) a) Máquina-operatriz, Máquina-ferramenta a) Máquina auto-regulada b) Objetivação da mão: Substituição do homem b) Objetivação das funções cerebrais abstratas, direção pela máquina regulação da máquina: Máquina-Prótese (rôbo) c) Objeto de trabalho: ferro + carvão c) Objeto de trabalho: silício, supercondutores 2.2.Forças produtivas materiais 2 (as formas produtivas materiais combinadas socialmente na unidade produtiva) a) Sistemas de máquinas automáticas especializadas a) Sistema flexível auto-regulado de máquinas polifuncionais b) Continuidade, rigidez, padronização Resumo: Princípio Mecânico Resumo: Princípio Orgânico 2.3. Forças produtivas materiais 3 (a combinação social dos meios de trabalho no espaço nacional e internacional a) Meios de circulação materiais centralizados e segregados a) Meios de circulação materiais e imateriais (informacionais) descentralizados e interativos (telemática em rede) 2.4. Forças produtivas humanas 1 (O processo de trabalho: o homem, os meios e objetos de trabalho Vigilância estrita: homem apêndice da máquina Otimização, polivalência vertical (concepção + produção) 2.5. Forças produtivas humanas 2 (Combinação social dos homens na unidade produtiva a) Divisão: trabalhadores produtivos e improdutivos, os a) Intersecção: trabalhadores produtivos e improdutivos, últimos monopolizando a concepção mesclagem e gradação de funções produtivas e improdutivas b) Oposição: Ciência e Produção b) Inter-relações: Ciência e Produção 2.6. Forças produtivas humanas 3 (Combinação social dos homens no espaço nacional e internacional a) Domínio das atividades industriais a) Cooperações Serviços-Indústria b) Papel dinâmico da indústria metalurgica b) Papel dinâmico da mecatrônica c) Divisão: Proletariado industrial e empregados de Serviços c) Cooperação: Professores, pesquisadores, assalariados de Serviços e assalariados da Indústria d) Segregação Urbana d) Integração Urbana de funções em rede É possível vislumbrar a evolução do “pensamento administrativo” a partir da análise do seu desenvolvimento histórico concreto. Isso pode feito, numa primeira aproximação, de forma simples, a partir da apresentação dos principais autores e protagonistas e suas propostas relacionadas às formas de organização do processo de produção. Isso é feito no tópico apresentado a seguir. 105 I) Algumas das principais características e fundamentos mais importantes das chamadas “Escolas” do pensamento administrativo6 i. Escola Clássica Denominação dada ao pensamento daqueles que fundaram a Ciência da Administração ou mesmo através de suas atividades puseram em prática certas técnicas e princípios que representaram grandes transformações e aumento da produtividade na indústria do final do século XIX e início do século XX. Seus nomes mais representativos foram: Henry Towne, Frederick Winslow Taylor, Henry Laurence Gantt, Henri Fayol, Frank Gilbreth dentre outros. Seguem-se as considerações mais relevantes sobre o pensamento dos seus principais autores e protagonistas A) Fayol, Henri (1841-1925) Nascido na França foi um dos mais importantes pensadores europeus da Ciência da Administração durante as primeiras décadas do século 20. Formado em engenharia e geologia, teve trinta anos de experiência como diretor geral de uma grande empresa metalúrgica e de mineração, a CommentryFourchambault-Decazeville. Embora tivesse enfrentado uma ameaça de falência ao assumir a direção, quando da sua aposentadoria a empresa apresentava uma situação muito sólida e o quadro técnico mais competente de toda a Europa. Considerava que seu sucesso devia-se menos ao administrador brilhante que era, e muito mais ao fato de que os empregados seguiam princípios muito simples que poderiam ser facilmente ensinados e aprendidos. A análise da Administração como uma questão separada da engenharia abriu caminho para a formulação de uma teoria da Administração, o que talvez tenha sido a principal contribuição de Fayol para o desenvolvimento dessa área do conhecimento humano. Embora no princípio considerasse com pouca simpatia as contribuições de Taylor, Fayol percebeu rapidamente que os dois enfoques eram complementares. A diferença é que Taylor havia começado suas análises num extremo – no torneiro mecânico no interior da fábrica – e ele no outro: no executivo em sua mesa de trabalho. No final da vida, dedicou-se a disseminar suas teorias sobre Administração inclusive aplicada a outros campos, como as organizações militares e governamentais. Suas principais publicações: Administração Industrial e Geral: Previsão, Organização, Comando, Coordenação e Controle, de 1916; A Incapacidade Administrativa do Estado: os Correios e Telégrafos, de 1921 e O Despertar do Espírito Público, 1927. B) Towne, Henry R. (1844-1924) Um dos fundadores da Ciência da Administração por ter afirmado em 1886, na comunicação “The Engineer as Economist” (O Engenheiro como Economista) feita à Asme – American Society Mechanical Engineers (Sociedade Americana de Engenheiros Mecânicos) – que a Administração deveria ser uma disciplina independente, como a engenharia: “As questões administrativas de uma fábrica tem tanta importância como as questões de engenharia”. No entanto apenas em 1907 a 6 Todas as informações e análise contidas neste tópico, foram retiradas de: a) Sandroni, Paulo & Sandroni, L. Alberto M.: Karoshi, o jogo da Qualidade - Editora Best Seller, S.Paulo, 1995; b) Sandroni, Paulo, Dicionário de Administração e Finanças - Editora Best Seller, S.Paulo, 1996 e c) Sandroni, Paulo, Novo Dicionário de Economia - Editora Best Seller, S.Paulo, 1994. 106 Asme reconheceu a atividade do management engineering, a Engenharia da Administração e até 1915 um setor influente da Asme continuava a negar veementemente a existência de uma Ciência da Administração ou mesmo que tal tema fosse pertinente às atividades Asme. Para ele, o trabalho nas fábricas era desorganizado, quase inexistindo literatura a respeito de questões administrativas ou uma associação, órgão ou meio para o intercâmbio das experiências. Towne argumentava que o remédio para essa situação não deveria ser buscado entre o que ele denominava business men (homens de negócio) nem nos seus empregados de escritório ou contadores. A superação dessa situação deveria vir daqueles cuja experiência e treinamento os credenciava a compreender tanto as questões de mecânica como de funcionamento de escritórios: os engenheiros. Sua influência e o decidido apoio ao trabalho de Taylor foram cruciais para aumentar o interesse da Asme pelas questões da Administração. Foi também pioneiro na elaboração de uma importante técnica de Administração relacionada com os salários. Em 1889 ele apresentou à Asme os resultados de um sistema de pagamentos de salários denominado gain sharing (participação nos ganhos) existente em sua própria fábrica. O sistema consistia numa forma modificada do profit sharing (participação nos lucros), tendo como base não o trabalhador individual, mas um grupo pertencente a uma divisão ou departamento e sua eficiência relativa. Essa proposta constituiu talvez uma das primeiras tentativas de melhorar o sistema tradicional de salário por peça utilizado na indústria na segundo metade do século 19. C) Taylor, Frederick Winslow (1856-1915) Engenheiro norte-americano é considerado o pai da Administração Científica (assim está no epitáfio de seu túmulo em Germantown, Filadélfia), título que tem sido aceito tanto por simpatizantes como por críticos; livros e artigos traduzidos para um grande número de línguas e desde 1938 a medalha de ouro da Comissão Internacional para a Administração Científica traz sua efígie. Beneficiou-se, no desenvolvimento de suas proposições e conceitos, de trabalhos pioneiros tanto nos EUA como na Europa, nos campos da contabilidade, engenharia, técnica de organização de escritórios, da medicina (p.ex. descoberta do processo fisiológico que provoca o cansaço), assim como de vários mecanismos que já estavam se desenvolvendo no campo do incentivo ao trabalho e melhor controle do processo de produção: p.ex. as técnicas de Towne e de Gantt. Apoiado nestes trabalhos desenvolveu o que ele próprio denominou de “Revolução Mental”. Até Taylor, a administração das empresas era vista mais como um desdobramento de algum ramo especial da manufatura: estava relacionada com os conhecimentos técnicos necessários para produzir determinados produtos na indústria. A idéia que uma pessoa deveria ser treinada e receber instrução formal para tornar-se administrador competente, ainda não havia sido legitimada. Evoluiu para uma nova concepção de administração através da elaboração gradual de técnicas que permitiram a análise e a mensuração de processos elementares. Suas primeiras ações como capataz na Midvale Steel Works (Filadélfia, EUA) visavam eliminar a prática de “restrição da produção”, adotada defensivamente pelos trabalhadores (devido a sua própria experiência como torneiro, ele sabia que ser poderia atingir um nível de produção muito maior sem grandes esforços adicionais e acreditava que o não aproveitamento dessa potencialidade resultava de ignorância de ambas as partes) 107 O estabelecimento de padrões (para tempos e movimentos do processo de trabalho) deveria ser baseado nos conceitos (vagos) de “pagamento honesto” para “um dia honesto de trabalho” que deveriam ser concretizados a partir de rigorosa e precisa determinação “científica” (via cronômetro): tais padrões alteraram não só o planejamento das tarefas como o fluxo de materiais, as ferramentas utilizadas, de forma a permitir que cada trabalhador alcançasse o padrão e fosse além. Dois princípios emergiram dessas práticas e estabeleceram os alicerces essenciais da administração (“científica”, como passou a ser chamada): 1) A divisão dos ganhos entres as partes (gerência e trabalhadores) deveria ser abandonada como a questão mais importante; ambas as partes deveriam se concentrar em formas de fazer aumentar a magnitude destes ganhos; 2) Ambas as partes deveriam abandonar seus velhos julgamentos e opiniões individuais e substituí-los pela pesquisa e o conhecimento científico rigoroso. Em suma, se os homens deviam cooperar efetivamente, todas as organizações deveriam ter: a) um objetivo comum; b) um método comum para alcançá-los. Em suma: o conjunto de teorias sobre o aumento da produtividade do trabalho fabril, que passou a ser conhecida por taylorismo, abrange um sistema de normas voltadas para o controle dos movimentos do homem e da máquina no processo de produção, incluindo propostas de pagamento pelo desempenho do operário (prêmios e remuneração extras conforme o número de peças produzidas). Sistema muito aplicado nas medidas de racionalização e controle do trabalho fabril, mas também criticado pelo movimento sindical, que o acusou de intensificar a exploração do trabalhador e de desumanizá-lo, à medida que procura automatizar seus movimentos e retirar dele qualquer controle sobre o processo de trabalho. A linguagem crua utilizada em seu livro Principles and Methods of Scientific Management (Princípios e Métodos da Administração Científica), especialmente quando relata a forma de recrutamento dos trabalhadores para a realização dos experimentos na Midvale Steel C. da Pensilvânia, deve ter contribuído para consolidar essa impressão. Entre 1898 e 1901 desenvolveu e patenteou um processo novo de corte de alta velocidade para o aço. Seus livros mais importantes são os seguintes: A piece Rate System (O Sistema de Salário por peça), de 1895; Shop Management (A Administração da Fábrica), de 1903 e Principles and Methods of Scientific Management (Princípios e Métodos da Administração Científica), de 1911. Mais tarde suas concepções foram criticadas pelos fundadores da escola de relações humanas, especialmente por George Elton Mayo. D) Gantt, Henry Laurence (1861-1919) Engenheiro, membro da Asme, foi um dos primeiros a dirigir a atenção para o ser humano dentro da indústria: “entre todos os problemas de Administração (...) o elemento humano é o mais importante”. Embora tivesse colaborado com Taylor durante vários anos, algumas de suas concepções podem ser consideradas precursoras de métodos administrativos menos autoritários que vieram a ser desenvolvidos nas décadas seguintes. É mais conhecido pela confecção do Diagrama de Gantt ou Gráfico de Gantt (que hoje espanta pela sua simplicidade mas que na época em foi criado representou um enorme passo para o avanço da administração da produção), cuja finalidade é racionalizar, coordenar e controlar as operações em qualquer âmbito onde a produção esteja se desenvolvendo. Sua primeira contribuição original foi a instituição de um sistema de salários denominado Task and Bonus (Tarefa e Bonus), de 1901 (em artigo para a Asme). Antecedeu ao sistema de salário por 108 peça de Taylor na Midvale; o sistema de Gantt garantia ao trabalhador uma remuneração determinada se ele concluísse uma tarefa num tempo estabelecido, e um pagamento extra se conseguisse ir além. Dentre os pioneiros talvez tenha sido ele quem mais enfatizou a importância da liderança natural (não imposta) como um dos principais elementos para o êxito de um empreendimento industrial: em sua comunicação de 1915 (Liderança Industrial) ele defende a tese do fator humano na indústria e afirma que o incentivo pecuniário é apenas um entre vários que exercem influência nos trabalhadores. È reconhecido como uma “influência humanizadora sobre a administração industrial e pela criação do seu gráfico”. E) Ford, Henry (1863-1947) Empresário norte americano, pioneiro da indústria automobilístico e inovador dos processos de produção com a introdução da linha de montagem na fabricação em série de automóveis. Originário de uma família de agricultores de Michigan tornou-se mecânico aos dezesseis anos trabalhando em várias oficinas em Detroit. Foi o primeiro fabricante a tornar o automóvel um produto de consumo de massa (Ford T, chamado no Brasil de Ford Bigode, vendeu entre 1908 e 1926, cerca de 15 milhões de unidades, perto de 2,2 mil carros por dia) baixando custos por meio da produção em série e incrementando as vendas pelo barateamento do produto; para enfrentar a concorrência, aperfeiçoou ainda mais a linha de montagem, adquiriu plantações de seringueira (para a produção de pneus), minas de carvão e ferro e uma frota de navios, verticalizando sua produção. Apesar disso, Ford era extremamente conservador, negando-se a rever iniciativas que tiveram êxito e a atualizar o processo de produção; não admitia especialistas em administração nem queria pessoas formadas em universidades no seu quadro de funcionários. Por muito tempo negou-se a produzir carros que não fossem da cor preta; adversário ferrenho dos sindicatos (só a partir de 1941 admitiu a sindicalização de seus empregados), adotava uma ação paternalista nas relações de trabalho: diminuiu a jornada de seus empregados e pagava cerca de vinte dólares semanais quando a média de salário das outras empresas era de 11 dólares. Os princípios mais importantes (fundamentos gerais: racionalização da produção): a) geral: uma empresa deveria dedicar-se à produção de apenas um tipo de produto; b) uma empresa, para isso, deveria adotar a verticalização produtiva, dominando não apenas as fontes de matérias primas, mas até o transporte dos produtos; c) para reduzir os custos a produção deveria ser em massa e dotada de tecnologia capaz de desenvolver ao máximo a produtividade de cada trabalhador; d) o trabalho deveria ser altamente especializado, cada operário realizando apenas um tipo de tarefa; e) para garantir a produtividade os trabalhadores deveriam ser bem remunerados e as jornadas de trabalho mais curtas. O “fordismo” difundiu-se não apenas nos EUA mas em todo o mundo e durante várias décadas prevaleceu como método de produção industrial na maior parte dos países capitalistas desenvolvidos, mantendo-se até hoje, mas com importantes modificações. Ford não se destacou por seus escritos mas sim por suas realizações práticas que tiveram grande influência, especialmente na indústria, mas por desdobramentos nos métodos de administração da produção. 