A1 ID: 33715769 24-01-2011 Tiragem: 50367 Pág: 26 País: Portugal Cores: Cor Period.: Diária Área: 29,25 x 33,86 cm² Âmbito: Informação Geral Corte: 1 de 3 Entrevista Carlos Zorrinho, secretário de Estado da Energia e Inovação Há encomendas firmes de energia renovável por parte de países da UE Pedidos de exportação de electricidade de fonte renovável equivalem a quase cinco vezes a energia exportada em Dezembro passado por Portugal Lurdes Ferreira a Os tempos aconselham a adiar a liberalização total das tarifas dos consumidores domésticos, que estava prevista para o próximo ano, admite Carlos Zorrinho, secretário de Estado da Energia e Inovação. Espera, por outro lado, que a cimeira do próximo dia 4 dê um passo decisivo na capacidade de interligação da Península Ibérica com o resto da Europa, ao incluir Portugal e Espanha nos eixos prioritários da rede de energia da UE. Caso contrário, o país continuará sem conseguir exportar energia. O antigo ministro Mira Amaral acusa-o de irrealismo energético na questão dos subsídios às energias renováveis, por estar a suboptimizar as centrais eléctricas abrangidas por outros subsídios e com isso agravar estes mesmos subsídios. O que diz a isso? Estou muito confortável com a política energética do Governo. O eng.º Mira Amaral, que foi um excelente ministro da Indústria, não se perdoa a ele próprio não ter tido a visão da oportunidade para Portugal que era a aposta nas energias renováveis. Mas ele fez parte do trabalho que era necessário. Foi ele que celebrou os contratos de abastecimento energético que nos permitem hoje fazer uma transição sustentável para um mix energético baseado em energias renováveis. Portugal não está a gerar novo défice tarifário e estamos hoje mais preparados para fazer face a um eventual choque das energias fósseis. Em energia, não podemos cortar com um sistema e pôr outro a funcionar. Temos de garantir a sua transição e os custos relativos aos chamados CMEC e CAE são custos de transição. O que vai fazer na renegociação que já anunciou para estes contratos? A nossa intenção não é fazer nenhuma decisão unilateral, não vamos denunciar nenhum contrato. Vamos discutir com os vários intervenientes de energia em Portugal os mecanismos de optimização da gestão de energia: optimização do despacho, da distribuição. Estamos convencidos de que reduziremos o impacto dos CMEC e dos CAE nas tarifas e isso será bom para os produtores de energia, que terão maior sustentabilidade, não ficarão tão dependentes de contratos de equilíbrio. Tudo isto tem decorrido num quadro em que os custos energéticos em Portugal – nos combustíveis sem impostos e na electricidade – estão abaixo da média europeia e da Espanha. Que reacção já teve das empresas? Estão interessadas? A questão de fundo é o interesse que todos temos – empresas, consumidores, e Estado – em adaptar o modelo à sua própria evolução. Tenho total abertura das empresas para avaliar a forma de reforçar a sustentabilidade, um papel que também é do regulador. Estou profundamente convencido de que é um caminho em que todos podem ganhar, para não acontecer o mesmo que em outros países. Que centrais é que vão ser objecto de renegociação? Tanto as térmicas como as hídricas ou só as térmicas? Neste momento, estou a falar ainda de optimização do sistema, temos de falar, desde logo, de forma muito aberta com os produtores e os reguladores. A partir dessa optimização, verificaremos o que pode e deve ser eventualmente por consenso renegociado. É um trabalho para fazer no primeiro semestre. O tempo útil é até o regulador apresentar as tarifas para o próximo ano. “Vamos finalmente ter o operador único e com isso fechar o Mibel” O futuro do mercado a prazo, exclusivo de Portugal, “será negociado” Disse que o Mibel é o mercado regional mais desenvolvido da Europa. Mais do que o nórdico? Sim. Queremos muito terminar e fechar o Mibel. O facto de fecharmos o Mibel e criarmos o Operador do Mercado Ibérico (OMI) – está tudo preparado para o fazermos quando houver a próxima cimeira PortugalEspanha – cria grandes vantagens do ponto de vista do preço, da concorrencialidade. O que vai ser assinado na próxima cimeira ibérica? O Mibel tem hoje dois operadores, português e espanhol. Um faz operações de longo prazo, outro de curto prazo. Vamos finalmente ter o operador único e com isso fechar o Mibel e ter um mercado único a funcionar de forma perfeita. Portugal aceita que Espanha passe a ter também um mercado a prazo? Os estatutos do Operador do Mercado Ibérico são muito fortes e absolutamente paritários, garantindo que é um mercado único e que funciona