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RACISMO E APRENDIZAGEM ESCOLAR
Tânia Mara Pacifico
O presente artigo se propõe a analisar a relação entre racismo e
aprendizagem escolar e apontar possíveis caminhos para ações de
professores, pedagogos e diretores em uma perspectiva anti-racista.
O referencial teórico que subsidiará as análises se pauta na
legislação vigente (Lei 10639/03; Parecer 03/04 do Conselho Federal
de Educação; Deliberação 04 do Conselho Estadual do Paraná) e em
estudos que analisam na perspectiva crítica as desigualdades raciais (
por exemplo CAVALLEIRO, 2001; GIROUX, 1999; PAIXÃO, 2006;
ROSEMBERG, 1998; SILVA, 2005).
O termo raça é utilizado em consonância com as Diretrizes
Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-Raciais e
para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana (2004)
que
o
define
como
construído
nas
tensas
relações
sociais
estabelecidas entre brancos e negros e é muitas vezes utilizado para
informar características físicas como cor da pele, cabelo e não no
sentido biológico.
A PROBLEMÁTICA DO RACISMO NA EDUCAÇÃO ESCOLAR
O racismo é definido como um comportamento, uma ação que é
resultado da aversão, algumas vezes ódio, para com as pessoas que
tem uma pertença racial que é possível observar, por meio de traços
como cor da pele, tipo de cabelo, forma dos olhos, entre outras,
resulta da crença da existência de raças ou tipos humanos superiores
e inferiores, na tentativa de se impor como única ou verdadeira
(MUNANGA & GOMES, 2006).
No Brasil o preconceito em relação a negros tem características
bem
específicas,
ele
ocorre
principalmente
levando-se
em
consideração o fenótipo das pessoas, ou seja, características físicas
aparentes, tais como cabelo, cor de pele, formato da boca, do nariz.
2
Diferente do que ocorre nos Estados Unidos, onde o preconceito é
determinado particularmente pela origem (descendência). A “one
drope rule”, ou seja, regra de uma gota de sangue, indica que uma
pessoa pertence à raça negra, mesmo que não apresente aparência
física. O conceito racismo de “marca”, foi concebido por Oracy
Nogueira, para diferenciar o Brasil dos Estados Unidos (MUNANGA,
2006).
A prática do racismo é histórica e foi construída socialmente nas
relações sociais e pelas relações de poder que se fizerem presentes
nos diferentes modelos sociais organizados historicamente (seja ele
por raça, etnia, opção sexual, entre outras).
O Brasil é um país historicamente formado por uma diversidade
de grupos étnico-raciais, e com isto, pluralidade de crenças,
costumes, entre outros. Entretanto, é muito presente o racismo em
suas diferentes formas de expressão. Este é um país com baixo
desenvolvimento social, econômico e político e com graves problemas
nas questões relacionadas à saúde, habitação, saneamento e
educação. A população pobre é que mais sofre as conseqüências
desta realidade. As condições sociais desta população que, em
número significativo, por determinações históricas, se constituí
principalmente do grupo de negros, tem também ocasionado
condições precárias no processo de escolaridade, traduzidas no baixo
nível de formação, nas más condições de estrutura e organização e
em diversas formas de discriminação dentro e fora da escola.
É preciso discutir até que ponto o racismo influência o
desempenho escolar no ensino brasileiro. Na infância as práticas
discriminatórias podem
deixar seqüelas muitas vezes difíceis de
serem sanadas. A delicadeza da temática e sua gravidade tornam a
discussão a respeito do assunto tensa. As relações estabelecidas no
âmbito escolar, no que se refere ao ensino aprendizagem, não deixam
dúvidas de sua complexidade, em se tratando da temática racial. As
relações raciais na escola são, via de regra, movidas por uma
invisibilidade, por parte da maioria dos professores e da comunidade
escolar.
