1 ESTADO DA PARAÍBA TRIBUNAL DE CONTAS MINISTÉRIO PÚBLICO PROCESSO Nº: 11383/09 PARECER Nº: 00056/11 NATUREZA: Denúncia DENUNCIADO: Ugo Ugolino Lopes. DENUNCIANTE: Yasnaia Polyana Werton Feitosa. EMENTA: Denúncia. Município de Pombal. Doação de Terrenos Públicos sem a prévia Autorização Legislativa. Indisponibilidade do Patrimônio Público. Procedimento que fere o ordenamento jurídico pátrio. Procedência. Aplicação de Multa com fulcro no art. 56, II da LOTCE. Encaminhamento ao MP Comum. P A R E C E R Versam os presentes autos acerca de denúncia (fls.02/06) encaminhada pela atual gestora do Município de Pombal, Sra. Yasnaia Polyana Werton Feitosa a respeito de ato ilegal praticado pelo ex-Prefeito Municipal, Sr. Ugo Ugolino Lopes, referente à emissão de termos de permissões de uso – cerca de 1.115 (hum mil cento e quinze) terrenos pertencentes ao patrimônio público municipal – sem autorização legislativa, em pleno ano eleitoral (exercício de 2008). A Unidade Técnica, às fls. 3192, sugeriu a notificação do ex-Prefeito de Pombal, Sr. Ugo Ugulino Lopes, visando lhe facultar a oportunidade de apresentar esclarecimentos e justificativas acerca do fato denunciado. Notificado, às fls. 3193/3195, o interessado apresentou defesa de fls. 3196/3207, acompanhada de documentação de fls. 3208/3238. Dando cumprimento ao despacho do Exmº Sr. Conselheiro Fernando Rodrigues Catão, Relator deste processo (fls. 3240), a Auditoria, após examinar a documentação do processo, assim se pronunciou, às fls. 3241/3243: Parecer emitido e assinado eletronicamente pelo(a) Procurador(a) Isabella Barbosa Marinho Falcão em 14/01/2011 09:53. Autenticação: d215b1fe810ca1cd735ed405dc1f266a Impresso por: Renata Carneiro Campelo Diniz em 13/04/2011 16:15 2 ESTADO DA PARAÍBA TRIBUNAL DE CONTAS MINISTÉRIO PÚBLICO Essa Auditoria entende que o Gestor não apresentou a comprovação da Autorização Legal para as referidas doações, bem como os critérios adotados para a escolha dos beneficiários, uma vez que não se trata de uma permissão de uso de algum bem do município para uso devido da população, mas sim de doação de terrenos para construção de casas populares, devendo assim haver a permissão do Poder Legislativo bem como a comprovação da escolha dos beneficiários serem pessoas realmente carentes e com necessidade da atuação do serviço público, razão pela qual entendemos pela procedência da denúncia e pela irregularidade dos atos praticados pelo ex-Gestor do Município, Sr. Ugo Ugulino Lopes.(grifos nossos) Em seguida, os autos foram encaminhados ao Ministério Público Especial para exame e emissão de Parecer. É o relatório. Passo a opinar. A competência do Tribunal de Contas do Estado para receber e apurar denúncias, bem como a legitimidade para propô-las, têm previsão na Lei Complementar n.º 18/1993, especificamente nos arts. 1º, X, e 51, in verbis: Art. 1º - Ao Tribunal de Contas do Estado, órgão de controle externo, compete, nos termos das Constituições Federal e Estadual e na forma estabelecida nesta lei: (...) X - decidir sobre denúncia que lhe seja encaminhada por qualquer cidadão, partido político, associação ou sindicato, na forma prevista nesta lei. Art. 51 - Qualquer cidadão, partido político, associação ou sindicato é parte legítima para denunciar irregularidades ou ilegalidades perante o Tribunal de Contas do Estado. In casu, a Senhora Yasnaia Polyana Werton Feitosa denunciou a realização de ato ilegal praticado pelo ex-Prefeito Municipal, Sr. Ugo Ugolino Lopes, referente à emissão de termos de permissões de uso – cerca de 1.115 (hum mil cento e quinze) terrenos pertencentes ao patrimônio público municipal – sem autorização legislativa, em pleno ano eleitoral (exercício de 2008). De acordo com a análise feita pela Auditoria, a denúncia é procedente, tendo em vista que o ex-gestor não apresentou a documentação suficiente para sanar a irregularidade. De fato, não consta nos autos a permissão do Poder Legislativo, bem como a comprovação de carência dos beneficiados, bem como o estabelecimento de critérios objetivos para a sua seleção. O denunciado realizou durante o exercício de 2008 diversas doações de terrenos visando à construção de habitação popular. Tais doações ocorreram sob o rótulo equivocado de termo de permissão de uso, e com a agravante de ausência de autorização do Poder Legilsativo. Às fls. 3200, o denunciado assim descreve o procedimento por ele adotado Parecer emitido e assinado eletronicamente pelo(a) Procurador(a) Isabella Barbosa Marinho Falcão em 14/01/2011 09:53. Autenticação: d215b1fe810ca1cd735ed405dc1f266a Impresso por: Renata Carneiro Campelo Diniz em 13/04/2011 16:15 3 ESTADO DA PARAÍBA TRIBUNAL DE CONTAS MINISTÉRIO PÚBLICO “(...) ao se deparar com esse fato, e de posse do parecer jurídico da Procuradoria do Município, e da existência já no município de cadastros de pessoas sem teto, visando o bem comum, e através de um processo legítimo e democrático começou a realizar tais situações ouvindo as secretarias competentes a fim de permitir um lapso temporal de 05 anos para o beneficiário construir a