NOVAS TECNOLOGIAS
EVOLUÇÃO OU REVOLUÇÃO NA PILOTAGEM
Por todo o mundo, é consciência generalizada dos pilotos da barra, de que o futuro do serviço
de pilotagem assenta na capacidade de fornecerem, aos portos e aos seus utilizadores, um
serviço da mais alta qualidade. Entendem também, que isto só é possível através de uma
aprendizagem e evolução constante.
As novas tecnologias de navegação estão a transformar radicalmente a natureza da pilotagem.
Nas últimas décadas, o aumento das dimensões dos navios, assim como da sua capacidade de
carga, reduziram as margens de erro, aumentando simultaneamente as exigências técnicas,
operacionais e comerciais. A aquisição de competências e capacidades, para utilizar as novas
tecnologias disponíveis, em conjunto com processos de formação e treino exigentes, de forma
a permitir um acompanhamento das evoluções futuras, tornaram-se parte integrante do papel
do piloto nos tempos de hoje.
O papel crucial do piloto da barra sempre exigiu, da parte dos seus profissionais, capacidades
específicas e especializadas. Por todo o mundo, as associações de pilotos estão, cada vez mais,
a focalizarem-se na tecnologia especializada dos PPU (Pilot Portable Units), para aumentarem
os níveis de desempenho dos seus pilotos e para os ajudar a evitar acidentes.
Mais de que um equipamento de “hardware”, os PPU’s são uma combinação de sistemas, mais
ou menos desenvolvidos, em função do conjunto das necessidades e exigências específicas de
cada área de pilotagem, numa configuração própria, estabelecida pelo serviço de pilotagem
local. A grande questão centra-se no facto de que, cada grupo de pilotos tem de definir e
estabelecer as suas necessidades, em função das características e exigências do seu porto,
desenvolvendo depois a arquitectura de sistema adequado aos requisitos identificados.
Posto nestes termos, a expressão revolução parece ser a mais adequado ao contexto actual.
Tendo como referência uma visão antiquada e muito simplista, que não é a real, um “piloto à
antiga” quer simplesmente estar na ponte do navio, com o seu equipamento de “VHF”, a olhar
para o exterior, com o apoio via rádio da estação de pilotos ou do VTS, e basear a sua actuação
nos seus sentidos e conhecimentos, fornecendo instruções curtas e precisas.
De facto, este piloto tem vindo a executar um grande trabalho, com eficiência e segurança,
sem estar “online”e sem qualquer PPU ou ajuda electrónica de relevo. Para ele, um PPU
representa mais peso físico (que complica o embarque e/ou o desembarque), ter que saber
operar com computadores ou “smartphones”, saber como tirar informação do seu
equipamento, analisar muito mais informação disponível, ter que aprender a trabalhar com
softwares de navegação, lidar com “Pilot-Plugs” e questões relacionadas com sensores na
ponte dos navios. Essencialmente, receia bastante que lhe seja exigida muita concentração no
computador em detrimento da pilotagem, do navio ou do comandante. Tem pois, tendência a
ver este tipo de equipamentos, como “brinquedos” que são engraçados de ter, que fazem os
pilotos parecerem modernos, mas desnecessários.
Esta não é, de facto, a imagem do piloto actual. Os softwares de navegação direccionados para
a pilotagem existem e são utilizados já desde 2004, um pouco por todo o mundo, com o
envolvimento determinante dos pilotos na sua concepção e desenvolvimento. Num futuro
muito próximo, irão desaparecer as cartas de navegação em suporte de papel, a utilização de
computadores e “smartphones” é cada vez mais corrente, e os sistemas existentes
actualmente fornecem toda a informação que um piloto pode precisar durante um acto de
pilotagem, a níveis de qualidade, precisão e fiabilidade até há poucos anos impensáveis, de
uma forma cada vez mais perceptiva e amiga do utilizador. Todos os pilotos se sentem muito
mais confortáveis a olhar, também, para um ECDIS, ou um PPU, em situação de nevoeiro ou na
manobra de navios de grande porte.