3
Quando se propõe uma discussão com os professores, ela gera
na maioria das vezes, tensão e desconforto. Muitos preferem
silenciar, ao invés de enfrentar o problema. Alguns chegam a negar a
existência de racismo na escola. “A ausência de iniciativas diante de
conflitos raciais entre alunos e alunas mantém o quadro de
discriminação. Diante desses conflitos o “silêncio” revela conivência
com tais procedimentos (CAVALLEIRO, 2001, p.153). Um passo
importante em busca de uma educação anti-racista é reconhecer a
existência de atitudes discriminatórias na escola e dar atenção
quando essas atitudes ocorrerem. O silêncio muitas vezes pode levar
o aluno a se sentir abandonado, sem o apoio de uma pessoa, que
neste momento deveria fazer algo para confortá-lo e fortalecer sua
estima. A falta de ação leva por vezes, a revolta, e o aluno passa a
ser considerado violento, adquirindo o esteriótipo de agressivo e a
violência racial que ele sofreu é desconsiderada. Os diretores,
pedagogos e professores precisam ser sensibilizados para a gravidade
deste problema, que pode deixar seqüelas, que podem acompanhar
até a vida adulta deste aluno.
Estudos demonstram que mesmo em famílias, em que os irmão
são
fenotipicamente
diferentes,
o
aluno
com
fenótipo
com
características da raça negra, pode apresentar pior rendimento
escolar do que o irmão branco. Ao terem o desempenho educacional
comparados, irmãos de cor diferente (irmãos brancos em comparação
com pretos ou pardos); os irmão brancos apresentam maior
possibilidade que os irmãos negros, de apresentar rendimento
adequado a idade série, conforme dados do censo de 1991 (SILVA,
2005). Tendo em vista que pertencem à mesma família, e tiveram a
mesma criação, a explicação se desloca para o racismo sofrido no
ambiente escolar.
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CAMINHOS PARA UMA AÇÃO ANTI-RACISTA
O discurso de que vivemos, no Brasil, uma democracia racial, é
enfatizado na escola, mas já passou da hora da descontrução desse
mito; muitos autores vêm trabalhando nesse sentido (PAULO SILVA,
2005; CAVALLEIRO, 2001; MUNANGA, 2006).
O mito da democracia racial, baseado na dupla mestiçagem biológica
e cultural entre as três raças originárias, tem uma penetração muito
profunda na sociedade brasileira: exalta a idéia de convivência
harmoniosa entre os indivíduos de todas as camadas sociais e grupos
étnicos, permitindo às elites dominantes dissimular as desigualdades
e impedindo os membros das comunidades não-brancas de terem
consciência dos sutis mecanismos de exclusão da qual são vítimas na
sociedade (MUNANGA,2006, p.89).
A idéia, de que o Brasil, vive em uma democracia racial, foi
defendida por Gilberto Freire, sociólogo, em seu livro Casa Grande e
Senzala e persiste até os dias atuais. Mas a população negra sofre na
pele no dia-a-dia uma série de situações envolvendo humilhações e
privação de seus direitos, fatos que acontecem com freqüência
também na escola; de forma velada mas muitas vezes explícita,
reforçando e naturalizando a inferioridade da população negra.
Encontramos na literatura alguns exemplos: “Aparecida, 11 anos,
negra, afirmou não gostar de Glauber, um colega de sala, porque ‘ ele
é enjoado... fica me chamando
assim de baleia, de negona, de
pretona’. A reação de Aparecida diante disso é : Eu finjo que não
escuto” (FAZZI, 2006, p. 178). Ao comentar com uma amiga negra,
com baixa escolaridade tal artigo, ela me contou que lembra com
tristeza de ocasiões em que era xingada de “pau de fumo”, de
“macaca”, “ de nega fedida”, na escola. Disse que no começo sentia
muito ódio, mas que depois se acostumou e nem ligava mais. Os
depoimentos permitem levantar a hipótese que em muitas ocasiões o
racismo causa a princípio indignação e depois anestesia e a pessoa
começa a aceitar como normal, ou seja, fica naturalizada a suposta
superioridade do branco sobre o negro.
