Universidade Federal do Rio de Janeiro
ENSAIOS SOBRE PRODUTO POTENCIAL,
CONTABILIDADE DO CRESCIMENTO E
DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO.
Rafael Chelles Barroso
2005
ENSAIOS SOBRE PRODUTO POTENCIAL,
CONTABILIDADE DO CRESCIMENTO E
DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO.
Rafael Chelles Barroso
Dissertação de Mestrado apresentada ao
Programa de Pós-graduação em Economia,
Instituto de Economia, Universidade Federal
do Rio de Janeiro, como parte dos requisitos
necessários à obtenção do título de Mestre
em Ciências Econômicas.
Orientador: Antonio Barros de Castro
Co-orientador: Francisco E. P. de Souza
Rio de Janeiro
Setembro, 2005.
ii
ENSAIOS SOBRE PRODUTO POTENCIAL,
CONTABILIDADE DO CRESCIMENTO E
DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO.
Rafael Chelles Barroso
Orientador: Antonio Barros de Castro
Co-orientador: Francisco E. P. de Souza
Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós-graduação em
Economia, Instituto de Economia, Universidade Federal do Rio de
Janeiro, como parte dos requisitos necessários à obtenção do título de
Mestre em Ciências Econômicas.
Aprovado por:
Presidente, Prof. Antônio Barros de Castro
Profa. Viviani Luporini
Prof. João Sabóia
Prof. Francisco Eduardo Pires de Souza
Prof.
Rio de Janeiro
Setembro, 2005.
iii
Barroso, Rafael Chelles.
Ensaios sobre Produto Potencial, Contabilidade do
Crescimento e Desenvolvimento Econômico/ Rafael Chelles
Barroso. – Rio de Janeiro: UFRJ/ IE, 2005.
X, 145f.: il.; 31 cm.
Orientador: Antonio Barros de Castro
Dissertação (mestrado) – UFRJ/ IE/ Programa de PósGraduação em Economia, 2005.
Referências Bibliográficas: f.132-135.
1. Desenvolvimento Econômico. 2. Economia Brasileira.
I. Castro, Antonio Barros de. II. Universidade Federal do Rio de
Janeiro, Instituto de Economia – Programa de Pós-graduação em
Economia. III. Título.
Em caso de dúvidas, favor contatar a Bibliotecária da sua Unidade ou Centro
iv
AGRADECIMENTOS
Agradeço acima de tudo aos meus pais e a minha avó por me darem apoio
material e emocional ao longo dessa jornada e a última, em específico, por me acolher
em sua casa por quase 3 anos. Aos meus primos e primos, tias e mais recentemente à
minha afilhada por terem criado no Rio de Janeiro um verdadeiro ambiente familiar
para mim. Por último, mas não menos importante à Suzana que foi quem acompanhou
a minha batalha diária e me reconfortou nos momentos mais exasperantes.
Ao meu orientador, que além da orientação formal, me proporcionou outras
oportunidades de interação e de aprendizagem. Ao meu co-orientador, que
desobrigadamente e de coração aberto aceitou o pedido para me socorrer na reta final.
Aos demais membros do Grupo de Conjuntura que proporcionaram nesse período de
convivência, um rico fórum de debates para as mais variadas idéias. Também não
posso esquecer dos funcionários do grupo: Sônia e Sidenir, que nunca me negaram o
apoio necessário.
Inestimável também foi a ajuda de todas as pessoas como Marta Areosa, Regis
Bonelli, Lucilene Morandi, Richard Nelson e Howard Pack, que mesmo sem me
conhecerem responderam aos meus chamados por ajuda, por e-mail ou telefone, seja
esclarecendo dúvidas ou fornecendo base de dados ou outras informações que foram
extremamente valiosas para a elaboração dessa dissertação.
Por último, não posso me esquecer de agradecer aos meus colegas do
programa de pós-graduação, que tornaram essa jornada mais prazerosa, a Capes que
financiou os meus estudos e mais uma vez ao Grupo de Conjuntura que mesmo sob
dificuldades assumiu a tarefa do financiamento após o término da bolsa de mestrado.
v
RESUMO
ENSAIOS SOBRE PRODUTO POTENCIAL,
CONTABILIDADE DO CRESCIMENTO E
DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO.
Rafael Chelles Barroso
Orientador: Antonio Barros de Castro
Co-orientador: Francisco E. P. de Souza
Resumo da dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pósgraduação em Economia, Instituto de Economia, Universidade Federal do
Rio de Janeiro, como parte dos requisitos necessários à obtenção do título
de Mestre em Ciências Econômicas.
Recentemente, a pesquisa econômica brasileira viu seu interesse
pelos temas dos limites do crescimento serem reacendidos, incluído entre
eles o produto potencial e a contabilidade do crescimento. Essa
dissertação faz uma avaliação crítica dos modelos de PIB potencial e
contabilidade do crescimento, aplicados até hoje à economia brasileira.
Ademais, algumas sugestões dentro do referencial teórico ortodoxo e
também no enfoque evolucionista são feitas e avaliadas, com o intuito de
se avançar na compreensão da questão.
Palavras-chave: Desenvolvimento Econômico, Produto Potencial,
Contabilidade do Crescimento, Teorias Evolucionistas
Rio de Janeiro
Setembro, 2005.
vi
ABSTRACT
ESSAYS ON POTENTIAL OUTPUT, GROWTH ACCOUNTING AND
ECONOMIC DEVELOPMENT.
Rafael Chelles Barroso
Orientador: Antonio Barros de Castro
Co-orientador: Francisco E. P. de Souza
Abstract da dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pósgraduação em Economia, Instituto de Economia, Universidade Federal do
Rio de Janeiro, como parte dos requisitos necessários à obtenção do título
de Mestre em Ciências Econômicas.
The Brazilian economic research has recently seen a renewal in the
interest on the limits’ to growth literature, which includes themes such as
potential output and growth accounting. This dissertation undertakes a
critical appraisal of the potential output and growth accounting models,
applied so far to the Brazilian case. Furthermore, some suggestions within
the scope of the orthodox theory as well as in the evolutionary approach
are advanced, in order to enhance the comprehension of such questions.
Key-words: Economic Development,
Accounting, Evolutionary theories
Potential
Rio de Janeiro
Setembro, 2005.
vii
Output,
Growth
SUMÁRIO
1.
1.1.
1.2.
1.3.
2.
2.1.
2.1.1.
2.1.2.
2.2.
2.3.
2.4.
3.
3.1.
3.1.1.
3.1.2.
3.1.3.
3.1.4.
3.2.
3.2.1.
3.2.2.
3.2.3.
3.2.4.
3.3.
3.3.1.
3.3.2.
3.3.3.
3.4.
4.
4.1.
4.1.1.
4.1.2.
4.2.
4.2.1.
4.2.2.
5.
5.1.
5.2.
5.3.
6.
7.
Introdução .........................................................................................................1
Proposta e Plano da Dissertação .....................................................................2
PTF (Produtividade Total dos Fatores) e Contabilidade do Crescimento ..4
A Importância do PIB Potencial e dos Exercícios de Contabilidade do
Crescimento.....................................................................................................11
Metodologias de Cálculo do Produto Potencial ...........................................13
Métodos Estatísticos .......................................................................................14
O Filtro HP ...............................................................................................16
Resultados do Filtro HP aplicados ao Caso Brasileiro .........................18
Métodos Econômicos ......................................................................................21
Métodos Híbridos ...........................................................................................23
Breve Resenha da Literatura Internacional ................................................23
Métodos de Cálculo Aplicados ao Caso Brasileiro ......................................28
Um Modelo Simples de Função de Produção...............................................28
Metodologia ..............................................................................................28
Equações do Modelo ................................................................................34
Resultados.................................................................................................35
Projeções e Análises de Sensibilidade ....................................................42
Um Modelo de Crescimento Equilibrado.....................................................48
Metodologia ..............................................................................................48
Equações do Modelo ................................................................................54
Resultados.................................................................................................57
Produto Potencial e Exercícios Alternativos .........................................65
Modelos Alternativos: Solow-Swan e AK .....................................................71
Metodologia ..............................................................................................72
Equações ...................................................................................................74
Conclusões e Reflexões ............................................................................78
O Papel da Aplicação desses Modelos ao Caso Brasileiro ..........................85
Modelos Avançados de Produto Potencial ...................................................89
Taxa de Progresso Técnico de Fischer e PTF Vintage ................................89
Contabilidade do Crescimento e a Reprodutibilidade do Capital.......90
O Conceito da PTF Vintage...................................................................100
Um Modelo de Insumos Vintage..................................................................103
Justificativa e Metodologia....................................................................103
Resultados e Projeções...........................................................................105
Um Modelo Evolucionário de Desenvolvimento ........................................109
Relevância e Pertinência do Enfoque Evolucionário.................................110
Modelo Evolucionário Simples de Desenvolvimento numa Economia de
Dois Setores ...................................................................................................115
Resultados e Conclusões Preliminares........................................................120
Conclusão ......................................................................................................128
Bibliografia....................................................................................................132
viii
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 – O DP dos desvios absolutos do hiato na década de 1980 não foi o maior do
período .................................................................................................................19
Tabela 2 – Taxa de crescimento médio das séries originais e filtradas. ......................20
Tabela 3 – Diferentes estudos trazem diferentes estimativas da taxa de depreciação .30
Tabela 4 – A estabilização da economia diminuiu a volatilidade da PTF ...................38
Tabela 5 – Decomposição do crescimento: taxa de crescimento e contribuição de cada
fator ......................................................................................................................39
Tabela 6 – Diferenças na medição do fator trabalho são compensadas na PTF ..........40
Tabela 7 – Volatilidade do hiato diminui no período Pós-Real mas a taxa da
crescimento do PIB potencial não aumenta .........................................................42
Tabela 8 – Hipóteses adotadas em cada cenário e respectivos resultados ...................44
Tabela 9 – Maiores taxas de depreciação aumentam a taxa de crescimento do PIB
potencial. ..............................................................................................................47
Tabela 10 – Decomposição logarítmica teórica do crescimento – resultados originais
..............................................................................................................................62
Tabela 11 – Decomposição logarítmica teórica do crescimento sob hipóteses
alternativas ...........................................................................................................67
Tabela 12 – Decomposição logarítmica teórica do crescimento – base de dados
alternativa.............................................................................................................70
Tabela 13 – Decomposição do produto - modelo de Solow (apud Pessoa et Ali, 2003)
..............................................................................................................................78
Tabela 14 – Relação K/Y sobe mais fortemente na época do 4º Plano (1977-81) ......82
Tabela 15 – Quadro resumo dos exercícios do capítulo 3 ...........................................84
Tabela 16 – A correção de LP aumenta a importância da PTF em detrimento de K...98
Tabela 17 – Especificação da PTF Vintage ...............................................................101
Tabela 18 – Método Vintage redistribui a contribuição de K e L ao longo do período
............................................................................................................................106
Tabela 19 – PIB potencial vintage fornece maiores taxas de crescimento................108
ix
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 – Efeito da mudança do valor do parâmetro λ sobre o filtro HP. .................17
Figura 2 – Aplicação do filtro HP ao PIB brasileiro de 1940 a 2004. ........................18
Figura 3 – Aplicação do filtro HP ao PIB brasileiro de 1980 a 2004. ........................20
Figura 4 – Relação capital/ produto efetiva apresenta estabilidade no período 19802004......................................................................................................................36
Figura 5 – Trajetória da PTF no período 1980-2003. .................................................37
Figura 6 – PIB potencial e efetivo: 1980-2003 ...........................................................41
Figura 7 – Evolução do PIB potencial (em bilhões de R$ de 1999) sob os 3 cenários
..............................................................................................................................44
Figura 8 – Efeito da variação da NAIRU sobre o PIB potencial ................................45
Figura 9 - Efeito da variação da NAICU sobre o PIB potencial.................................46
Figura 10 – Efeito da variação da taxa de depreciação sobre o PIB potencial ...........47
Figura 11 – Participação do trabalho na renda declina ao longo do tempo ................53
Figura 12 – Modelo de Solow: crescimento equilibrado e de transição .....................57
Figura 13 – Evolução da relação capital/ produto total na economia brasileira de 1950
a 2000...................................................................................................................58
Figura 14 – Evolução da PTFD brasileira de 1950 até 2000 ......................................60
Figura 15 – PIB potencial difere muito pouco do PIB efetivo. ..................................65
Figura 16 – A PTFD obtida a partir dos dados com ajuste é quase um deslocamento
paralelo.................................................................................................................69
Figura 17 – PIB potencial por trabalhador..................................................................71
Figura 18 – Brasil e Coréia priorizaram o desenvolvimento das mesmas indústrias no
período do II PND................................................................................................83
Figura 19 - Trajetória de crescimento equilibrado de longo prazo ............................92
Figura 20 – PTF Vintage é menos volátil e antecede a PTF efetiva .........................102
Figura 21 – PIB potencial: PTF Vintage e PTF HP ..................................................102
Figura 22 – A PTF Vintage apresenta um resultado mais favorável a evolução da
produtividade .....................................................................................................105
Figura 23 – PIB potencial vintage é maior do que o PIB potencial tradicional .......108
Figura 24 – Prêmio pela qualificação (g) apresenta tendência crescente ao longo do
período ...............................................................................................................122
Figura 25 – Participação dos trabalhadores do setor moderno no total: efetivo x
simulações..........................................................................................................124
Figura 26 – Evolução da relação produto por trabalhador (Q/L)..............................126
Figura 27 – Evolução da relação capital por trabalhador (K/L) ...............................127
x
1. Introdução
A literatura econômica brasileira vive atualmente um ressurgimento do
interesse pelos temas relacionados ao crescimento econômico e seus limites, incluindo
cálculos do produto potencial e exercícios de contabilidade do crescimento.
O produto potencial é uma variável não observada. Isto é, ela não pode ser
medida através de pesquisas, como a produção industrial ou a taxa de desemprego.
Portanto, como qualquer variável não-observada em outros campos da ciência, ela tem
que ser construída conceitualmente a partir de uma teoria, tornando-a assim, passível
de controvérsias.
No conceito de produto potencial mais amplamente usado, o principal fator
limitante é a inflação, pois, o produto potencial não é só um conceito técnico de
engenharia. Assim, o produto potencial indica não somente o nível de produção
máximo possível, condicionado a disponibilidade de todos os fatores de produção,
mas também um uso não-inflacionário1 dos mesmos. Portanto, para se obter o PIB
potencial de uma economia, de acordo com essa definição, deve-se ajustar os fatores
de produção pelo seu nível de utilização não-inflacionário. Utilizam-se para esse fim
os conceitos irmãos de NAIRU (Non-Accelerating Inflation Rate of Unemployment) e
NAICU (Non-Accelerating Inflation Rate of Capacity Utilization).
Por outro lado, ao nível micro, os limites de produção não são rigidamente
definidos. Eles se alteram com o aprendizado, horas extras, novos turnos, etc, de
modo que as plantas fabris possuem faixas de produção e não um limite pontual bem
definido do seu máximo de produção.
Outra distinção que deve ser feita em relação ao conceito, diz respeito à
diferenciação entre produto potencial e tendência do produto ou produto tendencial. O
1
A inflação relevante para esse conceito é somente aquela originária de pressões de demanda.
1
produto tendencial é fruto de um tratamento estatístico, seja através de filtros como o
filtro HP (Hodrick-Prescott) ou filtros do tipo BP (Band-Pass) ou através ainda de
outras metodologias como a de Box-Jenkins, que visam extrair da série original os
componentes sazonais e cíclicos, obtendo dessa maneira o componente de tendência
do produto.
Fica claro, portanto, que a tendência do produto é um conceito puramente
estatístico, guardando apenas relações muito tênues com os fundamentos econômicos,
por trás do conceito de produto potencial. Uma certa confusão entre os termos pode
surgir, pois, uma prática muito comum para se obter estimativas do produto potencial
é a aplicação pura e simples de métodos estatísticos como o filtro HP.
Por último, deve se ressaltar que o conceito de produto potencial leva em
conta apenas a capacidade de oferta da economia, não entrando explicitamente em seu
cálculo nenhum elemento de demanda, mesmo que indiretamente ao induzir um
aumento do investimento.
Um outro conceito muito usado e estreitamente ligado ao produto potencial é o
conceito de hiato do produto. Ele nada mais é do que a diferença entre o produto
observado de uma economia em um determinado período e o produto potencial. O
hiato indica quanto uma economia poderia crescer sem gerar inflação, em
conseqüência de um maior grau de utilização dos fatores e da ampliação da
produtividade ao seu nível potencial.
1.1.
Proposta e Plano da Dissertação
A proposta dessa dissertação é analisar os principais trabalhos brasileiros
empíricos recentes, sobre produto potencial e contabilidade do crescimento. Mais do
que uma revisão crítica, o objetivo é examinar as hipóteses subjacentes e
2
conseqüências das mesmas para cada exercício, assim como as implicações e as
limitações das conclusões de cada um.
Busca-se, em conexão com o exposto no parágrafo acima, entender as
limitações e críticas que são feitas em geral a essas metodologias, de maneira a
avaliar, em que medida, essas críticas podem ser incorporadas ao método de cálculo
do produto potencial e exercícios de contabilidade do crescimento.
Por último, essa dissertação faz uma prospecção preliminar da linha de
pesquisa evolucionista, procurando ponderar as possíveis contribuições que ela possa
oferecer, no intuito de clarificar os pontos controversos do debate.
No restante dessa introdução, exploram-se os conceitos chaves para essa tese e
a relevância acadêmica e de política econômica dos mesmos.
O capítulo seguinte traz um resumo das metodologias disponíveis para
exercícios de produto potencial e contabilidade do crescimento, em conjunto com uma
breve revisão da literatura internacional.
O capítulo subseqüente se dedica à análise de 3 estudos aplicados ao caso
brasileiro, de grande relevância e impacto no debate, a saber: Silva Filho (2001),
Bacha & Bonelli (2004) e Pessôa et Al (2003a). O quarto capítulo apresenta, então,
uma alternativa de cálculo, incorporando críticas e aspectos metodológicos aplicáveis
ao caso brasileiro, para a mensuração do produto potencial e exercícios de
contabilidade do crescimento.
O penúltimo capítulo explora possíveis contribuições para o debate, advindas
da escola evolucionista, aplicadas a contextos similares do debate nos países asiáticos.
As duas principais referências aqui são: Nelson & Pack (1999) e Nelson & Winters
(1982). O sexto capítulo conclui.
3
1.2.
PTF (Produtividade Total dos Fatores) e Contabilidade do Crescimento2
Uma outra variável econômica não observável e utilizada no cálculo do
produto potencial é a PTF. O conceito de produtividade de um fator3 é amplamente
usado e aceito em economia, porém, sua origem não vem da teoria econômica, apesar
de ser usado pelos economistas desde os primórdios da ciência, e sim da engenharia.
Por outro lado, o conceito de PTF é alvo de divergências entre os economistas, quanto
a sua definição e operacionalização.
Muitos trabalhos, acadêmicos e de natureza mais aplicada, que utilizam-se do
conceito da PTF, suprimem essa polêmica da discussão, identificando a PTF como um
resíduo ou diretamente como o progresso técnico. Outros, ainda, a descrevem sem
conceituá-la, como Silva Filho (2001, p. 10): “durante a determinação do produto
potencial obtém-se estimativas da PTF, que é a principal medida de eficiência
agregada da economia e um dos principais determinantes do crescimento econômico”.
São poucos os estudos que se detêm em analisar os aspectos teóricos da PTF. Hulten
(2000) é um raro e completo exemplo.
A PTF, não obstante as mais modernas técnicas usadas para estimá-la, pode
ser obtida por uma singela manipulação das identidades contábeis das contas
nacionais. O PIB (Produto Interno Bruto) pode ser representado como na Equação (1),
onde P identifica o preço e Q a quantidade produzida. L e K são respectivamente as
quantidades dos fatores: trabalho e capital, utilizadas para produzir Q. Por último, w e
r são as respectivas remunerações ao fator trabalho (salário) e ao fator capital (juros).
Os subscritos t indicam o período de tempo.4
2
Essa seção está, em grande medida, baseada em Hulten (2000).
Definido como a quantidade do produto sobre a quantidade de um insumo (normalmente o fator
trabalho) utilizado na produção.
4
Daqui por diante, os símbolos (representados por letras maiúsculas) nas equações referir-se-ão sempre
as mesmas variáveis, ao menos quando explicitados de outra forma.
3
4
P ⋅Q = w ⋅ L + r ⋅ K
t
t
t
t
t
(1)
t
A igualdade representada na Equação (1), é válida para qualquer ano que se
meça o PIB. Porém, quando fixamos os preços dos produtos e dos fatores ao preço
nominal do período t = 0, por exemplo, essa igualdade só é válida se a produtividade
da economia não tiver variado. Na situação oposta, onde uma melhora na
produtividade permite obter uma maior quantidade do produto a partir da mesma
quantidade de insumos, uma variável (St), terá que ser inserida no lado direito da
equação para garantir a igualdade como mostra a Equação (2). Esta variável é a PTF.
Um exemplo numérico pode ser bastante instrumental para melhor
compreensão. Suponha que em t = 0, todos os preços (w0, r0, P0) sejam iguais a 1.
Além disso, têm-se 10 unidades de cada insumo, que por sua vez geram 20 unidades
do produto, garantindo assim a igualdade dos dois lados da equação. Suponha agora
que no momento t = 1, as mesmas 10 unidades de cada insumo geram conjuntamente
25 unidades de produto, devido a um aumento da produtividade. Expressando o
produto aos preços de t = 0, para evitar qualquer efeito advindo da variação nominal
dos preços, fica claro que para garantir a igualdade descrita na Equação (2), St deve
ser igual a 1,2.5
P Q = S ⋅ (w ⋅ L + r ⋅ K )
0
t
t
0
t
0
(2)
t
Num segundo exemplo, suponha que: em t = 0, todos os preços (w0, r0, P0)
sejam iguais a 1. Além disso, temos 10 unidades de cada insumo, que por sua vez
geram 20 unidades do produto, garantindo assim a igualdade dos dois lados da
equação. Suponha agora que no momento t = 1, as mesmas 10 unidades de cada
insumo geram conjuntamente 25 unidades de produto, devido a um aumento da
produtividade. Suponha que todos os preços tenham subido para 2. Mesmo
5
Note que o procedimento descrito é diferente de uma operação de deflacionamento.
5
exprimindo a igualdade em termos dos preços do período corrente, fica claro que para
garantir a igualdade descrita na Equação (2), St deve ser igual a 1,2.
Isso mostra que a variável St é necessária, independentemente se a equação
está expressa em preços correntes ou nominais, o que deixa claro a diferença entre o
que foi dito acima e um processo de deflacionamento. Além disso, o aumento da
produtividade provoca uma mudança de preços relativos entre o preço do produto e
dos fatores. O produto torna-se mais barato em relação aos fatores, uma vez que agora
com o mesmo montante de K e L produz-se uma quantidade maior.
Em resumo, uma variação nominal do produto pode vir de três fontes: de uma
variação nos preços, de um maior uso (ou aumento) dos insumos ou ainda de uma
maior produtividade no uso dos mesmos. O deflacionamento separa o efeito preço dos
demais, enquanto a variável St faz o mesmo com o efeito da produtividade.
Isolando St no lado esquerdo da Equação (2) temos a expressão da PTF como
mostra a Equação (3), que nada mais é do que a razão: produto por unidade total de
insumo. St é na verdade um número índice. E seu valor, em um ano específico,
depende do ano base a partir do qual ele foi calculado. Portanto, o seu valor pontual
não é relevante, mas somente a sua trajetória ao longo do tempo. A equação (3)
mostra exatamente isso: que St indica como evolui a quantidade produzida a partir de
uma dada cesta de fatores de produção.
St =
P ⋅Q
(w ⋅ L + r ⋅ K )
0
0
t
t
0
(3)
t
A PTF também pode ser obtida derivando-se uma função de produção em
relação ao tempo. Seja Yt o produto de uma economia, Xt o vetor que contém todos os
insumos e t; o índice de tempo. Então, a PTF é a derivada parcial da Equação (4), em
6
relação ao tempo. Ou seja, ela fornece a taxa de crescimento do produto ao longo do
tempo, mantendo todos os outros insumos constantes.
Y = F (X , t )
t
(4)
t
Entretanto, não foi a partir de identidades contábeis ou derivações que o termo
PTF ganhou tanto destaque na ciência econômica, mas sim a partir do trabalho de
Robert Solow. Seu mérito foi juntar de forma elegante, porém formal, o conceito de
PTF e a função de produção (FP), oferecendo uma alternativa ao enfoque de números
índices, decorrentes das unidades contábeis descritas nas equações de (1) a (3).
Na formulação de Solow, parte-se de uma FP, descrita na Equação (5), onde
At é um parâmetro de deslocamento neutro no sentido de Hicks, isto é, ele não altera a
razão (K/L) entre os insumos. At é comumente associado ao progresso técnico.
Todavia, essa associação padece da falta de rigor formal, pois, como apontado por
Hulten (2000, p. 9), At não capta o progresso tecnológico decorrente do investimento
em P&D (Pesquisa e Desenvolvimento), como explicado mais adiante na página 10,
que é parte intrínseca do progresso tecnológico de uma economia. Por outro lado, ele
capta melhorias provenientes de variáveis institucionais, como mudanças na
legislação, ambiente macroeconômico, organização das empresas, etc, quando essas
não fazem parte do progresso tecnológico.6
Q = A ⋅ F (K , L )
t
t
t
(5)
t
Partindo da Equação (5), e sem impor nenhuma forma a FP, obtemos uma
decomposição do crescimento a partir da diferenciação total, como mostra a Equação
(6).
6
O progresso tecnológico é referido aqui numa visão stricto sensu. Recentemente alguns estudos
passaram a se referir ao termo mais amplo: tecnologia da sociedade, para assim incorporar logicamente
os avanços provenientes de variáveis institucionais.
7
Q&
Q
t
t
 ∂Q
Kt  ⋅ K& t  +  ∂Q ⋅ Lt  ⋅ L& t  +
= 
⋅
 ∂K Qt  Kt   ∂L Qt  Lt 



