PANORAMA HISTÓRICO E SOCIAL DA LITERATURA EM LÍNGUA ESPANHOLA AULA 01: ORIGENS DA LITERATURA EM LÍNGUA ESPANHOLA, IDADE MÉDIA E PRÉ-RENASCIMENTO TÓPICO 03: A PRODUÇÃO LITERÁRIA O descobrimento em 1948, das jarchas, pequenas estrofes compostas no romance falado pelo mozárabes ( mescla de cristãos e árabes.) que eram cantados pelas pessoas do império Al-Andaluz, marcam as primeiras letras da península. Como nos indica Pedraza y Rodríguez (2000), nas jarchas: Oímos la voz de una mujer que casi siempre canta el mal de amores provocado por la ausencia o enfermedad del amado. Estos desgarrados lamentos, que Fonte [1] expresan la angustia de la soledad y el abandono, van dirigidos al amigo, o a la madre, hermanas o compañeras con quienes la joven desahoga sus penas (pág. 30). Com o rei Alfonso X, encontraremos uma narrativa estimulada por ele e muitas vezes produzida por aquele monarca. É a chamada prosa histórica, com as crônicas e textos jurídicos. Estes últimos sem nenhum valor estético. Já a narrativa histórica das crônicas como o texto de 1274, Estoria de España, apresenta um novo valor estético de acordo com o que os autores acima citados nos dizem: Frente a la sequedad y la prosa escueta de las crónicas anteriores, estas obedecen a un criterio estético. En medio de su sencillez, el lenguaje tiene una poderosa eficacia expresiva. OS CANTARES DE GESTA E O CANTAR DE MIO CID A empreitada da reconquista empreendida pelo reino central de Castilla fará surgir na literatura espanhola um personagem que perdurará até depois da idade média: o cavaleiro. Dada a necessidade de reiteradas batalhas contra os mouros do Al-Andaluz, os reinos contaram com os cavaleiros que serviam à coroa, à figura do rei, de maneira fiel e brava. As narrações destas batalhas, das aventuras destes cavaleiros, se concretizaram nos cantares de gesta. Fonte [2] Os cantares de gesta têm um caráter eminentemente popular. São definidos como: Relatos en verso, de composición oral, en los que se exaltan las hazañas (gestas) de héroes estrechamente vinculados a la colectividad a la que se destina el poema. A través del juglar, desempeñan un importante papel social, pues además de servir de diversión, sustituyen en cierta medida a unos medios de comunicación que entonces no existen (PEDRAZA y RODRÍGUEZ, 2000, p. 31). De fato, a separação entre os textos históricos e de ficção resulta difícil nos primeiros anos de desenvolvimento da prosa. Os textos narrativos ficcionais muitas vezes se estabelecem da corrupção da narrativa histórica. Assim, é importante considerar que os textos anteriores de prosa jurídica e histórica do período de Alfonso X, são importantes para a formação de uma linguagem apta a ficção literária posterior (GONZÁLEZ, 2010). É a partir desta formação da prosa marcada pela mescla entre realidade e ficção que surge o texto considerado inaugural de uma nova estética narrativa: El Cantar de Mio Cid, pertencendo a uma estética chamada “Mester de Juglaría(Oficio de Juglares)”. O texto anônimo, Cantar de Mio Cid, que narra os feitos de um personagem histórico, Rodrigo Díaz de Vivar (El Cid), não tem data acordada entre os pesquisadores que divergem quanto a isso. De qualquer modo, podemos enquadrá-lo no final do século XII ou princípios do XIII. O texto é importantíssimo por duas razões: sua antiguidade e seu valor estético. Fonte [3] Como se disse anteriormente, ainda não existia a imprensa, assim, a comunicação não tinha as facilidades advindas da criação de Gutenberg. As gestas espanholas cumpriam um papel social muito importante, como temos afirmado. Tal papel condicionou seu estilo: Es tan obvia la relación épica-propaganda-clase dominante-héroe, que el género ejemplifica de modo paradigmático el hecho de que las ideas dominantes en una época determinada sean las de la clase entonces dominante. La épica es un arte público, oral y juglaresco, y subsiste como tal mientras subsiste la sociedad a que pertenece, el mundo cerrado y orgánico del feudalismo, mientras no se produce la fragmentación de este sistema (AGUINAGA, PUÉRTOLAS &ZAVALA, 2000, p. 62). O povo sentia, assim, a necessidade de conservar sua história e, sem dominar a linguagem escrita, o fazia cantando. A linguagem, pois, era