Neste sentido, considera-se importante, promover espaços de
análise e reflexões sobre este tema, na perspectiva de desenvolver
5
estratégias pedagógicas de práticas anti-racistas com a contribuição
da Lei n.° 10.639 de 09 de janeiro de 2003, que define a inclusão
pelas escolas nos seus currículos de conteúdos de História da África e
Cultura Afro-Brasileira. Tal proposição pode ser considerada como
uma possibilidade de avanços no âmbito educacional e cultural e,
portanto, uma possibilidade, também, de mudanças em práticas
sociais
e
humanas,
com
o
reconhecimento
que
os
negros
contribuíram fortemente para a formação do povo brasileiro.
Repensar a forma de organização curricular e incentivar ações
pedagógicas que venham ao encontro das lutas travadas pelos
negros1, por direito de participação em todos os segmentos da
sociedade é um dever, agora instituído e garantido por lei. A lei, que
modifica o artigo 26 da LDB (Dias, 2005). Essa legislação legitima
uma
antiga
reivindicação
do
movimento
negro
e
a
sua
implementação nas escolas pode auxiliar para ressignificar a história
do negro no Brasil, como estratégia para mudança do auto-conceito e
crítica ao eurocentrismo. Cabe aos estabelecimentos de ensino criar
mecanismos para que ela seja cumprida. Segue o que reza a Lei:
“ Art. 1º A lei n. º 9.394, de 20 de dezembro de 1996, passa a vigorar
acrescida dos seguintes arts.26-A, 79-A e 79-B:
Art. 26 – A. Nos estabelecimentos de ensino fundamental e médio,
oficiais e particulares, torna-se obrigatório o ensino sobre História e
Cultura Afro-Brasileira.
§ 1º O conteúdo programático a que se refere o caput deste incluirá o
estudo da História da África e dos Africanos, a luta dos negros no
Brasil, a cultura negra brasileira e o negro na formação da sociedade
nacional, resgatando a contribuição do povo nas áreas social,
econômica e política pertinentes à História do Brasil.
§ 2 º Os conteúdos referentes à história e Cultura Afro-Brasileira serão
ministrados no âmbito de todo o currículo escolar, em especial na
áreas de Educação Artística e de Literatura e Histórias Brasileiras.
§ 3º (VETADO)
Art. 79-A (VETADO)
Art. 79-B O calendário escolar incluirá o dia 20 de novembro como
‘Dia Nacional da Consciência Negra.”
1
Será utilizado o termo negro, para designar pessoas, ou características da
população do Brasil, denominada nos Censos como pretas e pardas, segundo o
sentido utilizado pelo movimento negro.
6
Para efetivar a real aplicação da Lei n.º10.639/03 sugere-se que
diretores,
equipe
pedagógica
e
professores
aprofundem
o
conhecimento teórico e metodológico sobre o assunto e viabilizar
condições para consolidação deste conhecimento, com a intenção de
implantar na escola uma prática anti-racista. Propõe-se que uma
prática que repudie o racismo e qualquer forma de preconceito nas
escolas, pode contribuir para melhorar o ensino aprendizagem e
ajudar na manutenção dos alunos negros nas escolas, com voz e
participação ativa neste processo:
Todas as escolas deveriam fazer os professores e os alunos participarem
do currículo anti-racista que, de algum modo, está ligado a projetos da
sociedade em geral. Esta abordagem redefine não somente a
autoridade do professor e a responsabilidade dos alunos, mas situa a
escola como uma força importante na luta por justiça social, econômica
e cultural. Uma pedagogia de resistência pós-moderna e crítica pode
desafiar as fronteiras opressivas do racismo, mas também aquelas
barreiras que corroem e subvertem a construção de uma sociedade
democrática (GIROUX, 1999, p.166).