109 F) Outros autores “clássicos”: Gilbreth, Frank (1868-1924) e Gilbreth, Lilian (1878-1972) ii. Escola de Relações Humanas Concepção crítica da Escola Clássica, especialmente do Taylorismo, surgida nos Estados Unidos no final dos anos 30 tendo como referencial analítico os Estudos Hawthorne realizados na fábrica da Western Electric, em Cícero (Chicago), entre o final dos anos 20 e o início dos anos 30. Tais estudos desenvolvidas com base em pesquisa realizada entre 1924 e 1927, na Western Eletric Co. localizada em Hawthorne, Chicago, em colaboração com o Conselho Nacional de Pesquisas dos EUA, cujo objetivo era determinar a relação existente entre a intensidade da iluminação dos locais de trabalho e a eficiência dos trabalhadores, medida pela produção obtida; uma das experiências consistia no seguinte: dois grupos de operários que faziam o mesmo trabalho em condições idênticas foram escolhidos para observação, sendo devidamente anotada a produção de cada grupo. Um grupo trabalhou sob iluminação variável enquanto o outro sob iluminação constante; de início, não foi possível obter resultados, pois não se conseguia isolar os efeitos de outros e inúmeros fatores. Contudo, quando foram trocadas as lâmpadas das salas onde se realizava a experiência, levando os operários a acreditar que a intensidade da iluminação havia aumentado (quando na realidade isso não havia acontecido), a resposta foi um aumento na produção. Outras experiências foram feitas e todas indicaram a preponderância do fator psicológico sobre o fisiológico. Os principais representantes desta escola foram George Elton Mayo e Fritz Roethlisberger, além de Mary Parker Follet. A) Mayo, George Elton (1880-1949) Australiano, radicado nos EUA, foi um dos iniciadores da escola de relações humanas e um dos críticos das concepções de Taylor e Fayol da escola clássica. Participou, juntamente com outros pesquisadores da Harvard, Fritz Roethlisberger e William Dickson, dos experimentos de Hawthorne, que concluíram, após inúmeras experiências de variados tipos envolvendo as condições de desenvolver determinadas tarefas produtivas: a) que as condições materiais de trabalho, embora importantes, não tinham tanta influência sobre a produção quanto os aspectos sociais, psicológicos e humanos das relações dos trabalhadores com seus empregadores (as operárias trabalharam mais apenas porque se sentiam valorizadas por receber uma atenção especial da direção da empresa – ao ser escolhidas para a pesquisa; b) em síntese: os trabalhadores se sentiam parte importante da empresa, não seres isolados, próximos apenas fisicamente uns dos outros; as relações que se desenvolviam nessas condições entre os trabalhadores provocavam sentimentos de sociabilidade, valorização e realização pessoal; de uma outra forma: tais necessidades de reconhecimento durante muito tempo insatisfeitas, estavam sendo agora atendidas através da simples realização do experimento. Essa descoberta foi tão importante que passou a ser conhecida como “efeito Hawthorne”: ao se sentir valorizado pela chefia ou pela direção da empresa um grupo mudava seu comportamento passando a trabalhar com mais eficiência do que antes. Conclusão: quando um grupo informal de trabalhadores se identificava com a administração, a produtividade tendia a aumentar. O contrário acontecia quando estes grupos se colocavam em frontal oposição aos interesses da empresa, reagindo contra os controles rígidos e o tratamento desumano dispensado pela gerência. Os Estudos Hawthorne produziram pelo menos três descobertas que constituíram um 110 desafio à escola clássica: a) o nível de produção por trabalhador é geralmente determinado por normas sociais e não pela capacidade fisiológica ou física do trabalhador individual; b) sanções e prêmios não econômicos influenciam o comportamento do trabalhador e limitam os efeitos dos incentivos econômicos; c) os trabalhadores frequentemente agem e reagem mais como membros de grupos do que como indivíduos. Mayo trabalhou no Depto. de Pesquisas Industriais em Harvard, entre 1927 e 1947 e foi quem extraiu mais conclusões teóricas dessa experiência em Hawthorne: a) a constituição de grupos informais nas fábricas era uma reação à forma pela qual a sociedade tratava os operários, com insensibilidade; b) as condições de trabalho que prevaleciam na indústria nos EUA eram de opressão e humilhação, negando a satisfação das necessidades de auto-estima e de realização sentidas por cada um; embora tal “anomia” – impotência para controlar as coisas – fosse um resultado do funcionamento global da sociedade, Mayo considerava que no trabalho industrial ela alcançava seu grau máximo; ele denominou essa concepção de “hipótese da ralé” e contra ela se insurgiu lamentando as práticas autoritárias e orientadas exclusivamente para a realização de tarefas que nela se inspiravam. Tais concepções levaram Mayo a desfechar uma crítica à escola clássica representada por Taylor e Fayol, e à “hipótese da ralé” da qual partiam, isto é concepção de que os trabalhadores se preocupavam apenas em satisfazer suas necessidades fisiológicas e de segurança, formando uma massa desorganizada e desprezível que necessitava ser dirigida com base em práticas autoritárias. Para ele a autoridade deveria estar fundamentada, não apenas no direito formal de exigência de cumprimento de normas, mas no grau em que os indivíduos consentissem em obedecer: isso implicava um sistema de atitudes cooperativas dos trabalhadores e um sistema eficiente de comunicações que deveria ser desenvolvido pela empresa e também que tais concepções poderiam ser aplicadas a qualquer forma de organização social. Suas principais obras: Os problemas humanos de uma civilização industrial, de 1933; Os Problemas sociais de uma civilização industrial, de 1945 e Notas sobre a Psicologia de Pierre Janet, de 1948. B) Roethlisberger, Fritz Professor de relações humanas da Harvard Graduate School of Business Administration, planejou e supervisionou a pesquisa dos Estudos Hawthorne, que desenvolveu junto com Mayo e Dickson, escreveu juntamente com este último o relato mais completo de tais estudos, em 1939: A administração e o trabalhador (um relato do programa de pesquisa desenvolvido na WEC, fábrica de Hawthorne, Chicago) C) Outros autores: Follet, Mary Parker (1869-1933) iii. Escola Behaviorista (deve ser vista no conjunto da área de influência da Escola de Relações Humanas). Também denominada Teoria Comportamental, a Escola Behaviorista não deve ser confundida com a concepção em psicologia do mesmo nome, embora ambas coloquem a ênfase de seus estudos no 111 comportamento humano. Do ponto de vista histórico do desenvolvimento da ciência da administração, a escola behaviorista representa um desdobramento da escola de relações humanas na medida em que a considera um avanço em relação à rigidez da escola clássica (“taylorismo”), mas não aceita a visão de que a simples satisfação do trabalhador – do ponto de vista de suas condições psicossociais – resultaria em eficiência e maior produtividade. Por outro lado, os clássicos teriam falhado ao não levar em conta a análise das decisões e os limites da racionalidade enquadrados em princípios muito rígidos de administração. Ou melhor, o comportamento racional do homens dar-se-ia apenas em relação a um conjunto de dados que caracterizaria uma situação, e não em termos abstratos, como acreditavam os representantes da escola clássica. Os representantes mais destacados desta corrente de pensamento são Herbert Simon, em cujos livros Comportamento Administrativo (1945) e Teoria das Organizações (1958), este último em co-autoria com James March, estão expostas as idéias mais importantes sobre esta concepção administrativa; destacam-se também, Chester Barnard, Chris Argyris, Douglas McGregor e Rensis Likert. A) Chester, Barnard (1886-1961) Embora tenha escrito dois livros de grande importância, um deles considerado, por alguns, uma obra-prima, Chester Barnard foi mais um executivo prático do que um acadêmico. De fato, o livro The functions of the executive (As funções do executivo), de 1938, marcou época, e o outro, Organization and management (Organização e administração) de 1942, também foi considerado uma contribuição importante para a ciência da administração. Passou quase toda sua vida de trabalho em uma só empresa, a American Telephone and Telegraph (ATT), onde começou como funcionário do departamento de estatística até tornar-se presidente da Bell Telephone Company de New Jersey. Embora não tenha participado dos estudos de Hawthorne, conviveu com Mayo e Roethlisberger e outros representantes da Escola de Relações Humanas. Iniciou a redação de sua principal obra num momento em que os resultados dos experimentos em Hawtorne começavam a ser divulgados e a entrar em rota de colisão com as concepções da Escola Clássica (Taylor, Fayol, etc.). No início, seu livro apresenta uma teoria da cooperação na organização formal; a cooperação se origina de uma necessidade individual de cumprir propósitos, em um sistema cambiante, em que vários elementos biológicos, psicológicos e sociais estão combinados. O executivo precisa ter eficácia, isto é, alcançar os objetivos da organização que dirige, e agir com eficiência, ou seja, satisfazer seus motivos individuais, na medida em que tenta realizar os objetivos de sua organização. A organização é considerada como um sistema de atividades conscientemente coordenadas, de duas ou mais pessoas. Se não houver cooperação entre elas, a organização não sobreviverá. A função do executivo – daí o título do livro – consiste em ter a capacidade de tomar decisões que dêem um significado à coordenação da atividade organizada. Para ele, a organização existiria quando fossem satisfeitas três condições: a) há pessoas capazes de se comunicar entre si; b) elas estão dispostas a contribuir com sua ação; e c) para cumprir um propósito comum. A condição (b) significa a disposição de sacrificar o controle da própria conduta em benefício da coordenação. Como isso depende de cada indivíduo que compõe o grupo, o sistema global é instável, pois depende do estado de satisfações e insatisfações das pessoas dentro de cada organização. A condição (c) significa que cada organização tem um objetivo, mas que por si só não produz cooperação, a não ser quando aceito pelos participantes do grupo. Além de seu caráter objetivo, o fim a ser alcançado por uma empresa tem um significado subjetivo para aqueles que dela participam. Uma das funções do executivo consiste em introduzir a crença na existência real do propósito comum. A continuidade de uma organização não depende apenas dessa habilidade 112 executiva em propagar, mas também da habilidade em rever e renovar o propósito. Outra função do executivo é a comunicação, que liga o propósito à disposição individual de cooperar. Com base nos resultados de alguns dos experimentos de Hawtorne, Barnard enfatiza que a comunicação não é apenas a escrita e falada, mas também aquela originada na habilidade de entender as situações e intenções não-verbalizadas. Essa capacidade é desenvolvida pela experiência e pelo treinamento. Para ilustrar essas situações e intenções não-verbalizadas é citado um exemplo: durante os Estudos de Hawthorne os pesquisadores identificaram um prática – o binging – admitida como legítima dentro dos grupos informais tanto como brincadeira como para demonstrar descontentamento ou reprovação. Qualquer comportamento que infringisse as regras (informais) estabelecidas pelo grupo ou pela fração dominante desse grupo estaria sujeito a uma sanção: um dos trabalhadores daria um soco com toda a força possível no antebraço de um companheiro; aquele que recebia o golpe não reclamava mas ficava subentendido que tinha o direito de devolver o soco em quem o havia golpeado. O objetivo aparente e singelo dessa prática era verificar quem era capaz de golpear com mais força. Porém o binging tinha também caráter punitivo e era utilizado para ameaçar e impor a vontade da fração dominante em qualquer situação que houvesse discordância na prática, especialmente quando se tratasse de ultrapassar certos limites máximos de produção estabelecidos pelos grupos por iniciativa da gerência. Outro aspecto importante das concepções de Barnard é o que relaciona a organização formal e informal. Na medida em que via se tornando eficaz, a organização informal vai se formalizando e explicitando suas atitudes e instituições. No final do seu livro, enfatiza que o trabalho do executivo consiste não tanto em organizar, mas em manter a organização em funcionamento eficaz. Isso requer certas habilidades: lealdade à organização e a seus objetivos; a flexibilidade, capacidade de adaptação, o tato, a coragem e, evidentemente, a capacidade de liderança, definida por ele como o poder que os indivíduos tem de inspirar cooperação, através da crença na compreensão comum, na possibilidade de sucesso e na satisfação dos indivíduos. B) McGregor, Douglas (1898-1964) Em seu livro mais importante, O lado humano da empresa, de 1957, examina as motivações dos dirigentes de uma empresa. O texto foi escrito a partir de uma pesquisa realizada em conjunto com Alex Bavelas, financiada pela Fundação Sloan, sobre as características gerenciais. Como professor de Administração Industrial do MIT – Massachusets Institute of Technology, McGregor foi desenvolvendo suas teses numa postura crítica às concepções tradicionais ou clássicas de Taylor e Fayol. Segundo ele, o conceito tradicional de tarefa (no campo da administração) pode se apresentar em função de três proposições. E, para evitar as complicações introduzidas por um rótulo qualquer, ele denomina esse conjunto de proposições de Teoria X. As três proposições da teoria X, são as seguintes: 1) A administração é responsável pela organização dos elementos produtivos da empresa – dinheiro, materiais, equipamentos, pessoas – para realização de seus fins econômicos; 2) Com relação às pessoas, a administração é o processo de dirigir seus esforços, motivá-las, controlar suas ações e modificar seu comportamento para atender às necessidades da organização; 3) Sem essa intervenção ativa por parte da administração, as pessoas seriam indiferentes ou mesmo hostis às necessidades da organização. Na raiz destas concepções existiriam diversas crenças menos explícitas, mas largamente difundidas sobre a natureza dos trabalhadores e que se poderiam resumir: a) O cidadão médio tem uma inerente ojeriza pelo trabalho e, se lhe for permitido, não trabalhará; b) Ao cidadão comum 113 faltariam ambições, o gosto pela responsabilidade e pela liderança; c) O cidadão comum é fundamentalmente egocêntrico e indiferente às necessidades da organização; d) Sua própria natureza o leva a resistir às modificações; e) O cidadão comum é crédulo, não muito brilhante e está sempre disposto a acreditar em charlatões e demagogos. Assim sendo, as pessoas devem ser coagidas, controladas, dirigidas e ameaçadas com punições para que realizem o esforço necessário para que uma organização atinja seus objetivos. Para McGregor, os dirigentes das empresas se baseavam em proposições e crenças como estas. Consequentemente, as estruturas, diretrizes e práticas e seus programas administrativos refletiriam essas suposições. Em contraposição à Teoria X, ele apresenta uma nova teoria da Administração que denomina de Teoria Y. Como assinala em seu livro The human side of the enterprise”...”necessitamos de uma nova teoria a respeito da tarefa de administrar pessoas, baseada em suposições mais adequadas a respeito da natureza humana e da motivação. Serei audacioso a ponto de sugerir as linhas gerais de tal teoria. Podemos chamá-la de Teoria Y”. Os elementos principais de tal teoria seriam: 1) A administração é responsável pela organização dos elementos produtivos da empresa – dinheiro, materiais, equipamentos, pessoas – para realização de seus fins econômicos; 2) As pessoas não são passivas ou resistentes por natureza às necessidades da organização. Elas tornam-se assim por sua experiência em outras organizações; 3) A motivação, o potencial de desenvolvimento e a capacidade de assumir responsabilidades e dirigir o comportamento para os objetivos da organização estão todos presentes nas pessoas. É responsabilidade da organização proporcionar condições para que as pessoas reconheçam e desenvolvam, por si próprias, tais características; 4) A tarefa essencial da administração é criar as condições orgânicas e métodos de operação mediante os quais as pessoas possam atingir melhor seus objetivos e orientar seus esforços em direção aos objetivos da organização. Em resumo, para McGregor, a utilização de esforços físicos e mentais pelas pessoas – isto atividade de trabalho – seria algo tão natural quanto aquilo que acontece num jogo ou num momento de lazer. O cidadão típico não desgosta do trabalho; o controle externo e as ameaças de punição não são as únicas formas de fazer com que as pessoas trabalhem e realizem os objetivos de uma empresa. Além disso a recompensa pelo alcance de objetivos não é apenas a ausência de punições, mas a satisfação pessoal (do ego) de cada um por ter alcançado o objetivo ou ter realizado uma tarefa difícil pois na maioria dos casos as potencialidades do trabalhador médio não estariam sendo exploradas em sua totalidade. Isto é, a capacidade de desenvolver criativamente as tarefas e a imaginação para resolver problemas organizacionais encontra-se muito mais difundida (embora amortecida) entre as pessoas do que julga a concepção clássica. Para McGregor, a administração se destacaria como um processo de criação de oportunidades, realização de potenciais, remoção de obstáculos e encorajamento ao crescimento pessoal e profissional de cada um, e consequentemente, da organização onde se inserem tais pessoas. Projetando tais concepções da teoria Y sobre a natureza dos trabalhadores para o interior das empresas, McGregor analisa as práticas e normas que é preciso modificar para que possam alcançar seus objetivos com maior facilidade e eficácia. Para ele, as relações entre a gerência de uma empresa e seus empregados são geralmente tensas porque partem das concepções da teoria X. Isto é, se a gerência nã controlar os trabalhadores e pressionálos para trabalhar, eles não trabalharão ou não o farão adequadamente. McGregor mostra-se, por exemplo, especialmente preocupado com as avaliações de desempenho. Esse método transformaria