CENTRO DE CIÊNCIAS BIOLÓGICAS DEPARTAMENTO DE PSICOLOGIA GERAL E ANÁLISE DO COMPORTAMENTO PSICOLOGIA CLÍNICA NA ANÁLISE DO COMPORTAMENTO ANSIEDADE E TRANSTORNO DO PÂNICO Marcela Carvalho Patrícia Cristiane Oliveira Taís Robles Conceito de ansiedade A ansiedade é um sentimento comum e extremamente frequente em todos os seres humanos e útil para a sobrevivência e proteção do indivíduo. A definição de tal sentimento pode, muitas vezes, ser fornecida através de metáforas, dificultando definições precisas a respeito do objeto estudado. A ansiedade é definida como um estado emocional desagradável, que produz desconforto e muitas queixas. Quando sentida em alta frequência e intensidade deixa de ser um fator de proteção e passa a prejudicar o indivíduo e sua qualidade de vida. Portanto, é importante também que se busque uma definição fisiológica para o fenômeno. As pupilas da pessoa em estado de ansiedade dilatam para que seu poder de visão geral aumente; porém, como consequência, diminui a capacidade de a pessoa perceber os detalhes que a cercam. Essa característica foi selecionada pela evolução já que através desse recurso era possível ao homem identificar, no escuro das cavernas, um predador e as possíveis rotas de fuga (Roman & Savoia, 2003). A taquicardia ocorre para que haja maior irrigação sanguínea. Dessa forma, é possível ao cérebro e aos músculos trabalharem mais intensamente, deixando a pessoa alerta e ágil. A distribuição do sangue fica concentrada nos órgãos necessários para uma possível ação, como grandes músculos, enquanto tem pouca circulação nas extremidades como mãos e pés, tornando-os gelados e pálidos. A respiração se torna mais curta e ofegante em consequência do bater acelerado do coração, que exige maior oxigenação na circulação. Como consequência do aumento da respiração, o indivíduo pode sofrer falta de ar, se engasgar, sufocar e ter dores no peito. Com pouco sangue na cabeça, a ansiedade pode causar tonturas, visão borrada, confusão, fuga da realidade e sensações de frio e calor (Barlow, 1999; Roman & Savoia, 2003). O indivíduo, durante a reação de luta-e-fuga, também tem sua transpiração aumentada e há redução da atividade do sistema digestivo (causando náuseas, sensação de peso no estômago, constipação ou diarréia) e sintomas de tensão, que podem acarretar dores (Barlow, 1999). A ansiedade também envolve a mudança na atenção do indivíduo, deixandoo alerta para qualquer ameaça em potencial no ambiente. Dessa forma, pessoas ansiosas têm dificuldade para se focar em uma única tarefa, qualquer alteração no ambiente tira sua concentração. Indivíduos ansiosos são distraídos, possuem dificuldade de concentração e problemas de memória. Além da distração, essas pessoas também têm a precisão de seus movimentos prejudicada, já que, na ansiedade, as vias neurais se ocupam com impulsos de alerta do sistema de luta-e-fuga, fazendo com que decresça ou iniba os impulsos precisos que compõem o movimento coordenado (Barlow, 1999; Roman & Savoia, 2003). Portanto, essas e outras sensações corporais resultantes da ansiedade demonstram que há uma ativação geral no metabolismo do organismo. Como consequência, o indivíduo se sente exausto em decorrência da grande quantidade de energia perdida (Barlow, 1999). Os efeitos da adrenalina e da noradrenalina podem ser interrompidos de duas formas. A primeira é através de substâncias do corpo que as destroem. A segunda é pela ativação do sistema nervoso parassimpático. O corpo do organismo pode ser sobrecarregado pela reação de luta-efuga e, para evitar danos, ele próprio tem a capacidade de ativar o sistema nervoso parassimpático para voltar a um estado de relaxamento. Porém, o efeito da noradrenalina e da adrenalina não passa repentinamente. Tais substâncias são destruídas de forma gradual e o efeito que provocam no corpo passa aos poucos (Barlow, 1999). Cabe ressaltar que o estresse