 

A&
A
t
t
(6)
Os dois primeiros termos, no lado direito da equação, representam os
movimentos ao longo da curva, enquanto que o último termo representa o crescimento
devido ao deslocamento da curva. As partes destacadas entre parênteses representam
respectivamente, a elasticidade do produto em relação ao capital e ao trabalho.
Assumindo-se a hipótese de competição perfeita, isto é, de que cada fator é pago de
acordo com a sua contribuição na margem para o produto, as elasticidades podem ser
substituídas pela participação de cada fator na renda.7 Assim, chamando de Rt o
Resíduo de Solow e Sxt a parcela do fator x na renda, temos a seguinte equação.
&
& A&
Q&
K
L
=
−
⋅
−
⋅
R Q S K S L=A
t
t
K
t
t
t
L
t
t
t
t
t
t
(7)
Portanto, em teoria, o Resíduo de Solow, ou seja, aquela parcela do
crescimento do produto que não é explicada pelo crescimento dos insumos, é igual á
mudança na variável de deslocamento Hicks neutra, At. A ressalva feita acima é
necessária, uma vez que At é calculado por resíduo, e assim ele acaba por incorporar
também erros de medida nas variáveis. Isso não é um detalhe sem importância, pois, o
estoque de capital é uma variável não-observada, tornando os erros de medida algo
quase implícito às tentativas de mensuração do estoque de capital. A medida da
parcela do trabalho e do capital na renda também gera divergência que influencia o
valor do resíduo.
A formulação de Solow para o parâmetro de eficiência de Hicks, prescinde da
hipótese de retornos constantes de escala. Na verdade, essa hipótese é usada em
7
Caso esta hipótese seja relaxada, Hall (1988) mostrou que o resíduo de Solow é uma estimativa
viesada do parâmetro At.
8
muitos estudos empíricos para se obter a participação de um fator na renda,
usualmente do capital, por resíduo. Exemplificando, se assumimos retornos constantes
de escala e se sabemos por meio das contas nacionais que SLt é igual a 0,4; logo, por
resíduo obtemos que SKt é igual a 0,6. O custo de relaxar esta hipótese auxiliar,
conseqüentemente é ter que recorrer a outros artifícios para se estimar o valor da
participação do capital na renda.
Já a hipótese de que o progresso tecnológico, medido por At, aumenta a
produtividade marginal dos dois fatores na mesma magnitude, foi usada originalmente
na formulação de Solow e muitas vezes passa inadvertidamente. Essa hipótese pode
ser substituída, por um progresso tecnológico que impacte diferentemente cada fator.
Nesse caso, o Resíduo de Solow é dado pela Equação (8)b, que é uma média
ponderada da taxa de crescimento do parâmetro de eficiência de cada fator.8 Dessa
maneira, o progresso tecnológico pode aumentar de um período para o outro, apenas
com uma mudança nos ponderadores, sem que a produtividade de cada fator tenha de
fato aumentado. Essa característica, que pode acarretar distorções em exercícios de
contabilidade do crescimento e produto potencial tem por outro lado um aspecto
positivo, pois, realça a diferença entre progresso tecnológico e crescimento da
produtividade.
Q = F (a ⋅ K , b ⋅ L )
a& + ⋅ b&
=
⋅
R S a S b
K
t
t
t
t
t
t
t
t
L
t
t
t
t
(a)
(b)
(8)
Portanto, fica claro da discussão acima, que apesar de estreitamente
relacionados, progresso tecnológico, produtividade e PTF não são conceitos idênticos.
Nessa dissertação, a menos quando especificado de outra forma, o termo PTF vai estar
8
Representados na Equação (8)a pelas letras minúsculas a e b.
9
sempre associado com a variável de deslocamento Hicks neutra da FP (At). A PTF é,
conseqüentemente, uma medida da eficiência de como a sociedade combina os seus
dois fatores de produção, para obter o produto. Logo, ela capta melhoras na eficiência
decorrentes de mudanças institucionais e de mudanças tecnológicas, desde que
disponíveis a custo zero e que possam ser aplicadas também sem incorrer em nenhum
custo, o famoso “maná dos céus”.
Ela não capta, ou o faz de maneira apenas parcial, o progresso técnico
resultante do investimento em P&D, uma vez que todo o investimento se transforma
no fator de produção capital. O investimento em P&D é, portanto, um insumo. Ainda
que a PTF capte algum efeito do progresso tecnológico, fruto de P&D, devido as
externalidades, ela não capta nenhum efeito do progresso tecnológico embutido nos
bens de capital incorporados ao estoque de capital da economia ou devido ao
aprendizado dos trabalhadores. Isso acontece, pois, o trabalho seminal de Solow e
grande parte das aplicações práticas subseqüentes foram construídos sobre a
concepção neoclássica de tecnologia, onde o conhecimento é visto como um bem
público, gratuitamente acessado e utilizado por todos, apesar de essa não ser uma
hipótese necessária para se obter a PTF. Essa certamente não é a práxis do mundo
real, onde o conhecimento se encontra protegido através de barreiras como patentes,
segredos industriais, blueprints e no conhecimento tácito dos funcionários e
engenheiros de uma firma.
Da posse do cálculo da PTF e do estoque dos dois fatores de produção, podese proceder à contabilidade do crescimento. Essa nada mais é do que calcular a
contribuição de cada fator de produção e da PTF para o crescimento total do produto.
10
1.3.
A Importância do PIB Potencial e dos Exercícios de Contabilidade do
Crescimento
Como já foi dito no início da introdução, há um crescente interesse sobre o
PIB potencial e exercícios de contabilidade do crescimento.9 Esse destaque dado às
estimativas e metodologias do PIB potencial é prática comum no mundo todo. Elas
são usadas em organismos internacionais, como o FMI (Fundo Monetário
Internacional) e o BCE (Banco Central Europeu), entre outros e por bancos centrais e
órgãos nacionais de planejamento, ao redor do globo, como mostram as passagens
abaixo.
“Estimativas do produto potencial e do hiato do produto são, em particular,
largamente usadas nos procedimentos de supervisão macroeconômica da UE.
Estes indicadores também adquiriram um status operacional no SGP (Pacto de
Estabilidade e Crescimento)10, uma vez que fornecem um insumo essencial para
calcular os indicadores do resultado fiscal estrutural, que são usados por sua vez
para avaliar o progresso feito pelos países com vistas á meta de resultado fiscal
de médio prazo”.[Economic Policy Committee, 2001, p. 1].
“O produto potencial possui um papel em vários aspectos das previsões
econômicas do CBO (Escritório do Congresso para o Orçamento).11 Em
particular, o CBO usa o produto potencial para fixar o nível do PIB real nas suas
projeções de médio prazo… Finalmente, o produto potencial é um insumo
importante para calcular o déficit ou o superávit do orçamento padronizado, que
o CBO usa para avaliar a posição da política fiscal.” [Congressional Budget
Office, 2004, p. 1/2].
9
O Prêmio Banco do Brasil/ UNB de Economia Brasileira premiou em sua edição 2004, um artigo cuja
contribuição era um exercício de contabilidade do crescimento aplicado para o Brasil e para outros
países no período 1950-2000. Vide (Pessoa et Al, 2003b).
10
Abreviação para as iniciais em inglês
11
Idem
11
No Brasil, cálculos do PIB potencial já foram objetos de comentários, em três
relatórios de inflação do Banco Central. No relatório de setembro de 2004, o Banco
Central deixa bem claro como se utiliza desse cálculo.
“Ambas as variáveis [produto potencial e hiato do produto] são peças chaves
para o arcabouço analítico que serve de base á formulação, análise ou avaliação
da política monetária. Em particular, o hiato do produto tem papel central como
indicador de pressões inflacionárias.” [Banco Central do Brasil, 2004, p. 112].
Esse interesse é justificável, uma vez que o PIB potencial e o hiato do produto
são usados juntamente com outras informações, pelos formuladores de política, como
insumos na definição da política fiscal, principalmente na União Européia e nos EUA,
e da política monetária, inclusive no Brasil. Nessa última, o hiato do produto é
normalmente usado para representar a intensidade do componente de demanda na
inflação esperada. Ou seja, quanto menor o hiato do produto maior será o peso
explicativo da demanda na inflação, pois, menor é a margem dos produtores para
ampliar a oferta e maior é o ganho esperado, em termos de lucratividade, de um
aumento nos preços.
Na política fiscal12, o cálculo do produto potencial é utilizado para avaliar o
resultado fiscal estrutural do governo. A idéia é separar o resultado fiscal efetivo,
numa parcela cíclica ou sazonal, decorrente da posição em que a economia se
encontra relativamente ao ciclo econômico, e outra estrutural, que retrataria um
possível excesso ou insuficiência de gastos. Por isso, esse conceito, é às vezes referido
também como déficit ciclicamente ajustado. O resultado estrutural é aquele que
ocorreria caso o PIB de um país estivesse no seu nível potencial. Assim, uma
12
No caso brasileiro, o produto potencial não é usado atualmente por nenhum órgão oficial para fins de
política fiscal.
12
economia num ano de recessão pode apresentar um déficit fiscal, mas se esse se deve
única e exclusivamente ao mau desempenho da economia, o seu déficit estrutural será
zero. A situação inversa, onde um déficit estrutural é contrabalançado por um excesso
de arrecadação, graças a um desempenho extraordinário do PIB, também pode
ocorrer.
Os exercícios de contabilidade do crescimento, a princípio, despertam mais
interesse no debate acadêmico, devido às implicações que sugerem quanto a
interpretações do desenvolvimento econômico de um país. Porém, seus resultados não
são desprovidos de utilidade para o debate de política econômica, ainda que sejam
mais relevantes para uma discussão de mais longo prazo.
2. Metodologias de Cálculo do Produto Potencial
Uma vez definido o conceito de produto potencial e outros conceitos
correlatos e ter mostrado também a relevância prática do estudo do produto potencial
para acadêmicos e formuladores de política, a atenção se volta naturalmente para a
questão de como medir o produto potencial.
A resposta não é simples, nem tão pouco definitiva. De fato, há uma pletora de
metodologias concorrentes, cada uma com suas vantagens e desvantagens. Uma
mesma metodologia, dependendo das hipóteses e argumentos considerados, pode
comportar resultados distintos.
Para complicar ainda mais, a própria distinção entre as metodologias tem se
tornado cada vez mais fluída. De início, os diferentes métodos podiam ser
classificados entre estatísticos ou econômicos. Os primeiros se apoiam única e
exclusivamente em métodos puramente estatísticos para obter o PIB potencial, que
13
nesse caso, como discutido no começo da introdução, são na verdade uma medida da
tendência do produto.
Os métodos econômicos, ao contrário, são aqueles que se baseiam estritamente
na fundamentação teórica da economia, para estabelecer as relações entre as variáveis
necessárias para o cálculo, não se utilizando de nenhum método estatístico que ignore
relações ditadas a priori pela teoria econômica. Essa distinção perdeu um pouco do
seu sentido, a partir do momento que economistas e estatísticos começaram a misturálas no afã de obter melhores estimativas. Como a intenção aqui não é fazer um
trabalho de taxonomia dos diferentes métodos, mas simplesmente facilitar a
exposição, optou-se por seguir essa classificação acrescida de uma terceira categoria
para incluir os métodos híbridos. Não é intenção aqui, de maneira alguma, delimitar
as fronteiras entre cada categoria.
2.1.
Métodos Estatísticos
Os métodos estatísticos são aqueles que utilizam única e exclusivamente de
técnicas estatísticas de modelagem para extrair os componentes de ciclo e tendência
da série. Como nenhuma restrição de ordem econômica é imposta no processo, eles
podem gerar resultados contra-intuitivos.
Essa classe comporta quase todos os métodos de decomposição de séries,
desde os mais simples como a extração de uma tendência linear, passando pela
metodologia de Box-Jenkins, até o uso de filtros estatísticos. Esses últimos são os
mais largamente usados, sendo o filtro HP o mais comum, não obstante a existência e
o uso de outros filtros como o filtro de Kalman e os filtros do tipo BP. Há ainda outros
métodos de decomposição de séries, menos usados, como a decomposição BeveridgeNelson.
14
Os métodos estatísticos, assim como os demais, têm as suas vantagens e
desvantagens. Entre os pontos positivos, destacam-se a sua simplicidade e
transparência. Além disso, esses métodos são de aplicação fácil e rápida,
principalmente para os tipos mais difundidos, cujas rotinas para aplicação já estão
incluídas em pacotes estatísticos.13 Por último, como são filtros univariados (a maior
parte dos filtros multivariados não podem ser classificados como puramente
estatísticos, por incluírem alguma relação econômica), necessitam apenas de uma
série temporal, a série do PIB, para serem estimados.
Por outro lado, apresentam algumas desvantagens como a dependência de
hipóteses ad-hoc para a definição do valor de certos parâmetros, a falta de
fundamentação econômica e a sensibilidade ao período de estimação. Isto é, os
mesmos métodos aplicados à mesma série, porém para diferentes períodos de tempo,
fornecem resultados distintos, revelando uma maior e indesejada sensibilidade do que
as demais metodologias.
Finalmente, os filtros estatísticos como o HP e o BP, que se utilizam de
informações de períodos posteriores (t+1, t+2,…) e anteriores (t-1, t-2,…) para extrair a
informação no momento presente (t), e são, por isso, chamados de filtros de 2 lados,
sofrem do problema de viés de fim de amostra. Ou seja, a medida que a série se
aproxima do seu final, a quantidade de informações posteriores vai diminuindo,
conseqüentemente diminuindo a qualidade e confiabilidade da tendência extraída.
Este problema pode ser superado, inserindo-se estimativas obtidas pelo filtro para os
anos subseqüentes, expandindo as observações da amostra. Essa solução, contudo,
não encontra unanimidade na literatura quanto ao seu uso. Uma outra solução menos
controversa é aplicar o filtro somente para um subperíodo da amostra, contornando-se
13
tais como o E-Views ou podem ser obtidas gratuitamente na Internet, para os pacotes de programação
mais populares como o Matlab.
15
assim o problema. O inconveniente dessa proposta é que muitas vezes não se pode
abrir mão de informações mais recentes de uma série, devido ao pequeno número de
observações, ao risco de não captar novas tendências, etc.
Como o foco principal dessa dissertação não é a avaliação dos métodos
estatísticos, não será feita uma descrição detalhada de todos os métodos. No que se
segue, será apresentado apenas, uma descrição mais detalhada, assim como alguns
resultados do filtro HP aplicados ao PIB brasileiro.
2.1.1. O Filtro HP
O filtro HP foi originariamente proposto em meados da década de 80 pelos
economistas Robert Hodrick e Edward Prescott, razão pela qual o filtro foi batizado
de HP. A referência aqui usada, entretanto, é do paper de 1997.14 De acordo com os
autores, as séries econômicas podem ser decompostas em um componente de ciclo e
outro de tendência.15 Não há referência ao componente sazonal, uma vez que as séries
usadas no paper já eram sazonalmente ajustadas. Eles, então, propõem um método
para separar esses dois componentes, baseados na hipótese a priori de que o
componente de tendência varia suavemente ao longo do tempo. O filtro proposto está
explicitado na Equação (9), abaixo, onde c e g são respectivamente o componente de
ciclo e tendência.
T
T 2
+
λ
⋅

