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DOMINGO - O Estado do Maranhão - São Luís, 28 de agosto de 2011
COMPORTAMENTO
Carência e baixa
autoestima são alguns
dos motivos que levam
ao endividamento
O consumismo desenfreado e desnecessário é chamado de oneomania: mania de
comprar; o comprador compulsivo tem, geralmente, algum outro transtorno
associado; saiba quais os sintomas da doença e quais os perfis dos devedores
Katia Deutner
Do site iG
S
ÃO PAULO- Nunca foi tão
fácil conseguir crédito no
mercado. O resultado disso é que o brasileiro está se endividando cada vez mais. Cerca
de 63% das famílias estão devendo e comprometem pelo menos
30% do salário com dívidas. Este é o resultado de uma pesquisa de endividamento e inadimplência do consumidor, realizada em abril pela Confederação
Nacional do Comércio (CNC).
De acordo com o estudo, 8% não
têm condições de quitar o saldo
devedor, chegando a demorar
em média 58,8 dias para pagar.
"Há várias razões que levam
uma pessoa a se endividar: desde as estritamente necessárias,
ligadas à sobrevivência, até para
exibir um status que não tem,
para aliviar a ansiedade ou mesmo ocupar o tempo", diz a psicóloga Olga Tessari, autora do livro "Dirija Sua Vida Sem Medo"
(Ed. Letras Jurídicas). Comprar
indiscriminadamente, a ponto
de se tornar um devedor por
muito tempo e sem conseguir
parar, é considerado uma doença obsessivo-compulsiva chamada oneomania, que atinge
principalmente as mulheres.
Não se sabe ao certo o porquê,
mas acredita-se que sejam fatores culturais.
"O superendividamento é
uma consequência da compra
compulsiva. É uma característica de cada indivíduo que se
apoia no externo para fortalecer a sua imagem. Pode, ainda,
estar ligado à baixa autoestima
e por não saber lidar com emoções negativas ou não souber
dizer não a quem pede empréstimo", avalia a psicóloga Tatiana Filomensky, coordenadora
do atendimento de compradores compulsivos do Ambulatório Integrado dos Transtornos
do Impulso do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da USP.
Patologias associadas - Geralmente, o comprador compulsivo tem, também, algum outro
transtorno - como de humor, ansiedade, alimentar - ou dependência de substâncias químicas
(como drogas, medicamentos
ou álcool). "Comprar é gostoso.
E eles vão em busca da sensação
de prazer. Os problemas se acumulam e os prejuízos passam do
financeiro para o familiar e social. Brigas em casa são constantes", diz Tatiana Filomensky.
Embora percebam que o endividamento está prejudicando
a sua vida, para aliviar a ansiedade, essas pessoas compram cada vez mais. Mas não conseguem aplacar o sentimento e
voltam a ter comportamento
compulsivo. "É um círculo vicioso que traz cada vez mais sofrimento. Para resolver o problema, é preciso entender os fatores que geram a elevação da ansiedade, aprender a lidar com
eles e superá-los", afirma Olga
Tessari.
Note a diferença - Gostar de
comprar não é o mesmo que ser
um comprador compulsivo.
"Uma pessoa que se endivida
uma vez sofre tanto que vai fugir
ao máximo de novas prestações,
por medo do sofrimento vivido.
Já o compulsivo quer aliviar a
compulsão comprando cada vez
mais, na busca pelo prazer, sem
pensar no futuro", define Olga
Tessari. "Uma das minhas pacientes comprou a terceira torradeira, pois não podia perder
uma oferta maravilhosa. Quando indaguei por que, ela respondeu: 'Não resisti, foi mais forte
do que eu'", conta. Tatiana Filomensky já atendeu pacientes
com os mais diversos tipos de
problema. Gente que perdeu o
apartamento, o carro, uma poupança de R$ 100 mil.
Para se livrar da compulsão,
não há outro remédio senão fazer um tratamento psicológico
e, em alguns casos, psiquiátrico.