e a ansiedade são assuntos de grande discussão na sociedade atual devido ao aumento de sua incidência. De acordo com Margis, Picon, Cosner e Silveira (2003, p. 1), o estresse é “resultado da interação entre as características da pessoa e as demandas do meio, ou seja, as discrepâncias entre o meio externo e interno e a percepção do indivíduo quanto a sua capacidade de resposta”. Desta forma, é produto de um grande número de atividades que proporcionam desgaste no organismo físico e que levam a problemas de comportamento. A ansiedade está relacionada ao sinal de ameaça real ou imaginário. Segundo Graeff (2011), a ansiedade pode ser definida como uma emoção relacionada ao comportamento de avaliar riscos no ambiente. É evocada em situações nas quais há um perigo em potencial, podendo ser uma situação desconhecida para o indivíduo ou um estímulo que sinalize perigo (como, por exemplo, um predador). As sensações muitas vezes são geradas pela imprevisibilidade, muitas vezes até por motivos inexistentes. Quando uma situação de ameaça acarretou sensações corporais de ansiedade de grande intensidade em um indivíduo, em circunstâncias semelhantes, o organismo poderá voltar a experienciar as mesmas sensações corporais. Mesmo não estando em situações reais de perigo, o organismo se manifesta corporal e instintivamente perante a uma ameaça não visível, devido a sua relação passada em contextos de ameaça e suas consequências (Lory; Carvalho & Baptista, 2005). É importante pontuar que o conceito de ansiedade pode variar entre uma cultura e outra. Entre os leigos, ansiedade é considerada como uma espera de algo que está por vir, uma situação em que o indivíduo vivencia grande angústia e impaciência antecipadas, marcadas por sensações corporais. O indivíduo pode queixar-se de sensações corporais como: frio na barriga, nó na garganta, coração apertado, etc. Isso é considerado normal para eles, visto que grande parte das pessoas experiencia isto da mesma forma, embora, não entendam a função protetora (Wikipédia, 2008). Para se entender o comportamento humano recorre-se aos três níveis de seleção proposto por Skinner: filogenético, ontogenético e cultural (Skinner, 1981/1984). No primeiro nível, o comportamento é selecionado se contribuir para a sobrevivência da espécie à qual pertence o indivíduo que se comporta. De acordo com Margis; Picon; Cosner e Silveira (2003, p. 3), “a ansiedade e o medo, assim como o estresse, têm suas raízes nas reações de defesa dos animais, que ocorrem em resposta aos perigos encontrados no em seu meio ambiente”. Desta maneira, a ansiedade tem função filogenética de proteção ao próprio organismo. No segundo nível, o ontogenético, um operante é selecionado se produz reforço. Trata-se da evolução de indivíduos particulares de uma espécie durante sua vivência. A ansiedade se faz presente em algumas situações que sinalizam perigo, podendo variar de individuo para individuo de acordo com sua história de vida. Embora que, nos dias de hoje, as ameaças são diferentes das enfrentadas pelos nossos ancestrais. As sensações orgânicas da ansiedade se manifestam nos indivíduos que esperam sua vez em uma entrevista de emprego, durante uma prova, ao falar em público, situações apresentadas diariamente em sociedade. Além da história de vida, a história da cultura e suas práticas também fazem com que alguns eventos ambientais sinalizam ou não perigo. Esse é o terceiro nível de seleção, o cultural: em que os comportamentos selecionados contribuem para a sobrevivência da cultura que os mantêm. A consequência das práticas mantidas por esse nível é a própria perpetuação da cultura e das práticas que a compõem. Dessa forma, todo comportamento é entendido como um produto da seleção entre os três níveis. Em outras palavras, o comportamento é multideterminado, excluindo explicações que envolvem causas únicas. Assim, para a Análise do