O TÁXI COMO ALTERNATIVA DE TRANSPORTE EM GRANDES CIDADES Glaucia Guimarães Pereira Orlando Strambi Universidade de São Paulo Escola Politécnica RESUMO O táxi é um modo de transporte conhecido mundialmente, responsável geralmente por uma pequena parcela das viagens urbanas. Neste trabalho pretende-se estudar um sistema de táxi de grande porte como uma possível solução de mobilidade em grandes cidades, atendendo em princípio os usuários de automóvel. A metodologia proposta envolve estudos de demanda, dimensionamento de oferta e simulação. 1. INTRODUÇÃO Táxi é um veículo de aluguel para transporte de passageiros, com um taxímetro que marca o preço da corrida ou viagem. O termo táxi é uma redução de taxicab, que por sua vez é a forma reduzida da combinação de taximeter (medidor de taxa) e cab (carruagem, do francês cabriolet) (Houaiss, 2012). De forma geral, a ideia do transporte urbano em veículos de aluguel se espalhou pelo mundo no começo do século XX, e hoje o táxi é encontrado na maioria dos locais, independentemente do porte da cidade. O serviço é composto por veículos de aluguel com motorista, usado majoritariamente em viagens urbanas. De acordo com ANTP (2003), o transporte de passageiros por táxi é classificado como um serviço de utilidade pública, de interesse eminentemente local, cuja competência administrativa está a cargo exclusivo do poder público municipal. Há características positivas importantes que podem ser mencionadas sobre este modo de transporte: é porta-a-porta, não é preciso dirigir, não é necessário estacionar; é confortável e tem boa imagem. Apesar disto, o estado da prática dos serviços de táxi não é suficiente para atrair muitos usuários, haja vista a estimativa de menos de 200 mil táxis em operação em todo o país (ANTP, 2011). Provavelmente, isto se dá pelo alto valor da tarifa e pela incerteza de disponibilidade do serviço. Em geral, o transporte motorizado pode ser classificado em relação a ser público ou particular; coletivo ou individual. Por esta classificação, o táxi aparece como uma opção intermediária entre o público coletivo (ônibus, trem, metrô) e o particular individual (automóvel e motocicleta), ou seja, o táxi é um transporte público individual. No âmbito da área de transportes, o modo táxi parece ser bastante negligenciado, havendo poucos estudos específicos de planejamento sobre o tema. Assim, vislumbrando o potencial deste modo de transporte e a carência de trabalhos específicos de planejamento, esta pesquisa se propõe a estudar um sistema de transporte por táxi. Tendo como motivação o aumento da mobilidade em grandes cidades, o trabalho investiga se e quais características de um sistema de transporte público por táxi podem reduzir drasticamente o uso do automóvel particular. O trabalho tem como escopo a cidade de São Paulo. O estudo tem como hipótese: Um sistema de transporte por táxi pode substituir o automóvel particular em viagens urbanas. O sistema proposto é de grande porte porque pretende atender a quantidade de usuários de automóvel em São Paulo. Sendo assim, o objetivo geral é conceber um sistema de transporte público por táxi. Este trabalho de tese de doutorado justifica-se por propor uma solução de transporte para grandes cidades. Além da população em geral, particularmente o sistema de táxi permite oferecer melhores condições de mobilidade para grupos específicos carentes de locomoção, como idosos, portadores de deficiências físicas e pessoas com mobilidade reduzida. Pode-se afirmar também que o sistema de táxi é alternativa para os necessitam dirigir, mas ingeriram bebidas alcoólicas. Ainda em relação à segurança viária, vislumbra-se um cenário com veículos guiados por motoristas profissionais, que causam menos acidentes. Outros fatores ambientais podem ser citados a favor do sistema de táxi, como o controle da matriz energética dos veículos e a destinação do espaço público ocupado pelo automóvel para outros fins. 2. FUNÇÕES DESEMPENHADAS PELO TÁXI Em busca de referências bibliográficas para balizar a pesquisa, nenhum trabalho semelhante foi encontrado. Por enquanto, Trudel (1999) é o que mais se aproxima da proposta, porém, no trabalho descrito pelo autor, o táxi é usado como completo substituto do transporte coletivo. Trudel (1999) descreve um sistema de táxi