o chefe em juiz, e o resultado seria na maioria das vezes uma apreciação formal e artificial que não refletiria o real desempenho de um funcionário. Em substituição, sugere uma auto-avaliação, feita pelo próprio trabalhador e com seu superior atuando como assistente profissional, uma vez que, 114 segundo a teoria Y, a gerência deve se considerar mais como um elemento de ajuda profissional, de aconselhamento, que um fator de direção. Devidos aos excessos e exageros que posturas polarizadas desse tipo estimularam, e também a algumas concepções ingênuas que permearam tais modelos, as teses de McGregor caíram em desuso durante os anos 70. É inegável contudo, o valor que representaram e a influência que exerceram em seu tempo sobre a ciência da administração. Quando morreu, o autor estava preparando uma série de ensaios publicados postumamente (The Professional Manager – O Administrador Profissional) e esperava-se que este texto fosse uma continuação ou contivesse aprofundamentos e explicações sobre a obra anterior, o que não aconteceu. Dessa forma, algumas críticas às suas idéias, especialmente sobre o caráter utópico e lírico da teoria Y, ou sobre o maniqueísmo de suas concepções como um todo, não puderam ser respondidas – o que não diminui o valor de suas contribuições para o desenvolvimento da ciência da administração. iv. Teoria do Desenvolvimento Organizacional (tentativa de dar condições de operação para as concepções administrativas voltadas para a motivação no trabalho e a natureza do homem) Surgiu no início dos anos ‟60, graças à contribuição de vários autores que, preocupados com as idéias sobre o homem e suas organizações e o ambiente em que trabalham, em certo sentido desenvolveram e deram um desdobramento prático e operacional às concepções da escola behaviorista. A motivação central para esse tipo de abordagem decorreu das dificuldades de operacionalização das concepções das diferentes abordagens existentes até então e dos avanços representados pelas teorias de Maslow, McGregor e Herzberg, todas elas voltadas para a motivação no trabalho e a natureza do homem. A criação, a partir de 1947, das primeiras pesquisas de laboratório sobre o comportamento de grupos; o resultado mais interessante – a educação em laboratório, proporcionada pelo treinamento da sensitividade; a publicação em 1964, por Leland Bradford e psicólogos do National Training Laboratory, do livro T Group theory and laboratory methods, com os resultados de suas experiências com grupos T, e as transformações sofridas pelas empresas tanto do ponto de vista organizacional quanto da escala de produção, para o enfrentamento de um mundo cada vez mais competitivo, contribuíram para a introdução dessas novas tendências do pensamento administrativo. Em síntese, os elementos centrais dessa abordagem consistem no exame de quatro dimensões básicas, constituídas pelo ambiente, a organização, o grupo e o indivíduo, para observando a interdependência entre elas, realizar um diagnóstico da situação que permitia uma mudança, para que se possam atingir os objetivos da empresa. a. Hierarquia das necessidades de Maslow Classificação hierarquizada das necessidades humanas, desenvolvida por A.H. Maslow em 1943, nos USA, partindo do princípio de que, uma vez satisfeita uma necessidade de uma pessoa ou de um grupo, emerge imediatamente uma necessidade de nível superior (mais elevado), que se encontra logo em seguida. Dessa forma, uma vez que uma necessidade é satisfeita, ela deixa de ser motivadora das ações ou reivindicações de pessoas ou grupos. Ao contrário, se uma necessidade não é satisfeita, os indivíduos não buscam aquelas necessidades que se encontram em níveis mais elevados na hierarquia. No entanto, existiria uma certa interdependência entre os vários níveis de necessidades de tal forma 115 que, antes da satisfação total de uma necessidade determinada, já apareceria a busca da satisfação da necessidade imediatamente seguinte na hierarquia. Para Maslow, existiriam cinco níveis de necessidade humanas: 1) necessidades fisiológicas básicas, com alimento, abrigo, etc.; 2) necessidades de segurança; 3) necessidade de pertencer a um grupo; 4) auto-estima e prestígio; 5) auto-realização e sentimento de ter alcançado objetivos. b. Teoria de Herzberg Também chamada de teoria dos dois fatores, resultou de pesquisas realizadas por Frederick Herzberg nos USA, no final dos anos ‟50 e início dos ‟60, sobre a motivação no trabalho. Estas pesquisas levaram à conclusão ou a uma teoria geral de que existem dois conjuntos de fatores complementares no que se refere à realização do trabalho e à motivação dos trabalhadores: 1) conjunto formado por elementos “motivadores” ou de “satisfação”, isto é, aqueles que criam o interesse pelo trabalho e encorajam a aplicação das energias dos trabalhadores para sua execução; 2) fatores que causam “insatisfação”, também chamados de “higiene”, ou fatores de manutenção associados com o meio ou o entorno em que se realiza o trabalho. Embora esses últimos fatores não criem o interesse pelo trabalho, se alcançarem um nível aceitável, impedem a frustração e ajudam as pessoas a justificar seu empenho como por exemplo boas condições de trabalho, segurança no emprego, remuneração, etc. Ambos os tipos de fatores devem se satisfazer idealmente. A teoria destaca a dualidade da motivação: os trabalhadores atuam em relação ao conteúdo de seu trabalho de uma forma e, em relação às condições do entorno no qual o trabalho se realiza, de outra. Um trabalho interessante necessita estar associado com o bom entorno no qual ele se realiza. Inversamente, boas condições de trabalho isoladas não são suficientes mas devem estar associadas a um sentimento de que o trabalho realizado é interessante e significativo. Um dos resultados dessa teoria foi o aparecimento de muitas abordagens de enriquecimento de funções (job enrichment) para aumentar a motivação e satisfação no trabalho. v. Teoria da Contigência (Escola Contingencial) A principal concepção desta abordagem consiste em que os métodos administrativos aplicados às organizações são relativos, isto é, dependem das condições ambientais num sentido amplo, especialmente naquilo que é externo à organização. Assim, não existiriam regras administrativas absolutas para que uma organização alcançasse seus objetivos com eficácia. As condições ambientais são consideradas variáveis independentes, enquanto as técnicas administrativas são as variáveis dependentes ou, em outras palavras, estas últimas tem que se adaptar às primeiras [ y = f(x), sendo y = técnicas administrativas e x = condições ambientais ]. A Teoria da Contingência teve origem numa série de pesquisas realizadas para verificar quais as estruturas organizacionais mais eficazes para cada tipo de indústria, com o objetivo de estabelecer modelos. Para surpresa dos pesquisadores, cada tipo de organização variava de acordo com o ambiente externo, o que significa que não havia um caminho universal que conduzisse as organizações a uma situação de excelência, independentemente do ambiente em que estavam inseridas. A pesquisa mais importante entre estas foi a desenvolvida por Paul R. Lawrence e Jay W. Lorsch (As empresas e o ambiente: diferenciação e integração administrativa) 116 vi. Escola Estruturalista (v. também, teoria da Burocracia) A polarização entre as concepções da Escola Clássica e a da Escola de Relações Humanas e o fato de que ambas eram insuficientes para o enfrentamento das novas questões surgidas no campo da administração prepararam o terreno para o surgimento da concepção estruturalista. Apoiados nas concepções de Max Weber, os representantes dessas concepções desenvolveram um método analítico para compreensão da dinâmica das organizações que estuda os fenômenos com relação a uma totalidade, isto é, partindo do princípio de que o todo não é a soma de suas partes e sim algo maior do que uma simples soma ou justaposição. Nesse sentido é importante a posição que cada parte ocupa no todo, uma vez que o relacionamento entre as partes e as respectivas posições determina que o todo seja maior do que as partes. Partindo desta concepção, o Estruturalismo retoma a questão da interação dos grupos sociais no interior de uma organização e projeta esta questão para o estudo da interação do conjunto das organizações no âmbito da sociedade. Se para a Escola Clássica o que caracterizaria o homem seria o seu comportamento de “Homem Econômico” (Homo Economicus), e para a Escola de Relações Humanas o “Homem Social” para a Escola Estruturalista a característica fundamental seria o comportamento do “Homem Organizacional”, isto é, aquele que desempenha diferentes papéis em diferentes organizações. Os autores mais importantes dessa corrente de pensamento são: Amitai Etzioni, James D. Thompson, Victor A. Thompson, Peter Blau, Jean Viet e Burton R. Clarke. vii. Escola NeoClássica Também denominada Escola Operacional, Escola do Processo Administrativo ou mesmo Abordagem Universalista da Administração, esta escola se distingue pela grande ênfase colocada nos aspectos práticos da administração e pela busca de resultados. Os autores que compõem esta corrente de pensamento resgatam algumas das concepções da Escola Clássica e reagem contra a influência das concepções comportamentais na ciência da administração, especialmente no tocante à questão da importância dos aspectos objetivos, como os econômicos relacionados com a existência das organizações. As concepções da Escola Clássica como o problema da autoridade e da responsabilidade, a organização linear e funcional, a departamentalização, são retomadas e repensadas dentro de nova abordagem. As principais características desta escola seriam a ênfase na prática da administração, a retomada de alguns postulados da Escola Clássica, isto é, dos princípios gerais de administração, e uma atenção especial aos objetivos e resultados alcançados. Embora tenha como ponto de referência central a Escola Clássica, os representantes desta escola também se caracterizam pelo ecletismo na medida em que assimilam concepções da Escolas de Relações Humanas, Behaviourista, Estruturalista e da Teoria de Sistemas. Seus representantes mais destacados são: Peter Drucker, Harold Koontz, Cyril O‟Donnell, William Newman e Ernest Dale. viii. Teoria dos Sistemas Concepção desenvolvida por Ludwig von Bertalanffy, da Universidade de Alberta (Canadá), cujos primeiros escritos sobre o tema datam dos anos 20. O principal elemento desta teoria consiste na elaboração de princípios e modelos de desenvolvimento gerais (totalizadores, estruturados), seja no campo da física, da biologia ou das ciências sociais. De acordo com esta concepção, existiria uma tendência para a integração das ciências naturais ou sociais, e tal integração se daria por intermédio da teoria dos sistemas (ou Teoria Geral dos Sistemas). Essa nova formulação contribuiria para a conquista de uma teoria exata no campo das ciências sociais, o que indicaria uma tendência para a unidade da 117 ciência. No campo da administração a teoria dos sistemas trouxe elementos importantes para a explicação da dinâmica do funcionamento das empresas. Conceitos como totalidade, entropia, teleologia e finalidade, entre outros, contribuíram para uma melhor compreensão do funcionamento das empresas. ix. Outros autores e pesquisadores (em especial no século XX) A) Edwards Deming (1900-1994) Engenheiro e estatístico norte americano que introduziu os conceitos de controle de qualidade no Japão, a partir dos anos 50. Sua importância foi tão grande para o desenvolvimento da economia japonesa no pós-guerra que, em 1960, o imperador lhe conferiu a Medalha da Segunda Ordem do Tesouro Sagrado. Ainda no Japão, foi criado pela Associação Japonesa de Ciência e Engenharia (JUSE) o prêmio Deming (Deming Prize) e é distribuído anualmente para as empresas que mais se destacaram no desenvolvimento da qualidade dos seus produtos. Também nos Estados Unidos sua contribuição é reconhecida, tendo recebido premiações significativas (em 1956 a medalha Shewart de Qualidade e em 1983 o prêmio Samuel S. Wilks da Assoc. Americana de Estatística). Apesar de começado a carreira no campo específico do controle de qualidade suas contribuições vão mais além abordando outros temas de administração, especialmente os relacionados com o estilo de gerência. Em seu livro Qualidade: a revolução da administração ele estabelece os 14 princípios básicos da prática administrativa: I. Estabeleça constância de propósitos para a melhora do produto e do serviço, objetivando tornar-se competitivo e manter-se em atividade, bem como criar emprego. II. Adote a nova filosofia. Estamos numa nova era econômica. A administração ocidental deve acordar para o desafio, conscientizar-se de suas responsabilidades e assumir a liderança no processo de transformação. III. Deixe de depender de inspeção para atingir a qualidade. Elimine a necessidade de inspeção em massa, introduzindo a qualidade no produto desde seu primeiro estágio. IV. Cesse a prática de aprovar orçamentos com base no preço. Ao invés disso, minimize o custo total. Desenvolva um único fornecedor para cada ítem, num relacionamento de longo prazo fundamentado na lealdade e na confiança. V. Melhore constantemente o sistema de produção e de prestação de serviços, de modo a melhorar a qualidade e produtividade e, consequentemente, reduzir de forma sistemática os custos. VI. Institua treinamento no local de trabalho. VII. Institua liderança. O objetivo da chefia deve ser o de ajudar as pessoas e as máquinas e dispositivos a executarem um trabalho melhor. A chefia administrativa está necessitando de uma revisão geral, tanto quanto a chefia dos trabalhadores de produção. VIII. Elimine o medo, de tal forma que todos trabalhem de modo eficaz para a empresa. IX. Elimine as barreiras entre os departamentos. As pessoas engajadas em pesquisas, projetos, vendas e produção devem trabalhar em equipe, de modo a resolverem problemas de produção e utilização do produto ou serviço. 118 X. Elimine lemas, exortações e metas para a mão de obra que exijam nível zero de falhas e estabeleçam novos níveis de produtividade. Tais exortações apenas geram inimizades, visto que o grosso das causas da baixa qualidade e da baixa produtividade encontram-se no sistema, estando, portanto, fora do alcance dos trabalhadores. XI. Elimine padrões de trabalho (quotas) na linha de produção. Substitua-os pela liderança; elimine o processo de administração por cifras, objetivos numéricos. Substitua-os pela administração por processos através do exemplo de líderes. XII. Remova as barreiras que privam o operário horista de seu direito de orgulhar-se de seu desempenho. A responsabilidade dos chefes deve ser mudada de números absolutos para a qualidade; remova as barreiras que privam as pessoas da administração e da engenharia de seu direito de orgulhar-se de seu desempenho; isso significa, inter alia, a abolição da avaliação anual de desempenho ou de mérito, bem como da administração por objetivos. XIII. Institua um forte programa de educação e auto-aprimoramento. XIV. Engaje todos da empresa no processo de realizar a transformação. A transformação é de competência de todo mundo. B) Outros: Ohno, Taiichi Vice presidente da Toyota que, entre 1960 e 1970, implementou o sistema de produção Just In Time/Kanban. O Quadro apresentado na página seguinte permite visualizar de forma sintética a evolução histórica das escolas ao longo da história do capitalismo. 119 Períodos Históricos Autores, Protagonistas e Focos de estudos e trabalhos Linha do tempo: Escolas Administrativas e Principais Autores, Protagonistas e Teorias Séculos e Décadas Meados Séc. XVIII Séc. XIX Séc. XX (décadas) Séc. XXI Início Séc. XIX ' 40 ' 50 ' 60 ' 70 ' 80 ' 90 ' 00 ' 10 ' 20 ' 30 ' 40 ' 50 ' 60 ' 70 ' 80 ' 90 ' 00 I Rev. Industrial (Grande Indústria) II Rev. Industrial (en. elétrica/transporte) III Rev. Industrial (Informacional) (1) Fayol, Henri (1841-1925) Processo administrativo e papel dos gerentes Towne, Henry R. (1844-1924) Taylor, Frederick W. (1856-1915) Princípios da Administração Científica Gantt, Henry Laurence (1861-1919) Treinamento Profissionalizante Ford, Henry (1863-1947) Princípios da Produção em Massa Munsterberg, Hugo (1863-1916) Psicologia e Eficiência Industrial Gilbreth, Frank (1868-1924) Estudo de Movimentos * * * * * * * * * * * * * * * * (2) Follet, Mary Parker (1869-1933) Roethlisberger, Fritz Mayo, George Elton (1880-1949) (3) Barnard, Chester ((1886-1961) Mc Gregor, Douglas (1898-1964) Vroom, Victor - Teoria da Expectativa Herzberg, Frederick Teoria dos Dois Fatores Leland, Bradford Teoria do Desenvolvimento Organizacional Blake, W. & Mouton, J. Grid Gerencial (4) Drucker, Peter Koontz, Harold O'Donnell, Cyril Newman, William Dale, Ernest (5) Lawrence, Paul R. Lorsch, Jay W. (6) Deming, Edwards (1900-1994) Teoria / Gerenciamento da Qualidade Total Mintzberg, Henry Os papeis gerenciais Weber, Max (1864-1920) Tipo ideal (não prescritivo) de burocracia * Fonte: Sandroni, Paulo - Karoshi - O jôgo da Qualidade (Ed. Best Seller) e Dicionário de Administração e Finanças (Ed. Best Seller) * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * Legenda (das Escolas ou Abordagens) (1) Clássica ou Científica (2) Relações Humanas (3) Behaviorista (4) Clássica (5) Contingencial (6) Outras tendências Legenda dos períodos 1914-18 e 1939-45 ********************** Período provável do auge da implantação, vigência ou influência das propostas Períodos de Guerras Mundiais 120 II) A “segunda” e a “terceira” Revoluções Industriais: evolução da infraestrutura produtiva, mudanças nas formas de competição intercapitalista e impactos da chamada “competitividade global” sobre as estruturas e as estratégias das empresas (ou sobre as formas de administrar as empresas) A idéia de que as empresas devem preparar-se para concorrer no plano mundial ou, quando menos, nos mercados regionais privilegiados (os chamados blocos comerciais), tem dominado, nos últimos quinze ou vinte anos, as análises que buscam estabelecer os fundamentos para a formulação das estratégias competitivas das empresas. Vejamos, de forma breve, em primeiro lugar, uma rápida ilustração destes espaços privilegiados de comércio internacional e em seguida as principais questões estratégicas que se colocam para as empresas diante da possibilidade ou da necessidade de competir globalmente. Os principais blocos econômicos e comerciais, bem como suas características mais importantes, são apresentados a seguir7. 