∑
g t t = −1 ∑ c t
t =1
 t =1
Min{ }
T
[(g − g )− (g
t
t −1
t −1
−g
)] 
2
t −2

(9)
Ou seja, o filtro HP nada mais é do que minimizar a soma dos quadrados dos
desvios da série original (i.e. o componente de ciclo),16 sujeito a restrição de que a
soma dos quadrados da segunda diferença seja zero. O parâmetro λ é um número
14
Vide Hodrick & Prescott (1997).
Os autores usam no artigo a palavra growth, aqui traduzida como tendência.
16
y = c + g, logo c = y – g e c2 = (y – g)2.
15
16
positivo que penaliza a variabilidade da tendência. Ele é o peso que se atribui à
redução da volatilidade na série a ser extraída. Para valores muito altos de λ, mais
suave será a tendência. No limite, a série extraída se aproxima de uma tendência
linear. No pólo oposto, se o valor de λ é muito baixo, a série da tendência se aproxima
da série original, como mostra a Figura 1. A literatura acerca do filtro HP mostrou
Bilhões de R$ de 1999
também, que λ determina a duração do ciclo que passa pelo filtro.
1.200
1.000
800
600
400
200
19
40
19
43
19
46
19
49
19
52
19
55
19
58
19
61
19
64
19
67
19
70
19
73
19
76
19
79
19
82
19
85
19
88
19
91
19
94
19
97
20
00
20
03
-
(200)
PIB-HP-(λ=10)
PIB-HP-(λ=10000)
PIB
Figura 1 – Efeito da mudança do valor do parâmetro λ sobre o filtro HP.
Qual é o valor então que deve ser usado para λ? Os trabalhos empíricos
consagraram os seguintes valores para λ: 100, 1600 e 14400 se as séries são
respectivamente: anuais, trimestrais ou mensais. O porque desses valores podem ser
um mistério para muitos, mas como explicam os autores, eles são o quadrado da razão
entre uma variação moderadamente grande do ciclo e outra da tendência.17 O cálculo
do valor de λ, apesar de possuir uma explicação, é totalmente ad hoc e subjetivo,
sendo portanto um grande alvo de críticas ao filtro HP.
17
Os autores consideram como variações moderadamente grandes no ciclo e na tendência, números da
ordem de 5% e 0,125% respectivamente. Como dito pelos autores: “A nossa visão prévia era de que
um componente cíclico de 5% é moderadamente grande, assim como é uma mudança de 1/8 de 1% na
tendência em um trimestre.” Logo, para séries trimestrais, que são as utilizadas pelos autores, λ =
(5/0,125)2 = 1600.
17
Este não é o único predicado do filtro, passível de criticismos. A hipótese, a
priori, de que a tendência apresenta um comportamento suave é alvo também de
questionamentos. Além disso, a baixa freqüência do filtro HP que faz com que
componentes de ciclo e de tendência se misturem e o fato de que quando aplicado a
alguns casos específicos, ele pode gerar ciclos inexistentes, são provavelmente a
maior “vidraça” dessa metodologia e que estimulou o surgimento dos filtros BP.
2.1.2. Resultados do Filtro HP aplicados ao Caso Brasileiro
Essa seção é dedicada aos resultados da aplicação do filtro HP à série do PIB
brasileiro em R$ (Reais) a preços constantes de 1999, construída a partir de dados do
IBGE e de Morandi & Reis (2004).18 O filtro foi empregado duas vezes, na primeira
utilizou se o filtro na série toda, obtendo se a tendência do produto para o período
1940-2004 (Figura 2). Na segunda, o período foi restringido ao intervalo 1980-2004
Bilhões de R$ de 1999
(Figura 3).
1.200
1.000
800
1980
600
400
200
19
40
19
43
19
46
19
49
19
52
19
55
19
58
19
61
19
64
19
67
19
70
19
73
19
76
19
79
19
82
19
85
19
88
19
91
19
94
19
97
20
00
20
03
0
PIB
Tendência HP
Figura 2 – Aplicação do filtro HP ao PIB brasileiro de 1940 a 2004.
18
De 1940 até 1946, os dados são estimativas extraídas de Morandi & Reis (2004). A partir de 1947, os
dados são fornecidos pelo IBGE. Ambos foram deflacionados pelo deflator do PIB.
18
Pela observação visual da figura acima, vemos que até 1980, as séries do PIB
e do filtro HP apresentam comportamento mais uniforme e atrelado uma a outra.
Porém, a partir da década de 1980 e até meados da década de 1990, os desvios entre
uma série e outra parecem se tornar maiores. De fato, os desvios em termos absolutos
ficaram maiores. Contudo, em termos percentuais, os desvios registrados em alguns
anos da década de 1980 não são maiores do que os registrados em alguns anos
anteriores. No ano de 1980, por exemplo, o PIB foi maior que a tendência em
aproximadamente R$ 54 bilhões, o que é equivalente a 8,91% do PIB potencial do
mesmo ano. Esse mesmo desvio, computado em números relativos para o ano de
1940, foi de 8,89%.
De fato, a média e o DP (Desvio Padrão) do hiato em termos absolutos foi
maior na década de 1980 do que na década precedente, porém, não foi maior do que
na década de 1960, como mostra a Tabela 1. Além disso, os desvios tornaram-se
menores e mais previsíveis depois da década de 1980, o que na Figura 2 acentua
visualmente os desvios da década de 1980.
Tabela 1 – O DP dos desvios absolutos do hiato na década de 1980 não foi o maior do período
1940-49
1950-59
1960-69
1970-79
1980-89
1990-99
2000-04
1940-79
1980-04
Média
2,85
1,64
6,14
3,03
4,08
2,29
0,82
3,42
2,71
Desvio Padrão
2,82
1,29
2,90
1,73
2,76
1,74
0,71
2,77
2,38
Portanto, devido à hipótese sobre a suavidade do comportamento da tendência
e ajudado também pela escala do gráfico, a análise visual das duas séries em conjunto
pode nos levar a conclusão errônea de que a dispersão das observações se ampliou ao
longo do tempo, apesar da variabilidade da série não ter aumentado.
19
Bilhões de R$ de 1999
1.200
1.100
1.000
900
800
700
19
80
19
81
19
82
19
83
19
84
19
85
19
86
19
87
19
88
19
89
19
90
19
91
19
92
19
93
19
94
19
95
19
96
19
97
19
98
19
99
20
00
20
01
20
02
20
03
20
04
600
PIB
Tendência HP
Figura 3 – Aplicação do filtro HP ao PIB brasileiro de 1980 a 2004.
Na Figura 3, que cobre o período de 1980 a 2004, a leitura mais imediata do
gráfico não se mostra incorreta. A variabilidade da série diminui ao longo do tempo.
O desvio padrão dos desvios percentuais entre a série original e a de tendência cai de
4,8 para 2,7 e depois para 1,3 respectivamente nos períodos 1980-1989, 1990-1999 e
2000-2004.
Tabela 2 – Taxa de crescimento médio das séries originais e filtradas.
Média
Variância
Original
1940-04
5,24
16,89
Figura 2
Filtro HP
1940-04
5,30
5,86
Filtro HP
1980-04
2,51
0,29
Figura 3
Original Filtro HP
1980-04 1980-04
2,18
2,34
10,83
0,03
A Tabela 2, mostra a média e a variância das séries apresentadas nas duas
figuras acima, além disso na terceira coluna ela traz os mesmos dados calculados para
o subperíodo 1980-2004 da série de tendência obtida pelo filtro HP na Figura 2.
O primeiro fato que chama atenção, ainda que esperado, é como a aplicação do
filtro HP reduziu a volatilidade da série original para a série de tendência. No caso da
Figura 2, a variância é reduzida a 35% do seu valor e no período representado na
20
Figura 3, a redução é ainda maior com a variância chegando a menos de 1% do seu
valor original.
Por último, comparando a terceira com a última coluna, temos um exemplo do
problema da sensibilidade do filtro HP ao período de estimação, aludido
anteriormente. A Tabela 2, mostra que a aplicação do filtro HP com o mesmo
parâmetro para a mesma série, porém, para períodos distintos (1940-2004 contra
1980-2004), gera um crescimento médio diferente para o mesmo período (19802004).
2.2.
Métodos Econômicos
Os métodos econômicos de obtenção do produto potencial são aqueles que
levam em consideração apenas relações econômicas entre as variáveis (curva de
Phillips, Lei de Okun, etc). Ou seja, por trás de cada hipótese feita, há uma
fundamentação extraída da teoria econômica. Essa definição, porém, não exclui o uso
do instrumental econométrico/ estatístico. Contudo, ao contrário do filtro HP e dos
demais métodos estatísticos, nenhuma série ou estimativa é obtida a partir de métodos
e hipóteses ad hoc. Os métodos econômicos mais comuns são os que se utilizam de
uma (i) função de produção agregada ou de (ii) modelos estruturais (ou semiestruturais) macro-econométricos.
Uma das vantagens desses modelos é o ganho, em termos do entendimento dos
determinantes do crescimento do produto potencial. Saber, dentro do enfoque de uma
FP, se o crescimento advém de maior produtividade ou do acúmulo dos fatores de
produção, leva a diferentes respostas no que tange às políticas governamentais de
suporte ao crescimento.
21
Além
disso,
esses
enfoques
abrem
a
possibilidade
de
incorporar
particularidades das instituições e trajetórias econômicas de cada país, em oposição à
abordagem “one size fits all” do filtro HP. Por exemplo, um modelo de mercado de
trabalho para gerar uma NAIRU para um país europeu de ampla rede de proteção
social não pode ser igual ao modelo americano, onde o seguro desemprego e os bens
públicos são bem menos abrangentes. Ou seja, diferentes modelos de mercado de
trabalho podem ser acoplados ao cálculo do PIB potencial para se obter a NAIRU.
Por outro lado, as escolhas de especificação da FP ou do modelo, assim como
das fontes de dados e das técnicas de estimação podem ser um verdadeiro calcanhar
de Aquiles para a metodologia escolhida. Hipóteses simplificadoras, mas não
necessariamente incontornáveis como as hipóteses de retornos constantes de escala e
mercados competitivos são corriqueiramente impostas à FP e freqüentemente são
apontadas como um fator limitante da metodologia pelos seus críticos.
Por sua vez, modelos estruturais econométricos herdam todas as limitações
conhecidas na literatura do método de estimação empregado. Além disso, fontes de
dados que são revistas freqüentemente ou sobre cuja confiabilidade pairam dúvidas,
constituem uma outra brecha para criticismos a esta abordagem.
No Brasil, o modelo macroeconômico estrutural mais conhecido que estima,
entre muitas outras coisas, o PIB potencial é, sem dúvida, o do Banco Central descrito
em Muinho & Alves (2003). O modelo inclui mais de 30 equações, que estimam uma
curva de Phillips, os componentes da demanda agregada, o produto potencial, além de
blocos para o setor externo, o setor fiscal e o mercado de trabalho. Nele o PIB
potencial é obtido por uma FP, que modela o lado da oferta da economia, onde a
participação do capital na renda, a PEA e a PTF foram estimadas econometricamente
e a NAIRU foi obtida, levando-se em conta a curva de Phillips.
22
2.3.
Métodos Híbridos
Os métodos híbridos tentam juntar as vantagens dos dois métodos anteriores,
ao mesmo tempo em que procuram, na medida do possível, evitar as desvantagens de
cada método. Assim, eles tentam unir a simplicidade e transparência dos métodos
estatísticos com a fundamentação teórica dos métodos econômicos.
Na prática, esses métodos surgiram quando os filtros estatísticos foram
ampliados para incorporar mais de uma série, os chamados filtros multivariados que,
portanto, incorporaram relações econômicas. Essa categoria também engloba
derivações do método da FP, que frente à dificuldade de se obter estimativas da
tendência da PTF ou da NAIRU, optam, às vezes, pela aplicação do filtro HP à série
original, de modo a obter o resultado desejado.
Um dos cálculos de produto potencial disponível para auxiliar o COPOM
(Comitê de Política Monetária) do Banco Central brasileiro, feito de acordo com a
metodologia apresentada em Areosa (2004), é um exemplo didático do método
híbrido. Nesse artigo, a autora combina o filtro HP e o método da FP para estimar
conjuntamente a NAIRU, a NAICU e o hiato do produto, todos submetidos a uma
restrição da curva de Phillips.
2.4.
Breve Resenha da Literatura Internacional
Essa última seção do segundo capítulo é dedicada a uma breve revisão da
literatura internacional produzida sobre o tema. Os trabalhos brasileiros não serão
resenhados aqui, pois, serão assuntos do próximo capítulo.
Esforços para se medir o produto potencial ocorrem já a um bom tempo, desde
meados da década de 1960. O que há de novo é uma tentativa de organizar e
23
sistematizar o debate, para que esse avance. O primeiro artigo com esse intuito Giorno et alii (1995) - foi preparado pelo departamento econômico da OCDE
(Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico), para sistematizar os
vários métodos usados internamente. Nesse trabalho, os autores fazem uma resenha
teórica e empírica sobre três métodos: FP, filtro HP e o método da tendência temporal
segmentada19. Esse último, único ainda não apresentado até aqui, consiste em impor
uma tendência temporal distinta à série do PIB de cada país, para cada ciclo. Os ciclos
são definidos então, como o período entre dois picos na série do PIB. Assim a taxa de
crescimento do produto potencial varia entre os ciclos, mas a mesma é constante
dentro de cada ciclo. Esse método apesar de simples e intuitivo, apresenta um grave
problema para a etapa de previsão, que é como definir o tamanho do ciclo atual, razão
pela qual ele acabou sendo descartado ao longo do tempo.
O FMI também participou desse esforço. Dois artigos com a chancela do
Fundo são amplamente citados. O primeiro: De Masi (1997) é também um
levantamento dos estudos empíricos já feitos pela equipe de economistas do FMI.
Grosso modo, o método da FP era, à época, o mais utilizado para os países
desenvolvidos, devido à abundância e confiabilidade dos dados. Para os países em
desenvolvimento, por motivo oposto ao referido acima, os filtros estatísticos eram os
mais utilizados. Por último, para os países do antigo regime socialista, a escolha
recaía usualmente sobre modelos de crescimento endógeno, suplementados por
relações, de outros países, entre as variáveis-chaves e a taxa de crescimento, por
absoluta falta de dados ou de melhor hipótese.
O segundo paper do FMI: Cerra & Saxena (2000), apesar de ser um trabalho
cujos testes empíricos são feitos somente para a Suécia, dá uma contribuição para toda
19
O nome consagrado deste método na literatura em língua inglesa é split time trend.
24
a linha de pesquisa, pois, analisa a teoria e aplica ao caso sueco, modelos até hoje
pouco utilizados, como modelos bivariados de variáveis não observadas, modelos de
componentes comuns (ciclo e tendência) com taxas de crescimento assimétricas e
estimativas econométricas de produto potencial e NAIRU através de um sistema de
equações.
Outro aspecto relevante desse trabalho é a dispersão das estimativas de
produto potencial e hiato do produto, calculadas para o ano de 1998, chamando
atenção para o fato de quão importante são as hipóteses que baseiam a escolha do
modelo e do valor dos parâmetros imputados. A taxa de crescimento do produto
potencial varia de 0,9%, pelo filtro de Kalman (modelo de componentes permanentes
e transitórios comuns) na segunda estimativa20 até 4,2%; pelo mesmo filtro, porém
com dois estados21. O mesmo fenômeno ocorre com as estimativas do hiato do
produto que variam de -5,5% até 0,2%22. O primeiro número é obtido pela segunda
estimativa do modelo de componentes permanentes e transitórios comuns de um
estado e a segunda estimativa é obtida pelo método das variáveis não-observadas
univariado e também pelo método similar bivariado, onde o hiato do produto é
estimado conjuntamente com a NAIRU.
Ainda no âmbito dos organismos multilaterais, o estudo de McMorrow &
Roeger (2001), da CE (Comissão Européia), prossegue na mesma linha dos anteriores,
fazendo um survey teórico e a conseqüente aplicação empírica dos métodos aos países
da UE (União Européia). A diferenciação em relação aos anteriores está na
implementação do que eles chamam de modelo vintage, onde para se obter a PTF
20
A segunda estimativa difere da primeira apenas pelo valor dos parâmetros iniciais imputados para a
iteração.
21
O filtro de Kalman é um filtro de representação estado – espaço. No modelo de dois estados, usado
no artigo, cada componente da série: permanente e cíclico está representado num estado diferente.
22
Hiatos negativos significam que o produto efetivo está abaixo do produto potencial, enquanto que
hiatos positivos sinalizam a situação oposta.
25
potencial, regride-se o resíduo de Solow sobre uma constante, uma tendência temporal
e a idade média do estoque de capital. A intenção dos autores, com essa última
variável, é captar no modelo o efeito da heterogeneidade, em termos de produtividade,
do estoque de capital.
Outro grande impulso para a pesquisa sobre produto potencial e hiato do
produto veio dos bancos centrais do mundo todo, especialmente daqueles que
passaram a adotar metas de inflação explícitas, uma vez que como já mencionado
anteriormente, o hiato do produto é um indicador de pressões de demanda na inflação.
Nesse aspecto, um dos bancos centrais mais avançados no tema é, sem dúvida, o
Reserve Bank of New Zealand.
No estudo apresentado sob a forma de um relatório de pesquisa do ano de
2000 - Claus et Ali (2000) - que compila os esforços empreendidos até então dentro
do banco central daquele país, os autores procuraram abordar três questões: (i)
desenvolvimento das várias técnicas de estimação, (ii) avaliação do resultado gerado
pelas mesmas e (iii) implicações de política decorrente da incerteza associada as
estimativas do hiato do produto.
O banco trabalha com três metodologias distintas de estimação: filtro
multivariado que é usado nas projeções econômicas, um VAR (vetores autoregressivos) e um modelo multivariado de variáveis não-observadas. Da avaliação
conjunta das três, os autores concluíram que as mesmas movem-se conjuntamente,
particularmente nas décadas de 1970 e 1990, mas que existe uma incerteza quanto à
magnitude do hiato uma vez que os três métodos geram estimativas diferentes.
Em relação ao último objetivo do paper, os autores afirmam que não obstante
as incertezas acerca das estimativas do hiato do produto, esse é um previsor de
razoável eficiência da inflação e que seu uso como insumo da política monetária gera
26
mais estabilidade do que instabilidade ao ciclo econômico. Porém, os autores não
concluem sem antes fazer a seguinte advertência.
“O hiato do produto fornece uma ligação entre a economia real e a inflação e
permanece como um importante indicador de pressões inflacionárias futuras no
Banco Central Neozelandês. Contudo, dado que uma gama de outros fatores
também influencia a inflação, o hiato do produto tem o seu espaço dentro de um
amplo enfoque de metas de inflação. Logo, o hiato do produto é sempre visto
dentro do contexto, juntamente com outros indicadores. Se usado dessa maneira
e não de acordo com uma exatidão espúria, ele tem um papel valioso a
desempenhar”. [Claus, 2000, p. 8].
O BCE também possui seus estudos sobre metodologia de cálculo do produto
potencial. Mendez & Palenzuela (2001) fazem uma avaliação de diversos métodos
quanto ao seu poder de previsão da inflação e quanto à magnitude das revisões ex-post
do hiato calculado e chegam a conclusão de que os modelos multivariados de
componentes não-observados, onde o componente permanente é modelado como um
passeio aleatório ou como uma tendência linear local são os melhores previsores,
ainda que seu poder de previsão da inflação seja ligeiramente inferior a um modelo
auto-regressivo com o número ótimo de defasagens.
Willman (2002) também é um trabalho para discussão do BCE. O objetivo
desse estudo vai um pouco além do produto potencial, porém, um subproduto dessa
pesquisa são estimativas de produto potencial e hiato do produto, obtidas a partir de
um modelo multi-setorial, onde cada setor, que se diferenciam pelos mark-ups, são
agregados segundo uma FP Cobb-Douglas ou então uma FP CES (Constant Elasticity
of Substitution).
27
Por último, mas não menos interessante, é o trabalho de Dupasquier et Ali
(1999). Assim como muitos outros, ele traz uma análise dos resultados fornecidos por
diferentes metodologias. A sua singularidade reside, porém, na análise da metodologia
proposta por Cochrane, que é pouco estudada e aplicada. Essa metodologia usa um
VAR com duas variáveis: produto e consumo e defasagens da razão produto/
consumo. Se o consumo é um passeio aleatório e as variáveis são cointegradas, então
flutuações no produto sem contrapartida no consumo são vistas como transitórias.
3. Métodos de Cálculo Aplicados ao Caso Brasileiro
Essa seção apresenta três exercícios alternativos de contabilidade do
crescimento e produto potencial. Todos os três são baseados em artigos de outros
economistas. O intuito, além de resenhar esses trabalhos, é atualizar seus cálculos e
projeções, bem como testar hipóteses alternativas no âmbito da metodologia
empregada.
3.1.
Um Modelo Simples de Função de Produção
O método usado nessa seção segue, em grandes linhas, a metodologia descrita
em Silva Filho (2001). Esse trabalho foi uma das primeiras tentativas de se medir o
produto potencial da economia brasileira, depois de um longo jejum temporal. A
década de 1990 registra apenas duas tentativas correlatas,23 porém, o artigo citado
acima é, sem dúvida, o primeiro, cujo período de análise se estendeu para além do
Plano Real, por um ínterim consideravelmente longo, de 1980 a 2000.
3.1.1. Metodologia
23
Vide Carvalho (1996) e Bonelli & Fonseca (1998).
28
O estoque de capital foi construído a partir da série da FBCF (Formação Bruta
de Capital Fixo), através do método do inventário perpétuo. A intuição, por trás desse
método, é que o estoque de capital de um país no período t é formado: pelo estoque de
capital no período t-1, devidamente descontado da depreciação24 incorrida no período,
mais o investimento no período t, como mostra a Equação (10).
K t = (1−δ )⋅ K t −1 + I t
(10)
Escrevendo-se Kt-1 na forma da Equação (10), e substituindo-lo na mesma
equação pela expressão obtida, temos a Equação (11), abaixo.
2
K t = (1−δ ) ⋅ K t − 2 + (1−δ )I t −1 + I t
(11)
Fazendo essas substituições sucessivamente até o período inicial, obtém-se a
seguinte expressão de Kt.
t
t
1−δ  ⋅
=
+ ∑i =1 1−δ
Kt 
K
0




t −1
⋅Ii
(12)
A Equação (12) é bastante instrutiva, pois, mostra que o estoque de capital em
qualquer período pode ser construído, a partir do estoque de capital no período inicial,
da taxa de depreciação e da série de investimento ou FBCF. Porém, com exceção
dessa última, os outros dados necessários não são diretamente observáveis e suas
estimativas trazem para o cálculo do estoque de capital um considerável grau de
incerteza.
Para a taxa de depreciação, não se dispõe no Brasil de nenhum dado oficial ou
pesquisa de campo. Portanto, conta-se somente com estimativas feitas em trabalhos
acadêmicos, a partir de dados agregados ou outros métodos. O problema é que os
estudos que estimam a taxa de depreciação ou fazem hipóteses sobre a mesma, se
24
A depreciação é entendida como a perda de valor de um bem ao longo de sua vida útil devido à perda
de eficiência, obsolescência tecnológica ou qualquer outro motivo extraordinário. Para uma discussão
mais detalhada sobre o conceito de depreciação, vide seção 2 de Morandi & Reis (2004).
29
utilizam de números muito dispares, como mostra a Tabela 3. Silva Filho (2001)
resolveu esse problema, adotando em seu cálculo a taxa arbitrária de 5%.
Tabela 3 – Diferentes estudos trazem diferentes estimativas da taxa de depreciação
Taxa de Depreciação
3,56% a 4,32%
3,10%
3,74%a
8,62%
3,50%
5%
Carvalho, 1996
Bonelli & Fonseca, 1998
Morandi & Reis, 2004
Muinho & Alves, 2003
Pessoa et Ali, 2003
Silva Filho, 2001
a
Média da taxa de depreciação do período: 1951-2003.
Outra fonte de incerteza na obtenção do estoque de capital, como já dito
acima, é a obtenção do estoque de capital inicial: K0. Uma maneira simples de se
obter o estoque de capital inicial é supor uma relação capital-produto para o período
inicial, e a partir do valor do produto, obter o valor do estoque inicial. Uma
alternativa, condizente com o método do inventário perpétuo, é escrever K0 em função
das variáveis descritas na Equação (12).
n
K 0 = 1−δ  ⋅ K −n + ∑
0
i =− n
i
1−δ  ⋅

 Ii
(13)
O estoque de capital inicial pode ser expresso, então, como na Equação (13).
Se supõe-se que o investimento cresce a uma taxa constante g, sua trajetória pode ser
descrita, então, pela Equação (14).
I j = (1+ g )⋅ I j −1
(14)
Igualmente, o investimento no período t0 pode ser escrito no mesmo formato
(Equação (15)).
I 0 = (1+ g ) ⋅ I − j
j
(15)
Trocando o termo entre parênteses de lado, isola-se I-j na equação e obtém-se a
Equação (16).
30
I−j =
I0
(1+ g ) j
(a)
(16)
I − j = (1+ g ) ⋅ I 0
−j
(b)
Agora, pode-se substituir (16) em (13), para se obter a expressão final do
estoque inicial, descrita na Equação (17).
i
n
K 0 = (1−δ ) ⋅ K − n + ∑
0
i = − n −1
 1−δ 