Portanto, o ensino de História da África e Cultura Afro-Brasileira,
se ensinado nas escolas com compromisso e responsabilidade, por
parte dos professores, pode contribuir para valorizar a identidade
negra e para que os alunos se fortaleçam, permaneçam estudando e
aumentem o percentual de escolaridade, até então baixo, dos alunos
negros.
ARTICULAÇÃO COM O MOVIMENTO NEGRO
Os movimentos negros através de variadas ações, tais como
palestras e ações conjuntas, apresenta-se como um aliado das
escolas para ajudar a articular estratégias para implementar uma
educação anti-racista.
O movimento negro também é muito atuante no cenário
brasileiro, e ao longo da história está travando lutas em busca de
uma sociedade onde os negros tenham seus direitos garantidos. Para
7
tanto o conhecimento sobre a temática racial e a capacidade de se
colocar no lugar do outro são primordiais.
Diversos
seminários,
encontros,
oficinas,
entre
eles:
a
comemoração do centenário da abolição da escravatura em 1988, a
III Conferência Mundial das Nações Unidas contra o Racismo,
Xenofobia e Intolerância Correlata, realizada em Durban, em 2001,
trataram de temas ligados ao racismo e ao combate do racismo nos
livros didáticos. Destaca-se também a importância do movimento
negro, através de ações diversificadas (SILVA, 2005).
Na luta por conquistas relacionadas às questões raciais, entre
elas: a luta contra o racismo e a discriminação racial; a literatura
aponta a importância que movimento negro teve e têm nas mais
diversas reivindicações e avanços. A inserção do estudo da História e
Cultura da áfrica e Afro-Brasileira é uma antiga reivindicação do
movimento negro, que contribuiu para elaboração da lei 10639/03:
“Ao movimento social negro tem-se constituído como um movimento
importante na sociedade brasileira. A história é repleta das ações de
rebeldia, de luta e libertação da população negra, desde o início da
escravidão
no
Brasil.
Os
quilombos
são
sinais
vivos
dessa
organização e resistência” (PAIXÃO, p.53, 2007).
O Parecer n.º 03/04 do Conselho Nacional de Educação, prevê o
ensino da História da África, de forma positiva, buscando não
enfatizar as questões relacionadas aos aspectos negativos. Essa
indicação se deve principalmente ao fato de que o aluno negro
precisa, desde a mais tenra idade infância, formar sua identidade.
Sendo considerada como um processo contínuo construído pelos
negro/as em diversos espaços institucionais ou não, pelos quais
circulam; essa identidade negra também é construída na escola,
durante a trajetória desses sujeitos. Portanto a escola tem a
responsabilidade
social
e
educacional
de
compreender
sua
complexidade, respeitando-a, bem como as outras identidades
construídas pelos sujeitos no âmbito escolar; lidando de maneira
positiva com ela (GOMES, 2005).
8
ANÁLISE CRÍTICA DE LIVROS E MATERIAIS DIDÁTICOS
No que diz respeito à educação brasileira é possível perceber e
vivenciar as distorções sobre os negros em materiais didáticos
pedagógicos e também na forma de ministrar as aulas, que por
vezes, são carregadas de falta de conhecimento e preconceito com
relação aos negros, sua história, suas características e sua cultura:
Assim, pelo menos desde a década de 1970, foram sendo realizadas
pesquisas sobre livros didáticos de diferentes disciplinas e níveis
escolares e de literatura infanto-juvenil que evidenciam o forte
preconceito racial aí veiculado, que se manifesta desde a menor
representação de personagens negros a servirem de modelo,
passando por sua desqualificação até a omissão quanto à
contribuição do negro na formação cultural do Brasil ( ROSEMBERG,
1998, p.84).