Por tudo isto, os pilotos da barra precisam e querem ter, melhor informação em tempo útil.
Não podem, nem querem, abandonar os princípios de actuação que serviram de suporte à sua
actividade ao longo dos tempos. A melhor escala para pilotar é a de 1:1, para tal o olhar para o
exterior da ponte de navegação é essencial, a capacidade de avaliar e decidir rapidamente,
fruto do conhecimento adquirido, treino prático e da experiência, é insubstituível. Qualquer
sistema que incorpore tecnologias de navegação e manobra representa só, mais uma
ferramenta de trabalho ao dispor do piloto para levar a cabo a sua actividade.
Este enquadramento leva-nos a concluir que estamos perante um processo de evolução da
actividade do piloto, à imagem do que outrora representaram outros equipamentos como a
girobússola, o radar e mais recentemente o AIS, por exemplo.
No entanto, não será de todo descabido falar em revolução, uma vez que a dinâmica criada,
exigirá uma grande modificação nos métodos de trabalho e organização, com novas
ferramentas de trabalho e constantes desenvolvimentos tecnológicos. Também nesta área, os
profissionais da pilotagem dos portos não se deixaram ultrapassar. Através das suas
organizações, eles têm liderado, um pouco por todo o mundo, processos de certificação de
qualidade (ISO) dos seus serviços, tendo mesmo criado uma norma própria direccionada às
organizações de pilotagem (ISPO), promovendo e desenvolvendo profundas alterações nos
seus métodos de trabalho e funcionamento, com uma visão virada para o futuro, numa
perspectiva de evolução constante e acompanhamento de todas as inovações.
O grande desafio da utilização dos PPU’s, com toda a sua carga tecnológica, reside no
equilíbrio ou balanço, que tem que ser constantemente feito, entre a mais-valia do
equipamento, como auxiliar para a execução do serviço de pilotagem, a sua
operacionalidade/portabilidade (peso, facilidade de utilização, etc.) e o seu custo.
Há que ter sempre presente que, o objectivo é fornecer ao piloto uma ferramenta extra, que
promove um maior nível de segurança e prevenção de acidentes e incidentes, ao mesmo
tempo que aumenta substancialmente as eficiências operacionais, do serviço e do piloto,
potenciando assim resultados comerciais favoráveis. De nada servirá ter um equipamento com
performances admiráveis, se depois o piloto não for capaz de o transportar para bordo, ou no
inverso, ter um aparelho extremamente portável, mas que se limita a fornecer informação que
é facilmente obtida pelos meios tradicionais. Por outro lado, o factor económico tem também
um peso importante na escolha ou nas opções seleccionadas.
O percurso evolutivo destas tecnologias tem sido absolutamente fabuloso. Nos últimos anos,
em resultado de alguns projectos de investigação, principalmente da Comunidade Europeia,
com destaque para o IPPA (Innovative Portable Pilot Assistence) que decorreu entre 1998 e
2002, e que foi, claramente, o grande ponto de partida para o desenvolvimento dos PPU’s, e
mais recentemente para o projecto MarNis (Maritime Navigation and Information Services)
que terminou em fins de 2008, que deu mais um grande contributo decisivo, com a concepção
do POADSS (Portable Operational Approach and Docking Support System), aliado ao
envolvimento de algumas organizações de pilotos, em especial na Europa, os equipamentos de
topo actualmente disponíveis, conseguem apresentar características físicas e operacionais
absolutamente incríveis.
Em termos gerais, estão normalmente disponíveis dois níveis de equipamento. Uma versão
leve, em que o piloto está dependente dos dados de posicionamento fornecidos pelo navio
(através de ligação à Pilot Plug), em que a precisão da posição é limitada ao GPS do navio,
sendo os dados exteriores obtidos através do AIS do navio. É possível, no entanto, com o
recurso a uma ligação de banda larga via internet, obter todos os dados, também, através da
estação VTS.