 ⋅I 0
1
+
g


(17)
O último passo para se chegar a uma expressão mais palatável para o estoque
inicial de capital é obter o limite da Equação (17), quando n tende ao infinito. O
primeiro termo da equação zera, pois, a exponenciação à infinitésima potência da
primeira expressão entre parênteses tende a zero, uma vez que 1-δ é menor que um.
Logo, deve-se se preocupar apenas com o segundo membro da Equação (17), que
simplifica para a expressão mostrada na Equação (18).
K0 =
(1+ g ) ⋅
(g +δ ) I 0
(18)
Portanto, para calcular o estoque inicial de capital não é necessário nenhum
dado novo. Note que g pode ser obtido a partir da série da FBCF. Esse
desenvolvimento matemático todo, entretanto, não elimina de forma alguma a
incerteza associada com o cálculo de K0.
Há, contudo, uma estratégia mais pragmática, para se minimizar possíveis
erros na estimação do estoque inicial de capital. Essa estratégia consiste em estimar o
capital inicial para o ano mais longínquo possível e a partir daí, construir a série do
estoque de capital. A estimação do produto potencial, porém, deve ser feita utilizandose apenas um subperíodo desse estoque, iniciado alguns anos depois de K0 e
31
terminado no último período, para o qual se disponha de informação. Isso minimiza a
incerteza, pois, no período inicial do cálculo do produto potencial, K0 já foi
depreciado por alguns períodos e a sua participação no estoque de capital corrente
também já diminuiu consideravelmente, diminuindo assim a magnitude de qualquer
erro incorrido ao se estimar o estoque de capital inicial. Nessa seção, o estoque de
capital foi estimado a partir de 1970, contudo, o produto potencial só começou a ser
calculado em 1980.
Por último, o estoque de capital foi corrigido por um fator de utilização, de
modo que, somente o capital em uso contribuísse efetivamente para o produto. Caso
contrário, correria-se o risco de superestimar a contribuição do fator capital e em
decorrência inflar artificialmente o produto potencial. Para isso, optou-se por corrigir
o estoque de capital pelo NUCI (Nível de Utilização da Capacidade Instalada) da
FGV (Fundação Getúlio Vargas).
Essa escolha é controversa, pois, se corrige uma variável (estoque de capital),
que engloba os 3 setores da economia (agricultura, indústria e serviços) por uma
variável setorial, que mede o grau de utilização apenas na indústria. Além disso, a
própria definição de grau de utilização em alguns subsetores do setor serviço e
principalmente na agricultura é bastante questionável.
Outro dado, indispensável para o exercício, é o estoque do fator trabalho. Ao
contrário do estoque de capital, esse não precisa ser estimado. Todavia, a escolha da
série de trabalho a ser utilizada também influencia os resultados. Idealmente, esse
estoque deveria ser medido em horas trabalhadas pela parcela da população
empregada. Entretanto, no Brasil, os dados ainda não nos permitem construir essa
série.
32
No artigo de Silva Filho, o estoque de trabalho é medido pelo número de
trabalhadores na PEA, ajustados pela taxa de desemprego, isto é, somente os
trabalhadores efetivamente empregados naquele ano são incluídos na série.25 A fonte
de dados é a PME (Pesquisa Mensal do Emprego) do IBGE (Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística).
O problema aqui reside na pesquisa do IBGE, que não capta o total da
população empregada no Brasil, pois, sua abrangência se limita a 6 regiões
metropolitanas26 e mais recentemente pode estar superestimando a taxa de
desemprego, devido a uma mudança na estrutura regional da localização da indústria e
ao fortalecimento do agronegócio no interior do país. Ademais, a PME também
apresenta dificuldades de encadeamento de seus resultados, devido às revisões
metodológicas sofridas ao longo desse período.27 Por tudo isso, no exercício que se
segue, optou-se por construir a série de estoque de trabalho, a partir dos dados da
PNAD (Pesquisa Nacional por Amostragem de Domicílios), cuja abrangência engloba
todas as regiões do Brasil desde 1981, com exceção da área rural da região Norte.
Restam ainda algumas hipóteses necessárias ao cálculo do produto potencial
que precisam ser comentadas. A primeira delas diz respeito sobre o nível nãoinflacionário de uso dos fatores, os conhecidos NAIRU e NAICU. No artigo que serve
de base e no exercício feito nessa seção, a NAIRU foi obtida como a média simples
das taxas de desemprego do período do exercício. A NAICU por sua vez, foi
escolhida com base numa análise qualitativa, ou seja, que inclui julgamentos
subjetivos do autor do artigo original. Ele escolheu o nível de 85% de utilização da
25
O autor ainda faz um ajuste na taxa de participação de sorte que a PEA não caia de um ano para o
outro. Isso, porém, foi necessário somente em um ano da série empregada. Ele justifica esse ajuste com
base numa prociclicalidade excessiva da série frente ao comportamento esperado pela teoria
econômica.
26
A PME pesquisa as regiões metropolitanas das seguintes capitais: Recife, Salvador, Belo Horizonte,
Rio de Janeiro, São Paulo e Porto Alegre.
27
A PME sofreu revisões metodológicas nos anos de 1982, 1983 e 1993.
33
capacidade como sendo a NAICU, argumentando que a média simples do período
(79%) é claramente aquém da NAICU e que o pico da série atingido em 1973 foi
claramente inflacionário.28
Por último, é necessário fazer hipóteses sobre a parcela do trabalho e do
capital na renda.29 A escolha do autor recaiu em Sk = 0,49 e SL = 0,51; apoiando-se
nos dados recentes. Porém, como veremos mais adiante na Subseção 3.2.1, esses
dados são alvo de controvérsia no debate acadêmico e no caso brasileiro, em
específico, são sensíveis ainda à hipótese de a que fator (capital ou trabalho) atribuir o
rendimento dos autônomos.
3.1.2. Equações do Modelo
O modelo parte do pressuposto de que a economia pode ser representada por
uma FP Cobb-Douglas, com todas as suas propriedades conhecidas. Soma-se a isso a
hipótese de retornos constantes de escala e de mercados competitivos, de sorte que a
economia pode ser representada como na Equação (19).
α
1−α
Y t = At ⋅ K t −1⋅ Lt
(19)
Ou seja, o produto efetivo da economia no período t é função da PTF (At), do
estoque de trabalho em t (Lt), do estoque de capital no período anterior (Kt-1) e da
participação do trabalho (1-α) e do capital (α) na renda. O passo seguinte é aplicar o
logaritmo à equação, para se chegar a Equação (20).
ln Y t = ln At + α ⋅ln K t −1 + (1−α )⋅ ln Lt
(20)
Para se obter a PTF basta, então, rearranjar os membros dessa equação e
derivá-la em relação ao tempo.
28
29
A hipótese de que a NAICU é igual a 85% foi mantida nos exercícios dessa seção.
Assumindo se mercados competitivos e retornos constantes de escala.
34
ln At = ln Y t −α ⋅ln K t −1 − (1−α )⋅ ln Lt
(21)


∂ ln At ∂ lnY t
=
−α ⋅ ∂ ln K t −1  − (1−α )⋅ ∂ ln Lt 
∂t
∂t
 ∂t 
 ∂t 
(22)
Todo esse procedimento só é válido para variáveis em tempo contínuo. Como
o produto é uma série de baixa freqüência, a PTF é melhor descrita usando uma
equação em tempo discreto, como em (23). 30


1+


1−α
 
 

At  = 1+ Y t  − 1+ K t −1

 
 