Cabe ao professor prestar muita atenção nos materiais didáticos
que utilizará para ministrar suas aulas. O livro didático que na maioria
das vezes é o principal recurso utilizado, pelos professores em sua
prática diária, pode reforçar o racismo. Determinados livros didáticos
ao retratar o negro, ocupando cargos subalternos, sem família
constituída, praticando atos ilícitos, passam a idéia de inferioridade
racial. Cândida Soares da Costa (2007, p. 89) esclarece muito bem
esta questão quando afirma que:
Os negros continuam sendo colocados em posições semelhantes aos
que as ideologias racistas insistem em conferir-lhes ao longo do
tempo. A análise dos dados aponta que as imagens distorcidas,
dispensadas a negros e brancos, ajudam a disseminar a condição de
discriminação contra os negros, haja vista que são representados
como insignificante minoria e em papéis de pouca valorização social
(COSTA, 2007, p. 89).
No Paraná em 2007, representantes do Coletivo da Igualdade
Racial e ACNAP (Associação Cultural da Negritude e Ação Popular)
denunciaram junto ao Ministério Público em Londrina, e anexaram a
carta do Professor Edmundo Silva Novais que pedia a retirada do livro
didático da Editora Positivo – Coleção conversando sobre História – 3ª
9
série do autor Francisco Coelho Sampaio, que trazia ilustrações
racistas. Segundo o professor o livro descumpre a lei e negligencia a
história dos povos negros na História do Brasil. Relatou também o
exagero de imagens em que pessoas negras aparecem em condições
de humilhação e sofrimento, totalizando 25 imagens. Dentre as quais
10 mostram pessoas negras apanhando e sendo humilhadas por
pessoas brancas. A que chama mais atenção são crianças negras
sofrendo e acorrentadas pelo pescoço. O termo escravo aparece 73
vezes, intercalando os termos negros e africanos, podendo fazer as
crianças acreditarem que são sinônimos. Em 12/12/2007 as referidas
entidades, obtiveram parecer favorável a mudança de conteúdo
negativo sobre a participação do povo negro na História do Brasil.
(www.app.com.br.coletivos/igualdade racial).
Esta atuação da APP-Sindicato do Paraná e do movimento negro
(ACNAP) com a colaboração do Professor Edmundo, alerta para o
papel dos professores no que diz respeito a analisar e ficar atento as
ilustrações existentes nos livros e materiais didáticos, para seguir
este exemplo e denunciar essas manifestações racistas.
O fato de existirem livros didáticos que mantêm as idéias de
supremacia racial branca e inferiorizam negros e indígenas, não quer
dizer que nada pode ser feito. Professores com boa formação e
compromissados com uma educação anti-racista, ao perceberem
textos e ilustrações que desmereçam os não brancos podem, por
meio
de
análise
criteriosa,
discutir
com
os
alunos,
para
descaracterizar a discriminação. Nas palavras de Paulo Vinícius
Baptista da Silva:
Utilizando textos em sala de aula que trazem muitas marcas de
hierarquia entre brancos e negros(ou entre brancos e indígenas, ou
entre heterossexuais e homossexuais, etc.) professores bem
preparados para debater estes temas podem operar no sentido de
crítica, junto com seus alunos, aos discursos discriminatórios. (...)Da
análise crítica conjunta com os alunos talvez possamos gerar pontos
de vista anti-racistas e anti-discriminatórios, mudando a direção da
que normalmente operam os discursos nas escola (SILVA, 2007, p.
188).
10
RESPEITO À DIVERSIDADE CULTURAL E RELIGIOSA
Ao tratar das questões religiosas, os praticantes das religiões de
matriz africana, Candomblé e Umbanda principalmente, sofrem
preconceito por uma parte da população brasileira. As igrejas
católicas
e
evangélicas
condenam
os
rituais,
considerando-os
satânicos; fazem associação dos orixás a demônios. “Mas até hoje
existe um persistente preconceito na população em geral, contra as
religiões afro-brasileiras e os terreiros de candomblé, que são
freqüentemente chamados de “macumba”, com significado de antros
do mal”.
