Direito regulatório e
economia
Aulas 12 e 13
Serviços públicos
O que é serviço
público?
Como saber se uma atividade
econômica (em sentido amplo) é um
serviço público?
Celso Antônio Bandeira de Mello
“Serviço público é toda atividade de oferecimento de
utilidade ou comodidade material destinada à satisfação
da coletividade em geral, mas fruível singularmente
pelos administrados, que o Estado assume como
pertinente a seus deveres e presta por si mesmo ou por
quem lhe faça as vezes, sob um regime de Direito
Público – portanto, consagrador de prerrogativas de
supremacias e restrições especiais -, instituído pelo Estado
em favor dos interesses definidos como públicos no
sistema normativo”.
BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de direito administrativo. 21ª ed.
São Paulo: Malheiros, 2006, p. 642
José dos Santos Carvalho Filho
“Serviço público [é] toda atividade prestada
pelo Estado ou por seus delegados, basicamente
sob regime de direito público, com vistas à
satisfação de necessidades essenciais e
secundárias da coletividade.”
CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 15a ed.
Rio de Janeiro: Lumen Iuris, 2006.
Marçal Justen Filho
“Serviço público é uma atividade pública
administrativa de satisfação concreta de
necessidades individuais ou transindividuais,
materiais ou imateriais, vinculadas diretamente a
um direito fundamental, destinada a pessoas
indeterminadas e executada sob regime de direito
público.”
JUSTEN FILHO, Marçal. Curso de direito administrativo. São Paulo: Malheiros,
2005, p. 478.
Elementos utilizados na
conceituação dos serviços públicos

Critério subjetivo (titularidade)

Critério material / objetivo (visa à satisfação de
interesses coletivos)

Critério formal (regime de direito público –
publicatio -lei)
Serviços públicos na Constituição de
1988