At −1   Y t −1   K t −2 
α


− 1+ Lt 
 Lt −1 
(23)
Uma vez obtida a PTF, o produto potencial pode ser obtido através da
Equação (24), que é uma versão da Equação (19), escrita para os níveis potenciais do
produto, dos insumos e da PTF.
α
1−α
Y t = A t ⋅ K t −1⋅ L t
(24)
O nível potencial do estoque de capital e do estoque de trabalho é obtido
multiplicando-se o estoque total desses insumos pela NAICU e NAIRU
respectivamente.
Já para a PTF, o procedimento é ligeiramente diferente. Primeiramente, devese construir um índice para a PTF, com base 100 no ano de 1980, refletindo as
variações encontradas através da Equação (23). Esse índice reflete, portanto, a
produtividade efetiva de cada ano. Para encontrar a PTF potencial, optou-se por
aplicar o filtro HP a essa série.
3.1.3. Resultados
30
As variáveis na Equação (23) estão medidas em logaritmo.
35
O primeiro resultado, obtido a partir do cálculo do estoque de capital, é a
relação capital/ produto. Essa razão nos diz, em média, quantas unidades de capital
são necessárias para se produzir uma unidade do produto. Uma razão igual a dois
significa que a economia produz, em média, uma unidade do produto, a partir de duas
unidades de capital. Isso, porém, não significa que a cada duas unidades de capital
adicionadas a economia, o produto se elevará em uma unidade. Para esse cálculo, é
necessário saber a relação capital/ produto incremental da economia, isto é, quantas
unidades de capital são necessárias para se produzir, na margem, mais uma unidade
do produto.
A Figura 4 traz a relação capital/ produto total e efetiva, calculada para a
economia brasileira de 1980 a 2004. A razão capital/ produto efetiva difere da total,
pois, leva em conta somente o estoque de capital em uso, isto é, o estoque de capital é
ajustado pelo NUCI.
3,4
3,2
3,0
2,8
2,6
2,4
2,2
19
80
19
81
19
82
19
83
19
84
19
85
19
86
19
87
19
88
19
89
19
90
19
91
19
92
19
93
19
94
19
95
19
96
19
97
19
98
19
99
20
00
20
01
20
02
20
03
20
04
2,0
Total
Efetiva
Figura 4 – Relação capital/ produto efetiva apresenta estabilidade no período 1980-2004.
A primeira característica que chama atenção na figura acima, apesar de
esperado, é que os movimentos na relação efetiva são muito mais suaves do que na
relação total. A relação total indica uma intenção de oferta baseada em decisões
36
passadas dos empresários. A razão efetiva incorpora as decisões correntes de curto
prazo de quanto ofertar, tomada pelo empresário. A Figura 4 mostra, então, que os
empresários ajustam suas decisões de longo prazo para se adequar a demanda no curto
prazo, mas ainda, a figura acima mostra que esse ajuste é substancial, pois, na relação
total o ponto de máximo global é quase 19% maior que o ponto de mínimo global,
enquanto que na relação capital/ produto efetiva essa mesma diferença é de 5%.
Outro fato que chama atenção na Figura 4, é a estabilidade relativa das duas
relações. Note que apesar das variações ao longo do período, as duas séries
apresentam valores finais, muito próximos dos iniciais. A relação capital/ produto
total apresenta em 2004, um valor 2,3% maior do que em 1980, enquanto a relação
capital/ produto efetiva apresentou em 2004, um valor apenas 1,2% maior do que em
1980. As próximas seções desse capítulo trarão outros cálculos para a mesma relação,
o que nos permitirá concluir se esse resultado é geral ou fruto de alguma escolha
metodológica específica.
O segundo resultado obtido com essa metodologia é a evolução da PTF e a
tendência da PTF para esse período, como mostra a Figura 5.
1,00
0,98
0,96
0,94
0,92
0,90
0,88
0,86
0,84
19
80
19
81
19
82
19
83
19
84
19
85
19
86
19
87
19
88
19
89
19
90
19
91
19
92
19
93
19
94
19
95
19
96
19
97
19
98
19
99
20
00
20
01
20
02
20
03
0,82
PTF
Tendência-PTF
Figura 5 – Trajetória da PTF no período 1980-2003.
37
A leitura da figura acima deixa claro que a produtividade da economia
brasileira, medida por essa ótica e na visão de Silva Filho (2001), sofreu uma queda
em 1981, da qual ela não se recuperou até hoje. É notório também, que a volatilidade
da série diminuiu, a partir de meados da década de 1990. Isso é, de certa forma,
justificável, uma vez que a década de 1980 e o início da década seguinte, foi um
período muito instável marcado por uma sucessão de planos econômicos de
estabilização baseados em terapias de choque. Esse ponto fica bem claro na Tabela 4,
que mostra que o desvio padrão no período Pós-Plano Real se reduziu a menos de
30% do seu valor na década de 1980.
Contudo, o que pode parecer contra-intuitivo, é que a média da PTF nos
subperíodos: 1981-90; 1991-00 e 1994-03, que correspondem respectivamente às
décadas de 1980, 1990 e ao período de economia estabilizada, são muito semelhantes.
De fato, um teste t aplicado a esses dois subconjuntos da amostra falha em rejeitar a
hipótese nula de que as médias são iguais.31
Tabela 4 – A estabilização da economia diminuiu a volatilidade da PTF
1980-03
1981-90
1991-00
2001-03
1994-03
Média
0,911
0,910
0,904
0,907
0,911
Desvio Padrão
0,030
0,033
0,018
0,003
0,009
Com base no que foi dito nos dois parágrafos acima, fica claro que o efeito do
Plano Real sobre a PTF foi de conferi-la uma maior estabilidade, assim como ocorreu
com as outras variáveis na economia. Entretanto, ele não foi nem de longe condição
suficiente para que a PTF alcançasse um crescimento sustentado.
31
O teste t bi-caudal aplicado para comparar as décadas de 1980 e 1990, supondo variâncias iguais,
forneceu uma estatística de 0,5998, para um valor crítico à 10% com 9 graus de liberdade de 1,8333.
Um segundo teste bi-caudal foi feito para comparar o período Pré e Pós-Plano Real, supondo variâncias
distintas das suas amostras, fornecendo o valor de 0,9854 para a estatística de teste.
38
De posse do estoque de capital e da PTF podemos proceder à contabilidade do
crescimento exposta na Tabela 5.
Tabela 5 – Decomposição do crescimento: taxa de crescimento e contribuição de cada fator
A
K
L
-1,56%
1,50%
1,63%
-100,2%
96,1%
104,1%
1991-2000
2,61%
0,87%
0,81%
0,93%
33,3%
31,0%
35,7%
1994-2003
2,46%
0,19%
1,39%
0,88%
7,8%
56,5%
35,7%
a
Os números em vermelho, na segunda linha de cada subperíodo,
indicam a contribuição de cada fator para o crescimento .
1981-1990
Y
1,56%
A decomposição do crescimento confirma que do ponto de vista da
produtividade da economia, a década de 1980 realmente foi a década perdida. É de
certa forma emblemático constatar que, na visão do autor, se a PTF tivesse ficado
estável nessa década, tudo mais constante, o PIB brasileiro teria crescido a uma taxa
média duas vezes maior. Em outras palavras, a queda da PTF reduziu o crescimento
do PIB pela metade na década de 1980.
A marca da década de 1990 é um crescimento eqüitativo com todos os fatores
crescendo e contribuindo a taxas positivas e muito similares. Como resultado, a taxa
média de expansão da economia foi a maior dos 3 subperíodos analisados.
O terceiro subperíodo, cuja característica unificadora é a estabilidade da
economia, mostra uma menor taxa de crescimento (e também da contribuição) da
PTF, evidenciando que qualquer que tenha sido o fator que impulsionou a PTF na
década de 1990, esse foi perdendo força ao longo do tempo. Os números, porém,
corroboram com a hipótese levantada anteriormente de que só a estabilização da
economia não foi suficiente para sustentar o crescimento da PTF e liderar o
desenvolvimento econômico.
Ainda sobre a Tabela 5, é válido comentar que a taxa de crescimento do
estoque de trabalho é declinante, o que é condizente com um país como o Brasil, que
39
se encontra no estágio final de sua transição demográfica e é mais um ponto a favor
da escolha da PNAD como fonte para o estoque de trabalho.
Por último, como mostra a Tabela 6, a comparação dos resultados obtidos
nesse exercício com os resultados originais de Silva Filho (2001) evidenciam um
aspecto importante da metodologia de cálculo da contabilidade do crescimento. Como
aludido anteriormente, esses dois exercícios diferem na escolha da fonte de dados para
o estoque de trabalho. Logo, é de se esperar que a taxa de crescimento do estoque de
trabalho difira levemente entre os dois exercícios. O efeito colateral disso é uma
diferença de mesma magnitude, porém, de sinal oposto na taxa de crescimento da
PTF.
Por exemplo, na década de 1980, a taxa de crescimento médio do estoque de
trabalho medido pela PME foi de 1,8%, enquanto que pela PNAD o mesmo
crescimento foi de 1,6%, ou seja, uma diferença de 0,17 pontos percentuais a mais.
Logo, a PTF calculada nesse exercício deve ser 0,17 pontos percentuais, menor do
que a taxa encontrada em Silva Filho (2001).32
Tabela 6 – Diferenças na medição do fator trabalho são compensadas na PTF
(Silva Filho, 2001)
Tabela 4
Y
A
K
L
A
K
L
1981-1990 1,56%
-1,74%
1,50%
1,80%
-1,56%
1,50%
1,63%
-111,2%
96,0%
115,2%
-100,2%
96,1%
104,1%
a
2,61%
1991-2000
0,97%
0,82%
0,84%
0,87%
0,81%
0,93%
37,0%
31,1%
31,9%
33,3%
31,0%
35,7%
a
A soma das taxas de crescimento em (Silva Filho, 2001) não somam 2,61%, pois o
IBGE reviu os números das contas nacionais, após a publicação do artigo.
Tendo analisado, os resultados da estimação do estoque de capital, da PTF e
da contabilidade do crescimento, o próximo passo é calcular o produto potencial da
economia de acordo com a Equação (24). Para isso, adotou-se como NAIRU, a média
da taxa de desemprego no período 1980-2003, que foi de 6,1%. Para a NAICU,
32
A diferença entre as duas medidas da taxa de crescimento da PTF na Tabela 6, não soma exatamente
0,17% por uma mera questão de arredondamento.
40
manteve-se a taxa de 85% adotada no paper original. E para PTF adotou-se a
Bilhões de R$ de 1999
tendência obtida pelo filtro HP, ilustrada na Figura 5. O resultado está na Figura 6.
1.200
1.100
1.000
1997
900
1989
800
700
19
80
19
81
19
82
19
83
19
84
19
85
19
86
19
87
19
88
19
89
19
90
19
91
19
92
19
93
19
94
19
95
19
96
19
97
19
98
19
99
20
00
20
01
20
02
20
03
600
PIB Potencial
PIB Efetivo
Figura 6 – PIB potencial e efetivo: 1980-2003
A primeira evidência que chama atenção é, sem dúvida, o fato de que no
período analisado o PIB efetivo nunca esteve acima do potencial. O menor hiato
registrado foi em 1980, onde o PIB efetivo correspondeu a 97,2% do potencial. Em
contrapartida, o maior hiato ocorreu 3 anos depois, quando o PIB efetivo era somente
83,9% do potencial.
Na Figura
6, podemos distinguir, grosso modo, 3 períodos. Nos dois
primeiros que vão de 1980 a 1989 e de 1990 a 1997, respectivamente, o
comportamento é muito similar. Os períodos iniciam com um hiato estreito que vai se
ampliando até mais ou menos a metade do período, a partir da qual o hiato começa a
se estreitar novamente, dando esse formato de barriga ao gráfico. No terceiro período,
o que se vê é um hiato muito mais estável, com o PIB efetivo correndo quase que em
paralelo com o PIB potencial. A coluna 2 da Tabela 7 confirma essa análise,
mostrando que o DP (Desvio Padrão) do hiato, medido como porcentagem do produto
efetivo, é muito menor no terceiro período.
41
Tabela 7 – Volatilidade do hiato diminui no período Pós-Real mas a taxa da crescimento do PIB
potencial não aumenta
1980-89
1990-97
1998-03
1980-03
DP do Hiato
4,97
3,98
1,02
3,95
1981-90
1991-00
1994-03
1980-03
Hiato Médio
11,30
11,48
10,02
11,02
DP do Hiato
4,42
3,53
1,62
3,95
PIB Potencial - Taxa de Cresc.
2,68
2,22
2,19
2,39
A Tabela 7, também mostra que a taxa de crescimento do PIB potencial no
período todo foi muito baixa, média de 2,4%. Além disso, o período Pós-Plano Real é
caracterizado pela menor taxa de crescimento do potencial da economia e pelo menor
desvio padrão. Em resumo, a economia brasileira cresceu a taxas menores a partir de
1994, porém, mais previsíveis.
3.1.4. Projeções e Análises de Sensibilidade
Essa última subseção apresenta 3 possíveis cenários para o produto potencial
da economia no horizonte de longo-prazo (2005-2014). Em seguida, alguns exercícios
de estática comparativa são feitos para mostrar a influência de variações nos
parâmetros sobre as projeções e o próprio produto potencial.
Para se construir os cenários são necessárias 3 hipóteses somente. A primeira
que é comum a todos os cenários é sobre a taxa de crescimento da PEA33 empregada
(1,8% ao ano), que é equivalente a taxa de crescimento da mesma no período PósReal. As outras duas hipóteses versam sobre a taxa de investimento e a taxa de
crescimento da PTF no período 2005-2014.
Em seguida, definiu-se 3 cenários qualitativamente distintos para a economia
brasileira. No primeiro cenário, chamado de crescimento natural, assume-se que a
economia brasileira estará livre do ‘stop and go’ que a caracterizou de 1994 até 2003,
entrando numa trajetória de crescimento sustentado, sem que isso implique
necessariamente em altas taxas de crescimento. Essa nova dinâmica de crescimento é
33
Assumindo uma NAIRU constante e igual a 6,11%.
42
decorrente do ajuste interno (contas públicas e inflação sob controle) e externo
(equilíbrio na balança de pagamentos), que se acredita irá perdurar.
Nesse cenário, a taxa de investimento cresce meio ponto percentual (em
termos do PIB) a cada ano, para chegar a 2014 com uma taxa de 24,6%, a preços
constantes de 2004. O crescimento da PTF é uma média do crescimento, dos anos do
período Pós-Real em que a economia brasileira não esteve submetida a intempéries
externas.34
O segundo cenário é chamado de crescimento restringido. Nesse, o ano de
2004, não é visto como evidência de uma nova dinâmica macroeconômica, mas sim
como um ano, onde a conjuntura externa favorável permitiu um forte crescimento da
economia brasileira. Nesse cenário, os fundamentos macroeconômicos do Brasil
voltariam a se deteriorar e o país voltaria a caminhar no ritmo do chamado vôo da
galinha.
No cenário restringido, a taxa de investimento é suposta constante e igual a
20% do PIB, também a preços de 2004. A PTF cresce ao mesmo ritmo lento, ao qual
ela evoluiu no período 1994-2003.
O último cenário, referido como crescimento estimulado, parte em linhas
gerais dos mesmos pressupostos do primeiro, porém, assume que o governo e a
sociedade civil levarão adiante uma agenda de reformas e políticas, que melhorarão o
arcabouço institucional do país, impactando permanentemente o potencial de longo
prazo do país. Tal agenda inclui, sem prejuízo de outras iniciativas, uma política
industrial de apoio à inovação e uma reforma tributária que simplifique a legislação.
Nesse cenário, a taxa de investimento cresce mais rapidamente em respostas às
novas oportunidades de investimento que surgem no novo quadro institucional,
34
Para isso utilizaram-se os anos de 1994, 1997 e 2000.
43
atingindo em 2014, o nível de 28,6% do PIB, a preços de 2004. Já o crescimento da
PTF parte do mesmo ritmo alcançado em 2004, se amplia mais rapidamente em 2005
e 2006 devido ao desengavetamento de conhecimentos e capacitações acumulados
pelas empresas no período 1994-2003 e depois passa a crescer a um ritmo maior a
cada ano, devido à difusão da cultura inovadora na economia brasileira.
A Figura 7, mostra a trajetória do crescimento do PIB potencial do Brasil sob
os 3 cenários para o período 2005-2014 e a Tabela 8, apresenta um resumo das
hipóteses adotadas sob cada cenário e a taxa de crescimento médio do PIB potencial
Bilhões de R$ de 1999
obtida em cada um deles.
2.200
2.100
2.000
1.900
1.800
1.700
1.600
1.500
1.400
1.300
1.200
1.100
2004
2005
2006
2007
2008
Restringido
2009
Natural
2010
2011
2012
2013
2014
Estimulado
Figura 7 – Evolução do PIB potencial (em bilhões de R$ de 1999) sob os 3 cenários
Tabela 8 – Hipóteses adotadas em cada cenário e respectivos resultados
Restringido
Natural
Estimulado
a
b
Taxa de Investimentoa
20,00%
24,60%
28,60%
Crescimento da PTFb
0,19%
2,30%
4,04%
Crescimento do PIB Potencialb
1,74%
4,16%
6,20%
Taxa de investimento em 2014 a preços constantes de 2004.
Média do período 2005-2014.
No cenário de crescimento estimulado o Brasil entraria, então, na tão sonhada
trajetória de crescimento elevado e sustentável, rivalizando assim com o crescimento
de outros países emergentes como a China e a Índia. Por outro lado, o crescimento do
44
produto potencial sob o cenário de crescimento restringido, se mostra inferior ao
crescimento obtido no período Pós-Real, pois, ao contrário do que ocorreu nesses
anos, supõe-se que os choques externos serão a regra e não a exceção.
Agora, veremos como a mudança em um dos parâmetros como a taxa de
depreciação ou a NAICU, altera os resultados obtidos. A Figura 8, mostra o efeito da
mudança do nível da NAIRU sobre o PIB potencial. Para esse exercício, se escolheu
uma NAIRU de 4% e outra de 8%, permitindo assim avaliar tanto mudanças para
Bilhões de R$ de 1999
cima como para baixo.
1.200
1.100
1.000
900
800
700
19
80
19
81
19
82
19
83
19
84
19
85
19
86
19
87
19
88
19
89
19
90
19
91
19
92
19
93
19
94
19
95
19
96
19
97
19
98
19
99
20
00
20
01
20
02
20
03
600
PIB Potencial (original)
PIB Potencial (NAIRU = 8%)
PIB Potencial (NAIRU = 4%)
Figura 8 – Efeito da variação da NAIRU sobre o PIB potencial
Vemos que um menor nível da NAIRU está associado a um maior nível do
produto potencial, uma vez que se aumentou o estoque potencial de empregados. A
mesma lógica, porém, com os sinais inversos se aplica ao PIB potencial obtido com a
NAIRU de 8%. A variação da NAIRU corresponde a um deslocamento da curva do
PIB potencial, uma vez que as três curvas no gráfico são exatamente paralelas em
todos os seus segmentos. Dessa maneira, ela não altera a evolução do PIB potencial e,
portanto, não influi nas taxas de crescimento do produto potencial, obtidas nos 3
cenários.
45
A Figura 9, mostra o mesmo exercício feito para a NAICU. O resultado e a
interpretação são muito similares à da Figura 8. A única diferença fica por conta do
Bilhões de R$ de 1999
tamanho do deslocamento das curvas, que é maior na Figura 9.
1.250
1.150
1.050
950
850
750
19
80
19
81
19
82
19
83
19
84
19
85
19
86
19
87
19
88
19
89
19
90
19
91
19
92
19
93
19
94
19
95
19
96
19
97
19
98
19
99
20
00
20
01
20
02
20
03
650
PIB Potencial (original)
PIB Potencial (NAICU = 90%)
PIB Potencial (NAICU = 80%)
Figura 9 - Efeito da variação da NAICU sobre o PIB potencial
O último exercício de estática comparativa mostra os efeitos de uma variação
na taxa de depreciação do estoque de capital. Para esse exercício, a metodologia
adotada foi ligeiramente diferente. Enquanto nos outros exercícios o parâmetro foi
modificado na fase inicial, ou seja, antes da obtenção da PTF, aqui a taxa de
depreciação só foi modificada na fase do cálculo do potencial. A conseqüência disso é
que nos dois primeiros exercícios a tendência da PTF precisou ser reestimada, ao
passo que nesse exercício utilizou-se a mesma série, que foi empregada para o cálculo
do PIB potencial original.
A intenção com isso é mostrar, como que partindo do mesmo nível do PIB
potencial em 1980, a escolha da taxa de depreciação influi no PIB potencial de uma
maneira que vai se magnificando ao longo do tempo. Assim, obtém-se duas trajetórias
completamente distintas, como mostra a Figura 10.
46
Bilhões de R$ de 1999
1.500
1.400
1.300
1.200
1.100
1.000
900
800
700
19
80
19
81
19
82
19
83
19
84
19
85
19
86
19
87
19
88
19
89
19
90
19
91
19
92
19
93
19
94
19
95
19
96
19
97
19
98
19
99
20
00
20
01
20
02
20
03
600
PIB Potencial (original)
PIB Potencial (δ = 2,5%)
PIB Potencial (δ= 7,5%)
Figura 10 – Efeito da variação da taxa de depreciação sobre o PIB potencial
Uma menor taxa de depreciação, gera por sua vez, um maior estoque de
capital, cuja contribuição absoluta para o crescimento também aumenta. Isso ocorre
porque a vida útil do estoque de capital é estendida. Um bem de capital, cuja
depreciação ocorre à taxa linear de 5% ao ano, como suposto no exercício tem uma
vida útil de 20 anos. Se a taxa de depreciação assumida for de 2,5%, a vida útil desse
bem então dobra. No caso oposto em que a depreciação é suposta mais rápida, por
exemplo, igual a 7,5%, a vida útil do estoque de capital se reduz para 13,3 anos.
Tudo isso se refere ao nível (valor) do PIB potencial. Entretanto, como fica
claro na Figura 10, diferentes taxas de depreciação implicam em diferentes taxas de
crescimento do potencial, uma vez que as curvas não são mais paralelas umas as
outras. Em função disso, a Tabela 9, mostra as taxas de crescimento médio, obtidas
sob os 3 cenários, variando a taxa de depreciação e mantendo constante as demais
hipóteses.
Tabela 9 – Maiores taxas de depreciação aumentam a taxa de crescimento do PIB potencial.
Restringido
Natural
Estimulado
(δ = 2,5%)
1,74%
4,01%
6,05%
47
(δ = 7,5%)
1,75%
4,29%
6,42%
Uma taxa de depreciação maior significa, principalmente nos cenários de
crescimento natural e estimulado, uma maior taxa de crescimento, pois, as adições ao
estoque de capital são proporcionalmente maiores representando assim, um maior
crescimento do estoque de capital.
3.2.
Um Modelo de Crescimento Equilibrado
Essa seção investiga e estende os resultados de Pessôa et Ali (2003). Esse
artigo utilizou-se de uma base de dados internacionais para realizar exercícios de
contabilidade do crescimento para vários países. Além disso, a FP utilizada foi
levemente modificada em relação à da Seção 3.1, para levar em consideração
trajetórias de crescimento equilibrado e de transição. Nesse exercício, a FP é dada
pela Equação (25) , onde yt é o produto por trabalhador, At é a PTFD (Produtividade
Total dos Fatores Descontada da evolução tecnológica), kt é o estoque de capital por
trabalhador, Ht é o capital humano (escolaridade) por trabalhador e λt representa o
aumento de produtividade decorrente da evolução da fronteira tecnológica.
yt = At ⋅ f (k t , H t ,λ t )
(25)
3.2.1. Metodologia
Os dados para esse exercício foram extraídos da PWT (Penn World Table)
versão 6.1. A PWT é uma base de dados internacional mantida pelo CIC (Centro para
Comparações Internacionais) da Universidade da Pensilvânia. Essa base de dados
contém informações para 168 países sobre 23 diferentes variáveis das contas
nacionais dos anos de 1950 até 2000. Infelizmente, para muitos países alguns dados
não estão disponíveis, ou estão apenas para algum subperíodo da amostra. Os dados
são informados em dólares de 1996, ajustados pela PPC (Paridade do Poder de
48
Compra), de maneira a minimizar distorções decorrentes do nível de preços e das
taxas de câmbio, na comparação entre países.35 Os autores utilizaram-se de uma base
de dados internacional e ajustada pela PPC, pois, o artigo original aplica a mesma
metodologia para diversos países, comparando os resultados em seguida.
O estoque de capital é construído pelo método do inventário perpétuo, assim
como demonstrado na Subseção 3.1.1. Porém, diferentemente do exposto
previamente, o estoque de capital inicial imputado foi obtido através da multiplicação
da relação capital/ produto para o Brasil em 1950 (1,94) em Morandi & Reis (2004)
pelo PIB do Brasil dado pela PWT. Para os anos posteriores, depreciou-se o estoque
de capital em 3,5% ao ano, o que corresponde à média da taxa de depreciação da
economia americana no período 1950-2000, acrescentando-se o montante anual do
investimento ao estoque.
A taxa de depreciação como vimos anteriormente é o parâmetro mais crucial
nesse tipo de exercício. Contudo, como não há no Brasil dados para se calcular uma
taxa de depreciação do estoque de capital nacional, resta nos, então, somente apontar
as vantagens e desvantagens da escolha feita por cada autor.
Nesse caso, a principal vantagem de utilizar a taxa de depreciação americana,
sem dúvida, é a confiabilidade dos dados. Por outro lado, admitir que máquinas e
equipamentos no Brasil se depreciem ao mesmo ritmo que na economia americana,
que está na fronteira tecnológica, talvez não seja a hipótese mais plausível. Além
disso, o estoque de construções e estruturas dos dois países foi construído com
diferentes métodos e materiais.
35
Para maiores detalhes vide o apêndice de Heston et ali (2002) em:
http://pwt.econ.upenn.edu/Documentation/append61.pdf.
49
Para a série de escolaridade, utilizou-se os dados compilados em Barro & Lee
(2000).36 Nesse artigo, os autores calculam para intervalos de 5 anos, a escolaridade
média de 1960 até 2000, medida em anos de estudo, levando em consideração
diferenças de duração dos ciclos educacionais entre países, para dois grupos da
população: maiores de 15 anos e maiores de 25 anos. Nesse exercício, utilizaram-se os
dados de escolaridade para a população maior de 15 anos, uma vez que essa faixa
etária é a mais próxima da PEA.
Para representar o progresso tecnológico na fronteira, os autores ajustaram
uma tendência exponencial à série do produto por trabalhador, controlando pelo
aumento da escolaridade média da força de trabalho, para o período 1950-72. O
progresso técnico é dado, então, pela Equação (26), onde g representa a taxa de
progresso técnico.
λ t = 1+ g 
t
= (1,0153)t
(26)
Os autores escolheram esse subperíodo, porque segundo os mesmos, após
1972, o crescimento da PTF teria se reduzido nos E.U.A, conseqüência dos choques
do petróleo. Ora, não há razão a priori para se supor que a fronteira tecnológica cresça
a taxas constantes. Pelo contrário, dado o caráter disruptivo e inovador do progresso
tecnológico é muito provável que esse se processe a taxas variáveis ao longo do
tempo.
Portanto, a adoção de uma taxa de progresso tecnológico constante para todo o
período da série e extrapolada a partir de um subperíodo da série, pode induzir a
subestimação da PTFD em certos anos das décadas de 1970 e 1980, onde a PTF
claramente se expandiu mais devagar e a superestimação da mesma na década
36
A Base de dados Barro-Lee pode ser obtida em: http://www.cid.harvard.edu/ciddata/ciddata.html.
50
seguinte, devido à aceleração da produtividade trazida pela revolução da tecnologia da
informação e comunicação.
Como afirmado em Pessôa et ali (2004), se alguns países conseguiram escapar
dessa tendência mundial na década de 1970 e 80, muito provavelmente não
alcançaram tal feito porque a fronteira crescia a uma taxa mais rápida e sim devido a
arranjos institucionais particulares, que lhes permitiram avançar além da fronteira
nesses anos.
A FP da Equação (25) necessita também de dados sobre o número de
trabalhadores, uma vez que algumas das suas variáveis são expressas em termos per
capita. A PWT usa dados da PEA para calcular as variáveis per capita. O ideal seria
calcular tais variáveis em termos do número de trabalhadores empregados. No artigo
original, os autores constroem uma série de PEA e PEA empregada, a partir de dados
do Censo, da PNAD e do SCN (Sistema de Contas Nacionais).
Finalmente, resta comentar sobre o valor dos parâmetros usados. Nesse
exercício, há dois novos parâmetros, que são utilizados na função representativa do
capital humano (Ht), que serão oportunamente comentados na próxima subseção. Uma
outra diferença em relação ao exercício da Seção 3.1, é que no exercício de Pessôa et
ali (2003) os autores não fizeram nenhum ajuste para a utilização dos fatores.
Portanto, é de se esperar que a PTFD reflita também fatores conjunturais.
Nesse exercício, também é necessário imputar valores para a parcela do capital
e do trabalho na renda. Os valores usados são alvo de controvérsia, porque não
guardam relação com os dados calculados pelo SCN. Os autores fixaram SL = 0,6 e SK
= 0,4; com base em Gomes et ali (2005). Nesse artigo, seguindo sugestões de Gollin
(2002) e Young (1995), aplicam-se procedimentos para a correção da parcela do
trabalho na renda para um valor, que refletiria com maior acuidade o dado real.
51
Para propor essa correção, descartaram-se explicações baseadas em diferentes
tecnologias de produção, na existência de poder de mercado dos empresários gerando
quase-rendas em detrimento dos trabalhadores e em diferenças de arranjos
institucionais ou na existência de fatores fixos, para explicar a diversidade da parcela
do trabalho na renda entre países.
Gollin (2002), especificamente, também descarta qualquer explicação baseada
na diferença da composição setorial do produto entre os países. Para ele, a disparidade
dos números entre países se deve unicamente à contabilização errônea da renda do
trabalhador por conta própria ou autônomo como renda do capital, uma vez que essa
última sai como resíduo, ou seja, ela é o resultado da subtração da renda dos
assalariados da renda total. Gomes et ali (2005) aplica essas correções para o Brasil e
chega a resultados para a participação do trabalho na renda entre 0,5 e 0,67.
Pode parecer plausível que essa explicação responda por uma parte da
discrepância, em países como Gana, Bangladesh e Nigéria, onde os empregados por
conta própria correspondem de 75% a 80% do total dos trabalhadores empregados na
manufatura, como dizem os próprios autores. Porém, a aplicação ao Brasil das
mesmas correções feitas para tais países, não parece muito correta por uma série de
motivos, que estão expostos abaixo.
Em primeiro lugar, porque desde 1990, quando se iniciou o novo SCN, o PIB
pela ótica da renda traz dados separados para rendimentos dos trabalhadores
autônomos, sendo esse definido como uma renda mista, isto é, aquela parcela da renda
total, cuja contribuição do capital e do trabalho não podem ser distinguidas no todo.
Portanto, se o SCN já capta o rendimento dos autônomos, não há muito sentido em se
fazer uma correção para levar em conta o rendimento dos trabalhadores por conta
própria.
52
Além disso, mesmo que os dados do IBGE captem o rendimento dos
autônomos de maneira incompleta, o tamanho dessa distorção, sugerida pela diferença
entre os números obtidos em Gomes et alii (2005) e os números do IBGE mostrados
na Figura
11, parece muito grande. Levando-nos, pois, à conclusão de que as
correções propostas parecem superestimar a parcela dos autônomos na renda nacional.
É muito difícil supor que uma parcela de aproximadamente 12% da renda nacional,
que está contabilizada como sendo do capital, corresponda à renda de autônomos que
não foi captada pelo SCN, principalmente se levarmos em conta que essas ocupações
normalmente estão associados a um trabalho precário de baixa produtividade e
rendimento.
0,65
0,62
0,60
0,55
0,52
0,50
0,48
0,45
0,40
0,38
0,35
0,30
1990
1991
1992
1993
1994
1995
1996
Capital (Excedente Operacional Bruto)
1997
1998
1999
2000
2001
2002
2003
Trabalho (Assalariados + Autonômos)
Figura 11 – Participação do trabalho na renda declina ao longo do tempo
O argumento acima, apesar de contundente, não é a única razão para se
suspeitar da adequação de tal ajuste ao caso brasileiro. Os dados mostrados na Figura
11, são coerentes com a distribuição pessoal da renda, na qual o Brasil apresenta um
dos maiores índices de Gini do mundo e com a evolução da taxa de juros e da massa
salarial no mesmo período.
53
Quanto à distribuição da renda pessoal, é razoável supor que ela guarde
alguma relação com a distribuição funcional da renda. Logo, é pouco plausível que
um país, onde os 10% mais ricos se apropriam de 47% da renda total e os 50% mais
pobres ficam com apenas 13% do total,37 tenha uma distribuição funcional da renda,
onde 67% corresponda a rendimentos do trabalho.
Por último, muitos modelos teóricos de desenvolvimento assumem hipóteses
sobre a parcela do capital na renda ou obtêm resultados sobre a evolução da mesma.
Em particular, o modelo de Nelson & Winters (1982) prevê que ao longo do processo
de desenvolvimento, a parcela do capital na renda deve crescer em função das quaserendas geradas pelos produtores do setor moderno da economia. Ao final do processo,
essas quase-rendas se dissipam e a parcela do capital na renda encontra um novo
equilíbrio ao mesmo valor que prevalecia anteriormente. Maiores detalhes desse
modelo serão explorados no Capítulo 5. Por hora, a passagem transcrita abaixo,
extraída da mesma obra é bastante instrumental ao ponto levantado.
“Nos países menos desenvolvidos, encontra-se uma considerável dispersão entre
firmas nos seus níveis de produtividade, salários pagos e lucratividade.
Ademais, a parcela do capital é provavelmente maior nos países menos
desenvolvidos do que nos países desenvolvidos, refletindo principalmente a
presença de quase-rendas grandes no setor da economia que emprega a
tecnologia moderna” [Nelson & Winters, 1982, p. 240]
3.2.2. Equações do Modelo
O modelo é representado genericamente pela Equação (25). Porém, adotandose uma especificação Cobb-Douglas para a função e assumindo-se retornos constantes
de escala e mercados competitivos, podemos reescrever a equação na forma exposta
em (27).
37
Dados de 2002 calculados pelo IPEA com base na PNAD, obtidos no IPEADATA.
54
yt = At ⋅ k αt ⋅(H t ⋅λ t )1−α
(27)
Todos os símbolos acima representam as mesmas variáveis discutidas
anteriormente. A variável referente ao capital humano (Ht) toma a forma específica
representada na Equação (28).
{
θ
H t = exp 1−ψ ⋅h1−ψ
}
(28)
Nessa equação, h representa a escolaridade da PEA para um dado ano, medida
em anos de estudo. As letras gregas θ e ψ são parâmetros da função, onde θ é igual a
0,32 e ψ é igual a 0,58. A Equação (28) assume que o retorno, em termos de salário,
ao investimento em educação é positivo, porém, decrescente. Além disso, para incluir
essa equação na forma funcional da FP, é suposto implicitamente que o impacto da
educação na produtividade do trabalhador é bem descrito pelo rendimento recebido
pelo trabalhador, ou seja, externalidades decorrentes do maior nível educacional do
trabalhador não são captadas aqui.
O próximo passo é encontrar a PTFD, que é dada por (29).
At =
yt
1−α
α
k t ⋅(H t ⋅λ t )
(29)
De posse da PTFD e de todos os demais dados descritos aqui, pode-se
proceder ao exercício de contabilidade do crescimento propriamente dito. Os autores
propuseram, porém, uma maneira diferente de se fazer a decomposição do
crescimento em relação ao procedimento da Seção 3.1, a qual eles batizaram de
decomposição logarítmica teórica do crescimento. Para isso, eles partiram da Equação
(27) e multiplicaram os dois lados por y -α, obtendo (30).
55
α
k 
1−α
1−α
y t = At ⋅ t  ⋅ (H t ⋅λ t )
 yt 
(30)
Elevando-se os dois lados a (1/1-α)-iésima potência, obtêm-se a Equação (31).
α
 kt 
yt = At α ⋅  ⋅ H t ⋅λ t
 yt 
1
1−
1−α








(31)
O termo no primeiro parênteses é a relação capital/ produto, chamando-a de
Kt, chega-se finalmente a Equação (32).
α
yt = At α ⋅ (K t ) α ⋅ (H t ⋅λ t )
1
1−
1−
(32)
A partir dessa equação, fazendo a divisão de yt+1 por yt e depois aplicando o
logaritmo, obtém-se a expressão necessária para fazer a decomposição.
 yt +1  1
 At +1   λt +1  α
 Kt +1   eh
⋅ln
⋅ln
ln
 =
 + ln
+
 + ln h
y
−
1
−
α
1
α
λ
A
K
 t   t 
 t  e
 t 
t +1
t



