NPI-FMR PROPOSTA DE UM MODELO DE ORGANIZAÇÃO DA COMERCIALIZAÇÃO DE PRODUTOS AGRÍCOLAS ATRAVÉS DO FINANCIAMENTO POR FAMÍLIAS URBANAS COMO COMPLEMENTO DO ORGANISMO AGRÍCOLA NA GRANDE SÃO PAULO Gustavo Mussato Gonçalves UNIP – São Paulo Desde a formação das cidades, a relação entre campo e urbe se fez em função desta e em detrimento daquele. A partir do momento em que as pessoas passaram a viver aglomeradas num espaço, formando as cidades, passaram também a atrair para estes locais as inúmeras atividades que antes pertenciam ao campo, restando a este, por fim, apenas as atividades mais primárias, relacionadas ao cultivo do solo, devido à não existência de espaço hábil nos centros urbanos para tal. Com isso, muitas pessoas (mão-de-obra) também se viram atraídas pelas novas oportunidades de emprego. Logo, os agricultores puderam começar a produzir excedente para sustentar a grande massa populacional que se formava e não tinha mais como produzir seus próprios alimentos. Porém, em conseqüência à especialização das atividades veio o avanço tecnológico e as cidades começaram a transformar (industrializar) a matéria-prima obtida do campo. Desta forma, os agricultores forneciam produtos a preços relativamente baixos, mas tinham de adquirir, para satisfação de suas necessidades, produtos a preços geralmente mais elevados, o que acarretou no aumento da diferença entre ambos. Com a chegada da industrialização, do modo como isso ocorreu na América Latina, o cidadão do campo foi mais uma vez deixado de lado. Devido a própria localização geográfica, São Paulo se constituiu desde o princípio um grande centro populacional, se comparado ao restante do país. Portanto, no começo do século XX, assim como o Rio de Janeiro, Recife, Porto Alegre, e outras poucas capitais, ali se formou um polo industrial, principalmente por oferecer concentração de mão-de-obra, mercado consumidor e facilidade para distribuição das mercadorias. O morador das áreas rurais foi mais uma vez ignorado, pelo fato da indústria ser uma atividade eminentemente urbana e, também pelo fato de já naquele tempo possuir um baixo poder aquisitivo em relação aos moradores das cidades. Assim se viu mais uma vez a lacuna entre cidade e campo ser aumentada até porquê os investimentos que poderiam melhorar a vida no meio rural, se voltaram para a nova atividade, por exemplo com ampliação e melhoria da malha viária e outras benfeitorias relacionadas à infra-estrutura. Revista Núcleo de Pesquisa Interdisciplinar, São Manuel, 10/05/2006. http://www.fmr.edu.br/npi_2.php. 4p. 2 Pela situação que se formou no campo e o grande desenvolvimento das cidades, ocorreu um enorme esvaziamento no meio rural e consequentemente um inchaço do meio urbano. Todavia este não conseguia absorver tamanho contigente de mão-de-obra e isso acabou formando uma enorme população “marginalizada”. Na primeira metade do século XX São Paulo recebeu um grande número de imigrantes, principalmente europeus que procuravam se refugiar. Logo depois a cidade se tornou um polo receptor de migrantes de todo o Brasil, que vinham atrás de melhores condições de vida e do “sonho da cidade grande”. Desta forma a capital paulista atingiu um crescimento exagerado e sem planejamento, que saiu do controle das autoridades e o governo não tinha mais condições de, acompanhando o desenvolvimento, oferecer condições de uma vida digna aos habitantes. Essa nova forma de vida que se constituiu em enormes massas populacionais vivendo aglomeradas, “possibilitou/exigiu” a criação de métodos e meios de comunicação que pudessem controlar as pessoas e instiga-las ao consumo, para dar um fim lucrativo a todo o excesso de produção que a industrialização possibilitava. Assim foram criados os jornais, telefone, rádio, televisão, internet e também a propaganda, etc. Com o passar dos tempos, o avanço tecnológico também atingiu a agricultura, que precisava