Para situações mais exigentes, os equipamentos de primeira linha existentes hoje, na versão
completa, incorporam nos seus sistemas uma interface igual aos sistemas utilizados nas
estações VTS, fornecendo ao piloto a bordo do navio, a imagem de tráfego existente nos
monitores destas estações, com dados meteorológicos e hidrográficos, tudo em tempo real,
com batimetria dinâmica, incluindo sondagens de alta densidade. Toda a informação existente
do porto é assim posta à disposição de quem de facto, a qualquer momento, dela necessita.
Estes equipamentos utilizam sistemas de posicionamento integrados e independentes GNSS
(GPS e GLONASS), RTK (Real Time Kinematice) e sensores de movimento inerciais. Conseguemse rigores na posição da ordem dos dois centímetros no plano horizontal e de três centímetros
no plano vertical, o que, associado a sistemas de cálculo dinâmico do resguardo por debaixo da
quilha, fornece uma segurança apreciável, principalmente em situações de trânsito de navios
em que o calado está próximo dos limites de profundidade da área onde navegam.
Para além da posição, estes equipamentos fornecem dados de movimento, com rigores e
sensibilidades superiores à percepção humana, com destaque para o RoT (Rate of Turn) de um
décimo de grau por minuto, assim como o rigor de um centímetro por segundo na velocidade,
tanto da proa como da popa do navio, em situação de manobra.
De facto, a tecnologia existente já permite que o piloto tenha à sua disposição, toda a
informação existente no porto, de uma forma completamente autónoma do navio (baterias
com doze horas de autonomia), e com uma apresentação bastante amiga do utilizador, com
formatos desenvolvidos especificamente para o serviço de pilotagem. A questão que se
levanta imediatamente tem a ver com a portabilidade deste tipo de equipamento. Como
resultado dos imensos esforços dos fabricantes, já existem soluções integradas, em
funcionamento, com pouco mais de quatro quilos de peso, apresentando dimensões
compatíveis com uma mochila transportável às costas. Este é um dos factores de maior
preocupação para os pilotos, uma vez que o momento do embarque ou desembarque, de ou
para a lancha de pilotos, constitui um momento de verdadeiro risco para a integridade física
destes profissionais, especialmente em condições meteorológicas desfavoráveis.
Com o evoluir constante da tecnologia, é espectável que, sem comprometer a
operacionalidade, fiabilidade e resistência dos equipamentos, seja possível encontrar soluções
mais compactas e leves, no entanto, as características apresentadas pelos sistemas de topo
dos dias de hoje, já deixaram, no mínimo, de ser desencorajadoras para a generalidade dos
pilotos relativamente ao seu transporte para bordo dos navios.
Uma nota final para aquele que costuma ser o elemento decisivo em praticamente todos os
processos; o custo. Tudo depende da complexidade dos sistemas ou opções pretendidas, nas
versões mais completas o preço é ainda bastante elevado, no entanto, a tendência será de
redução gradual dos custos com a utilização cada vez mais massiva destes equipamentos por
todo o mundo.
O recurso às novas de tecnologias, na navegação marítima, está na ordem do dia nas instâncias
internacionais. Um pouco por todo a parte, surgem fóruns e grupos de trabalho que se
debruçam sobre esta temática. Desde o final de 2005 que a própria IMO tem um novo item
nos programas de trabalho dos Subcomités “Safety of Navigation (NAV)” e
“Radiocommunications and Search and Rescue (COMSAR)”, denominado E-Navigation. O
objectivo é desenvolver uma visão estratégica para a utilização de ferramentas electrónicas de
navegação, de uma forma sistemática e global, reduzindo os acidentes de navegação e
limitando a possibilidade de erros e falhas, com um sistema preciso e económico. A ideia base
é pois aquela que já foi expressa anteriormente. Garantir um elevado nível de segurança e
prevenção de incidentes, aumentando a eficácia operacional com resultados comerciais
favoráveis.
Em jeito de conclusão, as novas tecnologias representam para o serviço de pilotagem - mais do
que uma revolução ou evolução - um desafio de actualização constante das suas ferramentas
de trabalho, sempre no sentido de potenciar e valorizar o factor humano, essencial nesta
actividade específica e altamente especializada, de importância capital para sector marítimo
portuário.
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