(33)
O objetivo de se fazer toda essa transformação com as equações, para colocar
a FP em termos da relação capital/ produto está relacionado com o modelo de
crescimento de Solow e a intenção dos autores de avaliar se os países apresentam uma
dinâmica de crescimento equilibrado ou de transição.
No crescimento equilibrado ou estado estacionário de Solow, a relação capital/
produto é constante, logo, ∆K/∆Y38 em (33) deve ser igual a 0. Isso não quer dizer
que o estoque de capital não cresce, mas que ele aumenta somente no ritmo necessário
para dotar os novos trabalhadores com o mesmo estoque per capita que os
trabalhadores mais antigos. Já no crescimento de transição, a relação capital/ produto
cresce indicando que a economia está se movendo de um estado estacionário a outro.
38
∆K/∆Y é o terceiro termo no membro direito da equação.
56
Figura 12 – Modelo de Solow: crescimento equilibrado e de transição
B
y
C
A
ka
kc
kb
k
Na Figura 12, as linhas retas (de cor vermelha) representam a relação capital/
produto, enquanto as linhas côncavas (de cor azul) representam a FP agregada da
economia. Uma trajetória de crescimento equilibrado é exemplificada na figura como
um movimento do ponto A até C, ao passo que uma trajetória de transição é
representada por uma mudança do ponto A até B.
A vantagem desse procedimento é que o crescimento do produto, medido no
eixo vertical como a distância entre os pontos A e C, que na decomposição tradicional
seria atribuído ao fator capital, aqui é contabilizado como um incremento da PTF.
Somente o aumento do produto, ocasionado por uma acumulação de capital numa
dinâmica de transição, é contabilizado sob o fator capital nesse exercício. Na Figura
12, esse montante corresponde a distância entre os pontos C e B, medidos no eixo
vertical.
3.2.3. Resultados
57
Como no exercício anterior, vamos começar a explorar os resultados pela
relação capital/ produto. Como não se fez nenhum ajuste para a utilização do estoque
de capital, a Figura 13 traz apenas a relação total.
3,00
1983
2,75
2,50
2,25
1967
1980
2,00
1,75
1973
19
50
19
52
19
54
19
56
19
58
19
60
19
62
19
64
19
66
19
68
19
70
19
72
19
74
19
76
19
78
19
80
19
82
19
84
19
86
19
88
19
90
19
92
19
94
19
96
19
98
20
00
1,50
Capital/ Produto
Figura 13 – Evolução da relação capital/ produto total na economia brasileira de 1950 a 2000
Claramente, distinguem-se dois períodos de estabilidade na relação capital/
produto, entremeados por uma fase de transição. No primeiro período, que vai do
início da série até 1967, a relação K/Y oscila em torno de uma média de 2. No
segundo período, que abrange os anos de 1983 até 2000, a mesma razão oscila em
torno de uma média de 2,7. A diferença entre os dois períodos fica por conta da
volatilidade que é muito maior no segundo intervalo. De fato, o desvio padrão no
segundo período (0,12) é mais que o dobro do que o desvio registrado no primeiro
momento (0,056) da série.
Os anos da série, que marcam o intervalo entre esses dois momentos, de 1967
até 1983, também apresentam dois períodos nitidamente distintos, cujos
comportamentos se coadunam excepcionalmente bem com a história econômica
brasileira do período.
58
No primeiro, que vai de 1967 até 1973, a relação capital/ produto cai até
atingir o menor nível nessa série histórica (1,78). Esse período coincide com o
chamado milagre econômico brasileiro, quando o país apresentou altas taxas de
crescimento, em grande parte, advindas de uma maior utilização da capacidade
instalada, que desfrutava de elevada ociosidade, fruto da recessão dos primeiros anos
do governo militar. Isso se traduziu, na relação capital/ produto, num crescimento do
denominador (Y) em maior proporção do que o numerador (K).
De 1973 até 1983, pelo contrário, a relação capital/ produto entrou numa
trajetória estritamente ascendente, com exceção de 1980. Nesse período, a razão K/Y
subiu mais de 50%, passando de 1,8 para 2,8. Esse ínterim foi marcado na economia
brasileira pelos investimentos da chamada safra do milagre e pela implementação do
II PND (Plano Nacional de Desenvolvimento). Esse último apesar de originalmente
planejado para terminar em 1979, teve muitos projetos, cujos prazos de maturação
foram estendidos até o início da década de 1980, devido à instabilidade do período
que impediu que o plano fosse implementado de acordo com o seu cronograma
inicial. O II PND se caracterizou pela prioridade dada aos projetos na área de insumos
básicos e bens de capital, setores reconhecidamente de maior intensidade em capital, o
que explica o aumento da relação capital/ produto, verificado na Figura 13.39
Por último, vemos que, ao contrário do estoque de capital elaborado no
primeiro exercício e mostrado na Figura 4, o estoque de capital calculado nesse
exercício não apresenta a estabilidade verificada no anterior para o período 19802000. De fato, em 1980, a relação capital/ produto se encontrava no meio de um
período de transição. Essa estabilidade da relação, verificada na Seção 3.1, durante
todo o período, só encontra paralelo aqui a partir de 1983.
39
Para maiores detalhes sobre o II PND vide Castro & Souza (1985).
59
Na prática, porém, não podemos garantir que as duas séries fornecem
resultados contraditórios. É muito mais provável, que o estoque de capital do primeiro
exercício tenha antecipado uma tendência, que só se verificou alguns anos mais tarde
no presente exercício, devido a características particulares do primeiro método como a
maior taxa de depreciação e a menor amplitude da série do estoque de capital. Ou
seja, ambos os gráficos apresentam resultados quase similares.
110
1976
1980
100
1961
90
1967
80
1990
70
1997
19
50
19
52
19
54
19
56
19
58
19
60
19
62
19
64
19
66
19
68
19
70
19
72
19
74
19
76
19
78
19
80
19
82
19
84
19
86
19
88
19
90
19
92
19
94
19
96
19
98
20
00
60
PTFD
Figura 14 – Evolução da PTFD brasileira de 1950 até 2000
A Figura 14, exibe um outro importante resultado derivado do exercício de
decomposição do crescimento: a evolução da PTFD de 1950 até 2000. A variável
mostrada nesse gráfico, é ligeiramente diferente daquela comentada na Figura 5.
Aqui se descontou uma constante, que representa o progresso técnico da fronteira,
assim a produtividade total é, na verdade, um deslocamento paralelo para cima, da
curva apresentada. Contudo, o fato desse deslocamento ser paralelo não altera a
dinâmica da produtividade, o que torna indiferente comentar os resultados da PTFD
ou da PTF total.
A primeira tendência que chama atenção é o salto de produtividade registrado
entre 1967 e 1976, que se estendeu, em grandes linhas, até 1980. Depreende-se daí
60
que o milagre econômico brasileiro (1967-73) não foi puramente uma ocupação da
capacidade ociosa, ele também estava fortemente fundamentado na produtividade
ascendente da economia.
Prosseguindo mais adiante na história econômica brasileira daquele período,
fica claro que os dados não sustentam a interpretação daqueles que tentam negar
qualquer racionalidade econômica do II PND (1975-79), pois, a PTFD da economia
nesse período cresceu ou se manteve em patamares altos. Essa, porém, é a única
implicação indubitável do cotejo do gráfico com a experiência econômica do período.
Uma conciliação dos dados da produtividade da economia brasileira com as outras
interpretações acerca do período demanda maiores investigações, que fogem ao
escopo dessa tese, uma vez que esse período foi extremamente complexo e marcado
por: choques externos (crise do petróleo e da dívida externa), uma nova rodada de
investimento (II PND) que se prolongou até o início da década de 1980 e a inflexão da
política macroeconômica com o retorno de Delfin Neto ao Ministério da Fazenda.
Igualmente ao exercício anterior, percebemos que, na visão dos autores, a
década de 1980 foi realmente, a década perdida em termos de produtividade. A PTFD
registrou uma queda de mais de 22% nesse período, sendo que até o ano de 2000, ela
ainda estava em um nível inferior ao de 1990. Porém, mais impressionante ainda, é o
fato de que em 2000 e em toda a década de 1990, a PTFD registrou um nível menor
do que na década de 1950. Ou seja, em termos da PTFD e baseado nesse enfoque
teórico, o Brasil regrediu mais de meio século, depois de 1980!
As reformas de cunho liberal e a estabilização macroeconômica, nas quais
muitos economistas depositaram suas apostas como a pré-condição suficiente para a
retomada do crescimento sustentável, chegaram a ensaiar uma resposta positiva, com
a PTFD crescendo 7,5% de 1992 até 1996, mas logo se mostraram insuficientes.
61
E por último, mas não menos importante, a Tabela 10, resume por décadas, de
1950 a 2000, a decomposição logarítmica teórica do crescimento, o objetivo final dos
autores do artigo original.
Tabela 10 – Decomposição logarítmica teórica do crescimento – resultados originais
1950-59
1960-69
1970-79
1980-89
1990-00
1950-00
PTFD
39%
44%
37%
417%
-55%
-25%
Fronteira K deepening
40%
11%
46%
-12%
46%
26%
-107%
-112%
92%
-16%
72%
21%
H
9%
23%
-10%
-99%
79%
33%
Os dois fatos que mais chamam atenção nessa tabela são, sem dúvida, os
números da década de 1980 e como o resultado total do período na última linha não
guarda muita relação com os resultados decenais. Por isso, antes de tecer comentários
sobre esses resultados, uma advertência sobre o método de obtenção desses resultados
tem que ser feita, a fim de evitar distorções na análise. Cada célula da tabela foi obtida
através de divisões como a expressa em (34).


ln xt + n 
 xt 
y 
ln t + n 
 yt 
(34)
A letra x representa os 4 componentes da decomposição: fronteira, PTFD,
capital humano e relação K/Y. Além disso, a PTFD e a relação capital/ produto tem
seu numerador multiplicados pelos mesmos fatores da Equação (33). Ou seja, o que a
Tabela 10, mostra é a importância relativa do crescimento de cada fator para o
crescimento do PIB.
Os sinais positivos e negativos não indicam necessariamente contribuições
positivas ou negativas. Um sinal positivo indica que aquele fator atuou, evoluiu na
mesma direção do PIB, enquanto que um sinal negativo indica que um determinado
62
fator atuou em direção contrária à evolução do PIB. Logo, para que possamos
entender os resultados acima, temos que saber, a priori, se o PIB cresceu ou diminuiu
em cada década.
Para os dados da tabela acima, o PIB apresentou variação positiva para todas
as décadas com exceção da década de 1980. Dessa maneira, o crescimento de 417%
da PTFD na década de 1980, que numa leitura rápida poderia indicar um estrondoso
movimento de catch-up, na verdade indica que tanto o PIB e a PTFD caíram nessa
década e que a queda dessa última foi mais de 4 vezes maior do que o declínio do
PIB. Da mesma forma, os outros 3 fatores: fronteira, relação capital/ produto e capital
humano cresceram nessa década. Os autores concluem, então, que a queda da PTFD
foi tão grande que contrabalançou o crescimento dos outros fatores e acabou por
determinar o declínio do produto nessa década.
Esse modo de decompor o produto permite aos autores responder a duas
questões. A primeira é se o crescimento do Brasil é melhor descrito por uma trajetória
de transição ou de equilíbrio? O período 1950-2000 como um todo, pode ser descrito
como de transição, uma vez que o aumento da relação capital/ produto explica 21% do
crescimento do PIB nesse período. Porém, de modo algum ele foi uniforme, a maior
contribuição da transição para um maior nível da relação capital/ produto foi na
década de 1970 e 1980, como esperado.
A segunda pergunta é sobre se o crescimento do Brasil foi fruto de um esforço
próprio de crescimento da produtividade mais rápido que o ritmo da fronteira, ou se o
Brasil cresceu apenas involuntariamente devido à expansão da fronteira tecnológica?
Pessôa et ali (2003), olhando para a última linha da Tabela 10, conclui que o
Brasil não conseguiu diminuir a brecha de produtividade em relação aos países da
63
fronteira e que seu crescimento se deve majoritariamente a expansão da fronteira
tecnológica.
Essa é uma conclusão forte mas que a primeira vista, está bem fundamentada
nos dados empíricos obtidos pelos autores e sumariados na Tabela 10. Entretanto, ela
é fortemente dependente da visão teórica e das hipóteses práticas adotadas, a respeito
do progresso tecnológico. Primeiramente, pelo fato do progresso técnico ser
representado por uma taxa de crescimento positiva e constante, não se poderia esperar
outro resultado que não uma contribuição positiva da fronteira para o crescimento. Ou
seja, ao contrário dos outros fatores, que podem apresentar contribuição positiva ou
negativa, a fronteira por construção do exercício é uma variável que possui um limite
inferior positivo para o seu intervalo.
Em conexão com o tópico acima e como já aventado anteriormente, parece
claro que a contribuição da PTFD está subestimada na década de 1980 como
contrapartida da superestimação do crescimento da fronteira na mesma década, que
ficou marcada pela desaceleração em escala mundial da produtividade.
Ademais, o próprio conceito teórico de fronteira tecnológica, onde o
conhecimento seria um bem público sem custo para a sua assimilação e
implementação, parece inadequado a realidade, o que acaba por distorcer a
interpretação. O fato de um país mais atrasado conseguir acompanhar o ritmo da
expansão da fronteira denota, por si só, um grande feito e não um movimento
involuntário, pois, tal proeza não é, de forma alguma, uma tarefa mecânica ou
automática. De fato, a literatura registra muitos exemplos de países que por um tempo
estiveram na fronteira do desenvolvimento e por motivos diversos ficaram para trás.40
40
Uma discussão mais detalhada sobre a natureza do progresso tecnológico será feita nos capítulos 5 e
6.
64
3.2.4. Produto Potencial e Exercícios Alternativos
Essa última subseção se dedica a apresentar o cálculo do produto potencial,
que não é feito no artigo original, mas que sai quase como uma extensão natural da
metodologia aplicada. Apresentam-se também exercícios alternativos de contabilidade
do crescimento e produto potencial para que se possa avaliar até que ponto, os
resultados originais são dependentes dos valores dos parâmetros adotados.
A Figura 15, mostra o produto efetivo e o potencial da economia brasileira
para o período 1950-2000. Como nessa metodologia não foi feito nenhum ajuste para
o grau de utilização do fator capital, o estoque de capital é o mesmo nas séries do
produto efetivo e potencial, o mesmo ocorrendo com os dados de escolaridade e da
fronteira tecnológica. Logo, as duas séries apresentadas na figura abaixo, diferem
somente nos dados da PEA e da PTFD. Para essas duas séries, por falta de melhor
opção, aplicou-se o filtro HP. Para a série da PEA, na verdade aplicou-se o filtro à
série da razão PEA sobre população total. Por último, as séries do PIB foram
multiplicadas pelo número de trabalhadores para se passar do PIB por trabalhador
Bilhões de US$ PPC
para o PIB total.
1.250
1.150
1.050
950
850
750
650
550
450
350
250
150
19
50
19
52
19
54
19
56
19
58
19
60
19
62
19
64
19
66
19
68
19
70
19
72
19
74
19
76
19
78
19
80
19
82
19
84
19
86
19
88
19
90
19
92
19
94
19
96
19
98
20
00
50
PIB potencial (total-HP)
PIB efetivo (total)
Figura 15 – PIB potencial difere muito pouco do PIB efetivo.
65
O produto potencial, obtido por esse método, possui uma trajetória muito
próxima do produto efetivo, principalmente de 1950 até a década de 1980, a partir da
qual eles começaram a apresentar uma maior diferença. O hiato médio, em termos
relativos, para o período total é de 3%, sendo que o maior e o menor hiato registrado
foram respectivamente de 9,2% e 0,2%. Tal resultado é muito mais um subproduto da
metodologia empregada, que não ajustou o fator capital pelo seu nível de utilização,
do que a reprodução de uma real característica da economia brasileira.
Outro fato interessante, que pode ser visto nesse gráfico é que a partir da
década de 1980, a economia brasileira apresentou ciclos claramente delineados, isto é,
após um momento, onde o produto efetivo se mantém acima do potencial, segue um
momento no qual o inverso ocorre. Note que esse resultado é particular a esse
exercício, não sendo obtido noutro exercício. Além disso, o fato da economia
brasileira se manter acima do potencial por períodos prolongados de tempo, não
obstante o hiato positivo acumulado, se coloca em oposição à teoria, que nega a
sustentabilidade de tais períodos. Mais intrigante ainda é verificar que isso ocorreu
uma vez num período de baixa inflação: 1994 a 1998. É claro, que tal fato pode ser
um subproduto (indesejado) desse exercício, o que não nos permite, por enquanto,
extrapolar maiores conclusões a partir daí.
Feito o cálculo do produto potencial, que surge quase como uma extensão
natural do artigo original, o foco agora se volta para a influência das variações dos
parâmetros e da base de dados sobre os resultados obtidos no artigo de Pessoa et ali
(2003). A Tabela 11 apresenta o mesmo exercício de decomposição do crescimento
feito anteriormente, porém, agora sob novas hipóteses para os valores dos parâmetros.
Aqui, a taxa de depreciação adotada é de 5%, a parcela do trabalho na renda é de 50%
66
e a taxa de crescimento do progresso técnico é assumida constante e igual a 0,8% ao
ano.
Tabela 11 – Decomposição logarítmica teórica do crescimento sob hipóteses alternativas
1950-59
1960-69
1970-79
1980-89
1990-00
1950-00
PTFD
76%
81%
43%
393%
18%
16%
Fronteira K deepening
21%
-7%
24%
-28%
24%
43%
-56%
-139%
48%
-45%
38%
13%
H
9%
23%
-10%
-99%
79%
33%
Nesse exercício, as conclusões derivadas são distintas. A começar, pela
contribuição da fronteira, que é bem menor, evidenciando que esse é um componente
determinístico da decomposição e que por construção sua contribuição é sempre
positiva e será tanto maior quanto for o valor do parâmetro g.
Sob essas novas hipóteses, verifica-se que todos os fatores passaram a
contribuir positivamente para o crescimento do PIB no período 1950-00, e que a
contribuição foi mais equânime. Portanto, com base na tabela acima não podemos
concluir, como os autores fizeram baseados na Tabela 10, de que o Brasil cresceu
praticamente por osmose do progresso técnico gerado na fronteira.
Quanto à relação capital/ produto, a maior taxa de depreciação do estoque de
capital, sem dúvida, influiu para que a contribuição ao crescimento de K/Y
diminuísse, reduzindo conseqüentemente o poder explicativo de um movimento de
transição, nos termos de Solow, na evolução do PIB brasileiro. Porém, cresceu a
importância desse fator para explicar o crescimento das décadas de 1970 e 1980,
quando o Brasil empreendeu um esforço de implantação e fortalecimento de indústrias
mais capital-intensivas.
Por último, vê-se que a PTFD cresceu durante todo o período com exceção
apenas da década de 1980. Além disso, nas décadas de 1950, 1960 e 1970 ela foi o
principal motor do crescimento brasileiro.
67
Todos esses itens levantados e em especial os dois últimos são muito mais
intuitivos e condizentes com os fatos estilizados e as interpretações prevalecentes
sobre o desenvolvimento econômico brasileiro. Por exemplo, é de se esperar que de
1950 a 1979, quando a população brasileira estava migrando do campo para a cidade,
novas indústrias estavam sendo instaladas no Brasil e novos bens de consumo sendo
difundidos, que a PTFD da economia aumentasse. Da mesma maneira, é coerente com
o escopo do II PND que a relação capital/ produto se ampliasse. Portanto, ao invés de
assumir hipóteses, que são questionáveis e tomar seus resultados como verdades
absolutas, um enfoque, onde as hipóteses são escolhidas com base na verossimilhança
entre os resultados e a experiência efetiva do Brasil, pode ser uma boa alternativa para
se calibrar os parâmetros, dada a incerteza em torno dos mesmos.
A maior diferença entre o cálculo feito em Pessôa et ali (2003) e exercícios
similares, além da decomposição teórica, está na base de dados usada pelo primeiro,
que se justifica uma vez que um objetivo do estudo era fazer uma comparação entre
países. Além disso, nesse estudo não se ajusta nenhum fator pelo seu grau de
utilização. O motivo não é mencionado no texto, mas certamente, deve estar
relacionado com a dificuldade ou impossibilidade de se obter estimativas do grau de
utilização para todos esses países de maneira confiável e compatível.
Tendo isso em vista, optou-se por aplicar a mesma metodologia de
decomposição e os mesmos valores dos parâmetros aos dados de fontes nacionais e
ajustados para o grau de utilização. Assim, o PIB e a população total foram extraídos
do SCN do IBGE. O estoque de capital foi obtido, multiplicando-se o PIB pela razão
capital/ produto apresentada na Figura 13. A série de escolaridade e da razão PEA/
população total foram mantidas. O ajuste para o estoque de capital foi feito com base
no NUCI da FGV, já o estoque de trabalho foi ajustado pela taxa de desemprego
68
obtida na PNAD, pois, o Brasil não dispõe de uma série tão longa de desemprego, que
cubra o período 1950-00. Por conta disso, o período de análise teve que ser
encurtado.41
A Figura 16 traz uma comparação da PTFD obtida originalmente (PTFD1)
com a PTFD obtida sob o novo conjunto de dados (PTFD2).
130
120
110
100
90
80
PTFD1
20
00
19
98
19
96
19
94
19
92
19
90
19
88
19
86
19
84
19
82
19
80
19
78
19
76
19
74
19
72
19
70
70
PTFD2
Figura 16 – A PTFD obtida a partir dos dados com ajuste é quase um deslocamento paralelo
O ajuste pela utilização do fator capital diminui a contribuição do mesmo ao
crescimento, o que automaticamente aumenta a PTFD, uma vez que essa sai por
resíduo. A maior diferença entre uma e outra está no nível das séries, uma vez que a
taxa de crescimento médio das duas é muito similar (-1,1% contra -1%) e também
pelo fato de a PTFD2 apresentar movimentos mais suaves. Tirando essas diferenças, o
movimento ao longo do tempo e, portanto, a sua análise, são praticamente iguais.
E como que a mudança da base de dados e a correção pela utilização dos
fatores altera a decomposição teórica do crescimento? A Tabela 12 traz os novos
resultados para que eles possam ser comparados com os números da Tabela 10.
41
Os cálculos foram feitos somente de 1970 a 2000, mas mesmo assim teve se que assumir que a taxa
de desemprego de 1970 até 1975, foi igual à de 1976.
69
Tabela 12 – Decomposição logarítmica teórica do crescimento – base de dados alternativa
1970-80
1980-90
1990-00
1970-00
PTFD
41%
357%
-73%
-135%
Fronteira K deepening
46%
23%
-107%
-51%
79%
26%
121%
52%
H
-10%
-99%
68%
63%
A nova base de dados não alterou os resultados de maneira considerável.
Como previsto, a contribuição do aumento da relação capital/ produto, o chamado
capital deepening, diminuiu. Como contrapartida, a contribuição da PTFD aumentou,
apesar de ainda continuar contribuindo negativamente para o crescimento do PIB no
período. No quadro geral, a mensagem continua a mesma: a fronteira foi o maior
determinante do crescimento brasileiro no período e o desenvolvimento da
produtividade local somente atrapalhou. Com base na tabela acima e na visão dos
autores do artigo original, tivesse a PTFD ficado estável nesses 30 anos, o
crescimento do Brasil teria sido 135% maior.
A Figura
17 mostra os resultados do produto potencial por trabalhador,
utilizando a nova base de dados e o ajuste para a utilização dos fatores. O período de
análise foi estendido até 2004, uma vez que para parte dos dados como PIB e
população se dispunha de dados mais atuais. Para outros, teve-se que assumir algumas
hipóteses. Para a escolaridade, extrapolou-se a taxa de crescimento da década de
1990. Para o estoque de capital, aplicou-se a mesma taxa de crescimento da relação
capital/ produto de Morandi & Reis (2004) e para PEA assumiu-se uma tendência
linear.
70
Milhares de R$ de 2003
27
25
1997
1980
23
1976
21
19
17
Efetivo
20
04
20
02
20
00
19
98
19
96
19
94
19
92
19
90
19
88
19
86
19
84
19
82
19
80
19
78
19
76
19
74
19
72
19
70
15
Potencial
Figura 17 – PIB potencial por trabalhador
A maior diferença fica por conta do tamanho dos hiatos comparado com
aqueles obtidos na Figura 15. Para o mesmo período, 1970-2000, o PIB potencial
com ajuste e base de dados alternativa apresenta um hiato médio em termos absolutos
de 8,1%, enquanto que com os dados originais e sem ajuste o mesmo valor foi de
3,4%.
Outra dessemelhança importante é quanto ao comportamento das duas séries.
Na Figura 15, chamou-se atenção para a dinâmica de ciclos do PIB efetivo, que
ultrapassava o potencial por longos períodos de tempo. Na figura acima, ao contrário,
e similarmente ao primeiro exercício, não se verificou nenhum hiato negativo depois
de 1980. Além disso, os anos de menor hiato (1986/7 e 1997) coincidem com os do
primeiro exercício. Ademais, os comportamentos dos hiatos nesse período e também
na década de 1970 são muito mais compatíveis com a história econômica brasileira.
3.3.
Modelos Alternativos: Solow-Swan e AK
Essa seção, a última do capítulo 3, faz uma resenha de Bacha & Bonelli
(2004). Esse artigo tenta entender os determinantes por trás do crescimento brasileiro
71
acelerado nas décadas de 1940 a 1970 e também o porque do baixo crescimento
econômico registrado a partir da década de 1980. Para isso, os autores aplicam duas
metodologias diferentes aos dados empíricos: o modelo AK e o modelo Solow-Swan
(SS), obtendo alguns resultados, que serão analisados adiante. Nas duas próximas
subseções, faz-se a descrição dos dados e da metodologia.
3.3.1. Metodologia
O trabalho referido difere um pouco daqueles analisados nas seções anteriores,
pois, ele não restringe sua análise somente a exercícios de contabilidade do
crescimento. O artigo investiga também os determinantes da acumulação de capital e
implementa um modelo do tipo Y=AK. Por isso, o número de séries requeridas é um
pouco maior e distinta dos exercícios precedentes.
Comecemos, entretanto, pelas séries mais usuais. A série do estoque de
capital, utilizado pelos autores, é aquela construída em Morandi & Reis (2004), que
abrange todo o período do estudo: 1940 a 2002. Nesse artigo, porém, o estoque de
capital no ano t é uma média geométrica do estoque de capital em Morandi & Reis
(2004) nos anos t e t-1.
A taxa de depreciação utilizada, quando necessária, também foi estimada no
mesmo paper em que se obteve o estoque de capital. Ela varia entre 3,5% e 4% do
estoque líquido de capital, sendo sua média para o período de 1951 a 2004,
equivalente a 3,73%.
O estoque de capital também é ajustado pelo seu grau de utilização, porém,
nesse texto, os autores incorporam, de certa forma, as críticas ao ajuste puro e simples
pelo NUCI da FGV e propõem uma correção alternativa. Segundo eles, certos setores
da atividade econômica, como administração pública, agricultura e aluguéis operam,
72
por definição, sempre ao nível de pleno emprego. Esses setores representariam em
média, para o período do estudo, 35% do PIB quando visto pela ótica da oferta. A
utilização do restante do estoque de capital da economia variaria de acordo com o
nível de utilização da capacidade da indústria, cuja melhor aproximação é o NUCI da
FGV. O grau de utilização é descrito, portanto, pela Equação (35).
UC = 0,35×1 + 0,65× NUCI ( FGV )
(35)
O NUCI da FGV só foi calculado a partir de 1968. Logo, os autores tiveram
que estimar uma equação para o mesmo para poder inferir seu valor nos anos de 1940
a 1968. Por último, a série obtida foi normalizada, com o nível de utilização de 1973,
o maior da série, sendo igualado a 100%.
A construção da série de trabalhadores empregados desde 1940, sem dúvida
alguma, é a tarefa mais difícil. Os autores usam uma série decenal de empregados em
relação a PIA (População em Idade Ativa), pois, tais dados só estão disponíveis para
os anos dos censos demográficos brasileiros. Para se interpolar essa série e obter
assim dados anuais de trabalhadores empregados, os autores optaram por uma
metodologia distinta da interpolação linear simples.
A variação anual do número de empregados foi obtida multiplicando-se a
elasticidade emprego capital (que pode ser calculada somente para os anos de censo)
pela variação anual do capital utilizado. A vantagem desse procedimento, segundo os
autores, é que emprego e estoque de capital passam a apresentar comportamentos
relacionados ao longo do ciclo, além de se preservar os dados decenais obtidos do
censo.
As duas últimas séries usadas no artigo são a taxa de poupança e o preço
relativo do investimento. A taxa de poupança, pelas identidades das contas nacionais,
é igual à taxa de investimento da economia. Por último, o preço relativo do
73
investimento é a razão do deflator da FBCF e do deflator do PIB, ambos obtidos do
SCN, tomando o ano de 2000 como ano base.
3.3.2. Equações
Como dito no começo dessa seção, o principal objetivo do artigo é investigar
as causas das crescentes taxas de crescimento do PIB brasileiro e da conseqüente
queda da mesma, a partir de meados da década de 1980. Com esse objetivo em mente,
os autores traçaram um roteiro de pesquisa que averigua possíveis fatores explicativos
como a acumulação de capital, a taxa de poupança e o preço relativo do investimento.
O artigo se aprofunda na investigação do comportamento da acumulação de
capital, pois, esse parece ser a principal razão da queda da taxa de crescimento. Para
isso, deriva-se uma equação dos determinantes da acumulação de capital. O ponto de
partida é a Equação (36), que descreve a taxa de crescimento do estoque de capital
( K& ).
I
K& = − δ
K
(36)
Essa depende positivamente do investimento e negativamente da depreciação.
Dividindo-se e multiplicando-se por Y a taxa de investimento (I/K), a equação pode
ser reescrita como em (37).
I I Y
= ⋅
K Y K
(37)
Por sua vez, (I/Y) também pode ser escrito de outra maneira se dividido e
multiplicado por (Py/Pi), que é a razão entre o preço do produto e o preço do
investimento.
74
I Pi ⋅ I P y
=
⋅
Y P y ⋅Y Pi
(38)
O primeiro termo no lado direito da Equação (38) é a taxa de investimento em
termos nominais, que pela identidade das contas nacionais pode ser escrita como a
taxa de poupança (S). O segundo termo, por sua vez, é o inverso do preço relativo do
investimento, ao qual chamaremos de p. Assim, a equação acima simplifica para.
I
1
= s⋅
Y
p
(39)
O Termo (Y/K) na Equação (37), também pode ser reescrito de outra maneira
se multiplicado e dividido pelo nível de utilização da economia (u). O termo entre
parênteses na Equação (40) nada mais é do que o inverso da famigerada relação
capital/ produto efetiva, já mostrada anteriormente, e aqui referida pela letra (v).
Y
 Y 
= u ⋅