sua casa sob pena de, não fazendo, retornar o referido terreno ao patrimônio público”. Hely Lopes Meireles ensina que “Os bens públicos, quaisquer que sejam, podem ser alienados, desde que a Administração satisfaça certas condições prévias para sua transferência ao domínio privado ou outra entidade pública”1. E mais adiante, quando trata especificamente da doação: “A Administração pode fazer doações de bens móveis ou imóveis desafetados do uso público...omissis... Essas doações podem ser com ou sem encargos e em qualquer caso dependem de lei autorizadora, que estabeleça as condições para sua efetivação, e de prévia avaliação do bem a ser doado, não sendo exigível licitação para o contratado alienado”.2 O Superior Tribunal de Justiça, através de sua Terceira Turma, já se posicionou acerca da exigibilidade de autorização legislativa para a realização de alienação de bem público imóvel, in verbis: CIVIL. ALIENAÇÃO DE BEM PUBLICO. FALTA DE AUTORIZAÇÃO LEGISLATIVA. PRESCRIÇÃO. NÃO PRESCREVE A AÇÃO PARA OBTER DECLARAÇÃO DE NULIDADE DE VENDA DE BEM PUBLICO, SEM AUTORIZAÇÃO LEGISLATIVA, POSTO QUE A INALIENABILIDADE DOS BENS PUBLICOS IMPEDE A SUA PERDA E A AQUISIÇÃO POR OUTREM PELO DECURSO DE TEMPO.(Resp 11831/PB; STJ – 3ª Turma, Min. Relator: Dias Trindade; julgamento no dia 30/03/1993.; e publicação no DJ em 17/05/1993; pág.09329) O Tribunal Regional Federal da 1ª Região em recente decisão, também se manifestou no mesmo sentido firmado do precedente da Corte Superior, vejamos: CONSTITUCIONAL. AÇÃO POPULAR. IMÓVEL PÚBLICO. DOAÇÃO POR MUNICÍPIO À UNIÃO, SEM ENCARGO. AUTORIZAÇÃO LEGISLATIVA. NÃO COMPROVADO DESVIO DE FINALIDADE. REMESSA OFICIAL. DESPROVIMENTO. 1. Não configurado desvio de finalidade nem lesão ao patrimônio público no ato de doação, sem encargo, de bem imóvel do Município de Marabá/PA à União, para fins de ampliação do aeroporto da referida cidade. Isso porque o dito negócio jurídico foi entabulado nos limites da Lei 8.666/93, art. 17, I, "b" e II, "a", porquanto precedido de autorização legislativa municipal e destinado à utilidade pública específica. 2. Remessa desprovida.( AC APELAÇÃO CIVEL – 200439010004885; TRF 1ª Região- Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL FAGUNDES DE DEUS; Órgão Julgador: 5ª Turma; Fonte: e-DJF1 DATA:23/04/2010 PAGINA:207.) 1 2 in Direito Administrativo Brasileiro, 14ª edição, RT, 1989, p. 440/441. idem, p. 443 Parecer emitido e assinado eletronicamente pelo(a) Procurador(a) Isabella Barbosa Marinho Falcão em 14/01/2011 09:53. Autenticação: d215b1fe810ca1cd735ed405dc1f266a Impresso por: Renata Carneiro Campelo Diniz em 13/04/2011 16:15 4 ESTADO DA PARAÍBA TRIBUNAL DE CONTAS MINISTÉRIO PÚBLICO Vê-se que tudo que se expôs está em perfeita consonância com o princípio da indisponibilidade, pela administração, dos bens e interesses públicos, integrante do regime jurídicoadministrativo, magistralmente descrito por Celso Antônio Bandeira de Mello3: A indisponibilidade dos interesses públicos significa que, sendo interesses qualificados como próprios da coletividade – internos ao setor público –, não se encontram à livre disposição de quem quer se seja, por inapropriáveis. O próprio órgão administrativo que os representa não tem disponibilidade sobre eles, no sentido de que lhe incumbe apenas curá-los – o que também é um dever – na estrita conformidade do que predispuser a “intentio legis”. Portanto, os bens públicos não estão entregues à livre disposição da vontade do administrador, antes, são instrumentos que servem à busca da satisfação do interesse público e da coletividade, devendo ser manejados com impessoalidade, isentos de qualquer interesse de beneficiar quem quer se seja. Neste contexto, a doação de bens públicos deve ser vista com restrição, admitida somente em caráter excepcional, já que importa a alienação gratuita de patrimônio público, uma liberalidade que proporciona ao donatário certa vantagem à custa do erário. Registre-se, ainda, que não consta do álbum processual qualquer documentação comprobatória da adoção de critérios objetivos para as escolhas dos beneficiários das doações realizadas pelo Município de Pombal, na gestão do Sr. Ugo Ugolino Lopes, ferindo o princípio impessoalidade que deve nortear toda a administração pública. Ex POSITIS, opina esta Representante do Ministério Público de Contas pela PROCEDÊNCIA da vertente denúncia, devendo ser aplicada ao ex-gestor, Sr. Ugo Ugolino Lopes, a multa prevista no art. 56, II da LOTCE, em virtude da grave ofensa às normas legais e encaminhamento ao Ministério Público Comum para as providências que entender necessárias. João Pessoa, 14 de janeiro de 2011. ISABELLA BARBOSA MARINHO FALCÃO Procuradora-Geral do Ministério Público junto ao TC-PB em exercício 3 MELLO, Celso Antônio Bandeira. Curso de Direito Administrativo. 11 ed. São Paulo: Malheiros, p. 33. Parecer emitido e assinado eletronicamente pelo(a) Procurador(a) Isabella Barbosa Marinho Falcão em 14/01/2011 09:53. Autenticação: d215b1fe810ca1cd735ed405dc1f266a Impresso por: Renata Carneiro Campelo Diniz em 13/04/2011 16:15