1) ASSOCIAÇÃO LATINO-AMERICANA DE INTEGRAÇÃO (ALADI) Criada em 12 de agosto de 1980 pelo Tratado de Montevidéu, a ALADI objetivou criar um mercado comum latino-americano, a longo prazo e de maneira gradual, mediante a concessão de preferências tarifárias e acordos regionais e de alcance parcial. A ALADI substituiu a ALALC, a antiga Associação Latino-Americana de Livre Comércio, que foi criada em 1960. A ALADI congrega uma população de 411,4 milhões de habitantes, formando um PIB de US$ 1,66 trilhão, gerando exportações no valor de US$ 235 bilhões e importações que alcançam os US$ 225 bilhões. Cuba é o mais recente país-membro da ALADI. São Países-Membros da ALADI: Argentina, Bolívia, Brasil, Chile, Colômbia, Cuba, Equador, México, Paraguai, Peru, Uruguai e Venezuela. Outras informações: http://www.aladi.org/ 2) ÁREA DE LIVRE COMÉRCIO DAS AMÉRICAS (ALCA) A Área de Livre Comércio das Américas (ALCA), uma idéia lançada pelos Estados Unidos, surge em 1994 com o objetivo de eliminar as barreiras alfandegárias entre os 34 países americanos, exceto Cuba. A ALCA tem o prazo mínimo de sete anos para sua formação, mas enfrenta oposição para sua implementação, tanto do Congresso dos Estados Unidos quanto dos demais países do Continente Americano. Se implantada, a ALCA poderá transformar-se em um dos maiores blocos comerciais do mundo, superando mesmo a União Européia. Seu Produto Interno Bruto (PIB) será da ordem de 10 trilhões de dólares (1,5 trilhão a mais que a UE), e sua população alcançará os 784 milhões de habitantes, mais do dobro da registrada na União Européia. 7 Fontes: CONGRESSO NACIONAL - COMISSÃO PARLAMENTAR -CONJUNTA DO MERCOSUL REPRESENTAÇÃO BRASILEIRA - http://www.camara.gov.br/mercosul/ e site do Banco Mundial: http://www.bancomundial.org/ 121 O governo do Presidente Bill Clinton propõe a implementação imediata de acordos parciais, com abertura total do mercado em 2005, mas enfrenta a oposição do Partido Republicano, majoritário no Congresso norte-americano, que não cede ao pedido de autorização para aplicar o instrumento conhecido como "fast track", ou seja, de negociação rápida e sem qualquer interferência do Congresso quanto à apresentação de emendas à propostas de acordos comerciais apresentados pelo Executivo. Nesse sentido, o Brasil e o Mercosul prevêem grande dificuldade na adaptação de suas economias a essa proposta de integração, preferindo dar início ao processo de negociação em 2005. São Países-Membros da ALCA: Antigua e Barbuda, Argentina, Bahamas, Barbados, Belize, Bolívia, Brasil, Canadá, Chile, Colômbia, Costa Rica, Dominica, El Salvador, Equador, Estados Unidos da América, Granada, Guatemala, Guiana, Haiti, Honduras, Jamaica, México, Nicarágua, Panamá, Paraguai, Peru, República Dominicana, Santa Lúcia, São Cristóvão e Neves, São Vicente e Granadinas, Suriname, Trinidad e Tobago, Uruguai e Venezuela. Outras informações: http://www.ftaa-alca.org/ 3) ACORDO COMERCIAL SOBRE RELAÇÕES AUSTRÁLIA E NOVA ZELÂNDIA (ANZCERTA) ECONÔMICAS ENTRE Criado em 1983, tornou-se o principal instrumento de administração das relações econômicas entre Austrália e Nova Zelândia. Foi planejado para transformar-se em um acordo entre os dois países, cujo principal objetivo é a criação de uma área de livre comércio. Entre 1983 e 1999, o ANZCERTA elevou as relações comerciais australiano-neozelandezas em mais de 400%, o que significou um volume de transações acima de 10 bilhões de dólares australianos, em 1998. Além do protocolo geral destinado a acelerar o livre comércio de mercadorias entre os dois países, o ANZCERTA destaca-se pelo seu protocolo sobre livre comércio na área de serviços, o primeiro do mundo globalizado. Vale destacar que o ANZCERTA assinou um acordo inicial com o ASEAN, em 1995, para facilitar os fluxos de comércio e de investimentos entre as duas regiões. No momento, os dois blocos estabeleceram um grupo de trabalho que estuda a possibilidade de criação de uma área de livre comércio, reunindo o ANZCERTA e o ASEAN, até 2010. O bloco reúne uma população de 22,5 milhões de habitantes, com um PIB de US$ 468,1 bilhões, um montante de exportação no valor de US$ 70,3 bilhões e importações que atingem os US$ 75,7 bilhões. São países-membros do ANZCERTA: Austrália e Nova Zelândia. Outras informações: http://www.dfat.gov.au/geo/spacific/nz/anz_cer/anz_cer.html 4) FÓRUM ECONÔMICO DA ASIA E DO PACÍFICO (APEC) Organismo intergovernamental para consulta e cooperação econômica, na verdade constitui-se em um bloco econômico para promover a abertura de mercados entre vinte países, com Hong Kong representando a China. A APEC foi oficializada em 1993 e pretende estabelecer a livre troca de mercadorias entre todos os países do grupo até 2020. 122 A APEC é, sem sombra de dúvida, um poderoso bloco econômico, pois responde por cerca de metade do PIB e 40% do comércio mundial. O bloco reúne uma população de 2.173,2 milhões de habitantes, alcançando um PIB de US$ 17,2 trilhões, exportações no valor de US$ 2,5 trilhões e importações de US$ 2,150 trilhões. São Países-Membros da APEC: Austrália, Brunei, Canadá, Indonésia, Japão, Malásia, Nova Zelândia, Filipinas, Cingapura, Coréia do Sul, Tailândia e Estados Unidos da América, desde 1989; China, Hong Kong (China), Formosa (Taiwan), desde 1991; México, Papua Nova Guiné, desde 1993; Chile, a partir de 1994; e Peru, Federação Russa e Vietnã, a partir 1998. Outras informações: http://www.apecsec.org.sg/ 5) ASSOCIAÇÃO DE NAÇÕES DO SUDESTE ASIÁTICO (ASEAN) Surgiu em 1967, liderada pela Tailândia, com o objetivo de assegurar a estabilidade política e de acelerar o processo de desenvolvimento da região. O bloco busca promover o desenvolvimento econômico, social e cultural da região através de programas cooperativos, salvaguardando a estabilidade política e econômica da região, bem como servindo como fórum de discussão das diferenças intra-regionais. Atualmente a ASEAN encontra-se empenhada em atingir uma zona de livre comércio até 2008. Hoje, o bloco representa um mercado de 510 milhões de pessoas e um PIB de US$ 750,7 bilhões, com exportações da ordem de US$ 350 bilhões e importações alcançando os US$ 346 bilhões. São Países-Membros da ASEAN: Indonésia, Malásia, Filipinas, Cingapura e Tailândia, desde 1967; Brunei, a partir de 1984; Vietnã desde 1985; Mianmar e Laos a partir de 1997 e Camboja desde 1999. Outras informações: http://www.asean.or.id/ 6) MERCADO COMUM E COMUNIDADE DO CARIBE (CARICOM) É um bloco de cooperação econômica e política, criado em 1973, formado por quatorze países e quatro territórios da região caribenha. Em 1998, Cuba foi admitida como observadora do Caricom. O bloco foi formado por ex-colônias de potências européias que, após a sua independência, viram-se na contingência de aliar-se para suprir limitações decorrentes da sua nova condição e acelerar o seu processo de desenvolvimento econômico. O Caricom tem uma população de 7,2 milhões de habitantes, um PIB de US$ 20,9 bilhões, exportações girando em torno dos US$ 7 bilhões e importações alcançando os US$ 9,8 bilhões. São Países-Membros do CARICOM: Antigua e Barbuda, Bahamas, Barbados, Belize, Dominica, Granada, Guiana, Jamaica, Montserrat, Santa Lúcia, São Cristóvão e Neves, São Vicente e Granadinas, Suriname e Trinidad e Tobago. Outras informações: http://www.caricom.org/ 7) COMUNIDADE DOS ESTADOS INDEPENDENTES (CEI) 123 Criada em 1991, a Comunidade dos Estados Independentes (CEI) constitui-se num bloco políticoeconômico que reúne 12 das 15 repúblicas que formavam a antiga União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS). Ficaram de fora apenas os três países bálticos: Lituânia, Letônia e Estônia, sendo que este último está solicitando ingresso na União Européia. A CEI, com uma população de 273,7 milhões de habitantes, está organizada em um confederação de Estados, que preserva a soberania de cada um. A Comunidade prevê a centralização de Forças Armadas e o uso de uma moeda comum: o Rublo. Seu PIB é estimado em US$ 587,8 bilhões. São Países-Membros da CEI: Armênia, Belarus, Cazaquistão, Federação Russa, Moldávia, Quirquistão, Tadjiquistão, Turcomenistão, Ucrânia, Uzbequistão, desde 1991, e Geórgia e Azerbaidjão, a partir 1993. Outras informações: http://www.rochester.r12.mn.us/kellogg/rodgers/cis/thecio.htm 8) ASSOCIAÇÃO EUROPÉIA DE LIVRE COMÉRCIO (EFTA) A EFTA foi constituída pela Convenção de Estocolmo, assinada em 04 de janeiro de 1960, tendo como primeiros parceiros Áustria, Dinamarca, Noruega, Portugal, Suécia, Suíça e Reino Unido (Inglaterra, Escócia, País de Gales e Irlanda do Norte). A EFTA surgiu como uma oposição à Comunidade Econômica Européia (CEE), pois seus EstadosMembros procuravam evitar o que consideravam pesados compromissos econômicos e institucionais, pois enquanto o Reino Unido buscava total liberdade econômica, sem maiores compromissos institucionais, a Áustria, a Suécia e a Suíça defendiam o direito à soberania política. Com o fortalecimento da Comunidade Européia, a EFTA perdeu a maioria de seus integrantes, pois Áustria, Dinamarca, Portugal, Suécia, Reino Unido e Finlândia, que entrou em 1986, aderiram ao bloco de maior magnitude. Hoje, a EFTA restringe-se à associação de apenas quatro países, a saber, Islândia, Liechtenstein, Noruega e Suíça. O grupo abriga uma população de 12 milhões de habitantes, que gera um PIB US$ 416,713 bilhões, exportações num total de US$ 126,4 bilhões e importações de US$ 113, 4 bilhões. Em 02 de maio de 1992, na cidade do Porto, Portugal, a EFTA assinou com a União Européia um acordo criando o Espaço Econômico Europeu (EEE), o qual viabilizará, não só aumento do volume de comércio com a União Européia como também a participação dos seus quatro Estados-Membros em outros programas da União Européia. São Países-Membros da EFTA: Islândia, Liechtenstein, Noruega e Suíça. Outras informações: www.efta.int 9) MERCADO COMUM CENTRO-AMERICANO (MCCA) Surgiu em 1960 na tentativa de promover a paz na região, afetada por graves conflitos bélicos. Em 4 de junho de 1961 foi assinado o Tratado de Integração Centro-Americana com o objetivo de criar um mercado comum nessa região. 124 Na mesma época foi criado o Parlamento Centro-Americano (PARLACEN) e a Corte CentroAmericana de Justiça, que ainda não possui caráter permanente. Hoje, os Estados-Membros do MCCA designaram um grupo de trabalho para preparar o processo de constituição da União Centro-Americana, nos mesmos moldes da União Européia. O bloco reúne uma população de 33,4 milhões de habitantes, possuindo um PIB de US$ 49,4 bilhões, com exportações no valor de US$ 14,3 bilhões e importações alcançando os US$ 18,1 bilhões. São Países-Membros do MCCA: Costa Rica, El Salvador, Guatemala, Honduras, Nicarágua e Panamá. Outras informações: http://www.mundolatino.org/i/politica/integrac.htm 10) MERCADO COMUM DO SUL (MERCOSUL) Criado em 26 de março de 1991, pelo Tratado de Assunção, o MERCOSUL objetiva estabelecer a livre circulação de pessoas, bens, serviços e fatores produtivos no longo prazo, quando espera-se que o maior número de economias latino-americanas estejam integradas ao bloco. No presente momento os países-membros fundadores, Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai esforçamse por adotar uma política comercial comum e pela coordenação de posições conjuntas em fóruns internacionais. Vale destacar os esforços dos países-membros em projetar a coordenação de políticas macroeconômicas e setoriais bem como as aproximações no sentido da harmonização das legislações nacionais, com vistas a agilizar o processo inicial de integração entre suas economias, estudando-se inclusive a criação de uma moeda única. Bolívia e Chile são países associados ao Mercosul e que têm participado na qualidade de observadores em quase todos os fóruns de negociação do bloco. No momento, Bolívia e Chile negociam a sua adesão como países-membros do Mercosul. Negociações com o México e Comunidade Andina estão em fase adiantada, com vistas ao seu ingresso na condição de observadores. O MERCOSUL integra uma população de 220 milhões de habitantes, movimentando um PIB de US$ 1,250 trilhão, o que gera exportações no total de US$ 85 bilhões e importações no valor de US$ 95 bilhões. São Países-Membros e Associados do MERCOSUL: Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai e, associados, Bolívia e Chile. 11) ACORDO DE LIVRE COMÉRCIO DA AMÉRICA DO NORTE – NAFTA Constitue-se em um instrumento de integração das economias dos EUA, do Canadá e do México. O NAFTA (North America Free Trade Agreement) foi iniciado em 1988, entre norte-americanos e canadenses, e por meio do Acordo de Liberalização Econômica, assinado em 1991, formalizou-se o relacionamento comercial entre os Estados Unidos e o Canadá. Em 13 de agosto de 1992, o bloco recebeu a adesão dos mexicanos. O NAFTA entrou em vigor em 1º de janeiro de 1994, com um prazo de 15 anos para a total eliminação das barreiras alfandegárias entre os três países, estando aberto a todos os Estados da América Central e do Sul. 125 O NAFTA consolidou o intenso comércio regional no hemisfério norte do Continente Americano, beneficiando grandemente à economia mexicana, e aparece como resposta à formação da Comunidade Européia, ajudando a enfrentar a concorrência representada pela economia japonesa e por este bloco econômico europeu. O bloco econômico do NAFTA abriga uma população de 404,5 milhões de habitantes, produzindo um PIB de US$ 8,8 trilhões, que gera US$ 959,4 bilhões de exportações e US$ 1,201 trilhão de importações. São Países-Membros do NAFTA: Estados Unidos, Canadá e México. Outras informações: www.nafta.net 12) COMUNIDADE ANDINA, GRUPO ANDINO OU PACTO ANDINO (CAN) Em 26 de maio de 1969, pelo Acordo de Cartagena, Colômbia, Peru, Venezuela, Equador, Bolívia e Chile criaram uma União Aduaneira e Econômica para fazer restrições à entrada de capital estrangeiro, com base em estudos da Comissão Econômica para a América Latina (CEPAL), órgão da ONU. Em 1973, com a subida ao poder do General Augusto Pinochet, o Chile retirou-se do Pacto, abrindo sua economia ao mercado externo, principalmente ao norte-americano. Hoje, o grupo de países remanescentes objetiva criar um mercado comum, em função do processo de globalização econômica que exige a formação em bloco para melhor defesa de seus interesses e promoção integrada do seu desenvolvimento. Este bloco econômico reúne uma população de 99,8 milhões de habitantes, que gera um PIB de US$ 239 bilhões, com exportações alcançando os US$ 46,2 bilhões e importações no valor de US$ 36,4 bilhões. São Países-Membros da CAN: Bolívia, Colômbia, Equador, Peru e Venezuela. Outras informações: http://www.comunidadandina.org/ 13) COMUNIDADE PARA O DESENVOLVIMENTO DA ÁFRICA AUSTRAL (SADC) Foi criada em 1992, para incentivar as relações comerciais entre seus 14 países membros. Tem o objetivo de criar um mercado comum, a médio prazo, seguindo o modelo básico da União Européia e alguns aspectos do Mercosul. Tem também o propósito de promover esforços para estabelecer a paz e a segurança na conturbada região meridional africana. O bloco reúne uma população de 127,2 milhões de habitantes e produz um PIB de US$ 175,5 bilhões, exportando US$ 41,8 bilhões de sua produção e importando US$ 40 bilhões de produtos do exterior. São Países-Membros da SADC: África do Sul, Angola, Botsuana, Lesoto, Malavi, Maurício, Moçambique, Namíbia, República Democrática do Congo, Seicheles, Suazilândia, Tanzânia, Zâmbia e Zimbábue. Outras informações: http://www.sadcexpo.org/ 126 14) UNIÃO EUROPÉIA (UE) A União Européia representa o estágio mais avançado do processo de formação de blocos econômicos no contexto da globalização. Originada da Comunidade Econômica Européia (CEE), fundada em 1957, pelo Tratado de Roma, a União Européia (UE) é o segundo maior bloco econômico do mundo em termos de PIB: 8 trilhões de dólares. Formado por 15 países da Europa Ocidental, sua população é estimada em 374 milhões de habitantes. Em 1992 é consolidado o Mercado Comum Europeu, com