arcaizante, de uma composição que nos chega depois de várias reescrituras do texto ao longo do tempo. As idéias se reiteram excessivamente através de uma linguagem que as repete. Para terminar, pois não é a intenção, como já foi dito anteriormente, aprofundar-se nas considerações, já que as disciplinas de literatura tratarão de detalhar mais, terminaremos esta descrição dos cantares de gesta com uma última informação sobre a importância destes textos: A épica castelhana se distingue nesse contexto, em função de sua maior proximidade cronológica com os fatos históricos. Dessa maneira, há menos espaço para a fantasia e numerosos elementos aparecem próximos à realidade histórica que os inspirou; da mesma maneira, a realidade geográfica é representada com maior fidelidade (GONZÁLEZ, 2010, p. 95). Deste modo, as gestas cumprem um papel fundamental, embora sendo consideradas obras de ficção, de registro histórico da sociedade da época. MESTER DE CLERECÍA O século XIII trará em oposição ao mester de juglaría outra estética: o Mester de Clerecía ( Oficio de Clérigos.) . Trata-se de uma poética culta, com cuidados formais como o uso do verso alexandrino ( de 14 sílabas.) e a chamada cuaderna vía ( estrofes de quatro versos com rima consonântica comum.) . Por ter sido feita em sua maioria absoluta por homens do clero, os temas costumam ser de caráter religioso com um fundo de moralidade. Fonte [4] Lembre-se que estamos na idade média, quando o poder da Igreja Católica era o maior em termos culturais e religiosos e que se impunha à sociedade. Como resposta aos cantares feitos pela população, de cunho popular e secular, os clérigos tratavam de escrever histórias que tratassem do sagrado e da moral, para lembrar às pessoas de Deus e de seus valores, que estavam, então, no centro da cultura. Embora se chame sempre atenção para que as pessoas não se enganem, crendo que os valores clássicos do império romano e de sua cultura desapareçam da noite para o dia, e que somente voltem a aparecer com a queda de Constantinopla, marcando o final da idade média; é importante recordar que “la Historia no posee bisagras”, com as palavras de González (2010), para que se movam e o que estava detrás da porta desapareça. O uso de uma métrica clássica como a alexandrina e a cuaderna vía, pelo mester de clerecía, mostra bem isso. Como expressão desta estética, pode-se apontar dois autores, cujos textos destacar-se-á para uma leitura no próximo tópico da aula: Gonzalo de Berceo y el Arcipreste de Hita. O que fizeram os autores do mester de clerecía foi elencar elementos do popular cantar de gesta e enquadrá-los sob uma estética mais culta. Exemplo disso é Gonzalo de Berceo que, de acordo com Pedraza y Rodríguez (2000), é o primeiro poeta espanhol cujo nome se tem notícia. Os autores citados consideram a Berceo: […] un juglar a lo divino, que aplica los recursos propios de los cantares de gesta para captar la atención del receptor. Las figuras de los santos que exalta son equiparables a las de los héroes épicos. Utiliza un lenguaje coloquial que permite hacerse entender por todas las gentes iletradas. Se atiene siempre a la regularidad de la cuaderna vía, con escasas imperfecciones (2000, p. 41). Gonzalo de Berceo é conhecido como autor dos Milagros de Nuestra Señora, obra composta por uma introdução e por vinte e cinco poemas que contam milagres atribuídos à Virgem Maria. Como definem os autores que se cita acima, sua linguagem é simples e hoje se vê seus textos como uma forte propaganda escolástica, com bastante apelo popular e que buscava tocar exatamente as pessoas mais simples, deixando-as convencidas dos valores eclesiásticos que defendia: Quiero fer una prosa en román paladino, en el qual suele pueblo falar a su vecino. Traduzindo: “Quiero hacer un poema en lengua vulgar, / en la cual suele el pueblo hablar con su vecino”. Estes dois versos de Berceo mostram a influencia social interagindo de maneira decisiva na estética e temática de sua obra. Como as pessoas mais simples não falavam latim, os clérigos passaram a escrever na língua vernacular, em castelhano. De qualquer modo, Berceo conseguia seu intento através do manejo hábil, com as palavras de Aguinaga, Puértolas Zavala (2000), do respeito e temor que as massas analfabetas sentiam pela letra escrita. Mais adiante, após mostras dos versos do poeta espanhol, os autores sentenciam: “Queda así claro el propósito del “ingenuo ” y “ primitivo (Os termos ingênuo e primitivo pertecem à crítica desavisada do poeta que interpretou alguma vez a simplicidade de sua linguagem como sendo descuido.) ” poeta: servir a los intereses económicos de su cenobio.” A mostra dos poemas é a seguinte: si estos votos fuessen lealmente enviados, estos santos preçiosos serien nuestros pagados; avriemos pan e vino, temporales temprados, non seriemos commo de tristiçia menguados. (Si estos votos fuesen lealmente cumplidos, / estos santos preciosos estarían contentos de nosotros, / tendríamos pan y vino, tiempo templado, / no estaríamos, como estamos, llenos de tristeza) Fragmento e tradução tirados de: AGUINAGA, PUÉRTOLAS &ZAVALA, Historia Social de la Literatura Española vol. I. Madrid: Ediciones Akal S.A., 2000. Observemos a exortação que faz o clérigo em seus poemas para que as pessoas façam doações e ofertas à igreja, para que os santos fiquem satisfeitos e ajudem em suas necessidades. O TEATRO PRIMITIVO CASTELHANO A verdade é que os autores concordam que não se pode falar de um teatro medieval espanhol, pois quase não há documentos teatrais da época inicial das letras castelhanas. Das pouquíssimas encontradas até hoje, está Auto de los Reyes Magos, de autoria desconhecida e datado do final do século XII, começo do XIII. Imcompleta, a peça se centra no episódio bíblico dos reis magos a Jesus Cristo. Correto será dizer que a primeira grande obra Fonte [5] teatral em língua castelhana será La Celestina, já na alvorada do Renascimento, do qual se falará adiante. O ARCIPRESTE JUAN RUIZ E O LIBRO DE BUEN AMOR Fonte [6] Ante o início do ocaso do sistema feudal, no século XIV, surge a obra mais complexa e polêmica da Idade Média Espanhola, extraordinária por vários aspectos: pela maturidade de seu estilo, pelos diversos temas inseridos nela e por seu registro sócio-histórico: El libro de Buen Amor, de Juan Ruiz. O século XIV é marcado pelo início da crise do sistema feudal. Muitos foram os acontecimentos que levaram a esta crise, conforme nos indica Aguinaga, Puértolas Zavala (2000, p. 97-99): 1. As sucessivas pestes que assolaram a Europa; 2. A fuga dos camponeses para as cidades, devido as pestes; 3. A falta de mão de obra para o trabalho nos campos e manutenção do estilo de vida feudal; 4. Pela primeira vez, ocorrem imposições de condições para sua atuação no trabalho, por parte dos camponeses aos proprietários, registrando-se assim as primeiras reivindicações sociais da história; 5. Incapacidade da classe dominante tradicional para controlar e explorar a força de trabalho camponesa; 6. Aumento do comércio e da atividade monetária nas cidades; 7. Um cisma da igreja católica que, em determinado período, chegou a ter três diferentes papas ao mesmo tempo, cada um respondendo aos interesses dos poderes presentes na Europa, debilitando o poder da igreja; 8. Deterioração das relações sociais, servis e paternalistas em que os seres humanos viviam suas vidas como imutáveis e estáveis. É exatamente neste momento de crise do sistema feudal que aparecem pela primeira vez manifestações subjetivas na literatura, que não estão ligadas ao mundo exterior ou às relações do homem com este mundo, senão com sentimentos como solidão, angústia e insegurança. Desta forma, o Libro del Buen Amor, do Arcipreste de Hita, aparece como documento de extrema importância de manifestação desta crise nas páginas literárias. Muitos estudiosos incluem o livro de Juan Ruiz na estética do Mester de Clerecía ( por isso o fizemos no tópico “Panorama”, no início da aula.) , contudo, a polêmica que envolve o texto do sacerdote faz com que haja grandes divergências quanto a esta inclusão. O que causa a polêmica é a inserção no texto, por parte do autor, de múltiplos elementos das culturas que povoavam a península e, claro, o território castelhano; como consequência, há uma mescla dentro do texto de episódios de elevado erotismo para a época narrados pelo autor e, em contraponto, histórias voltadas para a religiosidade. A existência, em um