O caso do setor postal (ADPF 46)
-
Cabe à UF manter
-
Lei 6.538/78 alude à monopólio
Serviço postal
Constituição
Federal
Art. 21 – Compete à União:
(...)
X – manter o serviço postal e o correio aéreo
nacional
Serviço postal
Lei
6538/78
Art. 2º - O serviço postal e o serviço de telegrama são explorados
pela União, através de empresa pública vinculada ao Ministério das
Comunicações.
Art. 9º - São exploradas pela União, em regime de monopólio, as
seguintes atividades postais:
I - recebimento, transporte e entrega, no território nacional, e a
expedição, para o exterior, de carta e cartão-postal;
II - recebimento, transporte e entrega, no território nacional, e a
expedição, para o exterior, de correspondência agrupada:
III - fabricação, emissão de selos e de outras fórmulas de
franqueamento postal.
Atividade econômica e participação
do Estado
Art.
170, CF
“A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano
e na livre iniciativa...”
Art. 173, caput, CF
“Ressalvados os casos previstos nesta Constituição, a exploração
direta da atividade econômica pelo Estado só será permitida quando
necessária aos imperativos da segurança nacional ou a relevante
interesse coletivo, conforme definidos em lei
Art. 175, CF
“Incumbe ao Poder Público, na forma da lei, diretamente ou sob
regime de concessão ou permissão, sempre através de licitação, a
prestação de serviços públicos”.
ADPF 46 – Informativo STF 392
Voto Rel. Marco Aurélio Mello
O Tribunal iniciou julgamento de argüição de descumprimento
de preceito fundamental proposta pela Associação Brasileira das
Empresas de Distribuição – ABRAED, em que se pretende a
declaração da não-recepção, pela CF/88, da Lei 6.538/78, que
instituiu monopólio das atividades postais pela Empresa
Brasileira de Correios e Telégrafos - ECT. O Min. Marco
Aurélio, relator, (...) acolheu o pedido formulado para declarar a
não-recepção pela CF/88 dos artigos da Lei 6.538/78 que
disciplinaram o regime da prestação de serviço postal como
monopólio exclusivo da União, ao fundamento de que eles
violam os princípios da livre iniciativa, da liberdade no exercício
de qualquer trabalho, da livre concorrência e do livre exercício
de qualquer atividade econômica (CF, arts. 1º, IV; 5º, XIII; 170,
caput, IV e parágrafo único, respectivamente).
Voto Rel. Marco Aurélio Mello
Ressaltando, inicialmente, a necessidade de se interpretar a
Constituição de modo a lhe dar a maior eficácia possível,
diante da realidade vigente, considerou que a expressão
“manter o serviço postal”, contida no inciso X do art. 21 da
CF, inserida na primeira Constituição e repetida nas
seguintes, teria adquirido alcance diverso com o passar do
tempo, evoluindo no sentido de significar, no contexto
social presente, não mais monopólio, mas um conjunto de
serviços que a União deve garantir e, eventualmente,
prestar de forma direta, se inexistente interesse econômico
para o desenvolvimento da atividade em certos locais do
território brasileiro.
Voto Rel. Marco Aurélio Mello
Considerou, para tanto, as mutações ocorridas no Direito
Administrativo brasileiro, decorrentes da gradativa
redução da participação direta do Estado na atividade
econômica, em razão do reconhecimento da sua
ineficiência na prestação de serviços públicos e na
realização dos investimentos tecnológicos necessários à
melhoria dos mesmos, salientando, no ponto, em relação
à ECT, as diversas falhas observadas em sua
administração, o atraso tecnológico, e os elevados custos e
preços dos serviços prestados.
Voto Rel. Marco Aurelio Mello
Diante disso, concluiu não ter sido recepcionado, pela
CF/88, o monopólio do serviço postal, inclusive, por
inexistir previsão a ele relativa no texto constitucional, o
qual seria exaustivo quanto à instituição do monopólio na
atividade econômica (CF, arts. 21, XXIII, e 177).
Asseverou que, em prol da preservação do interesse
público, a atuação do Estado deveria ser subsidiária,
afastando-se sua intervenção desnecessária em área
sustentada, de forma satisfatória, pelo setor privado –
titular da atividade econômica, permitindo, dessa forma, a
liberdade de iniciativa e de concorrência, passando o
Estado a posicionar-se como agente normativo e regulador
das atividades econômicas, nos termos do disposto no art.
174 da CF.
Voto do Rel. Marco Aurélio Mello
Isso por melhor atender ao interesse da coletividade a
garantia de que o serviço postal seja prestado em regime
de concorrência entre as várias empresas do mercado
consumidor, eis que esse modelo promove o
aperfeiçoamento tecnológico, a redução dos custos
operacionais e dos preços dos serviços. Entendeu ainda
que, ao se reconhecer que a atividade econômica não é
própria do Estado, seria dispensável definir-se serviço
postal ou como serviço público ou como atividade
econômica em sentido estrito, sendo, ademais, possível a
existência de duplo regime (público e privado) na
realização da referida atividade.
Voto do Min. Eros Grau
Prosseguindo no julgamento, o Min. Eros Grau divergiu e julgou
improcedente o pedido. Tendo em conta a orientação fixada
pelo Supremo na ACO 765 QO/RJ (...), no sentido de que o