a eliminação das últimas barreiras alfandegárias entre os países-membros. Pelo Tratado de Maastricht (cidade da Holanda), a União Européia entra em funcionamento a partir de 1º de novembro de 1993. Dois outros tratados complementam o Tratado de Maastricht, um para tratar da União Política e o outro para cuidar da União Monetária e Econômica. O Parlamento Europeu, com sede em Estrasburgo, na França, para sessões plenárias, é formado por parlamentares eleitos pelas populações dos países-membros da União Européia. Em Luxemburgo, funciona a Secretaria Administrativa, e em Bruxelas, na Bélgica, realizam-se reuniões das Comissões Temáticas, assim como o Conselho de Ministros da União Européia e seu braço executivo, a Comissão Européia. O Euro é a moeda única criada pela União Européia, no momento sendo utilizada apenas em transações bancárias, desde 1º de janeiro de 1999. Existe previsão de lançamento de cédulas que começarão a circular na Europa com poder legal para efetuar quaisquer pagamentos, e as moedas nacionais serão extintas. Três países resistem ao fim da emissão de sua própria moeda, Reino Unido, Suécia e Dinamarca, por temer as conseqüências da perda da sua soberania. O Euro, uma moeda européia forte, lastreada em economias poderosas, passará a competir com o dólar norte-americano no mercado internacional. Para admissão à União Econômica e Monetária o país-membro da União Européia deve atender aos seguintes pré-requisitos: a) déficit público máximo de 3% do PIB; b) inflação baixa e controlada; c) dívida pública de no máximo 60% do PIB; d) moeda estável, dentro da banda de flutuação do Mecanismo Europeu de Câmbio; e, por último, e) taxa de juro de longo prazo controlada. Nesse sentido, vale destacar que a Grécia, por não ter ainda conseguido atender a esses pré-requisitos, não teve sua admissão à moeda única definitivamente autorizada. Em 1º de julho de 2001, a União Européia dará início as negociações sobre livre comércio com o Mercosul. São países Membros da UE: Alemanha, Áustria, Bélgica, Dinamarca, Espanha, Finlândia, França, Grécia, Irlanda, Itália, Luxemburgo, Holanda (Países Baixos), Portugal, Reino Unido e Suécia. Além desses Estados-Membros, a União Européia negocia a adesão de mais 11 (onze) países ao bloco, sendo que Polônia, Hungria, Eslovênia, Estônia e Chipre podem ser admitidos a partir de 1º de janeiro de 2003, pois a situação de suas economias é considerada satisfatória, por atender aos pré-requisitos de entrada na União Monetária e Econômica. Outras informações: www.europa.eu.int 127 Um resumo das principais grandezas macroeconômicas dos blocos econômicos -comerciais analisados está ilustrado na Tabela 1, apresentada na página seguinte. O desenvolvimento destes blocos comerciais tem incrementado fortemente o comércio mundial que saltou de uma média de US$ 3,7 trilhões por ano, no período de 1980-1990, para US$ 4,5 trilhões em 1992 e cerca de US$ 5,6 trilhões estimados para 1993, estando no ano de 2000, em torno de US$ 13 trilhões. As informações mais detalhadas do Mercosul, da União Européia e da Nafta, no período de 1980 a 1999 e no ano de 2004 estão ilustradas na Tabelas apresentadas a seguir. Tabela 1 PPP GDP 2004 Produto Interno Total, "per capita" e População Ranking Economy ordenação: PIB "per capita" e (PIB Total) PIB Total PIB "per (bilhões de População capita" (mil US$ PPP) (mil hab) US$ PPP) 1 (1) United States 2 (6) United Kingdom 3 (3) Japan 4 (7) France 5 (8) Italy 6 (5) Germany 7 (11) Spain 8 (10) Russian Federation 9 (12) Mexico 10 (9) Brazil 11 (2) China (a) 12 (4) India (b) Total 11.628,08 1.832,25 3.774,09 1.744,35 1.621,37 2.325,83 1.046,25 1.408,60 1.014,51 1.482,86 7.123,71 3.362,96 38.364,87 293.507 59.405 127.764 59.991 57.573 82.631 41.286 142.814 103.795 178.718 1.296.500 1.079.721 3.523.705 39,62 30,84 29,54 29,08 28,16 28,15 25,34 9,86 9,77 8,30 5,49 3,11 10,89 % da Renda apropriada pela população 20% mais ricos 20% mais pobres 45,8 5,4 44,0 6,1 35,7 10,6 40,2 7,2 42,0 6,5 36,9 8,5 40,3 7,5 39,3 8,2 59,1 3,1 63,2 2,4 50,0 4,7 43,3 8,9 % PIB Planeta = Os demais 48,8 49,9 53,7 52,6 51,5 54,6 52,2 52,5 37,8 34,4 45,3 47,8 Bloco Econômico / IDH Índice de Desenvolvimento Humano (ranking) Nafta / Elevado (10) UE / Elevado (15) APEC / Elevado (11) UE / Elevado (16) UE / Elevado (18) UE / Elevado (20) UE / Elevado (21) APEC / CEI / Médio (60) Nafta / Elevado (53) Mercosul / Médio (63) APEC / Médio (85) SAARC / Médio (127) 75,0% Notas: a. Estimate is based on a bilateral comparison between China and the United States (Ruoen and Kai, 1995). O Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) mede o nível de desenvolvimento humano dos países utilizando como critérios indicadores de educação (alfabetização e taxa de matrícula), longevidade (esperança de vida ao nascer) e renda (PIB per capita). O índice varia de zero (nenhum desenvolvimento humano) a um (desenvolvimento humano total). Países com IDH até 0,499 têm desenvolvimento humano considerado baixo, os países com índices entre 0,500 e 0,799 são considerados de médio desenvolvimento humano e países com IDH superior a 0,800 têm desenvolvimento humano considerado alto. Fontes: World Development Indicators database, World Bank, 15 July 2005 Obs.: IDH elevado (57 países), Médio (89 países) e Baixo (22 países) 128 Tabela 2 PPP GDP 2004 Ranking Economy ordenação: PIB "per capita" e (PIB Total) 13 (18) Netherlands 14 (13) Canada 15 (16) Australia 16 (14) Korea, Rep. 17 (22) Poland 18 (23) Argentina 19 (20) South Africa (b) 20 (19) Thailand 21 (17) Turkey 22 (21) Iran, Islamic Rep. 23 (15) Indonesia Total Produto Interno Total, "per capita" e % da Renda apropriada pela População população PIB Total PIB "per 20% 20% (bilhões de População capita" (mil $ mais mais Os $ PPP) (mil hab) PPP) ricos pobres demais 520,92 16.250 32,06 38,7 7,6 53,7 993,08 31.902 31,13 40,4 7,0 52,6 605,94 20.120 30,12 41,3 5,9 52,8 980,69 48.142 20,37 37,5 7,9 54,6 491,55 38.160 12,88 41,9 7,6 50,5 486,37 38.226 12,72 56,4 3,1 40,5 510,10 45.584 11,19 62,2 3,5 34,3 510,27 62.387 8,18 50,0 6,1 43,9 552,99 71.727 7,71 46,7 6,1 47,2 505,02 66.928 7,55 49,9 4,1 46 779,72 217.588 3,58 43,3 8,4 48,3 6.936,64 657.014 10,56 % PIB Planeta = Bloco Econômico / IDH Índice de Desenvolvimento Humano (ranking) UE / Elevado (12) Nafta / Elevado (5) APEC / Elevado (3) APEC / Elevado (28) UE / Elevado (36) Mercosul / Elevado (34) SADC / Médio (120) APEC / ASEAN / Médio (73) candidato UE / Médio (94) OPEP / Médio (99) APEC/ASEAN / Médio (110) 13,6% Notas: b. Estimate is based on regression; other PPP figures are extrapolated from the latest International Comparison Programme benchmark estimates. O Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) mede o nível de desenvolvimento humano dos países utilizando como critérios indicadores de educação (alfabetização e taxa de matrícula), longevidade (esperança de vida ao nascer) e renda (PIB per capita). O índice varia de zero (nenhum desenvolvimento humano) a um (desenvolvimento humano total). Países com IDH até 0,499 têm desenvolvimento humano considerado baixo, os países com índices entre 0,500 e 0,799 são considerados de médio desenvolvimento humano e países com IDH superior a 0,800 têm desenvolvimento humano considerado alto. Fontes: World Development Indicators database, World Bank, 15 July 2005 Obs.: IDH elevado (57 países), Médio (89 países) e Baixo (22 países) Tabela 3 24 25 26 27 28 29 30 31 32 33 34 35 36 37 38 39 40 PPP GDP 2004 Ranking Economy ordenação: PIB "per capita" e (PIB Total) (34) Switzerland (33) Austria (27) Belgium (38) Hong Kong, China (31) Sweden (36) Greece (40) Portugal (26) Saudi Arabia (b) (35) Malaysia (28) Colombia (b) (39) Algeria (b) (29) Ukraine (24) Philippines (30) Egypt, Arab Rep. (37) Vietnam (25) Pakistan (32) Bangladesh Total Produto Interno Total, "per capita" e % da Renda apropriada pela População população PIB Total PIB "per 20% 20% (bilhões de População capita" (mil $ mais mais Os $ PPP) (mil hab) PPP) ricos pobres demais 247,11 7.382 33,47 40,3 6,9 52,8 261,11 8.115 32,18 38,5 8,1 53,4 322,65 10.405 31,01 37,3 8,3 54,4 210,68 6.845 30,78 50,7 5,3 44 265,05 8.985 29,50 36,6 9,1 54,3 243,13 11.075 21,95 43,6 7,1 49,3 205,45 10.436 19,69 45,9 5,8 48,3 325,51 23.215 14,02 n.d. n.d. n.d. 246,04 25.209 9,76 54,3 4,4 41,3 322,58 45.300 7,12 61,8 2,7 35,5 210,66 32.373 6,51 42,6 7,0 50,4 303,28 48.008 6,32 37,8 8,8 53,4 378,23 82.987 4,56 52,3 5,4 42,3 282,03 68.738 4,10 43,6 8,6 47,8 222,17 82.162 2,70 45,4 7,5 47,1 336,05 152.061 2,21 42,3 8,8 48,9 263,43 140.494 1,88 41,3 9,0 49,7 3.095,43 710.983 4,35 % PIB Planeta = Bloco Econômico / IDH Índice de Desenvolvimento Humano (ranking) EFTA / Elevado (7) UE / Elevado (17) UE / Elevado (9) APEC / Elevado (22) UE / Elevado (6) UE / Elevado (24) UE / Elevado (27) OPEP / M édio (77) ASEAN / APEC / Média (61) ALADI / ALCA / Média (69) L. Árabe/OPEP Médio (103) CEI / M édio (78) ASEAN / APEC / Média (84) Liga Árabe / Médio (119) ASEAN/APEC / Médio (108) SARRC / Médio (135) SARRC / Médio (139) 6,1% Notas: b. Estim ate is based on regression; other PPP figures are extrapolated from the latest International Com parison Program m e benchm ark estim ates. O Índice de Desenvolvim ento Hum ano (IDH) m ede o nível de desenvolvim ento hum ano dos países utilizando com o critérios indicadores de educação (alfabetização e taxa de m atrícula), longevidade (esperança de vida ao nascer) e renda (PIB per capita). O índice varia de zero (nenhum desenvolvim ento hum ano) a um (desenvolvim ento hum ano total). Países com IDH até 0,499 têm desenvolvim ento hum ano considerado baixo, os países com índices entre 0,500 e 0,799 são considerados de m édio desenvolvim ento hum ano e países com IDH superior a 0,800 têm desenvolvim ento hum ano considerado alto. Fontes: World Developm ent Indicators database, World Bank, 15 July 2005 Obs.: IDH elevado (57 países), M édio (89 países) e Baixo (22 países) Tabela 4 129 Resumo Comparativo - União Européia, Nafta e Mercosul 1980 Valor 1990 Valor 1999 % a.a. 1980-90 Valor % a.a. 1990-99 1980 - 1999 % a.a. União Européia População (Milhões de Hab) PIB (US$ trilhões cte inter) PIB per capita (US$ mi. cte inter) Fluxo Comercial (US$ trilhões cte inter) Exportações Importações 355,3 3,935 11,077 1,923 0,951 0,972 364,6 4,996 13,705 3,726 1,874 1,851 0,26% 2,4% 2,2% 6,8% 7,0% 6,7% 375,4 5,972 15,908 5,252 2,702 2,550 0,33% 2,0% 1,7% 3,9% 4,1% 3,6% 0,29% 2,2% 1,9% 5,4% 5,6% 5,2% 323,563 4,281 13,229 0,758 0,369 0,389 365,135 5,530 15,145 1,551 0,734 0,817 1,22% 2,6% 1,4% 7,4% 7,1% 7,7% 400,909 7,100 17,709 3,021 1,383 1,638 1,04% 2,8% 1,8% 7,7% 7,3% 8,0% 1,13% 2,7% 1,5% 7,5% 7,2% 7,9% 172,294 0,775 4,499 0,093 0,041 0,052 207,464 0,833 4,015 0,114 0,065 0,049 1,87% 0,7% -1,1% 2,0% 4,7% -0,7% 236,465 1,114 4,711 0,240 0,115 0,126 1,46% 3,3% 1,8% 8,6% 6,5% 11,0% 1,68% 1,9% 0,2% 5,1% 5,6% 4,7% Nafta População (Milhões de Hab) PIB (US$ trilhões cte inter) PIB per capita (US$ mi. cte inter) Fluxo Comercial (US$ trilhões cte inter) Exportações Importações Mercosul População (Milhões de Hab) PIB (US$ trilhões cte inter) PIB per capita (US$ mi. cte inter) Fluxo Comercial (US$ trilhões cte inter) Exportações Importações Tabela 5.1 - União Européia AUT BEL DNK FIN FRA DEU GRC IRL ITA LUX NLD PRT ESP SWE GBR Austria Belgium Denmark Finland France Germany Greece Ireland Italy Luxembourg Netherlands Portugal Spain Sweden United Kingdom União Européia - EU .. Evolução do PIB real per capita - Período: 1980 a 1999 1980 1990 US $ US $ % ao ano 10.509 12.695 1,9% 11.109 13.232 1,8% 11.342 13.909 2,1% 10.851 14.059 2,6% 11.756 13.904 1,7% 18,784 5.901 6.768 1,4% 6.823 9.274 3,1% 10.323 12.488 1,9% 11.893 16.280 3,2% 11.284 13.029 1,4% 4.982 7.478 4,1% 7.390 9.583 2,6% 12.456 14.762 1,7% 10.167 13.217 2,7% 11,077 13,705 2,2% 1999 US $ % ao ano 14.666 14.975 16.799 15.272 15.438 22,604 7.852 16.418 13.680 23.763 15.582 9.296 11.497 15.836 15.073 15,908 1,6% 1,4% 2,1% 0,9% 1,2% 2,1% 1,7% 6,6% 1,0% 4,3% 2,0% 2,4% 2,0% 0,8% 1,5% 1,7% 1980 a 1999 % ao ano 1,8% 1,6% 2,1% 1,8% 1,4% 1,5% 4,7% 1,5% 3,7% 1,7% 3,3% 2,4% 1,3% 2,1% 1,9% Fontes: Banco Mundial planilhas Real GDP per capita in constant dollars (international prices, base year 1985) e Population, total GDP PPP = Gross Domestic Product using Power Parity Rate = Produto Interno Bruto usando paridade do poder de compra = PIB (produção total de bens e serviços para uso final) com dolar internacional (que tem poder de compra sobre seu PIB semelhante ao que o US$ tem sobre o PIB americano) AUT BEL DNK FIN FRA DEU GRC IRL ITA LUX NLD PRT ESP SWE GBR Austria Belgium Denmark Finland France Germany Greece Ireland Italy Luxembourg Netherlands Portugal Spain Sweden United Kingdom União Européia - EU Evolução da População Total - Período: 1980 a 1999 1980 1990 Milhões Hab. Milhões Hab. % ao ano 7,553 7,726 0,2% 9,847 9,967 0,1% 5,123 5,140 0,0% 4,780 4,986 0,4% 53,880 56,735 0,5% 78,303 79,433 0,1% 9,643 10,161 0,5% 3,401 3,506 0,3% 56,434 56,719 0,1% 0,365 0,382 0,5% 14,150 14,952 0,6% 9,766 9,896 0,1% 37,386 38,836 0,4% 8,310 8,559 0,3% 56,330 57,561 0,2% 355,271 364,559 0,3% 1999 Milhões Hab. 8,086 10,223 5,317 5,167 59,082 82,027 10,536 3,727 57,649 0,432 15,802 9,990 39,410 8,857 59,110 375,416 % ao ano 0,5% 0,3% 0,4% 0,4% 0,5% 0,4% 0,4% 0,7% 0,2% 1,4% 0,6% 0,1% 0,2% 0,4% 0,3% 0,3% 1980 a 1999 % ao ano 0,4% 0,2% 0,2% 0,4% 0,5% 0,2% 0,5% 0,5% 0,1% 0,9% 0,6% 0,1% 0,3% 0,3% 0,3% 0,3% Fontes: Banco Mundial planilhas Real GDP per capita in constant dollars (international prices, base year 1985) e Population, total GDP PPP = Gross Domestic Product using Power Parity Rate = Produto Interno Bruto usando paridade do poder de compra = PIB (produção total de bens e serviços para uso final) com dolar internacional (que tem poder de compra sobre seu PIB semelhante ao que o US$ tem sobre o PIB americano) 130 Tabela 5.2 - União Européia AUT BEL DNK FIN FRA DEU GRC IRL ITA LUX NLD PRT ESP SWE GBR Austria EXP IMP Belgium EXP IMP Denmark EXP IMP Finland EXP IMP France EXP IMP Germany EXP IMP Greece EXP IMP Ireland EXP IMP Italy EXP IMP Luxembourg EXP IMP Netherlands EXP IMP Portugal EXP IMP Spain EXP IMP Sweden EXP IMP United Kingdom EXP IMP União Européia EXP IMP Evolução das Exportações e Importações - Período: 1980 a 1999 1980 1990 1999 US $ bilhões US $ bilhões % ao ano US $ bilhões 26,650 63,694 9,1% 94,641 29,921 61,580 7,5% 95,644 70,498 138,610 7,0% 193,080 74,259 135,100 6,2% 182,170 21,989 48,902 8,3% 64,725 21,727 41,415 6,7% 57,595 16,802 31,180 6,4% 48,492 17,307 33,456 6,8% 37,887 153,200 285,390 6,4% 372,690 155,910 283,240 6,2% 329,610 224,220 474,710 7,8% 623,420 225,600 423,500 6,5% 587,350 8,122 13,018 4,8% 14,863 11,145 19,564 5,8% 25,601 9,610 26,786 10,8% 71,749 12,044 24,576 7,4% 61,713 97,298 219,970 8,5% 292,010 110,260 218,570 7,1% 268,820 21,341 20,705 90,380 160,450 5,9% 223,350 91,622 147,650 4,9% 200,270 16,061 19,037 1,7% 43,387 10,136 27,146 10,4% 27,146 32,140 83,595 10,0% 164,350 38,004 100,870 10,3% 170,640 38,151 70,560 6,3% 103,130 39,878 70,490 5,9% 89,268 146,070 238,570 5,0% 370,540 134,200 263,990 7,0% 395,600 951,191 1.874,472 7,0% 2.701,768 972,013 1.851,147 6,7% 2.550,019 4,5% 5,0% 3,8% 3,4% 3,2% 3,7% 5,0% 1,4% 3,0% 1,7% 3,1% 3,7% 1,5% 3,0% 11,6% 10,8% 3,2% 2,3% 1980 a 1999 % ao ano 6,9% 6,3% 5,4% 4,8% 5,8% 5,3% 5,7% 4,2% 4,8% 4,0% 5,5% 5,2% 3,2% 4,5% 11,2% 9,0% 6,0% 4,8% 3,7% 3,4% 9,6% 0,0% 7,8% 6,0% 4,3% 2,7% 5,0% 4,6% 4,1% 3,6% 4,9% 4,2% 5,4% 5,3% 9,0% 8,2% 5,4% 4,3% 5,0% 5,9% 5,6% 5,2% % ao ano Fontes: Banco Mundial planilhas Real GDP per capita in constant dollars (international prices, base year 1985) e Population, total GDP PPP = Gross Domestic Product using Power Parity Rate = Produto Interno Bruto usando paridade do poder de compra = PIB (produção total de bens e serviços para uso final) com dolar internacional (que tem poder de compra sobre seu PIB semelhante ao que o US$ tem sobre o PIB americano) Tabela 6 - Nafta CAN MEX USA Canada Mexico United States Nafta Evolução da População Total - Período: 1980 a 1999 1980 1990 Milhões Hab Milhões Hab % ao ano 24,900 28,172 1,2% 69,193 84,843 2,1% 229,470 252,120 0,9% 323,563 365,135 1,2% 1999 Milhões Hab 30,604 97,425 272,880 400,909 0,9% 1,5% 0,9% 1,0% 1980 a 1999 % ao ano 1,1% 1,8% 0,9% 1,1% 1,8% 3,4% 2,9% 2,8% 1980 a 1999 % ao ano 2,6% 2,5% 2,7% 2,7% 7,0% 6,3% 13,0% 12,7% 6,7% 8,0% 7,3% 8,0% 1980 a 1999 % ao ano 7,1% 7,1% 10,3% 9,4% 6,9% 7,9% 7,2% 7,9% % ao ano Fontes: Banco Mundial planilhas Real GDP per capita in constant dollars (international prices, base year 1985) e Population, total GDP PPP = Gross Domestic Product using Power Parity Rate = Produto Interno Bruto usando paridade do poder de compra = PIB (produção total de bens e serviços para uso final) com dolar internacional (que tem poder de compra sobre seu PIB semelhante ao que o US$ tem sobre o PIB americano) CAN MEX USA Canada Mexico United States Nafta Evolução do PIB real Total - Período: 1980 a 1999 1980 1990 US $ bilhões US $ bilhões % ao ano 351,912 483,798 3,2% 418,894 494,380 1,7% 3.509,744 4.551,774 2,6% 4.280,550 5.529,952 2,6% 1999 US $ bilhões 569,686 666,435 5.863,441 7.099,562 % ao ano Fontes: Banco Mundial planilhas Real GDP per capita in constant dollars (international prices, base