Rua Laura Alves nº 4 - 7º 1050 – 138 Lisboa Tel. +351 21 790 20 00 Fax +351 21 790 20 94 Fax +351 21 790 20 98/99 www.autoridadedaconcorrencia.pt [email protected] Comunicado nº8/2005 Fixação de honorários por parte de uma Ordem profissional A Autoridade da Concorrência condenou a Ordem dos Médicos Dentistas ao pagamento de uma coima no valor de €160.181 (cento e sessenta mil, cento e oitenta e um euros) por ter dado como provada a imposição de preços mínimos na prestação de serviços médicos dentários. A interferência na determinação de preços pelo livre jogo do mercado consubstancia uma contra-ordenação nos termos do n.º 1 do artigo 4.º da Lei n.º 18/2003, de 11 de Junho, e uma violação ao n.º 1 do artigo 81.º do Tratado que institui a Comunidade Europeia. A fixação de preços mínimos configura uma forma séria e das mais graves de restrição da concorrência: impedem os operadores de fixarem preços inferiores aos mínimos estabelecidos e desta forma, de fazerem concorrência entre si; privam os consumidores da possibilidade de adquirirem os serviços em causa ao melhor preço; por outro lado, os preços mínimos reforçam artificialmente os obstáculos ao acesso de novos concorrentes, que ficam impedidos de competir pela via do preço. Os factos A Autoridade da Concorrência tomou conhecimento da existência de uma “Tabela de Honorários” que procede à fixação de honorários mínimos e máximos a cobrar pelos médicos dentistas, divulgada na página da Internet da Ordem dos Médicos Dentistas. Esta tabela de honorários designa o tipo de intervenção ou serviço a prestar pelo médico dentista e o preço mínimo e máximo de cada intervenção. Além disso, também o Código Deontológico da Ordem dos Médicos Dentistas contém disposições que limitam a concorrência no mercado da prestação de serviços médico dentários, em regime independente, ao estabelecer critérios e indicações para a determinação dos honorários relativos à actividade dos médicos dentistas exercida em regime independente, i.e., na qualidade de profissionais liberais1. 1 Tal Código, na III parte, estabelece no seu artigo 22.º, que tem como epígrafe honorários, o seguinte: 1 - Na fixação de honorários, deve o médico dentista proceder com justo critério, tendo em conta, nomeadamente, a importância dos cuidados prestados, o tempo gasto, a dificuldade da intervenção e a sua notoriedade. 2 - O médico dentista deverá respeitar sempre os valores mínimos fixados pela tabela de honorários elaborada pela Ordem dos Médicos Dentistas. A Tabela de Honorários e o artigo 22.º do Código Deontológico encontram-se em vigor até à presente data. Em caso de violação das regras deontológicas, os médicos dentistas incorrem em infracção disciplinar que poderá ser sancionada com penas que podem ir da mera advertência à expulsão. Em 2004, foram publicados no Boletim da Ordem, decisões proferidas em Conselho Deontológico e de Disciplina onde estiveram em causa, inter alia, a prática de honorários por violação da Tabela de Honorários (“Tabela de Nomenclatura e Valores Relativos”). O enquadramento legal A legislação nacional2 e o Tratado que institui a Comunidade Europeia 3 proíbem as decisões que visem fixar, de forma directa ou indirecta, os preços de compra ou de venda (de bens ou serviços) ou a interferência na sua determinação pelo livre jogo do mercado, induzindo, artificialmente, quer a sua alta quer a sua baixa. A decisão A Autoridade da Concorrência concluiu que os n.ºs 2, 3 e 8 do artigo 22.º do Código Deontológico dos Médicos Dentistas e a Tabela de Honorários têm por objecto e por efeito a restrição da concorrência de forma sensível, porquanto obstam à formação do preço dos serviços de medicina dentária pelo livre jogo do mercado. Ao imporem a determinação dos honorários dos médicos dentistas em regime liberal, com base em tabelas de honorários mínimos e máximos, e ao impedirem a 3 - O médico dentista não deve ultrapassar os limites máximos da dita tabela, salvo em situações excepcionais e justificadas. (…) 8 - Não é permitido, de igual modo, aumentar ou reduzir os honorários pelo facto de o doente ter ou não qualquer comparticipação, a qualquer título, de instituições públicas ou privadas. 