implantado na cidade de Rimouski (32 mil habitantes, Quebec-Canadá), em 1993. O serviço, oferecido com agendamento de segunda à sexta-feira, foi usado como único serviço municipal de transporte. O sistema de táxi foi escolhido pela qualidade do serviço e por razões econômicas, pois os sistemas de ônibus estudados dariam prejuízos. O táxi pode exercer diferentes funções no sistema de transporte. Hanashiro (1978) afirma que funções do táxi em São Paulo são quatro: complementar, quando realiza viagens curtas com origem ou destino em terminais de transporte coletivo; suplementar, como alternativa ao transporte coletivo para o público em geral; de substituição, principalmente para classes mais altas como alternativa aos transportes individual ou coletivo; e autônomo, sem vínculo com o sistema de transporte de massa, sendo normalmente encarado dentro desta perspectiva. Notase que este autor classifica as funções do táxi sempre em relação ao transporte coletivo. A diferença entre as funções suplementar e substituição é bastante tênue, tendo foco no estrato socioeconômico do usuário. Segundo Trudel (1999), frequentemente o serviço de táxi não é considerado parte do sistema público de transporte porque seus veículos têm capacidade limitada para atender a demanda. Diz ainda que dentro do contexto do sistema regular de transporte público, o táxi pode exercer várias funções, como complementar a viagem a partir de estações de trem ou ônibus, substituir ônibus fora do horário de pico, aumentar a frequência do transporte público e atender áreas isoladas ou com baixa densidade populacional. No trabalho de Austin e Zegras (2012) é discutida a função desempenhada pelo serviço de táxi em Boston, Estados Unidos. Os autores concluem que o serviço de táxi pode ter função de complementar as viagens do transporte coletivo ou substituí-las, e que tais funções dependem do horário do dia, dado que há horários em que a oferta de transporte coletivo é pequena ou inexistente. Novamente, os autores também caracterizam as funções do táxi em relação ao transporte coletivo. Stern (1993) estuda a escolha de modos de transporte por pessoas idosas ou portadores de deficiência física na zona rural de Virgína, Estados Unidos. No estudo são avaliados os modos paratransit (transporte especial porta-a-porta, com agendamento prévio, subsidiado pelo governo), táxi, veículos com rotas fixas ou rotas flexíveis, ônibus acessíveis, dirigir automóvel, ser passageiro de automóvel, ou caminhar. Em relação ao táxi, o autor conclui que é um modo potencial para atender o público da pesquisa, só não tão bom quanto o paratransit. Por sua vez, Nourbakhsh e Ouyang (2012) estudam um sistema de transporte público sem rota definida em uma região hipotética de baixa densidade populacional. A análise de custos mostra que somente quando a demanda é baixa (< 10 passageiros por hora por km²) o sistema de táxi incorre em custos menores que o sistema proposto pelos autores. Mas vale notar que o custo operacional do táxi é considerado invariável com a demanda. Também no trabalho desses autores o sistema de táxi é comparado com o transporte público. Litman (2000) compara o uso de carros compartilhados (carsharing) com os modos individuais táxi, automóvel particular e aluguel de veículos convencional. O custo por quilômetro percorrido por táxi é sempre o mais alto dentre os modos, mas o carsharing tem como desvantagem taxas fixas anuais em torno de US$ 300,00, enquanto que os usuários preferem taxas menores ou taxas variáveis mais altas. O autor conclui que o carsharing pode ser viável, e que, ironicamente, uma das melhores maneiras de se reduzir o uso de automóveis é desenvolver novos negócios de serviços de automóveis. Esta última perspectiva é incorporada neste trabalho de tese. 3. METODOLOGIA Um dos desafios deste trabalho é lidar com uma situação hipotética, com todas as viagens de automóveis sendo realizadas por táxi, com o potencial de reduzir o congestionamento na cidade de São Paulo. A metodologia proposta consiste em estudar a demanda, conceber o sistema de táxi e simular o sistema. O estudo da demanda deverá estimar a quantidade de viagens atendidas pelo sistema, e analisar seu comportamento em função do tempo e do espaço. Dados da Pesquisa Origem e Destino da Região Metropolitana