year 1985) e Population, total GDP PPP = Gross Domestic Product using Power Parity Rate = Produto Interno Bruto usando paridade do poder de compra = PIB (produção total de bens e serviços para uso final) com dolar internacional (que tem poder de compra sobre seu PIB semelhante ao que o US$ tem sobre o PIB americano) CAN MEX USA Canada EXP IMP México EXP IMP United States EXP IMP Nafta EXP IMP Evolução das Exportações e Importações - Período: 1980 a 1999 1980 1990 1999 US $ bilhões US $ bilhões % ao ano US $ bilhões 74,977 149,540 7,1% 275,920 70,259 149,120 7,8% 257,510 22,622 48,805 8,0% 146,830 27,601 51,915 6,5% 152,700 271,800 536,060 7,0% 960,100 290,730 615,990 7,8% 1.227,600 369,399 734,405 7,1% 1.382,850 388,590 817,025 7,7% 1.637,810 % ao ano Fontes: Banco Mundial planilhas Real GDP per capita in constant dollars (international prices, base year 1985) e Population, total GDP PPP = Gross Domestic Product using Power Parity Rate = Produto Interno Bruto usando paridade do poder de compra = PIB (produção total de bens e serviços para uso final) com dolar internacional (que tem poder de compra sobre seu PIB semelhante ao que o US$ tem sobre o PIB americano) Tabela 7 - Mercosul 131 BRA ARG CHL URY BOL PRY Brasil Argentina Chile Uruguay Bolivia Paraguay Mercosul Evolução do PIB real Total - Período: 1980 a 1999 1980 1990 US$ Bi US$ Bi % ao ano 523,546 597,973 1,34% 182,780 153,072 -1,76% 43,384 56,823 2,74% 14,835 14,294 -0,37% 10,651 10,898 0,23% 7,891 8,978 1,30% 775,196 833,061 0,72% 1999 US$ Bi 741,513 237,087 99,631 19,665 16,167 11,663 1.114,062 % ao ano 2,42% 4,98% 6,44% 3,61% 4,48% 2,95% 3,28% 1980 a 1999 % ao ano 1,85% 1,38% 4,47% 1,49% 2,22% 2,08% 1,93% Fontes: Banco Mundial planilhas Real GDP per capita in constant dollars (international prices, base year 1985) e Population, total GDP PPP = Gross Domestic Product using Power Parity Rate = Produto Interno Bruto usando paridade do poder de compra = PIB (produção total de bens e serviços para uso final) com dolar internacional (que tem poder de compra sobre seu PIB semelhante ao que o US$ tem sobre o PIB americano) BRA ARG CHL URY BOL PRY Brasil Argentina Chile Uruguay Bolivia Paraguay Mercosul Evolução da População Total - Período: 1980 a 1999 1980 1990 Milhões Hab. Milhões Hab. % ao ano 121,670 147,940 2,0% 28,094 32,527 1,5% 11,147 13,099 1,6% 2,914 3,106 0,6% 5,355 6,573 2,1% 3,114 4,219 3,1% 172,294 207,464 1,9% 1999 Milhões Hab. 168,070 36,571 15,018 3,312 8,135 5,359 236,465 1,4% 1,3% 1,5% 0,7% 2,4% 2,7% 1,5% 1980 a 1999 % ao ano 1,7% 1,4% 1,6% 0,7% 2,2% 2,9% 1,7% 6,0% 9,9% 7,2% 18,9% 7,4% 7,8% 6,5% 10,5% 3,0% 6,3% 7,6% 5,1% 6,5% 11,0% 1980 a 1999 % ao ano 5,4% 4,6% 5,6% 4,9% 6,4% 5,1% 4,9% 3,4% 1,1% 4,4% 8,2% 4,9% 5,6% 4,7% % ao ano Fontes: Banco Mundial planilhas Real GDP per capita in constant dollars (international prices, base year 1985) e Population, total GDP PPP = Gross Domestic Product using Power Parity Rate = Produto Interno Bruto usando paridade do poder de compra = PIB (produção total de bens e serviços para uso final) com dolar internacional (que tem poder de compra sobre seu PIB semelhante ao que o US$ tem sobre o PIB americano) BRA ARG CHL URY BOL PRY Brasil EXP IMP Argentina EXP IMP Chile EXP IMP Uruguay EXP IMP Bolivia EXP IMP Paraguai EXP IMP Mercosul EXP IMP Evolução das Exportações e Importações - Período: 1980 a 1999 1980 1990 1999 US $ bilhões US $ bilhões % ao ano US $ bilhões 21,869 35,170 4,9% 59,299 27,826 28,184 0,1% 65,657 9,897 14,800 4,1% 27,764 13,182 6,846 -6,3% 32,561 5,968 10,221 5,5% 19,406 7,052 9,166 2,7% 18,058 1,526 2,159 3,5% 3,796 2,144 1,659 -2,5% 4,077 1,030 0,977 -0,5% 1,272 0,833 1,086 2,7% 1,881 0,701 1,609 8,7% 3,118 1,314 2,094 4,8% 3,270 40,991 64,935 4,7% 114,655 52,351 49,035 -0,7% 125,505 % ao ano Fontes: Banco Mundial planilhas Real GDP per capita in constant dollars (international prices, base year 1985) e Population, total GDP PPP = Gross Domestic Product using Power Parity Rate = Produto Interno Bruto usando paridade do poder de compra = PIB (produção total de bens e serviços para uso final) com dolar internacional (que tem poder de compra sobre seu PIB semelhante ao que o US$ tem sobre o PIB americano) Todo esse movimento tem seu eixo no desenvolvimento das unidades produtivas e rebate, recorrentemente, sobre elas, impondo a necessidade de elaboração de estratégias competitivas mais complexas e abrangentes em termos mundiais. É claro que as unidades não concorrem em igualdade de condições, nem no interior das suas economias nacionais, muito menos no âmbito das relações internacionais ou globais. Porém não parece ser possível ou suficiente, simplesmente, preparar-se individualmente - no plano de cada uma das unidades de negócios - para a concorrência global. Os problemas colocados para o andamento do processo (em especial, a questão imediata da profunda mudança do caráter do emprego produtivo e dos altos graus de desemprego ostentados nas economias nacionais que já se adiantaram no processo de reestruturação) sugerem a necessidade de elaboração articulada de projetos sociais e econômicos que explorem as potencialidades produtivas e incorporem a perspectiva de inclusão das diversas camadas sociais no âmbito do processo de inserção da economia nacional no movimento econômico global. No Brasil, o que se assiste nos anos recentes (em especial nos últimos dez a quinze anos) é uma assimilação não-crítica do processo de globalização da economia, culminando com movimentos 132 caóticos, tanto no interior da economia privada como no setor produtivo estatal, na direção de uma pretensa racionalidade econômica conduzida pelo mercado. Tal racionalidade implicaria ações das empresas no sentido de ajustes estruturais que redundariam numa nova forma de organização produtiva ao mesmo tempo mais leve (com custos menores que a anterior) e mais qualificada (no plano dos processos, dos produtos, dos recursos humanos, etc). Tais ajustes propiciariam também pretensos movimentos descendentes nos preços privados e públicos, bem como à eliminação dos descompassos entre a arrecadação e o gasto público. Estes dois fatos culminariam o processo de preparação da economia nacional (entenda-se, suas principais unidades produtivas) para o movimento competitivo global. No setor privado, esse posicionamento estratégico teria seu eixo nas soluções particulares (por empresa) a partir da compreensão do processo de globalização como uma luta competitiva baseada quase exclusivamente - nos preços, a partir de um raciocínio do tipo “ganhar o mercado a partir de menores preços e igual ou superior qualidade”. Pouquíssimas empresas parecem reconhecer a necessidade de atuar sobre as demandas educacionais e de recomposição da renda familiar nacional que tal raciocínio impõe (para citar apenas as demandas mais importantes e visíveis). Os dados das Tabelas 1 a 3, destacam a distribuição de renda fortemente assimétrica que caracteriza os países menos desenvolvidos e com menor inserção na economia global e, em medidas e graus distintos, também se constata assimetria, mesmo nos países com maiores graus de desenvolvimento ou com participação hegemônica nos negócios globais. Contudo, há uma grande diferença entre os graus de concentrações de renda na amostra dos países apresentados, observando-se agravamentos das desigualdades em países como o Brasil, África do Sul e Venezuela. É claro que o processo de integração ao movimento global de países com estes perfís de estruturas econômicas e sociais vai demandar esforços no sentido de equacionar problemas tais como, de um lado, a pobreza, o desemprego, a exclusão social, etc, e de outro, o volume e o ritmo dos investimentos necessários; isso ultrapassa, em muito, a capacidade e as possibilidades de ações individuais de unidades produtivas isoladas, colocando as soluções no âmbito de articulações supra-unidades ou supra-empresas individuais, ou seja, a formulação das estratégias de enfrentamento dessas questões situa-se no plano mais amplo das políticas públicas, em qualquer formato em que se possa pensá-las, hoje, diante da complexidade das tarefas impostas pela profundidade e extensão dos problemas existentes. III) Evolução da estrutura e da dinâmica organizacional das empresas: a divisão (horizontal e vertical) do trabalho como o princípio da organização da empresa; mudanças na estrutura técnica do capital; mudanças na estrutura do emprego Observemos agora a primeira face do processo de geração/apropriação do excedente produtivo na empresa, ou seja, a visão da gestão empresarial com base na estrutura da organização. Essencialmente, há dois aspectos fundamentais para serem abordados. Em primeiro lugar a questão do grau de importância absoluta e relativa de cada uma das funções básicas da empresa (produção, finanças e mercado), ou seja, se tem sentido hierarquizar tais funções, quanto à tomada de decisões estratégicas e a busca dos resultados e metas previstas. Em segundo lugar, e independente da forma como foi abordada a questão da hierarquização (ou não) das funções básicas, há a questão da construção de um sistema de informações, com suficiente agilidade e credibilidade, que garantam as condições para a adequada interação interna, em todos os níveis de cada função e inter-funções, de tal forma que esteja assegurada a fluidez das decisões estratégicas no interior da estrutura da organização. 133 A abordagem de ambas as questões deve se dar no sentido de construir uma estrutura organizacional "leve" e crescentemente participativa, de tal maneira que o fluxo de informações seja adequado e compatível face às metas estratégicas estabelecidas. O grau de complexidade da estrutura organizacional de uma unidade produtiva está relacionado a dois princípios básicos. O primeiro refere-se à diversidade de habilidades técnico-produtivas necessárias ao transcurso do processo de produção; este princípio está assentado na divisão técnica do trabalho e responde pelo número de "divisões horizontais" que caracterizam a estrutura. O segundo relaciona-se ao número de diferentes níveis de controle necessários ao desenrolar do conjunto do processo de gestão da empresa; tal princípio apoia-se tanto na divisão técnica do trabalho (quando se separam as atividades de planejamento e projeto de produtos/processos/métodos, da sua execução efetiva) como na divisão hierárquica de funções (quando se separam as atividades de direção, gerência, supervisão e execução das diversas atividades de uma empresa) e responde pelo número de "divisões ou níveis verticais" que formam a estrutura. Ambos os princípios encontram-se, atualmente, sob o fogo cruzado de críticas de variada natureza. Questiona-se, de um lado, a ineficiência estrutural-qualitativa de um sistema produtivo baseado na excessiva parcelização das tarefas concretas na fábrica; alternativamente, propõe-se a integração do maior número possível de etapas produtivas, em circuitos de produção onde os operadores respondam por um número maior de operações unitárias, garantindo assim, a priori, melhor qualificação para o conjunto do processo. De outro lado, questiona-se o número excessivo de níveis hierárquicos baseados na idéia do controle "externo" das operações; nesse caso, propõe-se a crescente autonomização dos circuitos da produção (tanto as atividades de operação como as de controle ou gestão) de tal forma que, ao lado da maior integração das etapas do processo, obtenha-se maior flexibilidade na base produtiva. Observa-se, como tendência nas modificações em curso nas estruturas organizacionais, a redução dos níveis hierárquicos (menos "gerência", menos "controle externo") e o aumento da integração e autonomia nos circuitos do processo produtivo. Uma representação gráfica através de um organograma - simbolizado pelas figuras de pirâmides - ilustra os principais efeitos das pressões em curso sobre a estrutura das organização. As mudanças que resultam da atuação das forças ilustradas na Figura 1, apresentada a seguir, estão relacionadas ao amplo processo de restruturação produtiva que vem ocorrendo nos últimos quinze anos ou vinte anos, processo este vinculado às mudanças mais profundas e extensas no grau de competitividade das principais economias nacionais e empresas do planeta. É evidente que a fluidez das informações não está garantida apenas pelo êxito da construção de uma estrutura organizacional “leve”. A observação das experiências de reestruturação produtiva das empresas, tem mostrado que é a construção de sistemas de informação estruturados, consistentes e de base unificada é que tem propiciado o sucesso das políticas de incremento à eficiência orgânica das estruturas empresariais. Em suma, trata-se de garantir a geração continuada de capacidade administrativa para dotar a estrutura organizacional de atributos qualificados para responder às exigências dinâmicas colocadas pela evolução dos processos produtivos, financeiros e comerciais. Uma das bases conceituais (ou “filosóficas”) sobre a qual se assentam tais processos de mudança, relaciona-se ao processo ou método gerencial denominado de TQM (Total Quality Management) Gestão da (ou para a) Qualidade Total. A Gestão da Qualidade Total (GQT) foi desenvolvida, pioneiramente, a partir de proposições formuladas por Deming no início dos anos ´50, como já foi citado nas seções anteriores deste texto. Tais proposições podem ser resumidas nos seguintes pontos, chamados de “os 14 princípios de 134 Administração ou princípios para a Transformação”, já brevemente comentados quando se apresentou o autor citado8. Seria muito útil e conveniente, lembrando que tal conjunto de princípios foi desenvolvido pensando na inserção internacional competitiva das empresas americanas há cerca de vinte e cinco anos, que os estudiosos e executivos brasileiros refletissem criticamente sobre as razões, possibilidades, objetivos, restrições objetivas e requisitos que se colocam para a adoção dessa filosofia para as empresas brasileiras; o surto de implantação imediata de tais princípios e a propaganda pela implantação generalizada de tais modificações - frequentemente efetivadas de forma mecânica e a-crítica -, podem acarretar efeitos não-desejados sobre as estruturas das organizações, especialmente sobre os níveis quantitativos e qualitativos do emprego no país. Figura 4 Tendências de mudanças na estrutura organizacional: pressões sobre as formas organizacionais vigentes Menos níveis hierárquicos (de decisão e comando), menos gerência e supervisão (1) Comitê de Direção Maior Integração Maior Autonomia (2) (2) Produção ou "chão de fábrica" (1) Maiores exigências de conhecimentos, habilidades e responsabilidades Obs: 8 (1) Pressões “verticais” sobre a estrutura e contrapartidas (2) Pressões “horizontais” sobre a estrutura e contrapartidas Deming (op. cit.), cap. 2, págs. 18 e 19. 