mesmo livro, de situações tão distintas levou a anos de discussão sobre o objetivo de Ruiz em mesclar tantas diferenças. Uns o vêem como um cínico que põe nas páginas de seu livro suas aventuras amorosas; outros o vêem como defensor da moral, usando histórias mais eróticas para defender a vida redimida e religiosa; e alguns, como o professor González (2010), dizem: Antes do que discutir a finalidade, didática ou não, moralizante ou não, do livro do Arcipreste, atente-se para o seu papel, como texto literário que é, dentro de determinadas coordenadas históricas [...] num meio cristão com fortes inferências mulçumanas e hebraicas (p. 125). Assim, o livro, com sua pluralidade de elementos, sendo um impressionante exemplo da conjunção das várias culturas, própria de Castilla, dá um passo importante para a modernidade, por trazer à baila uma discussão sobre a existência humana para além de sua relação com Deus. Pela primeira vez, um autor fará uma autobiografia, que não se preocupa com a salvação da alma como nos textos de Berceo ou com a temática de narrar as aventuras de um cavaleiro, como nos livros de cavalaria. As personagens femininas, que no texto são muitas, dada a narração da autobiografia amorosa do autor, evidenciam a crise da idealização feminina de então. Sobre isso ler o capítulo “O Arcipreste de Hita e seu Libro de Buen Amor”, do livro do professor Mario González já citado anteriormente. Ademais, a obra se caracteriza por possuir um riquíssimo vocabulário, jogos de palavras e incorporação de ditos tradicionais e do léxico popular, convertendo-se, assim, não somente numa herança da métrica e de certo didatismo do mester de clerecía, senão uma evolução e superação desta estética, pois, além de inovar nos versos, distanciando-se da cuaderna vía, várias vezes, incorpora a paródia e a comicidade (GONZÁLEZ, 2010). O FINAL DO SÉCULO: COPLAS A LA MUERTE DE SU PADRE Se o século XIV fica marcado pelo início da decadência do modo de vida medieval, o século XV pode-se considerar como o período da separação deste mundo: 1. O humanismo começa a se desenvolver no pensamento humano e avança; 2. A luta pelo poder entre a oligarquia da nobreza e a Coroa aumenta; 3. Há, pois, uma perda clara e progressiva dos valores tradicionais; 3. A burguesia, formada pelos comerciantes e pequenos donos de propriedades nas cidades e judeus novos, começa seu avanço, proporcional ao avanço do comércio e das relações monetárias. DATAS E ACONTECIMENTOS RELEVANTES DO SÉCULO XV PARA O CRESCIMENTO DO IMPÉRIO ESPANHOL. CLIQUE NAS ABAS ABAIXO: Em 1474, a princesa Isabel sobe ao trono de Castilla, casada com o príncipe Fernando herdeiro da coroa catalano-aragonesa. Esta união funde dois reinos fortes da península, um de forte presença peninsular e o outro com importantes conquistas no Mediterrâneo, como o reino de Nápoles. Conquistas que determinarão as letras do próximo século por influência da Itália na arte espanhola. A união dos reinos, embora respeitadas as leis e estatutos de cada um, significará o início da formação do estado absolutista e poderoso que caracterizará o poder dos auto-intitulados Reis Católicos. Este poder colocará a Espanha no topo do mundo seja por seu poder econômico e político, seja por sua influência na cultura e na arte nos próximos séculos. Como braço secular da igreja em sua empreitada contra a Reforma empreendida por Lutero na Alemanha, a Espanha atuará, ainda, com todo o seu poder na expulsão dos judeus de seu território e na perseguição dos que não professassem a fé de Roma. No ano de 1480, se estabelece a temida Inquisição espanhola, que difundirá o medo conhecido até hoje e, de tão absurdo e intolerante, que servirá de anedota para artistas como os americanos do Monty Python, na comedia do absurdo, que explorará exatamente o extremo das ações dos que a formavam. ASSISTA Temos, abaixo, o vídeo da comédia do Monty Python a que nos referimos para que o entenda: Inquisicion española [7] Definitivamente, o ano que marcará fortemente a passagem da Espanha para a modernidade será 1492. Repetimos as palavras de González (2010), a história não possui dobradiças que se movam e de um momento a outro se veja algo novo, depois da porta e se esqueça o que ficou