de forma única e com ganhos únicos. E o regime exclusivo do mercado a prazo continuará em Portugal, apesar de Espanha também o querer? Como em tudo na vida, embora o mercado seja único, a evolução será negociada e é prematuro pronunciar-me sobre isso. Serão tomadas decisões sobre o Mibgás? Temos grande vontade de avançar com esse processo. O meu colega espanhol também o tinha. Agora, vou ter de confirmar. É de todo o interesse dos dois países desenvolverem o Mibgás. ID: 33715769 24-01-2011 Tiragem: 50367 Pág: 27 País: Portugal Cores: Cor Period.: Diária Área: 29,56 x 31,14 cm² Âmbito: Informação Geral Corte: 2 de 3 DANIEL ROCHA Há “vários modelos” para resolver o novo cenário accionista da Galp Energia Para Carlos Zorrinho, as empresas energéticas não vão ressentir-se da crise em termos de financiamento Galp – A agitação accionista à volta da Galp tem “boas perspectivas de terminar rapidamente com um bom equilíbrio”. Questionado sobre se a solução passa por reforçar a posição portuguesa, escusou-se a comentar, alegando tratar-se de uma “negociação complexa que está em curso”, dizendo apenas que “há vários modelos de soluções robustas”. Crise – A generalidade das empresas do sector da energia não se vai ressentir da crise em termos de acesso a financiamento, antevê. Segundo as suas previsões, “vai haver um boom no mercado da eficiência energética, com as medidas anunciadas para a mini e microprodução, para a administração pública e famílias”. Mas admite que “alguns projectos poderão sentir mais dificuldade, não devido à sua taxa de rentabilidade, mas por garantias de acesso à matéria-prima, nomeadamente a biomassa”. Eficiência – Os novos concursos para a atribuição de 75 megawatts na mini e microprodução obrigam à aplicação de planos de eficiência energética. Todos os ministérios e organismos públicos têm de baixar o seu consumo em 20 por cento, nomear gestores locais de energia entre responsáveis já em funções e concorrer à emissão de “certificados brancos”. Às entidades que fizerem menos pela eficiência reduz-se o acesso às compras. Contrapartidas – Entre o modelo de desconto dos promotores e as contrapartidas financeiras à cabeça, diz que “os dois modelos são aceitáveis”. Em circunstâncias orçamentais normais, considera “mais adequado a devolução aos consumidores (o primeiro). Em determinadas circunstâncias económicas, os contribuintes precisam mais do que os consumidores e foi isso que aconteceu nos últimos anos”. O sector das renováveis queixase de a discussão em torno dos seus custos ser sempre sobre previsões e não sobre anos executados. Concorda? O ponto de partida da discussão está errado, sobretudo porque todas as projecções são feitas com base em referenciais de custo dos primeiros contratos destas tecnologias mas que ainda têm um grande peso. Mas se considerássemos os últimos concursos da eólica e projectássemos os resultados com esses preços, os diferenciais, se calhar, já seriam negativos. Se queremos desenvolver incentivos ao consumo no vazio e a mobilidade eléctrica para o carregamento de veículos à noite, a eólica constitui a muito breve prazo um factor de baixa do preço da energia em Portugal. Muito do alarmismo que surge em relação a uma eventual derrapagem de custos é porque não tem em conta esse facto: os contratos mais antigos vão chegando ao fim e os mais recentes são muito mais favoráveis. As energias renováveis só têm vantagens – são recursos endógenos, não-poluentes, geram emprego – e uma única desvantagem – não são armazenáveis, na forma como conhecemos hoje, excepto o bombeamento reversível. Por exemplo, o investimento hídrico em Portugal permite que 70 por cento da ponta dos nossos consumos pode ser garantida por essa reserva e é isso que fez com que o país não precise de qualquer tipo de central nuclear. E as eólicas são um meio de produção competitivo quotidiano. A pensar também no carro eléctrico. Portugal tem alguma liderança internacional no sistema de carregamento dos carros eléctricos, processamento de fluxos de energia associados aos carros eléctricos. E o que está a acontecer é uma transição de um modelo industrial para outro, de um baseado nos combustíveis fósseis para outro baseado na inovação limpa. É uma questão essencial e a liderança portuguesa neste domínio é um dos grandes factores de esperança: o facto de Portugal ser líder na transição. Temos sido escolhidos como país-modelo em vários fóruns internacionais, como no Clean Energy Forum, em Londres, e na cimeira mundial da energia do futuro, em Abu Dhabi. Às vezes os modelos caem... Na nossa história, Portugal tem momentos de