135 IV. Inserção e dinâmica das empresas no mercado Há um conjunto de conceitos relacionados com a natureza e a dinâmica do processo de surgimento, permanência e evolução dos empreendimentos capitalistas - unidades produtivas ou empresas - nos diversos setores da atividade econômica. Tais conceitos devem estar referidos a dois planos principais do estudo das unidades produtivas. Em primeiro lugar, trata-se de compreender as distintas formas de inserção de tais unidades nos mercados e a dinâmica de funcionamento das relações entre as diversas empresas e outros agentes econômicos no interior destes mercados. Além disso, deve-se procurar explicitar, no plano interno da organização empresarial, os principais conceitos sobre os quais se assentam os processos decisórios ou a definição de estratégias de atuação das empresas. Na verdade há uma conjugação (ou articulação) destes dois planos de análise no andamento histórico - concreto da evolução das empresas. Contudo, para a apresentação inicial das principais questões relacionadas ao estudo da Economia e Gestão Estratégica das Empresas, torna-se adequado a análise "separada" de cada um dos planos propostos. Iniciaremos com os conceitos de empresa, concorrência e de espaço competitivo (ou mercado) Produção no sentido estrito - transformação industrial - e no sentido amplo - qualquer processo que resulte na agregação de valor ao produto O conceito de produção, no sentido estrito, está relacionado ao processo de transformação indústrial, vale dizer, ao processo de agregação sucessiva de valores a partir da utilização de insumos, ferramentas, máquinas e trabalho humano. Contudo, não apenas os processos industriais são passíveis de agregação de valores. Todas as atividades que envolvem a distribuição, comercialização, apoio ou suporte técnicoadministrativo ou econômico, financeiro, etc., são atividades complementares a produção (estrito senso) e agregam valores aos produtos já produzidos. Dessa forma, é possível compreender o processo de produção num sentido mais geral ou amplo, envolvendo qualquer atividade que agregue valor aos produtos (bens ou serviços) e, portanto, possíveis de ser desenvolvidas por unidades produtivas no mercado. Por outro lado, o objetivo do processo de produção (de qualquer natureza e sentido), não está subordinado à satisfação de necessidades (de qualquer natureza) dos consumidores, vale dizer, a produção não pode ser entendida, exclusivamente, como "produção de bens e serviços dirigidos ao mercado para satisfação de necessidades dos consumidores". A noção mais relevante de "processo de produção" está relacionada a geração do excedente ou lucro. Ou seja, o processo de produção de bens e serviços deve ser visto como um meio de concretização do processo de produção do excedente. Assim as empresas, muito mais do que produtoras de determinados tipos de bens e serviços são, antes de tudo, produtoras de lucro (a justificativa superior para a continuidade e permanência no mercado, de qualquer processo de produção de bens e serviços). O conceito de produto então, relaciona-se a noção de "meio de produção de excedentes", e, apenas enquanto tal processo for bem sucedido, é que se justifica sua continuidade e a consequente permanência da empresa (unidade produtiva) no mercado. Por outro lado a empresa ("unidade produtora de excedentes através da produção de bens e serviços") tem uma estrutura organizacional que assenta-se sobre três pilares funcionais básicos: a produção (a base técnica que sustenta todas as atividades que resultam em bens ou serviços); a função financeira (a base técnica que supre as necessidades de dinheiro para a sustentação de todas as atividades da empresa) e a função de mercado (mercadológica ou de "marketing", que representa a base 136 técnica de sustentação das atividades que respondem pelo estabelecimento das relações diretas com os clientes e concorrentes da empresa) Conceito de Empresa (Unidade Produtiva, Empreendimento, Negócio) Assim, como foi visto acima, o conceito de empresa, no sistema econômico capitalista está relacionado à noção de uma unidade econômica destinada a desenvolver um conjunto de atividades determinadas, com o objetivo de gerar e apropriar-se de excedentes ou lucros. Em outras palavras, a empresa capitalista corresponderia a uma fração (maior ou menor) do capital total da sociedade, posta em movimento (ou em funcionamento) com a finalidade de crescer. Isso não significa, contudo, que todas as empresas devam nascer pequenas e, muito menos, que todas consigam crescer indefinidamente. Significa, sim, que, por representarem uma parcela do capital social posta em função, os empreendimentos capitalistas possuem uma identidade essencial: movimentam-se na busca do lucro e dos espaços de crescimento; por outro lado, em que pese essa identidade essencial, as empresas assumem características particulares e bastante diversas: porte, poder econômico, origem e grau de centralização da propriedade, capacidade de geração ou apropriação das inovações técnicas, do lucro e dos atributos de expansão no mercado, capacidade financeira (unidades isoladas ou conglomerados), dentre outras. Tais identidades e diferenças respondem pelas distintas capacitações específicas que as empresas apresentam na luta competitiva que travam, em busca da ocupação de espaços maiores no interior dos diversos mercados em que atuam. De uma forma bastante geral, podemos ilustrar as unidades produtivas (empresas) no mercado da forma que se segue. FIGURA 1 - ILUSTRAÇÃO PRELIMINAR SIMPLIFICADA DO EMPREENDIMENTO Entradas Saídas Unidade produtiva Entradas - Insumos materiais (matérias primas, partes, peças componentes, material de embalagem, sementes, terra para cultivo, fertilizantes, etc) - Insumos energéticos - Mercadorias - Máquinas, equipamentos, ferramentas, instalações, edificações, veículos, etc. - Força de trabalho humano (não-qualificado, especializado, etc) - Dinheiro - Informações, conhecimentos, idéias Saídas - Bens de consumo (imediato, duráveis) - Bens de produção (de capital, intermediários) - Serviços produtivos (terceirização de atividades industriais, transporte de bens) - Outros serviços públicos ou privados (Educação, Saúde, Transporte coletivo de pessoas, Pesquisa Básica, etc) - Mercadorias (Comércio varejista, atacadista, “centros de comercialização”, etc) - Dinheiro de Crédito 137 Figura 2 - Compartimentos funcionais (ou funções) básicos das unidades produtivas Entradas Saídas Processo de Produção (sentido amplo) - Funções Produção Vendas Finanças (operações, atividades, tarefas, etc.) Produção: Garantir a melhor utilização dos recursos produtivos (espaço físico, máquinas, equipamentos, insumos, força de trabalho) disponíveis, tendo em vista as necessidades colocadas pelo processo de geração do excedente. (Maior relação capital/produto, máxima produtividade, menores custos) Vendas: Garantir manutenção da posição no mercado, via expansão absoluta ou relativa da participação da unidade nas vendas totais, tendo em vista o objetivo de assegurar a permanência do processo lucrativo. (Formação do preço, estabilização da margem de lucro, maiores quantidades vendidas) Finanças: Garantir o suprimento de dinheiro para a obtenção dos recursos produtivos necessários e as condições do seu financiamento em prazos e custos compatíveis, tendo em vista o objetivo de apropriar-se da maior parcela possível do excedente gerado. (Manutenção do capital de giro, reposição do capital fixo, administração do fluxo de caixa e da reinversão de recursos líquidos liberados) Conceitos de Mercado9 Por outro lado, o conceito de mercado10 está associado a uma linha de produtos, diferenciados por marcas, modelos ou tipo de utilização (inclusive complementares) que resultem de processos de produção razoavelmente homogêneos, quanto aos insumos utilizados e a tecnologia. 9 A apresentação deste tópico está baseado nas análises contidas em Possas, M. L.: "Estrutura industrial brasileira: base produtiva e liderança de mercados", Campinas, Unicamp, tese de mestrado, mimeo., 1977. Em especial o capítulo IV, onde o autor - baseado na tipologia proposta por Maria da Conceição Tavares a partir dos trabalhos de V. Steindl e P. Sylos-Labini - identifica alguns padrões típicos de estruturas de mercado com dados dos principais setores da indústria brasileira em 1970. 138 Ou seja, o mercado seria um conjunto de empresas (maiores ou menores) cujos produtos possam ser utilizados com a mesma finalidade e cujos processos produtivos sejam razoavelmente semelhantes. Portanto, a noção de concorrência é inerente ao conceito de mercado capitalista, Ou seja, o movimento das empresas nos mercados se faz através da luta competitiva pela conquista de clientes na venda de bens ou serviços ou, em outras palavras, da luta pela manutenção ou ampliação das suas posições no mercado. Ademais, são as formas ou os padrões assumidos pela concorrência que determinam as características do funcionamento dos diversos mercados em termos da sua composição (ou estrutura) e desempenho dinâmicos. Há vários critérios de classificação dos mercados. Os mais importantes são aqueles que tomam como base o produto, ou a destinação do produto, e, em especial para os mercados industriais, aqueles que levam em conta os padrões de concorrência que se estabelecem entre as empresas que deles participam. Com base na destinação do produto há os mercados de bens e serviços de produção e os de bens e serviços de consumo. O mercado de bens e serviços de produção se subdivide em bens de capital (máquinas, equipamentos, instalações, edificações, etc) e bens intermediários ou insumos da produção (matérias primas, materiais, componentes, insumos energéticos, etc). Por outro lado, o mercado de bens e serviços de consumo divide-se em bens de consumo duráveis (uma ampla variedade de produtos que abrange habitações residenciais, veículos automotores, eletro-eletrônicos de uso doméstico ou comercial, etc) e bens de consumo não duráveis (bens de consumo imediato, cujos principais exemplos são os alimentos, roupas, calçados, cigarros, bebidas, etc). Por outro lado, com base no padrão de concorrência que se estabelece entre as empresas, o ponto de partida para a classificação dos mercados está na conjugação das noções de produtos e processos de produção. O conceito de mercado ou estrutura de mercado abrange, assim, a noção de "ramos da atividade capitalista que possuem uma determinada individualidade" e que possuem "características peculiares quanto à forma que se desenvolve o processo de competição entre as empresas aí presentes". Tais padrões de concorrência, numa determinada estrutura de mercado, dependeriam, basicamente, dos seguintes elementos: a. Forma pela qual as empresas líderes se inserem na estrutura produtiva, que pode constituir variados tipos de barreiras à entrada de novos competidores, em especial os de menor porte. Dentre os tipos de barreiras à entrada, os principais relacionam-se, às exigências ligadas ao padrão tecnológico utilizado no que se refere a elevada escala mínima de produção; ao uso de insumos específicos (importados, objeto de restrições monopólicas, etc); à também elevada escala mínima de gastos com distribuição dos produtos; ao grau de diferenciação dos produtos; à associação de vários dos atributos referidos, entre outros. b. Políticas de expansão das empresas líderes, ou sua estratégia de concorrência. O acesso às inovações técnicas; as possibilidades de mobilização de recursos financeiros disponíveis; as possibilidades de adaptação (implementação) dessas inovações técnicas aos mercados existentes ou mesmo à recriação de mercados, etc. A ação dos atributos citados conformam certos padrões de concorrência, que, por sua vez, configuram determinadas estruturas de mercado com características específicas de funcionamento e 10 A noção de mercado mais popular (ou corrente) está relacionada ao mercado de consumo. Assim, a idéia mais comum de mercado está associada ao conjunto dos consumidores de determinado produto e não ao conjunto das empresas produtoras deste produto. Contudo, como será argumentado a seguir tal noção - mercado de consumomais comum, não é a mais relevante ou explicativa para a compreensão do funcionamento dinâmico das unidades produtivas capitalistas, interessando, sim (V. Possas, op. cit.), a conceituação de mercado que conjuga as noções de produto e de processo de produção – “Indústria” -, de tal forma que a noção de mercado assenta-se nas empresas (“unidades produtoras”), tornando fundamental, portanto, a compreensão das bases conceituais que fundamentam a formulação de suas estratégias. 139 desempenho dinâmicos. Os atributos mais importantes que configuram as principais estruturas de mercado, são apresentados a seguir (v. Quadros 1 a 5) 140 141 142 Tendo em vista a questões abordadas até aqui, é possível estabelecer uma primeira tentativa de síntese conceitual para a noção de mercado, a partir dos atributos que caracterizam o movimento das empresas no mercados. Resumidamente podemos agrupar as noções de mercado em dois grandes conjuntos conceituais e práticos: a) A partir da noção de Concorrência - Conjunto de Empresas Produtoras Mercado é o Conjunto de Empresas com Produtos ou Serviços com utilização semelhante e processos produtivos relativamente homogêneos, passíveis de diferenciação em modelos, faixa etária, faixa de renda, etc. b) A partir da noção de “Satisfação” do Cliente - Conjunto de Clientes Mercado é o conjunto de: Consumidores finais: Clientes (indivíduos ou famílias) isolados ou agrupados (segmentados) conforme seu poder aquisitivo, Perfil sócio – cultural, Localização espacial/ geográfica ou outros Atributos Individuais ou de Grupos. Consumidores intermediários: Clientes (outras unidades produtoras) isolados ou agrupados (segmentados) conforme a especificação técnica e projeto de produtos ou serviços ou outros atributos de demanda produtiva. Para finalizar vale introduzir a noção de "Marketing", que atualmente abrange todas as ações sobre o mercado no sentido amplo – ou seja, um amplo conjunto de estratégias e táticas destinadas a garantir o estabelecimento de relações duradouras com os clientes levando em conta, necessariamente, os movimentos dos concorrentes - contempladas nos conceitos apresentados anteriormente, assumindo que na prática tal noção poderia ser sintetizada como "fazer o mercado", ou seja, manusear as principais ferramentas de gestão empresarial, destinadas à construção, preservação e/ou expansão de uma posição no mercado. Assim podemos conceituar "Marketing" nos dois planos abordados acima, para os mercados: Concorrência: Conjunto de Empresas Produtoras - Processos, produtos e serviços (relações internas e na rede produtiva) - Sistemas de Vendas e Distribuição (relações predominantes na cadeia) - Custos e Preços (relações internas, na cadeia e na rede) - Relações com a Mídia e consolidação das alianças Empresa-Produto e Agentes econômicos (relações internas e na cadeia) “Satisfação” do Cliente: Conjunto de Clientes - Finais: Caracterização do processo de demanda (quem, quando, quanto compra; o que move a demanda: qualidade, preço, atendimento, conjugações dos atributos, etc.) - Intermediários: Caracterização do processo de demanda com ênfase na construção de parceiras “virtuosas” na cadeia produtiva. 143 IV.1) Modelo Integrado de Gestão Empresarial A chamada gestão “interna” das empresas engloba ações em dois planos : a. No plano do processo de geração/apropriação do excedente produtivo: enfoque na economia da empresa; ênfase na formulação das estratégias de permanência e expansão da empresa no mercado. b. No plano do processo organizacional ou de funcionamento orgânico da empresa: enfoque na organização ou na capacitação organizacional da empresa; ênfase no desenvolvimento da estrutura organizacional face às exigências dinâmicas do funcionamento ou da inserção da empresa no mercado. Em outras palavras, a administração/gestão das empresas move-se a partir da compreensão do empreendimento capitalista como uma unidade com dupla determinação: Figura 3 UNIDADE DE ACUMULAÇÃO DE CAPITAL (ESTRATÉGIAS ECONÔMICA E FINANCEIRA) EMPREENDIMENTO CAPITALISTA - EMPRESA UNIDADE ORGÂNICA (ESTRUTURA ORGANIZACIONAL) As duas determinações concretas das empresas são complementares. Enquanto unidade de acumulação de capital a formulação dos objetivos estratégicos (ou o conjunto dos processos decisórios) fundamentais da empresa leva em conta, essencialmente, o padrão de concorrência que predomina na estrutura de mercado onde a empresa atua e a particular forma de inserção da unidade nesse mercado. Por outro lado, enquanto unidade orgânica o campo de definição de estratégias está relacionado com as respostas dinâmicas da estrutura organizacional diante das exigências colocadas pela forma de inserção da empresa no mercado. É mais ou menos como se o processo de geração do excedente fosse a infra-estrutura de uma entidade (a empresa) cuja superestrutura fosse o processo organizacional. Dessa forma, a conceituação de Gestão Empresarial deve ser desenvolvida com o conteúdo relacionado à organização e economia das empresas, ou seja, com a evolução da estrutura organizacional e com o processo de formulação das estratégias econômica e financeira das empresas. Para isso, tendo em vista as exigências dinâmicas da abordagem proposta, o desenvolvimento da parte introdutória da presente disciplina vai procurar relacionar as análises e proposições desenvolvidas em dois planos: - No plano em que predominam as relações “para fora” da empresa: buscando configurar o grau de autonomia da administração sobre o processo de geração/apropriação do excedente tendo em vista o conjunto ou a rede de relações inter-empresas ou inter-agentes econômicos em geral - “para trás" junto à cadeia de fornecedores; "para frente" junto à cadeia de distribuidores e clientes, etc. 144 - No plano em que predominam as relações “para dentro” da empresa: no sentido de configurar o grau de qualificação dos recursos humanos, dos processos, dos produtos e do conjunto ou da rede de relações intra-empresa, em especial a cadeia de relações da estrutura organizacional. A Gestão empresarial, portanto, tem sua ação referida ao movimento de acumulação de capital na unidade produtiva (na empresa). Tal movimento está relacionado com a geração continuada de um excedente, do qual a parcela apropriável pela empresa (que configura o seu potencial autônomo de acumulação) depende, em primeiro lugar, do montante do excedente obtido num dado período, e, em última instância, da estrutura financeira do capital utilizado (vale dizer, da utilização, em maior ou menor proporção, de capital de terceiros), e, de outro lado, de uma proporção fixa destinada ao pagamento do imposto de renda. A parcela apropriável do excedente gerado pode ser reinvertida, em maior ou menor proporção, na mesma unidade produtiva, configurando o que se chama de acumulação efetiva ou expansão do capital produtivo com recursos próprios. O processo acima descrito corresponde ao crescimento da firma que, em outras palavras, significa o aumento da sua capacidade produtiva e o incremento da sua participação no conjunto das vendas do seu mercado. Tal processo de expansão é inerente ao surgimento e permanência das unidades produtivas nos mercados e o seu ritmo, para cada unidade, irá depender das características estruturais e dinâmicas do mercado - em especial do padrão de concorrência que aí vigore - e da forma particular de inserção da unidade nesse mercado. IV. 1. 