serviço postal constitui serviço público, portanto, não
atividade econômica em sentido estrito, considerou inócua a
argumentação em torno da ofensa aos princípios da livre
iniciativa e da livre concorrência. Distinguindo o regime de
privilégio de que se reveste a prestação dos serviços públicos do
regime de monopólio, afirmou que os regimes jurídicos sob os
quais são prestados os serviços públicos implicam que sua
prestação seja desenvolvida sob privilégios, inclusive, em
regra, o da exclusividade na exploração da atividade econômica
em sentido amplo a que corresponde essa prestação, haja vista
que exatamente a potencialidade desse privilégio incentiva a
prestação do serviço público pelo setor privado quando este atua
na condição de concessionário ou permissionário.
Asseverou, que a prestação do serviço postal por empresa
privada só seria possível se a CF afirmasse que o serviço
postal é livre à iniciativa privada, tal como o fez em relação
à saúde e à educação, que são serviços públicos, os quais
podem ser prestados independentemente de concessão ou
permissão por estarem excluídos da regra do art. 175, em
razão do disposto nos artigos 199 e 209 (CF: “Art. 175.
Incumbe ao poder público, na forma da lei, diretamente ou
sob o regime de concessão ou permissão, sempre através
de licitação, a prestação de serviços públicos. ... Art. 199. A
assistência à saúde é livre à iniciativa privada. ... Art. 209. O
ensino é livre à iniciativa privada.”).
Ressaltou que o serviço postal é prestado pela ECT,
empresa pública criada pelo Decreto-Lei 509/69, que foi
recebido pela CF/88, a qual deve atuar em regime de
exclusividade (em linguagem técnica, em situação de
privilégio, e, em linguagem corrente, em regime de
monopólio), estando o âmbito do serviço postal bem
delineado nos artigos 7º e seguintes da Lei 6.538/78,
também recebida pela CF/88. Por fim, julgando insuficiente
a atuação subsidiária do Estado para solução dos conflitos
da realidade nacional, considerou que, vigentes os artigos 1º
e 3º da CF, haver-se-ia de exigir um Estado forte e apto a
garantir a todos uma existência digna, sendo incompatível
com a Constituição a proposta de substituição do Estado
pela sociedade civil.
Outros votos (Informativo 409)
Retomado julgamento de argüição de descumprimento de
preceito fundamental (...) Os Ministros Joaquim Barbosa e
Cezar Peluso acompanharam o voto do Min. Eros Grau, que,
abrindo divergência, julgou improcedente o pedido
formulado, ao fundamento de que o serviço postal constitui
serviço público, e não atividade econômica em sentido
estrito, que é prestado pela ECT em regime de privilégio,
tendo sido recepcionada pela CF/88 a Lei 6.538/78.
Votaram pela procedência parcial do pedido o Min. Carlos
Britto, que, também considerando que o serviço postal é
serviço público, de prestação exclusiva por parte da União,
ressalvou, entretanto, que a recepção da Lei 6.538/78 estaria
restrita às atividades que impliquem comunicação privada e
comunicação telegráfica, não alcançando, portanto, as de
caráter eminentemente mercantil,
Outros votos
e o Min. Gilmar Mendes, que declarava a não-recepção
somente dos artigos 42, 43, 44 e 45 da lei impugnada, que
tratam da criminalização da violação ao monopólio postal
da União, dado o caráter aberto da disposição, em afronta
ao princípio da reserva legal estrita. Após, o julgamento
foi suspenso em virtude do pedido de vista da Min. Ellen
Gracie. ADPF 46/DF, rel. Min. Marco Aurélio,
17.11.2005.
Voto Min. Ellen Gracie
(Informativo STF 510)
(...). A Min. Ellen Gracie, em voto-vista, reportando-se ao que
decidido no julgamento da ADI 3080/SC (DJU de 27.8.2004),
acompanhou a divergência, para julgar improcedente o pedido
formulado, ao fundamento de que o serviço postal constitui serviço
público, e não atividade econômica em sentido estrito, que é
prestado pela ECT em regime de privilégio, não se aplicando a ele
os princípios da livre concorrência e da livre iniciativa. Antes,
porém, asseverou que o pedido formulado implicaria uma
vulgarização do instituto da ADPF(...). Após, o julgamento foi
suspenso em virtude do pedido de vista do Min. Menezes Direito.
ADPF 46/DF
ADPF 46 - STF
ARGÜIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO
FUNDAMENTAL. EMPRESA PÚBLICA DE CORREIOS E
TELEGRÁFOS. PRIVILÉGIO DE ENTREGA DE
CORRESPONDÊNCIAS.
SERVIÇO
POSTAL.
CONTROVÉRSIA REFERENTE À LEI FEDERAL 6.538,
DE 22 DE JUNHO DE 1978. ATO NORMATIVO QUE
REGULA DIREITOS E OBRIGAÇÕES CONCERNENTES
AO SERVIÇO POSTAL. PREVISÃO DE SANÇÕES NAS
HIPÓTESES DE VIOLAÇÃO DO PRIVILÉGIO POSTAL.
COMPATIBILIDADE
COM
O
SISTEMA
CONSTITUCIONAL VIGENTE.
ADPF 46
ALEGAÇÃO DE AFRONTA AO DISPOSTO NOS
ARTIGOS 1º, INCISO IV; 5º, INCISO XIII, 170, CAPUT,
INCISO IV E PARÁGRAFO ÚNICO, E 173 DA
CONSTITUIÇÃO DO BRASIL. VIOLAÇÃO DOS
PRINCÍPIOS DA LIVRE CONCORRÊNCIA E LIVRE
INICIATIVA. NÃO-CARACTERIZAÇÃO. ARGUIÇÃO
JULGADA
IMPROCEDENTE.
INTERPRETAÇÃO
CONFORME À CONSTITUIÇÃO CONFERIDA AO
ARTIGO 42 DA LEI N. 6.538, QUE ESTABELECE
SANÇÃO, SE CONFIGURADA A VIOLAÇÃO DO
PRIVILÉGIO POSTAL DA UNIÃO. APLICAÇÃO ÀS
ATIVIDADES POSTAIS DESCRITAS NO ARTIGO 9º, DA
LEI
ADPF 46