sucesso e de insucesso. Todos os de sucesso ocorreram quando fomos pioneiros. E o que está a acontecer já não é só pioneirismo experimentalista. Há uma aposta dos EUA e da UE. O sector que está a canalizar mais investimento à escala mundial é o das baterias, para armazenamento energético, e isto já foi muito para além da fase experimental. Em Portugal, no último ano, foram investidos 500 milhões de euros em investigação científica na área da energia – foi o sector que mais aumentou o investimento, segundo o inquérito ao potencial científico e tecnológico de 2009. Quais as previsões para o salto a dar para um novo modelo energético, agora que o petróleo está praticamente a regressar aos 100 dólares? O salto será dado nesta década, a única questão é saber se será já em 2014/2016, mas os analistas prevêem que a paridade de rede das renováveis [custo igual às redes convencionais] vai ocorrer ainda esta década. Há muitos factores que contribuem para isso: em primeiro lugar, o aumento do preço do petróleo e o aumento do consumo e também a dificuldade em fazer grandes investimentos em redes, face à reacção das populações, e o perfil das renováveis ser mais descentralizado com uma necessidade de investimento muito menor em redes, muito menos perdas e muito menos focado no transporte. Outro facto é a Europa ter percebido finalmente uma coisa óbvia – não é possível haver mercado interno a sério se a chave, o Mercado Interno da Energia (MIE), não estiver garantida. A Europa não desenvolveu durante muitos anos o MIE. Felizmente, a 4 de Fevereiro tomará decisões que permitirão fazer uma rede de infra-estruturas que criará o verdadeiro mercado. E resolve-se finalmente um buraco no plano das redes transeuropeias, desde os tempos de Jacques Delors? Que agora estão decididas e financiadas. Se eu tivesse que salientar o grande falhanço, salientava o MIE. Já temos encomendas firmes de países da UE de dois gigawatts/hora de energia renovável para poderem cumprir o seu mix energético e não conseguimos vender. Como podem os países encomendar o que não podem receber, por falta de capacidade de interligação? Não têm, mas Portugal será dentro de dez anos exportador de energia eléctrica. O presidente da ERSE disse recentemente no Parlamento que o país vai ter um problema tarifário por vários anos. Até quando? Tudo depende da evolução dos factores imponderáveis. Os cálculos que fez para 2010, por exemplo, prevêem um sobrecusto de 500 milhões de euros das energias renováveis, mas o aumento do preço do petróleo pode fazer até que haja um sobreganho. A diferença do preço do petróleo e do gás pode alterar completamente as previsões e o aumento desses preços também vem alterar a base das concessões e o que vai decorrer da aplicação dos contratos em vigor. O que estamos a fazer é, em articulação com o regulador e com independência, uma monitorização fina de todos esses processos. Tem condições para dizer que a renegociação dos CAE e CMEC não vai resultar em novos custos, que os benefícios da referida optimização serão superiores aos 60 milhões de euros de custos máximos previstos com o processo? O que interessa é o custo final. Ninguém vai optimizar um sistema cujo resultado final seja a energia ficar mais cara. Sei que o preço da energia é elevado para todos os cidadãos, mas também temos de dizer aos portugueses que antes de mais somos cidadãos de um país e faz parte da nossa cidadania apoiarmos políticas pré-competitivas, ajudando a que se mantenham muitos postos de trabalho, a exportar mais, a importar menos e a fazer com que a economia funcione melhor. Para além de pagarem uma electricidade que não é mais cara do que pagam os outros cidadãos da UE, contribuem ainda para fazer de Portugal um dos países com menos emissões de CO2. O fim da tarifa regulada para os domésticos ainda está sobre a mesa? O nosso objectivo é que o mercado progressivamente vá funcionando, mas também percebemos que este momento é mais turbulento do que imaginávamos há cerca de um ano, por razões externas, face à volatilidade dos preços energéticos nos mercados externos. Temos que ter isso em atenção no momento da liberalização. Percebemos que num momento de grande volatilidade de preços pode não ser o momento mais indicado para os domésticos. Os tempos aconselham a alguma prudência. A electricidade não é mais cara do que pagam os outros cidadãos da União Europeia ID: 33715769 24-01-2011 Carlos Zorrinho Exportação de electricidade renovável vai disparar Pág. 26 Tiragem: 50367 Pág: 44 País: Portugal Cores: Cor Period.: Diária Área: 5,75 x 7,26 cm² Âmbito: Informação Geral Corte: 3 de 3