de São Paulo de 2007 indicam que são aproximadamente 4,6 milhões de viagens por dia de condutores de automóveis residentes na cidade. Porém, a pesquisa OD 2007 não contempla dados de turistas, nem viagens realizadas no final de semana. Assim, serão necessários outros levantamentos para dimensionar a demanda total do sistema. No cenário com redução de congestionamento supõe-se haver mudanças no horário de início e duração das viagens. Essas alterações no padrão de viagens precisam ser incorporadas no estudo, além de viagens atraídas de outros modos de transporte, pois têm influência no dimensionamento da oferta do sistema. Ainda em relação à demanda, com intuito de compreender as escolhas dos modos individuais, serão pesquisadas outras formas de transporte que tangem características individuais e públicas e podem ser comparadas com o táxi, como o atendimento a pessoas com necessidades especiais (paratransit), o compartilhamento de veículos (carsharing), o fretamento de veículos de passeios (car-pooling) e veículos autônomos (PRT – personal rapid transit). Atualmente, São Paulo conta com 33 mil táxis. Com o novo patamar de milhões de viagens a mais por dia, esta frota precisa ser revista. Qual é a frota necessária para atender a demanda? Quantas viagens um táxi consegue atender em um dia? Há gargalos no pico? Como a frota deve ser alocada ao longo do dia? Como os veículos devem se distribuir nas diversas regiões da cidade? Para se responder estas questões, serão estudados os modelos de oferta e serão realizadas entrevistas com taxistas. Tendo-se o modelo de comportamento da demanda e possíveis cenários de oferta, com as respectivas distribuições espaciais e temporais, pretende-se simular o sistema, com objetivo de extrair indicadores de desempenho. Um dos fatores-chave para simulação é a definição da forma de busca de táxis, ou seja, como a oferta encontra a demanda. As novas tecnologias de busca, principalmente com smartphones, serão estudadas. O uso destas tecnologias pode interferir fortemente no equilíbrio econômico-financeiro do sistema, já que alteram tanto a quilometragem total percorrida pelo táxi, quanto a parcela dessa quilometragem percorrida no atendimento a passageiros. O Quadro 1 apresenta o resumo da metodologia do trabalho. Quadro 1: Resumo da metodologia Etapa de estudo Demanda Oferta Simulação Métodos Estudo comparativo com outros modos individuais (carsharing, paratransit etc) Levantamentos para estimar a demanda (pesquisa OD, outros levantamentos) Alterações temporais da demanda Alterações espaciais da demanda Potencial de atrair demanda de outros modos Dimensionamento temporal Distribuição espacial Entrevistas com taxistas Tecnologias de busca de serviço disponivel Indicadores de desempenho Nota-se que a proposta inicial do trabalho é bastante ambiciosa e exigirá a identificação de aspectos em que seja possível introduzir simplificações para permitir seu desenvolvimento e análise. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ANTP (2003) Manual 10 - Administração dos Serviços de Táxi. Associação Nacional dos Transportes Públicos, São Paulo. ANTP (2011) Sistema de Informações da Mobilidade Urbana – Relatório 2010. Associação Nacional dos Transportes Públicos, São Paulo. Austin, D. e Zegras, P. C. (2012) Taxicabs as public transportation in Boston, Massachusetts. Transportation Research Record: Journal of the Transportation Research Board, v. 2277, p. 65-74. Hanashiro, G.K. (1978) Função do serviço de táxis no município de São Paulo no contexto dos transportes públicos. Notas técnicas da Companhia de Engenharia de Tráfego, n.8. Houaiss (2012) Grande dicionário Houaiss de língua portuguesa. Instituto António Houaiss, Rio de Janeiro. Litman, T. (2000) Evaluating carsharing benefits. Transportation Research Record: Journal of the Transportation Research Board, v. 1702, p.31-35. Nourbakhsh, S.M. e Ouyang, Y. (2012) A structured flexible transit system for low demand areas. Transportation Research Part B, v.46, p. 204-216. Stern, S. (1993) A disaggregate discrete choice model of transportation demand by elderly and disabled people in rural Virginia. Transportation Research Part A, v.27, n.4, p. 315-327. Trudel, M. (1999) The taxi as a transit mode. Transportation Quartely, v. 53, n.4, p 121-130.