1. O serviço postal --- conjunto de atividades que torna possível
o envio de correspondência, ou objeto postal, de um remetente
para endereço final e determinado --- não consubstancia
atividade econômica em sentido estrito. Serviço postal é serviço
público.

2. A atividade econômica em sentido amplo é gênero que
compreende duas espécies, o serviço público e a atividade
econômica em sentido estrito. Monopólio é de atividade
econômica em sentido estrito, empreendida por agentes
econômicos privados. A exclusividade da prestação dos serviços
públicos é expressão de uma situação de privilégio. Monopólio e
privilégio são distintos entre si; não se os deve confundir no
âmbito da linguagem jurídica, qual ocorre no vocabulário vulgar
ADPF 46

3. A Constituição do Brasil confere à União, em caráter
exclusivo, a exploração do serviço postal e o correio aéreo
nacional [artigo 20, inciso X].

4. O serviço postal é prestado pela Empresa Brasileira de
Correios e Telégrafos - ECT, empresa pública, entidade da
Administração Indireta da União, criada pelo decreto-lei n. 509,
de 10 de março de 1.969.

5. É imprescindível distinguirmos o regime de privilégio, que diz
com a prestação dos serviços públicos, do regime de monopólio
sob o qual, algumas vezes, a exploração de atividade econômica
em sentido estrito é empreendida pelo Estado.
ADPF 46

6. A Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos deve atuar em regime de
exclusividade na prestação dos serviços que lhe incumbem em situação de
privilégio, o privilégio postal.

7. Os regimes jurídicos sob os quais em regra são prestados os serviços
públicos importam em que essa atividade seja desenvolvida sob privilégio,
inclusive, em regra, o da exclusividade. 8. Argüição de descumprimento de
preceito fundamental julgada improcedente por maioria. O Tribunal deu
interpretação conforme à Constituição ao artigo 42 da Lei n. 6.538 para
restringir a sua aplicação às atividades postais descritas no artigo 9º desse ato
normativo.
(ADPF 46, Relator(a): Min. MARCO AURÉLIO, Relator(a) p/ Acórdão: Min. EROS GRAU,
Tribunal Pleno, julgado em 05/08/2009, DJe-035 DIVULG 25-02-2010 PUBLIC 26-02-2010
EMENT VOL-02391-01 PP-00020)
Ex. abrangência
ADMINISTRATIVO. ECT. SESI. LICITAÇÃO. ENTREGA DE
FATURAS. MONOPÓLIO ESTATAL.
1. Documentos bancários e títulos incluem-se no conceito de carta,
cuja distribuição é explorada pela União (ECT) em regime de
monopólio. Precedentes.
2. Recurso especial provido em parte.
(REsp 1014778/SC, Rel. Ministra
ELIANA CALMON,
SEGUNDA TURMA, julgado em 19/11/2009, DJe
02/12/2009)
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DRE_-_Aula_12_2010_(serviços_públicos)