1. Ilustração do modelo integrado de gestão empresarial (ou gestão econômicofinanceira da empresa no mercado), baseado no processo de geração/apropriação do excedente produtivo Vejamos, com mais detalhe, uma ilustração dos principais aspectos práticos envolvidos na conceituação de gestão das empresas nos mercados com base no processo de geração/apropriação do excedente produtivo. Todos os desdobramentos mais relevantes da taxa de lucro a) Geração continuada de um excedente produtivo e a permanência/expansão da empresa no mercado: Rebatimentos dos principais processos decisórios nas variáveis concretas do movimento do dia-a-dia das empresas (v. Ilustração 1, na página seguinte) Os conceitos e relações utilizadas no Quadro 1 são os seguintes: a. Taxa de Lucro Total (t) t = LAJI/KT LAJI = Montante de Lucro (ou excedente) total Antes de subtrair os Juros e Imposto de renda, ou Lucro Total das operações produtivas. Ou seja, agregação do excedente independente da sua destinação final e da origem do capital utilizado. KT = Capital Produtivo Total (médio do período). Esta taxa corresponde ao ritmo em que está se processando o retorno (em bases anuais, por exemplo) do capital total utilizado no empreendimento. b. Margem de lucro (m) m = LAJI/RT LAJI = ver ítem anterior. 145 RT = Montante da Receita Total das vendas efetuadas no período. Corresponde à composição das quantidades vendidas com os preços correntes. Este indicador representa a lucratividade média das Vendas da empresa no período. c. Rotação do Capital Produtivo (r) r = RT/KT RT = ver ítem anterior. KT = ver ítem anterior. Esta relação corresponde ao índice de Capital-Produto da empresa ou ainda a uma das medidas da produtividade dos recursos aplicados no período d. Lucro total (LAJI) LAJI = RT - CT LAJI = v. itens anteriores RT = ver intes anteriores. CT = Custos Totais das atividades desenvolvidas no período. e. Capital Total KT = KF + KC KT = Capital Produtivo Total (médio do período). KF = Montante total dos recursos aplicados em Capital Fixo utilizado (médio do período). KC = Montante total dos recursos aplicados em Capital Circulante utilizado (médio do período). f. Receita total RT = (QVi * Pvi) RT = Montante da Receita Total das vendas efetuadas no período. Corresponde à composição das quantidades vendidas com os preços correntes. QVi = Quantidade total vendida do produto i no período. Pvi = Preço de Venda unitário corrente produto i. g. Custo total CT = CF + (Vi * Qpi) CT = Custos Totais das atividades desenvolvidas no período. CF = Custos Fixos Totais (conjunto dos gastos que independem do volume produzido ou vendido no período). Vi = Custos Variáveis unitários do produto i (conjunto dos gastos que dependem do volume produzido ou vendido no período). QPi = Quantidade total produzida do produto i no período. 146 Ilustração 1 PROCESSO DE GERAÇÃO DO EXCEDENTE PRODUTIVO REBATIDO SOBRE AS PRINCIPAIS DECISÕES POLÍTICAS E ESTRATÉGICAS OU: DETERMINANTES DINÂMICOS DO PROCESSO LUCRATIVO E DA GESTÃO DAS EMPRESAS NO MERCADO Análise da Margem de Lucro Funções: preços e custos unitários, "mark up", formas de inserção CUSTOS 1. Padrão Tecnológico: grau de exigências do FIXOS padrão de concorrência e inserção da empresa CF 2. Estrutura organizacional: grau de complexidade funcional e decisória CUSTOS TOTAIS 3. Especificação de: produtos, processos, etc. CT = CF + CV vi EXCEDENTE PRODUTIVO CUSTOS VARIÁVEIS LAJI = RT - CT CV = (vi * QPi) 4. Insumos materiais: volumes e qualidade 5. Insumos energéticos: volumes e qualidade 6. Relações c/ trabalhadores: qualificação e pol. Salarial 7. Comissões, fretes, impostos 8. Regime de produção: programado ("empurrado") ou QPi MARGEM LAJI / RT PREÇO DE VENDA DO PRODUTO i PVi TAXA DE LUCRO LAJI / KT sob pedido ("puxado" pelas vendas) 9. Política de estocagem: garantia de suprimento 10. Política de custeio unitário: Políticas e Sistemas de Custeio, ciclos de vida dos produtos, etc. 11. Grau autonomia p/ fixar preço: inserção da empresa RECEITA TOTAL RT =PVi * QVi) QUANTIDADE 13. Forma de inserção: líder, seguidora, etc. QVi 14. Padrão de concorrência: concentração, barreiras, etc. 15. Estratégia de "marketing": Clientes e Midia 16. Sistema de vendas: organização do esforço interno CAPITAL FIXO KF ROTAÇÃO RT / KT CAPITAL TOTAL KT = KF + KC CAPITAL CIRCULANTE Análise da Rotação do Capital Funcões: produtividade dos recursos Estrutura Técnica do Capital, Condições de Investimento e Financiamento 12. Estrutura de mercado: grau de competitividade VENDIDA 17. Capacidade de investir em inovações 18. Exigências do padrão tecnológico ENTRADAS E DESEMBOLSOS 19. Ritmo de obsolescência do "mix" tecnológico DE CAIXA 20. Fluxos de Receitas/Despesas (em moeda $) PRAZOS 21.Ciclos (prazos): produção, recebimento das vendas, KC pagamentos das despesas e custos, etc. ESTOQUES 22. Insumos, Produtos, componentes, partes, peças, etc. (garantia de suprimento e minimização de custos) 147 Ilustração 1.1 INDICADORES FUNDAMENTAIS PARA A ANÁLISE DE VIABILIDADE ECONÔMICA E FINANCEIRA: TAXA E MARGEM DE LUCRO; ROTAÇÃO K Análise da Margem de Lucro - Funções mais importantes: custos e preços unitários, "mark up" (poder de mercado), qualidade da venda ("mix"), base técnica: produção e organização Ganhos unitários (altos patamares de preços) versus Ganhos de quantidade (altos patamares de produtividade) MARGEM DE LUCRO m = LAJI / RT Margem (m) Rotação (r) (%) (n de vezes) o Taxa (t) = m * r (%) TAXA 0,5% 50,0 25,0% DE LUCRO 1,0% 25,0 25,0% t = LAJI / KT 2,0% 12,5 25,0% 5,0% 5,0 25,0% ROTAÇÃO DO CAPITAL 8,0% 3,1 25,0% 10,0% 2,5 25,0% r = RT / KT 12,0% 2,1 25,0% 15,0% 1,7 25,0% 20,0% 1,3 25,0% 25,0% 1,0 25,0% 30,0% 0,8 25,0% Legenda 35,0% 0,7 25,0% LAJI = LUCRO TOTAL = Lucro Antes dos Juros e I. Renda 40,0% 0,6 25,0% LAJI = RT - CT, sendo RT = Receita Total e CT = Custos Totais 45,0% 0,6 25,0% KT = CAPITAL TOTAL 50,0% 0,5 25,0% Análise da Rotação - Funções mais importantes: Produtividade e Estrutura Técnica dos Recursos, Volume das Vendas, Ciclos: operacional, produto e tecnologia O quadro acima ilustra uma característica típica da gestão da lucratividade dos negócios em diversos setores da economia, característica esta relacionada às possibilidades de centrar a estratégia competitiva em ganhos de volume ou em ganhos unitários. Por outro lado, as variáveis relacionadas ao processo decisório concreto no dia-a-dia da empresa, níveis de decisões e funções administrativas a que pertencem, estão detalhados abaixo. A numeração entre parêntesis que se segue corresponde à numeração que fecha a decomposição da taxa de lucro total na extremidade direita do Ilustração 1. a) CUSTOS FIXOS: O montante de gastos com custos fixos está relacionado à decisões quanto ao (1) padrão tecnológico utilizado e à (2) estrutura administrativa da empresa. Tais decisões, em geral, configuram situações de longo prazo e pertencem, portanto, aos níveis decisórios responsáveis pelas formulações das políticas e estratégias mais amplas do empreendimento. b) CUSTOS VARIÁVEIS UNITÁRIOS: tais custos, em cada produto, são tecnicamente invariantes ao nível da unidade produzida e referem-se, principalmente, aos gastos com insumos materiais e energéticos; com salários e encargos da mão-de-obra direta; com serviços produtivos fornecidos por terceiros. Estes gastos dizem respeito, portanto, às decisões relativas à (3) engenharia ou ao projeto do produto e dos processos de produção; às relações estabelecidas com (4) fornecedores de insumos materiais e (5) energéticos; às (6) relações estabelecidas com os trabalhadores diretos da empresa, tais como políticas salariais, de qualificação e/ou incentivo ao desenvolvimento das habilidades técnicas produtivas e (7) decisões que afetam outras esferas da gestão empresarial; De fato, este grupo de gastos afeta diretamente as decisões de políticas e estratégias vinculadas ao lucro operacional bruto do produto 148 (ou seu "mark-up") constituindo-se, portanto, em variável estratégica fundamental para o funcionamento dinâmico do empreendimento. c) QUANTIDADE PRODUZIDA: A quantidade produzida de cada produto da empresa está relacionada diretamente com as (8) políticas e estratégias de produção e (9) políticas e estratégias de estocagem de insumos materiais, componentes, partes, submontagens e produtos acabados, que afetam a dinâmica do sistema de produção utilizado. d) QUANTIDADE VENDIDA E PREÇO DE VENDA: relacionam-se com (10) a política de custeio unitário dos produtos (aos custos diretos da unidade do produto e a margem de contribuição unitária, ou aos custos unitários totais e a margem de lucro unitária atribuídos aos produtos dependendo do sistema de custeio utilizado); ao (11) grau de autonomia para fixação do preço de venda, que, por sua vez, depende da (12) estrutura de mercado onde atua a empresa, bem como da (13) sua particular forma de inserção neste mercado e do (14) padrão de concorrência que ali vigore. Além destas variáveis estratégicas com fortes graus de indeterminação interna à empresa, há ainda decisões relacionadas com (15) a sua estratégia de mercado ou de "marketing" e com o (16) sistema de vendas utilizado. e) CAPITAL FIXO: o montante, o padrão e a composição do Capital Fixo utilizado na unidade produtiva tem relação com a (17) capacidade de investimento em inovações técnicas; com a (18) grau de exigência do mercado quanto ao padrão tecnológico e com (19) o ritmo de obsolescência do "mix" tecnológico utilizado. f) CAPITAL CIRCULANTE: O montante e a estrutura do capital circulante utilizado depende das decisões de políticas e estratégias relacionadas aos prazos de (20) entradas e (21) saídas de caixa, bem como ao (22) volume de recursos aplicados em estoques - de produto acabado, insumos, etc.-, resultante ao sistema de produção adotado. As Ilustrações 2 e 3, mostram a decomposição dos resultados tendo em vista sua distribuição dentre os diversos agentes que se apropriam dos lucros das empresas, além de permitir a visualização do processo de reinversão do capital produtivo na unidade e processo de financiamento dos recursos utilizados. Os conceitos mais importantes são os seguintes (os números que aparecem entre parêntesis são aqueles que constam nas “caixas” do lado direito dos Ilustrações 2 e 3). 149 Ilustração 2 PROCESSO DE APROPRIAÇÃO DO EXCEDENTE PRODUTIVO, ACUMULAÇÃO PRODUTIVA POTENCIAL E EFETIVA COM RECURSOS PRÓPRIOS IMPOSTO DE RENDA I.R. LUCRO TOTAL LAJI = Lp + Lt + IR TAXA DE LUCRO TOTAL (t) LAJI / KT 1. POLÍTICA TRIBUTÁRIA E GESTÃO CONTÁBIL-FISCAL LUCRO DE TERCEIROS Lt = JUROS 2. TAXA DE JUROS REINVERSÃO LUCRO PRÓPRIO Lp 3. ACUMULAÇÃO EFETIVA C/ RECURSOS PRÓPRIOS DISTRIBUIÇÃO 4. POLÍTICA DE DIVIDENDOS APLICAÇÕES EXTERNAS 5. POLÍTICA DE DIVERSIFICACÃO DO INVESTIMENTO CAPITAL PRÓPRIO Kp 6. LUCROS ACUMULADOS 7. NOVAS INVERSÕES CAPITAL TOTAL KT = Kp + Kt CAPITAL DE TERCEIROS Kt 8. FINANC. CURTO PRAZO 9. FINANC. LONGO PRAZO Ilustração 3 ESTRUTURA FINANCEIRA E DECISÕES ESTRATÉGICAS DE FINANCIAMENTO DA EMPRESA TAXA DE LUCRO TOTAL (t) t = LAJI / KT TAXA DE LUCRO PRÓPRIA (tp) tp = Lp / Kp TAXA DE LUCRO DE TERCEIROS (j) j = JUROS / Kt tp= t + [ (t - j) * (Kt / Kp)] Taf = tp / t Taf = 1 + { [ (t - j) * (Kt / Kp) ] / t } t:j > = < RELAÇÕES DE ALAVANCAGEM FINANCEIRA ALAVANCAGEM POSITIVA (FAVORÁVEL) ALAVANCAGEM NEUTRA ALAVANCAGEM NEGATIVA (DESFAVORÁVEL) 10. Taxa de alavancagem financeira 11.Recursos III´s vantajosos nos limites do grau de endividamento 12. Recursos de III´s indiferentes à apropriação do lucro nos limites do endividamento 13. Recursos de III´s desvantajosos em qualquer hipótese de endividamento a) Na Ilustração 2 está ilustrado o processo de apropriação do excedente produtivo, representado pelas variáveis relacionadas ao processo decisório concreto no dia-a-dia da empresa, níveis de decisões e funções administrativas a que pertencem. b) Na Ilustração 3, está ilustrado o processo de decisão sobre as condições de financiamento (suprimento de recursos financeiros próprios ou de terceiros) da empresa, destacando o conceito de alavancagem financeira. c) Assim, na Ilustração 2, as parcelas componentes do lucro total (ou excedente bruto) correspondem ao imposto de renda, ao juros pagos pela utilização de capital de terceiros e ao lucro próprio. Tais 150 variáveis são indeterminadas internamente, pois a empresa não tem autonomia para decidir o montante de Imposto de Renda (1) que ela vai pagar no período, e os juros pagos dependem do volume de capital de terceiros utilizado (3) (que pode ser, em princípio, determinado no orçamento financeiro da empresa) e da taxa de juros (2), em geral não objeto de negociação em amplas faixas de captação de recursos no mercado financeiro. d) O montante de lucro próprio, que é um resíduo ou um resultado, não corresponde, de imediato, ao volume de recursos disponíveis para reinvestimento na empresa. A parcela reinvestida (4) é representada pelo que resta depois da distribuição dos dividendos (5) e das eventuais aplicações externas (6) permanentes ou temporárias. Dessa forma o potencial de expansão (ou acumulação) com recursos próprios, no período, é representado pelo volume destinado a reinversão. Tais variáveis pertencem ao plano de decisões estratégicas mais complexas da empresa, e competem, em geral, à alta direção do empreendimento. e) As estratégias relacionadas às variáveis ou relações de (7) a (9) na Ilustração 2 e de (10) a (14) na Ilustração 3, dizem respeito à administração econômico-financeira da empresa. Refletem decisões quanto à estrutura financeira do capital da empresa: a proporção entre o capital próprio - que pode ser fruto de reinvestimento de lucros obtidos no passado (7) e/ou resultado de novas inversões de capital dos proprietários (8) - e o capital de terceiros - composto por financiamentos de capital de giro (9), ou de curto prazo e financiamentos de capital fixo (10), ou de longo prazo - no capital total utilizado; tais decisões, por seu lado, dependem da disponibilidade de capital próprio e da taxa de lucro próprio, esperada ou efetiva, e da relação prevalecente ou prevista entre a taxa de lucro total do empreendimento e a taxa de juros paga pela utilização de capital de terceiros. As condições de alavancagem financeira (11) favorável (12), neutra (13) e desfavorável (14) observadas, formarão o pano de fundo para que a administração financeira decida sobre a estrutura de capital a ser praticada (em especial quanto à tomada ou não de recursos de terceiros), na perseguição dos objetivos estratégicos de curto ou médio prazo. 151 Identificação dos principais conceitos e indicadores estratégicos da gestão econômica e financeira das empresas nos demonstrativos contábeis (D.R.E. = Demonstrativo de Resultado do Exercício e B.P = Balanço Patrimonial)11 Quadro 6 Conceitos Excedente Bruto Capital Total Receita Total Custos Totais Custos Variáveis Custos Fixos Capital Circulante Capital Fixo Capital Próprio Cap. de Terceiros Juros Taxa de Juros Imposto de Renda Lucro Próprio Estoques Indicadores LAJI KT RT CT CV CF KC KF KP Kt J j IR Lp E Demonstrativo contábil D.R.E. B. P. D.R.E. D.R.E. B. P. B. P. B. P. B. P. D.R.E. não consta 7 D.R.E. D.R.E. B. P. Nomenclatura Contábil Lucro Operacional Ativo Operacional Receita Operacional Custos & Desp. Operacionais1 não consta 2 não consta 3 Ativo Circulante Operacional4 Ativo Operacional (Imobilizado Bruto) Patrimônio Líquido Saldo de Financiamento 5 Despesas Financeiras 6 I. R. devido Lucro líquido Estoques 1. Corresponde ao conjunto dos custos (Custos dos Produtos Vendidos) e das despesas operacionais (Despesas Administrativas, Despesas com vendas, impostos sobre vendas, outros impostos, outras despesas operacionais). 2. Pode ser obtido por aproximação e corresponderia ao conjunto dos custos dos produtos vendidos, comissões sobre vendas e fretes, entre outros custos variáveis. 3. De maneira análoga pode ser obtido por aproximação pela diferença entre os custos totais e os custos variáveis. 4. Corresponde ao conjunto dos saldos disponíveis (Caixa e Bancos), outras disponibilidades operacionais, duplicatas a receber, estoques, adiantamentos a fornecedores e outros financiamentos concedidos. 5. Saldo de financiamentos vigentes para o Capital de Giro e Capital Fixo. 6. Despesas financeiras decorrentes de financiamentos do capital de giro. 7. Corresponde, aproximadamente, ao volume de despesas financeiras relacionado com o volume médio de capital de terceiros utilizado, no período, para financiamento do capital de giro (estimado pelo saldo de financiamento de capital de giro que se encontra no passivo comercial) 11 A quantificação das principais categorias e indicadores apresentados nas páginas anteriores, pode ser obtida a partir dos demonstrativos contábeis da empresa, tais como o Balanço Patrimonial e o Demonstrativo de Resultado do Exercício. As dificuldades para obter valores fidedignos como se sabe, advém do fato - conhecido - dos demonstrativos contábeis se constituírem em instrumentos de natureza fiscal e tributária, nem sempre os mais adequados para espelhar realidade econômica e financeira das empresas; ademais, há a necessidade da conversão de valores monetários (expresso em moeda corrente) de distintos períodos - ao longo de um ano, por exemplo - em valores constantes (descontada a inflação) o que possibilita a operação (adição ou subtração) de tais valores, além de tornar viável a realização de análises comparativas no tempo. 152