"Primeiro é preciso reconhecer
que tem a patologia e parar de
mentir. Precisa de avaliação médica correta e adequada, para
acabar com os sintomas, e da
psicológica, para entender por
que
que
comprar virou um
problema.
Analisar as
emoções envolvidas e
as situações em que gasta. É
preciso entender como lidar
bem com o dinheiro", diz Tatiana Filomensky.
Perfil dos devedores - De
acordo com Gilson Luís da Silva,
um dos coordenadores do grupo Devedores Anônimos, de São
Paulo, 70% dos frequentadores
das reuniões semanais são compradores compulsivos. "É o perfil mais comum. Compram para acumular objetos, para saciar
a ansiedade. Adquirem coisas
para si", diz.
Há ainda os que compram
afeto, sustentando os outros, pagando rodadas de
bebidas, se endividando para ajudar. "As pessoas usam de má-fé
e pedem dinheiro emprestado,
sempre se baseando em alguma
história de carência. E os endividados não sabem dizer não", revela Gilson Luís da Silva. Mas há,
Mais
Comprador compulsivo
As dívidas do funcionário público
Gilson Luís da Silva, 45,
começaram desde o primeiro emprego, aos 15 anos. "Naquela
época, não podia pegar
empréstimo em banco, então, pedia
para amigos e parentes", diz. A conta negativa foi crescendo junto com
ele, até que chegou a um ponto em
que já havia perdido muito - inclusive a tranquilidade de sua
família."Não gosto nem de pensar
em quanto já gastei. Comprava de
tudo - desde roupas até
eletroeletrônicos. E muitas vezes
nem usava. Minha primeira esposa chegou a desconfiar que
eu tivesse amante, pois não sabia
como o dinheiro sumia. Eu não tinha
nada palpável para apresentar. Era
juros em cima de juros, uma dívida
para pagar outra", relata. Foram
necessários 20 anos para Gilson
perceber que não era normal viver
todos os meses endividado e procurar ajuda. Hoje, ele é orientador do
grupo Devedores Anônimos de São
Paulo e ensina o que aprendeu em
10 anos de participação. "É uma patologia crônica. A qualquer momen-
to você pode ter uma recaída,
principalmente por problemas
emocionais", diz.
Não sabe dizer não
Lúcia* tem 39 anos e é solteira. Há
nove luta contra o impulso de emprestar dinheiro. "Meu problema
não é gastar demais e comprar compulsivamente", diz. "Eu sou desorganizada com as contas e os gastos.
Fui avalista de vários empréstimos
para ajudar aos outros e,
naturalmente, não me pagavam e
eu ficava com a dívida".
As dívidas de Lúcia equivaliam ao
valor de um carro. Hoje, ela diz que
não comete mais deslizes e só empresta o que sobra no final do mês
(quando empresa). "Fazia dívida
para pagar outra. As taxas de juros
são altíssimas e eu nem avaliava
qual era menor. Percebi que
precisava de ajuda quando assisti a
primeira apresentação da novela O
Clone, da Globo. Nos depoimentos
de pessoas compulsivas descobri
que eu também era", explica.
Segurando o impulso:
- Evite andar com cartões de crédito
e talões de cheque;
- Só saia com pouco dinheiro no
bolso;
- Quando for a um shopping, é sempre bom ter a companhia de um amigo para ajudar a manter o controle.
Porque são muitas as tentações.
Como saber se você é um
comprador compulsivo
• Não resiste ao impulso de
comprar?
• Gasta mais que o planejado e se
prejudica financeiramente?
• Impede ou prejudica seus planos
de vida e das pessoas à sua volta?
• Pede dinheiro emprestado para
os outros e até aplica golpes para
poder saldar a dívida?
• Precisa efetuar a compra de
qualquer maneira, independentemente do produto comprado?
• Percebe que está comprando
coisas que não usa ou usa muito
pouco?
• Assume dívidas acima de cinco
vezes o valor de sua renda
mensal?
também, quem contrai dívidas
porque não sabe contabilizar os
gastos e administrar o salário do
mês - e mesmo cheios de contas
para pagar, continuam gastando mais do que ganham.
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