aumentar sua produção de forma a sustentar os grandes centros urbanos que se formaram no mundo após a industrialização. Sendo assim, os agricultores começaram a utilizar novas técnicas relacionadas diretamente com o cultivo e o manejo animal, mas também passaram a usar insumos químicos que num primeiro momento revolucionaram a produção agrícola, aumentando de forma significativa as quantidades produzidas. Contudo, o tempo (inclui-se aqui inúmeros resultados de pesquisas científicas) veio provar que tal prática não era tão compensadora quanto se imaginava, já que o uso de fertilizantes e defensivos químicos se mostrou prejudicial à saúde. Com a chegada, nos últimos anos, de grandes redes varejistas a São Paulo, ficou cada vez mais difícil para os agricultores entrarem ou se manterem no mercado, já que a concorrência se tornou grande e desleal e não existe nenhum comprometimento dos supermercados com esse ou aquele produtor. Comumente é possível se ouvir de agricultores do entorno da capital paulista que para se amenizar os prejuízos pelos baixos preços pagos pelas grandes redes, muitos deles chegam ao absurdo de optar por arar a terra antes de realizar 3 a colheita, pois não obteriam renda suficiente para pagar por todo o processo de produção e ainda transporte, etc. O modelo econômico capitalista que o mundo adotou, favoreceu a concentração de renda e atualmente 20% de pessoas possui 80% do capital mundial e os outros 80% da população sobrevive com os 20% de capital restantes. Dessa grande maioria de pessoas, um número enorme vive em estado de miséria. Porém, apesar das grandes empresas deterem o controle mercadológico mundial e também o poder sobre os meios de comunicação, nas últimas décadas, a população do planeta de modo geral vem tomando consciência gradativamente sobre as drásticas conseqüências ocasionadas pelo atual sistema econômico e os problemas sócio-ambientais que ele provoca. Por isso, já a partir do pós II Grande Guerra Mundial, inúmeros projetos começaram a surgir como forma de reverter essa situação. A princípio, algumas instituições - principalmente de cunho religioso - de países do Norte ocidental começaram a comercializar produtos agrícolas e artesanais de países pobres do Sul a preços chamados justos, ou seja, ao invés de continuar com um sistema de ajuda paternalista e que nunca se mostrou sustentável, passaram a comprar os produtos com a preocupação de que os preços pagos fossem realmente suficientes para atender ás necessidades do produtor e do processo de produção, para criar sustentabilidade em todo o processo produtivo, de uma ponta a outra. Praticamente ao mesmo tempo, no Japão, à partir da preocupação de donas-de-casa com a escassez de produtos típicos da região, ou livres de agrotóxicos, surgia uma forma de comércio na qual famílias urbanas se comprometiam a comprar a produção de agricultores e em contrapartida estes se comprometiam a produzir conforme o planejamento feito em conjunto com as famílias da cidade. Nos últimos anos se formou, nos Estados do Sul do Brasil, uma rede de produção e comercialização que presa pelo relacionamento direto entre agricultores e consumidores. Todas esses modelos estão atualmente ligados ao movimento de agricultura orgânica e familiar e, apesar das dificuldades que toda mudança traz, têm conquistado bons resultados. Com isso pode-se notar que a necessidade de mudança existe, já que a situação chegou ao limite. Diversos modelos espalhados pelo mundo mostram que tal mudança é possível, basta se analisar as formas que melhor se enquadram ao ambiente de São Paulo e ter “flexibilidade” durante o processo, para acompanhar o dinamismo da economia e alcançar 4 assim uma melhor distribuição de renda e métodos de produção que sejam o mínimo possível agressivos ao meio ambiente, proporcionando condições para que a vida no planeta possa ter continuidade de uma maneira saudável.