Comportamento, além da ansiedade ser sentida em como um sinal de que algum evento aversivo irá ocorrer, sendo que este sinal pode ser real ou não, ela também é entendida como um fenômeno comportamental com diferentes níveis de complexidade. Ela pode acarretar em problemas diversos, como descreve Gentil (1998) “’ansiedade’ é um estado que envolve excitação biológica ou manifestações autonômicas e musculares, redução na eficiência comportamental e relatos verbais de estados internos desagradáveis”. Skinner (1941) salienta que a ansiedade teria componentes emocionais, descritos como reações fisiológicas, mediante os estímulos presentes no ambiente. Nas palavras de Skinner: há efeitos emocionais que podem ocorrer apenas quando um estímulo precede caracteristicamente um estímulo aversivo com um intervalo de tempo suficientemente grande para permitir a observação de mudanças comportamentais. A condição resultante geralmente é denominada ansiedade (Skinner, 1953/1965, p. 178). A ansiedade também é composta por respostas que modificam o ambiente e por ele são modificadas, ou seja, por comportamentos operantes. Respostas emocionais também podem identificar situações ameaçadoras. Skinner também complementa que, um estímulo verbal, também pode evocar reações emocionais, se ao decorrer da história comportamental do indivíduo, o estímulo verbal foi emparelhado diversas vezes com alguma situação ameaçadora ou incômoda. A ansiedade pode tornar-se prejudicial quando manifestada em situações inapropriadas de forma intensificada e desproporcional, ocasionando prejuízos individuais sociais, afetivos, em diversos contextos. Segundo Kissack e Leon, o DSM–IV-TR detalha os critérios para caracterizar o Transtorno de Ansiedade, são eles: 1- Preocupação excessiva ocorrendo na maioria dos dias por no mínimo seis meses. 2- Dificuldades em controlar a preocupação. 3- A ansiedade acompanhada de três ou mais dos seis sintomas seguintes: inquietação, fatigabilidade, sensação de branco, irritabilidade, tensão muscular, perturbações do sono. 4- Ansiedade e preocupação não são produtos exclusivos de estresse pós-traumático. 5- Ansiedade causa prejuízos no funcionamento social e ocupacional de áreas importantes da vida do sujeito. 6Perturbação não se deve aos efeitos fisiológicos diretos de uma substância psicoativa, e não estão exclusivamente ligados a transtornos de humor ou psicóticos. Aspectos da intervenção comportamental para manejo de casos de transtorno de ansiedade Partindo dos pressupostos da análise do comportamento, Zamignani e Vermes (2003) expõem possibilidades de intervenção para os comportamentos classificados como transtornos de ansiedade. Assim como com qualquer comportamento problema, o foco é a identificação e modificação das variáveis ambientais responsáveis pela instalação e manutenção do comportamento apresentado como queixa. O terapeuta faz um trabalho voltado para compreender a função do responder do cliente e assim tornar possível uma análise. As técnicas comportamentais citadas por Zamignani e Vermes (2003) podem auxiliar na intervenção referente aos transtornos de ansiedade. A técnica de exposição com prevenção de respostas (EPR) propõe a exposição do cliente às situações nas quais ocorram eventos eliciadores de ansiedade, e nessas situações o cliente também seja exposto ao contato com reforçadores naturais, ou seja, ocorre ao mesmo tempo a habituação e o reforçamento. Segundo Zamignani e Banaco (2004), à medida que se expõe o sujeito às estimulações ambientais aversivas, orienta-se para que este se abstenha de realizar qualquer ritualização. A exposição preferencialmente é feita de forma gradual, partindo sempre dos estímulos que provocam menos sofrimento para os que provocam sofrimento com maior intensidade. A exposição pode ser feita de forma imaginária ou in vivo (exposição real). A Terapia da Aceitação e Compromisso (ACT) proposta