para trás. A reconquista da cidade de Granada, a expulsão dos judeus da península e a chegada à América de Colombo, serão feitos que se perpetuarão como marcos da história da Espanha, mas que não se produzirão senão depois de muitos anos. Efetivamente, quando Boabdil, o último dos reis muçulmanos, deixa Granada, se firmará o poder dos reis Isabel e Fernando na península, depois de um caminho lento e difícil de reconquista. A chegada de Colombo à América significará a catarse de um império em expansão que se desdobrará em domínios por todo o mundo e se constituirá por mais de um século como o maior de todos. Embora a saída dos judeus das terras castelhanas haja representado uma perda irreparável para o comércio e finanças do império, o ponto de convergência da união da península, sob o signo do cristianismo católico, significará a hegemonia dos reis de Castilla. Ainda no áureo 1492, se vê nascer a primeira gramática da língua espanhola, uma obra extraordinária de Antonio Nebrija que, nas palavras de Malmberg (1992), será o “pilar do espanhol literário e nacional, por sua vez, meio de expressão do Império no século de Ouro”. A constituição deste império cheio de contradições em si mesmo, a efervescência de uma nova era, se verão representadas nas páginas de uma obra literária: La Celestina. Mas, antes há que se falar de um poeta que desenvolverá o lirismo em sua poesia, lirismo que apontará também, por sua vez, para a tendência que reinará nas letras do início do renascimento: Jorge Manrique. Jorge Manrique, filho de Rodrigo Manrique, nasceu em 1440 e morreu em 1479. Sua obra não terá a relevância muitas vezes exaltada, mas, nas palavras de González (2010): […] não teria seu nome registrado com maior relevância como poeta, não fossem essas quarenta estrofes que, além de serem fartamente conhecidas por todo hispanofalante medianamente erudito, em função de sua qualidade estética, significam uma belíssima síntese do pensamento da classe dominante da Espanha (ou Castela, ao menos) à época (p. 172). González se refere ao poema pelo qual Manrique é conhecido: Coplas a la muerte de su padre. Aristocrata, Manrique viveu como os de sua classe: era erudito, lutou como soldado em defesa da coroa e morreu defendendo-a. No referido poema, partindo do tema concreto da Fonte [8] morte de seu pai, o poeta vai direto ao comentário dolorido da circunstância humana na vida e ante a morte (AGUINAGA, PUÉRTOLAS & ZAVALA, 2000). É, pois, uma reflexão do poeta e um convite ao leitor para fazê-la sobre a vida e a morte e os valores do homem diante disso. Para terminar o comentário deste texto, que fecha o século XV, transcrevemos o que fala González (2010): As “Coplas” são uma obra-prima, sem dúvida, do ponto de vista de sua arquitetura, indo do geral ao particular e rompendo a possível monotonia com a transição clara entre os diversos segmentos, até culminar no dinamismo do drama particular de D. Rodrigo ante a morte. E a chave desta construção é uma sucessão de belas metáforas que constroem diversas alegorias para ilustrar o sentido da vida e da morte [...] Evidentemente, há no poema a intenção de que o leitor leia aquilo que o poeta pensa e quer transmitir; há, então, um didatismo que é ainda o lógico resíduo da poesia erudita medieval, que, predominantemente, se pautou por esta difusão. (p. 186) Assim, o poema de Jorge Manrique se encontra no topo de uma estética, de um modo de escrever, embora apresentando o lirismo que o caracteriza, faltará ainda o fim do didatismo, do fim da tradução das metáforas, que se verá materializar na poesia do espanhol Garcilaso de la Vega. UM PASSO PARA A MODERNIDADE, LA CELESTINA Sob o signo da modernidade, do início da conformação do Império Espanhol na América, em Canárias, no norte da África, na herança aragonesa da Itália, no centralismo administrativo do estado, na intolerância com os não fiéis à fé católica e no absolutismo dos Reis, surge em 1499, La Celestina. Embora não tenha surgido com este nome, senão com Comedia de Calixto y Melibea (1499) e depois com a transformação em Tragicomedia de Calixto y Melibea (1502). Não se entrará aqui nas polemicas de autoria ou composição da obra. Na disciplina de Literatura I, a discussão entrará em