(LÉPINE, 2007, p.35).
Diante da diversidade de religiões
existentes no mundo, originadas de culturas diferentes, a intolerância
às
religiões
afro-brasileiras,
por
vezes,
é
fruto
da
falta
de
conhecimento. A disciplina de ensino religioso, têm como indicação
transmitir o conhecimento sobre todas as religiões, inclusive as de
matriz africana. Através do estudo dessas religiões é possível
desmistificar essas crenças, mostrando a beleza do ritual e das
relações fraternas que são estabelecidas entre negros e brancos, nos
terreiros de Candomblé e centros de Umbanda.
A Umbanda é resultado do encontro do Candomblé, do
espiritismo kardecista francês e do catolicismo e é considerada uma
religião brasileira.
O Candomblé desenvolveu-se em várias regiões do país, ficando
conhecido com outras denominações. Na Bahia é Candomblé , Rio
Grande do Sul recebe o nome de batuque, no Rio de Janeiro de
macumba, xangô em Pernambuco e Alagoas , tambor de mina no
Maranhão e Pará ( MUNANGA& GOMES, 2006). É uma religião
monoteísta. Oludumaré é o Supremo - Criador , que é ajudado pelo
orixás2. Os praticantes dessa religião fazem sua conexão com o
sagrado através o Ifá – Oráculo detentor de toda sabedoria. A liturgia
é demorada e tem início com apresentação dos iniciados possuídos
2
“São divindades africanas trazidas para o Brasil pelos negros yorubás, grupo étnico
da África do oeste que inclui países como Nigéria, Togo e República do Benin
(BOTELHO, 2006, p.136).”
11
por seus orixás, dançando, sendo identificados pela cor de seus
trajes. Existem as ialorixás, lideres máximas do Candomblé, que são
sacerdotisas que conduzem o terreiro. Os babalorixás são sacerdotes
masculinos. Cada orixá tem suas especificidades, que inclui roupas,
insígnias, cores e cantos (BOTELHO, 2006).
O reconhecimento da importância da valorização e aceitação
dos rituais e das religiões de matriz africana é um passo rumo ao
combate a intolerância religiosa, contribuição que a escola encontra
respaldo legal, para dar através da Lei 10639/03.
ESCOLHA
DE
CONTEÚDOS
E
VALORIZAÇÃO
DO
AFRO-
BRASILEIRO
A opção sobre conteúdos escolares que levem à valorização de
afro-descentes
e
africanos
apresenta
múltiplas
possibilidades.
Trataremos a seguir de alguns exemplos de temas que podem ser
trabalhados neste sentido, com o intuito de colocar em primeiro plano
a positividade da herança africana e afro-brasileira.
As crianças negras são geralmente levadas a acreditar em sua
grande maioria, que os negros ao serem escravizados, não resistiram
ao serem capturados e aceitaram a escravidão de forma passiva. Este
fato pode gerar um sentimento de inferioridade e a construção de
uma postura submissa, que dificulta o relacionamento com os demais
alunos,
com
professores
e
principalmente
pode
interferir
na
aprendizagem. Uma das formas de resistência que, por vezes, não é
enfatizada durante as aulas pelos professores, nas disciplinas de
História e Geografia principalmente são os quilombos:
“Nesse sentido, o quilombo não significa refúgio de escravos fugidos.
Tratava-se de uma reunião fraterna e livre, com laços de
solidariedade e convivência resultante do esforço dos negros
escravizados de resgatar sua liberdade e dignidade por meio da fuga
do cativeiro e da organização de uma sociedade livre. Os quilombolas
eram homens e mulheres que se recusavam viver sob o regime da
escravidão e desenvolviam ações de rebeldia e de luta contra o
sistema (MUNANGA & GOMES 2006, p.72).”