por Steven Hayes também é um meio de intervenção terapêutica para os comportamentos ansiosos. De acordo com Brandão (1999), para que ocorra a modificação do comportamento-problema é necessário que os contextos sócio-verbais sejam modificados. Entenda-se por contexto “[...] os conjuntos de contingências estabelecidas pela comunidade sócio verbal que determinam nossos comportamentos, e por mudanças comportamentais, especialmente aquelas que reduzem as tentativas de controle dos eventos privados por parte dos clientes.” (BRANDÃO, 1999, p. 148). As estratégias de intervenção baseadas na Terapia de Aceitação e Compromisso podem ser descritas pelas seguintes metas: desamparo criativo, tentativa de controle de eventos privados como problema, eu como contexto e não como conteúdo, escolher e valorizar uma direção, abandonar a luta e compromisso com a mudança. A própria relação terapêutica pode servir de instrumento de intervenção. É adequada para a aprendizagem e a alteração de padrões de interação social do cliente e para desenvolver e ampliar repertório de habilidades sociais. A família é uma potencial área de intervenção, pois é um contexto importante do cliente e pode influenciar na aquisição, manutenção e modificação de comportamento. Síndrome do pânico O transtorno do pânico se caracteriza pela ocorrência de ataques de pânico, consistindo em uma sensação de medo ou intenso mal estar, além de estar acompanhado por sintomas físicos. Os ataques iniciam-se de maneira abrupta e alcançam sua máxima intensidade em até dez minutos. Intensas preocupações acerca da ocorrência de novos ataques podem acarretar em modificações de comportamento do indivíduo que já viveu um episódio (Salum et al, 2009). Em relação ao que foi dito anteriormente sobre a reação de luta e fuga no mecanismo da ansiedade, os ataques de pânico podem ser considerados uma resposta acentuada desta reação. Algumas situações podem ser desencadeadoras de crises de pânico ocasionando uma desregulação nos sistemas serotonérgicos, noradrenérgicos, gabaérgicos e respiratórios. A resposta biológica que decorre dessas alterações está vinculada a ameaças externas, bem como a errônea interpretação de respondentes (Cordás & Júnior). De acordo com Caballo (2003), o conceito inicial de ataque de pânico foi proposto por Barlow (1988) como um erro no sistema do medo, diante de situações estressantes da vida, em pessoas fisiologicamente vulneráveis. Os sintomas se iniciam a partir da interpretação das sensações fisiológicas normais como sinais de uma doença grave ou até morte. Além disso, dificuldades diante de situações da vida podem explicar o desenvolvimento de níveis elevados de ansiedade, podendo ocasionar um primeiro ataque de pânico.. Julgamentos distorcidos do perigo podem aumentar a ativação do medo, intensificando assim os sinais de medo já presentes. Diante disso, desenvolve-se medo ou ansiedade da ocorrência de futuros ataques, preocupação diante de possíveis consequências e significativas mudanças de comportamento, como de esquiva diante de situações ansiogênicas (Carvalho et al, 2008). Ao término de uma crise de pânico, o indivíduo relata uma sensação de esgotamento, fraqueza e relaxamento excessivo. Algumas pessoas sentem-se envergonhadas diante do episódio, dormem ou ficam prostrados durante horas (Júnior & Cordás). REFERÊNCIA BARLOW, D. H., & Craske, M. G. (1999). Transtorno do Pânico e agoraphobia. In: BARLOW, David H. (org). Manual clínico dos transtornos psicológicos. 2ª ed. Porto Alegre: Artmed, 1999. BRANDÃO, M.Z. Abordagem Contextual na Clínica Psicológica: Revisão da ACT e proposta de atendimento. In: KERBAUY, R.R. Sobre Comportamento e Cognição. v.4. 1999. p.148-155. CABALLO, V. Manual para o tratamento cognitivo comportamental dos transtornos psicológicos. 2003. CARVALHO, M.R; NARDI, E.G; RANGÉ, B. 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