detalhes mais apurados. Aqui, a tarefa será mostrar o valor da obra, hoje aceita como sendo de Fernando de Rojas (1473/76 -1541), para a história da Literatura Espanhola. Ou seja, seu valor estético, como obra de transição, ou pré-renascentista, ou moderna, variando do estudioso que a qualifique. Mas, independente de sua classificação, La Celestina é, sem dúvida, um documento da transformação social, cultural e histórica por que passava a Espanha na época de sua publicação. Clique na figura abaixo e leia mais sobre obra: Fonte [9] O argumento da obra é muito simples: Calixto, jovem rico, filho de poderosos burgueses da cidade, se apaixona por Melibea. Por intermédio de uma velha, Celestina, consegue os favores da dama de Melibea. Uma noite, depois de uma noite proibida no jardim de Melibea, Calixto morre após cair do muro do pomar; Melibea se suicida pela incapacidade de viver sem seu amante. Contudo, por trás da simplicidade de argumento da peça, Fernando de Rojas tece uma crônica de seu tempo: a dificuldade de união entre um novo convertido e uma “cristã velha”; as relações conflitantes do indivíduo com seu meio social; o condicionamento ao qual os personagens parecem presos por sua situação social; a crítica aos valores da época; o desnudamento das máscaras postas pela aristocracia; tudo constitui o fio condutor da obra de Rojas e a colocará no papel de importância que tem na literatura. A morte dos amantes, ao final da peça, pode apontar para uma punição por seus atos, mas revela muito mais que um didatismo medieval: revela a intenção do autor em expor a contradição paradoxal dos personagens, na dificuldade ante o querer ser e o que se impõe desde o exterior para que seja. A vontade de gozar a vida, embora entendendo seu papel no mundo, aponta para uma modernidade que não ocorrerá nos tempos da obra, mas nos anos seguintes de renascimento e, por isso, também mostra o valor de La Celestina. Os valores, contradições e angústias do ser humano quase como protagonistas da obra, também revelam o forte humanismo que ganhava espaço. Como advertem Mario González (2010) y Aguinaga, Puértolas Zavala (2000), não cairemos no equívoco de limitar a leitura de La Celestina a apenas uma leitura. Seja desde o ponto de vista do paradoxo, apresentado pelo primeiro, ou desde o ponto de vista do choque entre dois mundos (o medieval e o renascentista), dado pelos seguintes, as leituras são somente indicações. E finalmente se cita: La Celestina corresponde a las circunstancias personales y ambientales de un judío converso llamado Fernando de Rojas en la Castilla de finales del siglo XV. Lo cual, sin embargo, siendo importante no basta todavía. Se trata de una obra que refleja de modo admirable la situación de una Castilla en la que se ha roto el organicismo feudal tradicional y teocrático […] y en la cual la fragmentación del sistema medieval va acompañada de la fragmentación de la persona, mientras ésta, por su parte, va cayendo más y más en la deshumanización como consecuencia del nuevo absolutismo y de la irrupción violenta de los nuevos valores […] (AGUINAGA, PUÉRTOLAS & ZAVALA, 2000, p. 206). Como já apontado no início das considerações, La Celestina aparece como uma obra literária de valor estético inestimável, de valor documental também importantíssimo e como mostra de uma literatura que se metamorfoseia como os tempos passados ante os novos que se anunciam no horizonte. FONTES DAS IMAGENS 1. http://3.bp.blogspot.com/_ryvQxJ1fO7c/SHU6Oh_hbNI/AAAAAAAAA Bs/538Stxvt_Lg/s320/jarchas4.jpg 2. http://www.definicionabc.com/wp-content/uploads/gesta.jpg 3. http://2.bp.blogspot.com/-f9VtJTydXxI/UfG6DBTfnXI/AAAAAAAAJO Q/Y-Li3beMP8A/s1600/CANTAR_MIO_CID.jpg 4. http://3.bp.blogspot.com/-PRR9OtfkZfU/TxMDsf0XutI/AAAAAAAAAA k/VbobEUVV4Ss/s1600/Mester+de+Clerec%25C3%25ADa.jpg 5. http://www.calendamaia.cl/Forum/mercado.jpg 6. http://www.sarasuati.com/wp-content/uploads/2011/03/closeup.jpg 7. http://www.youtube.com/watch?v=8mzfyVluiIU 8. http://img1.mlstatic.com/jm/img?s=MLA&f=48847467_8141.jpg&v=P 9. http://1.bp.blogspot.com/_TUntXtsz5SY/TSOpZTjKoSI/AAAAAAAADD k/TUNs0VJ3I4c/s1600/9788877548108.jpg Responsável: Prof. Jimmy Robson Universidade Federal do Ceará - Instituto UFC Virtual