K
 u⋅K 
(40)
Substituindo as Equações (40) e (39) em (37) e a resultante delas depois em
(36), obtemos a Equação final (41), que descreve os determinantes da taxa de
acumulação de capital, a saber: taxa de poupança, preço do investimento, utilização da
capacidade, razão produto/ capital efetivo e taxa de depreciação.
1
K& = s ⋅ ⋅ u ⋅ v − δ
p
(41)
Após construírem uma matriz de correlações, os autores verificam, que o
preço do investimento e a relação produto/ capital efetiva apresentam as maiores
correlações com a taxa de acumulação de capital e alta correlação entre si, passando,
então, a investigar mais apuradamente essas duas séries.
75
O comportamento delas no período de análise é completamente distinto. O
preço relativo do investimento (p), após um período inicial de queda até 1952,
apresenta uma tendência clara de elevação, enquanto a relação produto/ capital efetiva
cai ao longo do período.
Uma das possíveis explicações levantadas para a queda de v, ou igualmente
para o aumento da relação capital/ produto é de que o Brasil estaria convergindo em
direção a um estado estacionário de Solow, partindo de um estoque de capital menor
do que o de equilíbrio. Para testar tal hipótese, calculou-se a taxa de crescimento do
estoque de capital num suposto estado estacionário. Nesse caso, ela seria igual a taxa
de crescimento do progresso técnico e da força de trabalho, que também é a taxa a
qual o produto total da economia evolui.
& &
K& ss = A + N
(42)
A taxa de crescimento do estoque de capital no estado estacionário está
resumida na Equação (42). A taxa do progresso técnico foi obtida como resíduo, num
exercício de decomposição do crescimento, com SK igual a 0,5 e as séries
anteriormente comentadas. Substituindo (42) na Equação (41), obtém-se o valor da
relação produto/ capital efetiva no estado estacionário (vss), como mostra (43).
v ss =
A& + N& +δ
⋅p
s⋅u
(43)
A comparação das séries de v e vss, mostra, que realmente o Brasil está num
momento de transição, o que justifica a queda em v. Além disso, os autores estimaram
uma equação para essa trajetória de ajustamento que mostrou, que esse movimento é
bem lento.
76
O paper direciona-se, em seguida, à exercícios de decomposição do
crescimento do PIB. O primeiro modelo usado é um modelo do tipo Y=AK, cuja FP
está descrita na Equação (44).
1−α
~
Y = (u ⋅ K )α ⋅ A
⋅h ⋅ L
(
)
(44)
Y, K, L, u e α representam as variáveis usuais ao passo que à representa o
progresso tecnológico exógeno e h é a habilidade ou qualificação contida no fator
trabalho. Supõe-se que a habilidade do trabalho é dada pela quantidade produzida, ou
seja, ela é proporcional à relação capital/ trabalho efetiva.
K
h = u ⋅ 
L
(45)
Substituindo (45) em (44), a FP simplifica-se para a Equação (46), onde v não
é a relação produto/ capital efetiva, mas sim uma transformação de Ã, (v=Ã1-α).
Y = v ⋅u ⋅ K
(46)
Essa equação é decomposta aditivamente em termos de taxas de crescimento,
como mostra (47), para se proceder com o exercício.
Y& = v& + u& + K&
(47)
O segundo modelo teórico usado para se decompor o produto é o modelo de
Solow, que parte da seguinte FP.
Y = (u ⋅ K )α ⋅ ( A⋅ L )1−α
(48)
Multiplicando-se e dividindo-se essa FP por (AL)α, obtém-se a Equação (49).
 u ⋅ K 
Y = 

