O presente texto trata do recurso à tortura em interrogatórios. É escrito por
James Marshall Fellow Jutta Tobias, de acordo com base na pesquisa publicada
por Mark Constanzo, Elle Gerrity e M. Brinton Lykes num trabalho da ASAP de
2007 intitulado “Psychologists and the Use of Torture in Interrogations”. Este
texto, depois de lhe ter sido entregue, foi recentemente submetido pelo
Presidente Obama ao Grupo Especial de Trabalho sobre Políticas de
Interrogatório e Transferência.
O Presidente encarregou este grupo de trabalho específico de “estudar e avaliar
se as práticas e técnicas de interrogatório definidas no Manual de Campo do
Exército, quando empregues por departamentos ou agências não militares,
proporcionam os meios apropriados para a aquisição da informação necessária à
protecção da nação e, se justificado, recomendar qualquer orientação adicional
ou diferente a outros departamentos ou agências”. Este texto foi concebido com
o objectivo de providenciar ao grupo de trabalho o máximo de informação
científica possível antes da emissão de quaisquer recomendações oficiais para o
Presidente Obama.
Num anúncio feito esta semana relacionado com esta questão, várias agências
noticiosas relataram que o Presidente Obama decidiu estender o prazo do grupo
especial de trabalho para a revisão dos referidos materiais e a tomada de decisão
por mais dois meses.
O Recurso à Tortura em Interrogatórios
O recurso à tortura durante os interrogatórios está definido pelas Nações Unidas
como forma de tratamento cruel ou degradante, com a intenção de obter
informação ou uma confissão1. Todas as formas de tortura são proibidas nos
Estados Unidos da América, incluindo em período de guerra.
Sem surpresa, a tortura inflige traumas graves e duradouros nas suas vítimas.
Enquanto alguns a aceitam em nome da segurança nacional, os seus custos
severos estendem-se aos indivíduos que aplicam técnicas de tortura como parte
das investigações para a segurança nacional. Os formuladores de políticas
deveriam considerar todos estes dados aquando da avaliação do recurso à tortura
em interrogatórios.
Os seguintes argumentos científicos são particularmente relevantes para o
debate sobre o recurso à tortura durante interrogatórios:
•
A tortura é ineficaz e susceptível de produzir informação falsa
•
Todas as partes envolvidas na tortura sofrem efeitos prejudiciais
duradouros
•
A tortura acarreta graves consequências negativas para sociedade
A Tortura é ineficaz e susceptível de produzir informação falsa
O recurso a técnicas abusivas de interrogatório partem, frequentemente, do
pressuposto de que um suspeito está a sonegar informação. As pesquisas têm
confirmado que os interrogadores não conseguem afirmar, com segurança, que
um suspeito está a reter informação. Os suspeitos inocentes que não possuem
informação valiosa apresentam-se, geralmente, provocadores e resistentes aos
interrogadores e são interrogados mais violentamente.2
• Inúmeros sobreviventes de tortura afirmam que teriam dito qualquer coisa
desde que acreditassem que isso faria os torturadores parar.3
• Estudos provam que as falsas confissões estão entre as principais causas de
condenações erradas, especialmente para os crimes mais graves. Cerca de um
quarto dos casos de condenações erradas envolvem falsas confissões.4
• As pesquisas têm demonstrado que os interrogadores com treino profissional
são apenas capazes de identificar enganos numa taxa marginalmente superior ao
acaso.5
Todas as partes envolvidas na tortura sofrem efeitos prejudiciais duradouros
• Análises sistemáticas dos dados relativos aos efeitos da tortura sugerem que
os sobreviventes de tortura sofrem graves danos ao longo da vida, ao nível do seu
funcionamento físico, psicológico e económico.6
• As consequências traumáticas da tortura estendem-se às famílias das vítimas
e prolongam-se por várias gerações de comunidades de sobreviventes.7
• Provas provenientes de pesquisa confirmam que mesmo que uma sociedade
justifique o recurso à tortura, os perpetradores de severas técnicas de
interrogação vivenciam efeitos psicológicos negativos como resultado das suas
acções.8
A tortura acarreta graves consequências negativas para sociedade
• Estudos científicos ilustram a forma como a impunidade dos perpetradores
de tortura está relacionada com a frustração, a insegurança e com o
comportamento aditivo e violento da comunidade.9
• Os Estados Unidos da América colocam em risco os seus cidadãos
aprisionados no estrangeiro dada a sua própria incapacidade de respeitar os
padrões internacionais no que concerne o tratamento de detidos.10
• Uma vez que o recurso à tortura em interrogatórios ocorre em segredo, isto é,
num vazio de monitorização legal, profissional ou comunitária, os Direitos
Humanos de todas as partes envolvidas não são protegidos.11
Políticas recomendadas
O recurso à tortura mina a credibilidade dos Estados Unidos da América no que
respeita a defesa dos Direitos Humanos internacionais. Além disso, e como
mostram as pesquisas supracitadas, a tortura é ineficaz e tem profundas
consequências nefastas para os cidadãos norte-americanos. É eticamente
inaceitável. Portanto, os Estados Unidos da América e as suas forças militares
devem, de uma vez por todas, banir todas as técnicas de interrogação cruéis,
desumanas e degradantes.
Este texto baseia-se no artigo académico “Psychologists and the Use of Torture
in Interrogations”, escrito por por Mark Constanzo, Elle Gerrity e M. Brinton
Lykes e publicado na revista Analyses Social Issues and Public Policy, Vol. 7,
No. 1, 2007, pp. 7-20.
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10 Costanzo, M., Gerrity, E., & Lykes, M. B. (2007). Psychologists and the Use of Torture in
Interrogations. Analyses of Social Issues and Public Policy, 7(1), 7-20.
11 Lott, B. (2007). APA and the Participation of Psychologists in Situations in Which Human
Rights Are Violated: Comment on “Psychologists and the Use of Torture in Interrogations”.
Analyses of Social Issues and Public Policy, 7(1), 35-43.
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