12
O professor ao oportunizar as crianças esse conhecimento,
aprofundando o tema, passando filmes e viabilizando discussões, dá
elementos para que elas passem a perceber como foram guerreiros
seus antepassados, que desejavam uma vida digna para os seus
descendentes que foi materializada, com competência, através da
organização dos quilombos. Por exemplo, o filme Quilombo, com
direção de Cacá Diegues, descreve a organização do Quilombo dos
Palmares, que ocorreu por volta de 1650, quando um grupo de
escravos se revolta , num engenho de Pernambuco e vai para o
Quilombo de Palmares, onde vários ex-escravos fugitivos resistem ao
cerco colonial. Destacam-se Ganga Zumba, príncipe africano e futuro
líder do quilombo, posteriormente, Zumbi, que será contra as idéias
conciliatórias de Ganga Zumba, e enfrentando um grande exército. O
filme tem duração de 119 minutos (Cadernos temáticos, 2006). No
Paraná
apesar
da
pouca
divulgação,
existem
comunidades
remanescentes de quilombos, identificadas pelo Grupo de Trabalho
Clóvis Moura, localizadas em sua maioria nos Campos Gerais, em
Curiúva, Castro, Guarapuava, Lapa, Ponta Grossa, Campo Largo, entre
outras (Cruz,2006).
Em 2004, teve início o mapeamento das comunidades
remanescentes quilombolas no Estado do Paraná. O grupo de trabalho
Clóvis Moura, do governo do Estado, sob a coordenação de Glauco
Souza Lobo e a Professora Clemilda Santiago que coordena o trabalho
de campo, pela SEED, catalogaram mais de 20 locais, e 14 delas têm
o reconhecimento da Fundação Palmares, como remanescentes
quilombolas e aproximadamente 20 comunidades estão em processo
de reconhecimento. A comunidade remanescente Paiol de Telha,
localizada no município de Pinhão, foi a primeira a chamar a atenção
no Estado e recebe o apoio de várias entidades: APP-Sindicato do
Paraná, CUT, ACNAP entre outras (Cadernos Temáticos, 2006).
Uma preocupação que os professores devem ter é com as
imagens usadas por eles para ilustrarem suas aulas. Em certas
ocasiões, alguns professores lançam mão de imagens apelativas,
13
encontradas facilmente na Internet, para sensibilizarem os alunos
com relação à pobreza, falta de saneamento básico, comida e de
oportunidades, utilizando-se para tanto de imagens de crianças
negras em condição de penúria e brancas com toda sorte de
privilégios. Quando se depara com essa situação a criança negra se
sente humilhada e tende a se identificar com a impossibilidade de
conseguir se posicionar como capaz. Na África e no Brasil, existem
crianças negras vivendo em condições adequadas. Existem imagens
belíssimas
de
países
africanos,
com
cidades
altamente
industrializadas e usufruindo de excelentes condições tecnológicas,
que
precisam
ser
mostradas.
O
imaginário
infantil
pode
ser
alimentado com ilustrações positivas da população e dos países
africanos.
Outro tema que merece destaque é a oralidade é muito
valorizada na cultura africana, as disciplinas de português, artes e
educação
física,
através
dos
contos
africanos,
encontram
possibilidades de demonstrar a riqueza herdada dos ancestrais,
explicando como os contos eram utilizados, enfatizando a arte e a
musicalidade.
O
Ministério
Público
através
do
FNDE,
PNBE,
distribuíram em 2007 para escolas estaduais de ensino fundamental,
livros de contos, dos quais dois sobre contos africanos que podem ser
utilizados em sala de aula. São eles: Sikulume e outros contos
africanos, adaptação de Júlio Emílio Braz, ilustrações de Luciana
Justiniani, Editora Pallas, Rio de Janeiro, 2005 e Histórias Africanas
para Contar e Recontar, autor Rogério Andrade Barbosa, ilustrações
de Graça Lima, Editora do Brasil, São Paulo, 2001.