2 Lei da Concorrência: Lei 18/2003, de 11 de Junho (art.4º, nº 1, sob a epígrafe “Práticas Proibidas”) “ Artigo 81.o- 1. São incompatíveis com o mercado comum e proibidos todos os acordos entre empresas, todas as decisões de associações de empresas e todas as práticas concertadas que sejam susceptíveis de afectar o comércio entre os Estados-Membros e que tenham por objectivo ou efeito impedir, restringir ou falsear a concorrência no mercado comum, designadamente as que consistam em: a) Fixar, de forma directa ou indirecta, os preços de compra ou de venda, ou quaisquer outras condições de transacção;” (…) 3 2 determinação dos honorários pelo livre jogo do mercado, tais práticas têm por finalidade a restrição da liberdade concorrencial dos dentistas: (i) (ii) (iii) (iv) Em primeiro lugar, do lado da oferta, que se traduz numa limitação da liberdade de determinação dos honorários Depois, porque a adopção de tabelas de honorários mínimos e máximos permite aos médicos dentistas, na sua actuação no mercado, prever com um grau de segurança razoável quais os preços praticados pelos seus concorrentes. Da imposição de honorários mínimos resulta também a criação de barreiras de acesso ao mercado pelos médicos dentistas recém licenciados que não beneficiando de uma reputação profissional consolidada se vêem impedidos de angariar clientes pela prática de preços mais baixos. Por outro lado, na perspectiva da procura, ou seja, de todos aqueles que pretendam recorrer aos serviços de medicina dentária, também há restrição pois a existência de honorários mínimos e máximos obrigatórios determina a impossibilidade de negociação de condições de prestação desses serviços, ficando os clientes impedidos de procurar obter as melhores condições de transacção dos serviços que carecem. Em suma, a regulamentação dos preços através de uma decisão de associação de empresas pode permitir que estes se mantenham acima dos níveis concorrenciais, convertendo-se os preços máximos, na prática, num regime de preços fixos. Assim, a Autoridade da Concorrência decidiu condenar a Ordem dos Médicos Dentistas ao pagamento de uma coima no valor de € 160.181,00 (cento e sessenta mil, cento e oitenta e um euros), obrigando ainda a Ordem à cessação imediata da aplicação e revogação dos n.ºs 2, 3 e 8 do artigo 22.º do Código Deontológico, bem como de todas e quaisquer tabelas de honorários e, ainda, à publicitação junto dos seus associados da execução das referidas medidas. Esta é a segunda decisão da Autoridade da Concorrência por infracção das regras da concorrência previstas no Tratado que institui a Comunidade Europeia, ao abrigo do novo regime descentralizado de aplicação das regras da concorrência Comunitárias, aprovado pelo Regulamento 1/20034. Refira-se ainda que, relativamente ao exercício das profissões liberais, já em 2000, o então Conselho da Concorrência havia condenado a Câmara dos Revisores Oficiais de Contas, cujo Código Deontológico determinava a obrigatoriedade da 4 Jornal Oficial L 1 de 4 01.2003, p.1. 3 prática de honorários mínimos pelos seus associados5. Esta decisão foi confirmada pelo acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 5 de Fevereiro de 2002. Da decisão da Autoridade da Concorrência cabe recurso judicial nos termos da lei6. Lisboa, 29Agosto de 2005 5 Decisão do Conselho da Concorrência, de 16 de Novembro de 2000. Nos termos do n.º 1 do artigo 50.º da Lei n.º 18/2003, das decisões proferidas pela Autoridade da Concorrência que determinem a aplicação de coimas ou de outras sanções previstas na lei cabe recurso para o Tribunal do Comércio com efeito suspensivo. 6 4