Os contos fazem parte da tradição oral africana e eram
contados pelos mais velhos, em algumas comunidades, após o jantar,
as crianças eram reunidas para ouvi-los e sempre tinha um teor de
ensinamento.
Outra questão se refere a uma preocupação que atormenta as
crianças pertencentes a raça negra é o cabelo, que é denominado por
algumas pessoas como “cabelo ruim”, a auto-estima das crianças fica
muito abalada, pois almejam, em sua grande maioria ter o cabelo
14
parecido com o da boneca Barbie, ou com o da apresentadora Xuxa,
sonho impossível. Mas para aproximarem-se desse ideal, muitas
recorrem ao alisamento e a trazê-los presos constantemente, bem
esticados,
para
não
se
tornarem
alvo
fácil
de
atitudes
discriminatórias, tais como serem xingadas de cabelo duro, de
bombril, assolan, pixaim, carrapinha, entre outros.
Desde muito cedo a criança aprende, por exemplo, que cabelo liso é
que é cabelo bonito, e esse padrão é reforçado, uma vez que
parecem raros, senão inexistentes, elogios ao cabelo crespo durante
a infância. (...) A intenção de alisar o cabelo é muito forte entre as
crianças observadas. Mesmo as que disseram gostar da própria cor
afirmaram não gostar do cabelo. A expressão “nega do cabelo duro”
ainda é utilizada como uma forma de inferiorização (...) Esse padrão
de beleza, liso e comprido, é quase unanimidade entre as crianças
(FAZZI, 2006, p.117).
Os professores, pedagogos e diretores, devem estar atentos e
proporcionar conversas e palestras que exaltem a beleza do cabelo
afro, mostrando a possibilidade de fazer vários penteados, entre eles
as tranças, que expressam a beleza do cabelo e que tem um
significado na cultura africana. A jornalista Neusa Baptista Pinto
elaborou um livro, material pertencente ao projeto “Pixaim: nem bom
nem ruim, só diferente”- estímulo à valorização do cabelo crespo
entre crianças na periferia de Cuiabá, que conta com recursos do
Fundo Estadual de Fomento à Cultura do Governo do Mato Grosso,
que conta a história de três meninas que enfrentam as manifestações
preconceituosas relacionadas ao cabelo crespo. Material como esse
pode servir de apoio para enriquecer a prática pedagógica em escolas
de ensino fundamental. O título do livro é: Cabelo Ruim? A história de
três meninas aprendendo a se aceitar. M.T., Editora Tanta Tinta, 2006.
15
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Diante da delicadeza e da gravidade da temática racial, diretores,
pedagogos e professores, ao serem sensibilizados sobre o problema
do racismo no ambiente escolar, tornam-se responsáveis pela
promoção de uma educação anti-racista, no sentido de não medir
esforços para garantir igualdades de condições de aprendizagem para
negros e brancos.
O compromisso em promover a igualdade racial inclui a
implementação da Lei 10639/03, que representa uma possibilidade de
avanço para ressignificar a História da África e da cultura Afrobrasileira; bem como atenção por parte dos professores aos materiais
didáticos utilizados para ministrar suas aulas, tomando cuidado com
textos e ilustrações que possam reforçar o racismo e quando por
ventura parecerem denunciar aos órgãos competentes.
Valorizar os conteúdos como contos africanos, respeito às
religiões de matriz africana, formas de resistência e luta como os
quilombos e atualmente a atuação do movimento negro, durante as
aulas, pode contribuir para elevar a auto – estima de alunos negros.
Essas ações concretas contra o racismo na escola podem
amenizar o prejuízo que esta prática vem trazendo para alunos
negros e significar reais possibilidades de aprendizagem.
16
Referências:
COSTA, Cândida Soares. O negro no livro didático de língua
portuguesa: imagens e percepções de alunos e professores.
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Racismo e aprendizagem - Secretaria de Estado da Educação do