A
⋅
L



α
1−α  1−α


⋅ A⋅ L
77
(49)
Chamando o termo entre colchetes de (1/v), que é apenas uma função da razão
capital/ trabalho efetiva e assumindo α igual a 0,5; a expressão acima simplifica-se
para a Equação (50)a, ou em termos de taxas de crescimento, na Equação (50)b.
1
Y =   ⋅ A⋅ L
v
(a)
(50)
 1&  & &
&
Y =   + A + L
v
(b)
Essa última equação mostra que fora do estado estacionário, o capital
deepening também explica o crescimento do PIB, juntamente com as usuais taxas de
progresso técnico e crescimento da população.
3.3.3. Conclusões e Reflexões
O artigo oferece várias conclusões, implicações e desdobramentos de sua
análise. Aqui serão comentados apenas aqueles pertinentes ao tema dessa dissertação.
Em primeiro lugar, a Tabela 13, traz os resultados do exercício de decomposição do
crescimento, no enfoque do modelo de Solow, feito no artigo, de acordo com a
Equação (50)b.
Tabela 13 – Decomposição do produto - modelo de Solow (apud Pessoa et Ali, 2003)
1942-52
1952-65
1965-74
1974-84
1984-93
1993-02
Y'
0,069
0,064
0,095
0,039
0,025
0,027
(1/v)'
0,011
0,008
0,002
0,026
0,008
-0,001
L'
0,021
0,024
0,034
0,031
0,025
0,016
A'
0,035
0,031
0,057
-0,017
-0,008
0,012
A'/Y'
51,1%
47,9%
59,6%
-43,5%
-32,0%
43,1%
Dois fatos chamam atenção por si só e também por estarem em concordância
com os resultados mostrado na Tabela 10. O primeiro deles diz respeito à contribuição
da PTF para o crescimento. Assim como no exercício da seção anterior, a PTF
78
contribuiu fortemente para o crescimento até meados da década de 1970, atuando no
sentido oposto, nos 20 anos seguintes, aproximadamente, para depois apresentar uma
leve recuperação no período mais recente.
Além disso, vimos que o capital deepening foi uma variável relevante para
explicar o crescimento durante todos os períodos com exceção do último. Porém, sua
contribuição mais primaz, assim como no outro exercício, foi em meados da década
de 1970 e início dos 80, coincidindo em grande parte com o período do II PND.
Os resultados acima, apesar de relevantes, não são o ponto central da
conclusão do artigo. A contribuição mais relevante, sem dúvida, é a explicação
tentativa que os autores oferecem para a queda das taxas de crescimento do PIB desde
meados da década de 1980 e que se prolonga até hoje.
Grosso modo, eles postulam que a contrapartida de uma relação produto/
capital efetiva (v) cadente foi o aumento do preço relativo do investimento. A
acumulação e aceleração dessa dinâmica teriam resultado na queda das taxas de
acumulação de capital, que por sua vez redundaram na queda das taxas de
crescimento do PIB.
A origem da queda de v estaria no modelo brasileiro de desenvolvimento, a
ISI (Industrialização por Substituição de Importações), caracterizada como um
modelo de economia orientada internamente e que gerava ineficiências, por proteger
os produtores locais. Essas características se acentuaram ao longo do tempo,
principalmente no governo militar e depois dos choques do petróleo. Tudo isso, na
visão dos dois autores, também levou a uma diminuição progressiva da taxa de
progresso técnico, a PTF, que em última instância se tornou negativa por duas
décadas.
79
Bacha & Bonelli (2004) afirma ainda que o II PND foi o paroxismo de todo
esse processo, levando ao entupimento dos mecanismos de transmissão do
crescimento econômico. O crescimento verificado no período 1974-84, ainda que
relativamente elevado, logrou-se as custas de um aumento na relação capital/ produto,
financiada por endividamento externo e aumento da força de trabalho empregada.
Em resumo, os autores acreditam, que uma resposta mais sensata aos choques
econômicos de 1970, teria evitado que a dinâmica descrita acima desaguasse no
tombo experimentado pela acumulação de capital.
Essa conclusão tentativa, apesar de fundamentada em dados empíricos e gozar
de certa lógica e plausibilidade, não passa por certas contraprovas empíricas, pelo
confronto com outros diagnósticos do período, consagrados na literatura, e pela
experiência vivida em outros países semelhantes. De forma alguma, os argumentos
arrolados em seguida são motivos para se abandonar tal explicação, muito pelo
contrário, esforços devem ser feitos para torná-la mais geral e compatível com os mais
diversos aspectos da realidade empírica.
Os autores, como dito acima, postulam que a queda em v, ou igualmente o
aumento da relação capital/ produto, tem relação com a natureza do modelo de ISI
seguido pelo Brasil. A ISI, com certeza, atuou para reduzir v (ou aumentar a relação
K/Y), porém, isso não é uma exclusividade do modelo específico do Brasil, tampouco
é por si só um fato ruim. O aumento da intensidade do capital é uma característica
estrutural dos processos de industrialização, como o brasileiro, que partem das
indústrias leves de bens de consumo até a implantação do setor produtor de bens
intermediários e bens de produção. Note que não há nada a priori ou automático, que
ligue a natureza do progresso técnico à relação K/Y. Ademais, como o próprio artigo
80
mostra, a perspectiva internacional e uma dinâmica de transição no modelo de Solow,
e não só a ISI, também explicam a queda em v.
Atack et ali (2003), usando dados ao nível da firma para a indústria
manufatureira dos EUA, obteve um aumento real de 70% na relação capital/ produto
entre 1850 e 1880. Caselli & Tenreyro (2005), analisando o processo de convergência
entre os países da União Européia, mostra que o aumento da PTF e da relação capital/
produto são os dois principais fatores, que explicam, no referencial do modelo de
Solow, a convergência entre os países mais atrasados e a França, país escolhido como
referência. De fato, quase 50% da redução do hiato de Espanha e Portugal em relação
à França se deve ao capital deepening.
O outro elo do argumento exposto acima, de que o aumento do preço relativo
do investimento (p) é um entrave ao crescimento, é indubitavelmente uma questão
enigmática da economia brasileira. Entretanto, o enigma acerca dessa questão é muito
maior. Vários autores já se debruçaram sobre ela, sem que obtivéssemos até hoje
alguma explicação confortável. E pior, não há consenso sequer sobre se o preço
relativo do investimento está subindo de fato e sobre o seu poder de afetar o
investimento.
Frischtak & Cavalcanti (2005) mostra que o preço dos bens de capital em
relação aos preços industriais médios apresenta uma tendência de queda, que se
reforçou a partir da década de 1990. Por outro lado, Souza (2004) mostra que o preço
relativo do investimento, medido pelos deflatores das CN, está subindo devido ao
aumento do preço dos bens da construção civil, uma vez que o preço de máquinas e
equipamentos vem caindo, ainda que em ritmo menor do que no resto do mundo.
Quanto ao efeito do preço relativo do investimento sobre o mesmo, também
não há consenso. A literatura empírica, aplicada ao caso brasileiro, oferece resultados
81
que substanciam os dois argumentos extremos. Frischtak & Cavalcanti (2003) traz
resultados, onde o preço real de máquinas e equipamentos: domésticos e importados
explicam, junto com outros fatores, a taxa de investimento em máquinas e
equipamentos, tanto domésticos quanto importados. Lélis (2005), ao contrário, não
aceita, aos níveis de significância usuais, a hipótese nula de que os coeficientes das
variáveis de preço do investimento sejam diferentes de zero, num modelo onde a
variável dependente é a Formação Bruta de Capital Fixo em máquinas e
equipamentos.
Tampouco, é correto atribuir ao II PND e sua estratégia de aprofundar a
industrialização brasileira, o golpe final que teria travado o crescimento brasileiro. A
Tabela 14, mostra a variação da relação capital/ produto e do preço relativo do
investimento para a Coréia, obtido na PWT e em Pessôa et ali (2003). A periodização
é feita de acordo com os planos qüinqüenais de desenvolvimento coreano.
Tabela 14 – Relação K/Y sobe mais fortemente na época do 4º Plano (1977-81)
Taxa de Crescimento Acumulada no Período
Relação K/Y
Preço Relat do Investimento
1962-66 1º Plano
-9,82%
-13,09%
1967-71 2º Plano
9,40%
7,66%
1972-76 3º Plano
6,02%
-8,03%
1977-81 4º Plano
38,15%
2,46%
1982-86 5º Plano
2,80%
9,47%
1953-00
157,98%
-12,99%
Fonte: (Heston et Ali, 2002), (Pessôa et Ali, 2003)
Fica claro que a relação capital/ produto subiu ao longo do processo de
industrialização coreano e que o preço relativo do investimento não subiu
concomitantemente, de fato, ele até caiu no mesmo período. Isso levanta dúvidas à
explicação, sem descartá-la totalmente, que postula uma relação entre o aumento em
K/Y (ou queda em v) e o aumento do preço relativo do investimento no Brasil.
Mais intrigante ainda é verificar que o maior aumento da relação capital/
produto ocorreu justamente durante o quarto plano que foi empreendido quase que
82
simultaneamente ao II PND e cuja prioridade, entre outras, foi a promoção da
indústria química e pesada, como mostram a Figura
18 e as passagens abaixo,
extraídas da íntegra do plano coreano.
“Enquanto que o crescimento passado da Coréia foi liderado por uma rápida
expansão das exportações intensivas em trabalho, no futuro, a ênfase deve ser
direcionada às indústrias intensivas em trabalho qualificado, para manter o
crescimento contínuo… Como resultado dessa mudança de foco, a proporção
das indústrias química e pesada na manufatura total irá aumentar de 42% para
50%.” [Korea, 1976, p. 11].
“Ênfase será colocada nas indústrias intensivas em trabalho qualificado como
máquinas, eletrônicos e construção naval durante o período do plano. Indústrias
capital intensivas como ferro e aço, metais não-ferrosos e petroquímicas serão
estabelecidas em escala grande suficiente para garantir competitividade
internacional.” [Korea, 1976, p. 42].
Brasil
X
X
Setores
Coréia
Bens de Capital
X
Cimento
X
Construção Naval
X
Defensivos agrícolas
X
Eletrônica de Base
X
X
Fertilizantes
X
X
Mat. Prima p/ Fármacos
X
Metais Não-ferrosos
X
X
Novas Fontes de Energia
X
X
Petroquímica
X
X
Papel e Celulose
X
X
Siderurgia
X
X
Têxtil
X
Vidros Planos
X
Fonte: II PND, 3º e 4ºPlano. Elaboração do autor
Figura 18 – Brasil e Coréia priorizaram o desenvolvimento das mesmas indústrias no período do
II PND
O endividamento externo também não é o fator que diferencia a
industrialização brasileira e coreana do período e que, portanto, seria um candidato
83
para explicar o porque do aumento do preço do investimento no Brasil. O volume de
empréstimos externos coreanos saltou de US$ 2 bilhões em 1970 para US$ 20 Bilhões
em 1979 (Chun, 2002). Para o mesmo período, a dívida externa bruta brasileira se
elevou de US$ 5,3 Bilhões para US$ 49,9 Bilhões. Como mostram os dados, Brasil e
Coréia se endividaram no exterior para avançar na industrialização nesse período.
Há ainda muitas nuances entre a experiência coreana e brasileira, que não são
exploradas aqui. Acredita-se que os pontos descritos acima tenham ajudado a ilustrar
que a experiência histórica brasileira é muito singular e complexa e que a explicação
tentativa fornecida pelos autores não dá conta de explicar por completo todos os fatos
macroeconômicos do período.
Por último, o artigo ainda traz as estimativas para o crescimento potencial do
PIB brasileiro num futuro próximo. De acordo com o modelo AK, a taxa de
crescimento potencial do estoque de capital é 2,1%. Já o modelo de Solow fornece
uma taxa de crescimento do PIB no estado estacionário de 4,3%. Como o estoque de
capital cresce a uma taxa menor do que a dada pelo modelo de Solow, no curto prazo
a taxa de crescimento potencial será uma média dessas duas que pode ser calculada a
partir da Equação (48), o que fornece uma taxa de crescimento potencial de 3,2%.
A Tabela 15 traz uma comparação resumida das principais características dos
exercícios de contabilidade do crescimento e produto potencial feitos nessa seção e
nas duas anteriores
Tabela 15 – Quadro resumo dos exercícios do capítulo 3
84
Método
Silva Filho (2001)
Seção 3.1
F.P. Cobb-Douglas
α
1-α
Yt = At. K t-1. L t
Pessôa et ali (2004)
Bacha & Bonelli (2004)
Seção 3.2
Seção 3.3
F.P. Cobb-Douglas, PTF
Y = AK e modelo
é Harrod neutra
Solow-Swan
Período
1980-2003
1950-2000
1940-2002
Dados
SCN, PNAD e FGV
PWT e IBGE para PEA
empregada
SCN e FGV
Somente em L
Em L e K com ajuste
parcial pelo NUCI/FGV
Correção para Em ambos os fatores (K e
Utilização
L)
Participação
do K na renda
0,49
0,60
0,50
Estoque de K
e K inicial
Método do Inventário
Perpétuo (PIM)
PIM e Morandi & Reis
(2004)
Média geométrica de
Morandi & Reis (2004)
Taxa de
depreciação
5%
3,50%
variável entre 3,5% e 4%
3.4.
O Papel da Aplicação desses Modelos ao Caso Brasileiro
Uma vez feita essa resenha ampliada da literatura empírica brasileira acerca do
produto potencial da economia, a pergunta que se coloca é sobre que papel, que
crédito se pode dar a tais medidas na formulação da política monetária. Ou seja, há
restrições específicas ao caso brasileiro no uso do hiato do produto como insumo para
a definição da política monetária?
Para se responder a tal pergunta, deve-se levar em conta que todos os modelos
apresentados nesse capítulo, utilizam-se da trajetória passada da economia para
construir o potencial futuro de crescimento. Isto é, eles partem da hipótese de que se
pode inferir o comportamento futuro da economia brasileira, a partir do seu
desempenho pregresso.
Tal hipótese não seria um grande problema se esse passado da economia,
notadamente as décadas de 1980 e 1990, fossem informativas sobre o comportamento
da economia no momento atual. Grosso modo, todos esses modelos seriam mais
85
relevantes e úteis, se os ciclos da economia na década de 1980 e 1990 tivessem sido
ditados por descompassos entre oferta e demanda.
Porém, como se sabe, as quedas do nível de atividade nessas duas décadas, em
raros momentos, foram reflexos de apertos monetários decorrentes de um
superaquecimento da demanda, e mesmo nos momentos, onde o desbalanço entre
oferta e demanda poderia gerar pressões inflacionárias, esse fator não foi o único
determinante da reversão do momento de crescimento econômico.
Por exemplo, na primeira metade da década de 1980, a recessão foi causada
pelo ambiente externo, caracterizado pela elevação dos juros americanos, que
determinou um ajuste externo forçado na economia brasileira. Já no período PósPlano Cruzado, realmente se vivenciou um momento de aquecimento da demanda.
Contudo, esse não foi o único fator a gerar inflação. Muitos setores, que foram pegos
no contrapé pelo congelamento, reduziram a quantidade ofertada, uma vez que ao
preço tabelado sua atividade não era lucrativa. Isso foi especialmente importante no
caso dos produtores agrícolas, onde a diferença entre os preços na safra e entressafra é
significativa e naquela época o era em proporções maiores do que atualmente.
Portanto, a inflação Pós-Cruzado não pode ser atribuída exclusivamente ao excesso de
demanda.
Depois do Plano Cruzado, a inflação assumiu uma dinâmica própria
aceleracionista e o país passou a flertar com a hiperinflação. Os ciclos da atividade
econômica passaram a ser ditado pelas tentativas de controle da inflação. Assim, num
primeiro momento logo após o plano havia uma euforia de consumo, devido a fugaz
estabilidade de preços. A aceleração da inflação, em seguida, trazia mecanismo
recessivos como a erosão dos salários, além dos demais efeitos deletérios da alta
inflação, que em conjunto determinavam o arrefecimento econômico.
86
O Plano Collor e o período no qual o ex-ministro Marcílio Marques Moreira
esteve a frente do Ministério da Fazenda, tampouco pode ter a sua recessão associada
com descompassos entre oferta e demanda. No primeiro, a recessão, que já vinha do
governo anterior, foi causada por um aperto na liquidez promovido para combater a
inflação e no segundo, o baixo crescimento do PIB foi ocasionado pelas altas taxas de
juros utilizadas para quebrar a dinâmica de superindexação da economia brasileira.
O período que coincide com o início do primeiro mandato do Presidente
Fernando Henrique foi o segundo e último momento, durante as décadas de 1980 e
1990, onde se verificou um forte aumento da demanda, que poderia gerar pressões
inflacionárias. De fato, o governo tomou algumas medidas para restringir o crédito,
porém, o aumento dos juros decretado não foi única e exclusivamente para deter o
consumo, mas também e primordialmente para defender a paridade da taxa de
câmbio, posta em dúvida pela crise mexicana.
Todos os ciclos posteriores de alta dos juros e de “stop and go” da economia
brasileira, até a eleição presidencial de 2002, foram motivados não por um excesso de
demanda, mas por mecanismos de defesa da paridade da taxa de câmbio (até 1999),
por problemas setoriais de restrição de oferta (crise energética), entre outros motivos.
Um dos resultados obtidos e também dos mais utilizados e mencionados dessa
metodologia é o pífio desempenho ex-post da produtividade, verificado nas décadas
de 1980 e 1990. Porém, se a produtividade é dada pelas máquinas e processos
utilizados na fabricação, não há motivos para se supor, a não ser por uma realocação
setorial de fatores ou por uma não-utilização das máquinas, que a produtividade ex-
ante apresente quedas da magnitude, que são encontradas nos exercícios feitos nos
três artigos resenhados. Portanto, fica difícil negar a existência de um componente
pró-cíclico nessa medida de produtividade.
87
A razão por trás disso está no fato de se fazer uma leitura (contabilização) ex-
post pelo lado da oferta da trajetória efetiva da economia, quando essa na verdade se
deu pela interação de elementos da oferta e da demanda. Dessa maneira, no caso
brasileiro, o papel explicativo dado á crise da dívida, á quase hiperinflação quase
somem e argumentos pelo lado da oferta, como um choque tecnológico negativo,
ganham ampliada relevância.
Essa baixa taxa de crescimento da PTF é depois apontada, numa
pseudocausalidade, pois, há uma inversão de sentido da causação, como a principal
responsável pela baixa taxa de crescimento do potencial. A inversão ocorre, pois, para
se obter a PTF são necessários dados de produto, capital e trabalho e depois a mesma
PTF vira um determinante junto com o capital e o trabalho do produto potencial.
Em resumo, o uso desses métodos tem que ser relativizado, pois, a última vez
em que os limites do crescimento pelo lado da oferta foram testados na prática, o que
logicamente permitiria usá-los como um bom guia para o futuro, foi na década de
1970. A famigerada taxa de crescimento do PIB Potencial de 3% a 3,5%; é, portanto,
a taxa que a economia brasileira pode se expandir se o cenário futuro for de uma mera
repetição dos problemas enfrentados no passado. Caso se acredite, que muitos desses
problemas já foram resolvidos ou se encontram, ao menos de certa forma,
encaminhados a perspectiva é de um cenário qualitativamente distinto e mais
promissor. Logo, há razões para se supor que em tal cenário, uma taxa de crescimento
do PIB potencial de 3% estaria subestimando o real potencial da economia.
Outro ponto intrigante notado nos cálculos de produto potencial, tanto nas
seções desse capítulo como nos cálculos a serem apresentados no próximo capítulo, é
o fato de que o produto potencial, após 1980, ficou sistematicamente acima do efetivo
e nenhum mecanismo de correção da própria economia atuou para diminuir esse hiato.
88
Intuitivamente, isso corresponde a dizer que os ofertantes erraram suas previsões
quanto a demanda esperada nos momento anteriores e mesmo assim não incorporaram
esses erros na hora de planejar a oferta no momento atual. Tal fato contradiz
pressupostos da teoria neoclássica como a racionalidade substantiva dos agentes e
qualquer forma de expectativa embutida nos agentes, seja ela racional ou adaptativa.
4. Modelos Avançados de Produto Potencial
Esse capítulo apresenta dois novos métodos, baseados em Hulten (1973) e
Giorno et ali (1995), para se fazer a contabilidade do crescimento e o cálculo do
produto potencial. A intenção é modificar os cálculos apresentados no capítulo
anterior, incorporando algumas críticas existentes na literatura sobre o tema,
avançando, assim, na direção de se obter cálculos mais condizentes com a realidade. É
nesse sentido, que os modelos podem ser chamados de avançados.
Na primeira seção, apresenta-se um exercício de contabilidade do crescimento,
no qual se contabiliza a importância total da mudança tecnológica para o crescimento
do produto, através da definição de uma taxa de progresso técnico de longo prazo de
Fischer. Também nessa seção, é apresentada uma nova forma de calcular a PTF
potencial: a chamada PTF Vintage.
Na segunda seção, explora-se uma segunda alternativa para o cálculo do
produto potencial, dessa vez utilizando-se dos conceitos de estoque de capital e de
trabalho vintage.
4.1.
Taxa de Progresso Técnico de Fischer e PTF Vintage
O objetivo dessa seção era apresentar para a mesma base de dados com o
período de tempo mais longo possível um exercício, onde a contabilidade do
89
crescimento fosse feita, permitindo-se a reprodutibilidade do capital, garantindo,
assim, uma decomposição correta do crescimento entre mudança tecnológica e
acumulação de capital. Em seguida, o PIB potencial seria calculado, utilizando-se um
novo conceito de PTF, que descarta tratamentos puramente estatísticos.
Devido à falta de séries longas para alguns dados necessários e a problemas
econométricos, essa intenção teve que ser abandonada. Assim, optou-se por apresentar
esses dois novos métodos com diferentes bases de dados, como ver-se-á nas duas
subseções seguintes.
4.1.1. Contabilidade do Crescimento e a Reprodutibilidade do Capital
Os exercícios de contabilidade do crescimento mais simples, como aquele
feito na Seção 3.1, tendem a superestimar a real contribuição do fator capital para o
crescimento do PIB. Isso acontece porque eles tratam o crescimento do estoque de
capital como algo exógeno, tornando, portanto, estático o modelo, uma vez que o
crescimento da PTF ou de outro fator qualquer, não gera um efeito de realimentação
na FP.
Na Seção 3.2, apresentou-se um modelo ligeiramente modificado, contudo
ainda de caráter estático. Nele, o progresso técnico era do tipo Harrod neutro, pois, a
relação capital/ produto era mantida constante. Assim, aumentos no estoque de
capital, que são induzidos pelo aumento da PTF, uma vez que o estoque de capital
aumenta para manter a relação K/Y constante, foram contabilizados como
contribuição da PTF.
Note que no exercício da Seção 3.2 e no exercício a ser desenvolvido nessa
seção, uma maior (ou menor) contribuição do estoque de capital para o crescimento
do produto, não implica, que o estoque de capital medido também tenha sido menor
90
ou maior. O crescimento do estoque de capital é o mesmo em todos os exercícios. A
diferença entre os exercícios de contabilidade do crescimento feitos nessa dissertação
é a concepção teórica acerca da origem dessa adição ao estoque de capital, que faz
com que parte da contribuição tradicionalmente atribuída ao capital, seja então
atribuída ao progresso técnico. Em suma, deve-se tomar cuidado para não confundir o
crescimento do estoque de um fator com a contribuição desse mesmo fator para o
crescimento do produto.
Nessa seção, apresentar-se-á então, uma forma de captar o efeito dinâmico de
causação entre progresso técnico e acumulação de capital, permitindo no modelo a
reprodutibilidade do capital. Ou seja, nesse modelo, onde o capital é insumo e produto
ao mesmo tempo, o aumento do estoque de capital não ocorre apenas por uma
decisão exógena como nos modelos estáticos. Nesse modelo, um aumento da
produtividade, aumenta o produto, ou seja, o estoque de capital, que por sua vez
aumenta o produto novamente e assim sucessivamente até que novas adições de
capital se igualem ao montante da depreciação e a economia repouse em um novo
equilíbrio.
Suponha que o progresso técnico faça a função de produção se deslocar para
cima num movimento único e permanente, acarretando um aumento do produto
potencial dessa economia, devido a maior produtividade da mesma. Nessa mesma
economia, suposta fechada e sem governo, esse aumento do produto será distribuído
entre consumo e poupança (ou investimento), sendo a parcela e o tamanho de cada um
dado pela PMgC (Propensão Marginal a Consumir) e pelo multiplicador. Esse
aumento do investimento acarreta uma ampliação correspondente do estoque de
capital e, portanto, não deve ser contabilizado sob o fator capital e sim na parcela da
PTF. Aumentos no estoque de capital, ocasionados por uma mudança na PMgC, é que
91
devem ser contabilizados sob o fator capital, nos exercícios de contabilidade do
crescimento. Dessa forma, mede-se, portanto, o progresso tecnológico ao longo da
trajetória de equilíbrio de longo prazo.
A explicação dada acima fica mais clara, recorrendo-se à ilustração da Figura
19. Nela, a fronteira de produção é representada pelas linhas côncavas (de cor azul) e
no eixo horizontal e vertical mede-se respectivamente o capital por trabalhador e o
produto por trabalhador.
B
V1/L0
Produto/ Trabalhador
C
V0/L0
A
D
E
K0/L0
K1/L0
Capital/ Trabalhador
Figura 19 - Trajetória de crescimento equilibrado de longo prazo
O aumento da produtividade se traduz num deslocamento para cima da
fronteira de produção e o ponto de equilíbrio da economia move-se de A para B. O
aumento total do produto é dado pelo segmento BD. Num exercício ordinário de
decomposição, o crescimento da economia (BD) poderia ser decomposto em uma
92
parcela decorrente da acumulação de capital, o segmento CD, e uma outra decorrente
do progresso técnico, representada pelo segmento BC.
Na decomposição do crescimento proposta nesse exercício, todo o crescimento
do produto acima, representado pelo segmento BD, é contabilizado como sendo
decorrente do progresso técnico. A taxa de progresso técnico, chamada em Hulten
(1975), de taxa de longo prazo de Fischer é dada pela razão BE/ DE, medindo assim
corretamente a importância total do progresso técnico no crescimento. Já a taxa do
progresso técnico de Hicks é dada pela razão BE/ CE.
Os segmentos BC e CD, apesar de representarem o efeito total do progresso
técnico, possuem origens distintas. Eles representam respectivamente o efeito puro da
PTF e o efeito da acumulação de capital induzida pela PTF.
A Figura 19 expressa uma situação extrema, onde toda a acumulação de
capital foi induzida pelo progresso técnico, devido a propósitos exclusivamente
didáticos. Esse método, porém, não exclui a possibilidade do estoque de capital se
ampliar por outras razões, sendo essa parcela conseqüentemente atribuída ao fator
capital como sua contribuição ao crescimento do produto.
Uma vez feito esse aparte teórico, pode-se passar ao exercício de contabilidade
do crescimento, propriamente dito. Como o intuito é aplicar um cálculo totalmente
novo ao caso brasileiro, buscaram-se as séries de dados mais longas possíveis. O
exercício abrange então, o período de 1940 até 2003. Os dados de estoque de capital
foram extraídos de Morandi & Reis (2004) e os dados de utilização da capacidade,
para o período anterior ao início da pesquisa da FGV, foram obtidos em Bacha &
Bonelli (2004). Os dados de PIB, população e emprego são do IBGE42. Além disso,
42
Como os dados de emprego entre 1940 e 1970, só estão disponíveis para os anos de censo, fez-se
uma interpolação linear similar à aplicada em Bacha & Bonelli (2004), utilizando-se, porém, a
elasticidade produto-emprego.
93
supõe-se que a parcela do capital na renda é igual a 0,5 e a elasticidade de substituição
entre os fatores é 1.
A metodologia por trás da correção proposta foi explicada e mostrada
graficamente acima, contudo, a operacionalização da mesma, através do método
gráfico, não é facilmente implementável. Para fazer isso, tem que se recorrer a
algumas equações.
Como foi dito anteriormente, a taxa de progresso técnico de longo prazo de
Fischer é aquela obtida a partir de um plano de consumo ótimo. Logo, a derivação
dessa correção deve partir de uma função de utilidade como a descrita em (51), onde c
é o consumo per capita e a é um fator de desconto subjetivo.43
U=
∞ t
∑ a ⋅u
t =0
(ct )
(51)
A dotação inicial de fatores é dada por K0 unidades do bem, pois, capital (K) é
insumo e produto, e L0 unidades de serviço do trabalho. L cresce exogenamente por
um fator constante e positivo: n.
Lt +1 = n ⋅ Lt
(52)
A tecnologia é de retornos constantes e pode ser resumida na Equação (53).
K t +1 = F (K t −C t , Lt )
(53)
Ou seja, a dotação no período t+1 é função da dotação não consumida do
período anterior e do insumo trabalho no período anterior. Expressando (53) em
termos per capita, isto é, dividindo tudo por Lt, obtém-se a Equação (54). 44
0 ≤ a ≤ 1; u′ ≥ 0; u′′ ≤ 0, ∀ ct ≥ 0
1
1
44
A função f tem as seguintes propriedades: f ′ ≥ , f ′′ ≤ 0, f (0 ) = 0, f ′(0 ) = ∞, f ′(∞ ) =
n
n
43
Propriedades da Equação (51):
94
 K t C t Lt 
k t +1 = f (k t −ct ) = f  − ,  =
 Lt Lt Lt 


f  K t − C t ,1
 Lt Lt 
Manipulando a Equação (52), pode-se expressar Lt como
(54)
Lt +1 n
e modificar
assim a equação acima.
 K t C t Lt +1  1
−
,
 = f (k t − ct ,1)
k t +1 = f (k t −ct ) = f 
n
L
L
 t +1 t +1
 n
(55)
O programa de consumo ótimo é, então, a solução do problema de otimização
condicionada, descrito em (56).
max U = ∑ at ⋅u (ct )s.a.k t +1 = f (k t − ct )
(56)
A condição necessária para o extremo é que a derivada da equação de
Lagrange seja igual a 0, isto é, que as taxas marginais de substituição na produção e
no consumo devem ser iguais, como exposto em (57).
u ′(ct )
= f ′(k t − ct )
a⋅u ′(ct +1)
(57)
Dada as propriedades de u e de f, a condição necessária é também suficiente.
Os valores que solucionam (57) são os valores estacionários de kt e ct, ou seja, aqueles
em que
k t +1 = k t
e
ct +1 = ct . Logo, a Equação (55) pode ser reescrita como:
(
k = f k −c
)
(58)
E como os valores que satisfazem (57) são os valores estacionários, decorre
que u ′(ct ) = u ′(ct +1) . Então, a condição necessária e suficiente simplifica para (59).
1
= f ′ k −c
a
(
)
(59)
Introduzindo a hipótese de mudança técnica, a tecnologia é descrita por uma
variação da Equação (53).
95
i
K t +1 = F (K t −C t , Lt )i = 0,1,2K
(60)
Se Fi satisfaz o problema de otimização, então para cada Fi há uma ordenada
[k , c ], representando um ótimo estacionário descrito por (58) e (59). A mudança de
i
i
Fi para Fi+1 causa uma mudança no produto de equilíbrio de longo prazo de
k
. Como essa mudança é resultado apenas da mudança técnica, a razão
k
k
i +1
i
para
i +1
k
i
representa a taxa de progresso técnico de longo prazo de Fischer.
Visto de outra maneira, k (t ) é a trajetória do produto de equilíbrio ótimo de
longo prazo e sua derivada no tempo é também a taxa de progresso técnico de longo
prazo de Fischer. Para fazer essa derivada, deve-se escrever o modelo numa forma
contínua, onde a tecnologia é dada por (61).
K (t ) = F (I (t ), L(t ),t )
I (t ) = K (t )− C (t )
(61)
Fazendo a diferencial total da equação acima, escrita em termos per capita,
obtém-se.
Dk ∂F K Di ∂F
=
⋅ ⋅ +
∂K F i
∂t
k
(62)
Adicionando-se a hipótese de mercados competitivos, a Equação (62)
simplifica para (63).
Dk
Di
=π ⋅ +T
i
k
(63)
Na Equação (63), П é a parcela do capital na renda e T é a taxa de progresso
técnico de Hicks. Portanto, a equação descreve a taxa de progresso técnico de longo
prazo de Fischer, sendo seu primeiro termo: o efeito da acumulação de capital
96
induzido pelo progresso técnico e o segundo termo é o efeito puro da PTF ou
progresso técnico de Hicks.45
O produto marginal de i é constante numa economia de 1 setor como mostra
(59). Diferenciando i como expresso em (61), obtém-se a Equação (64), onde R é o
viés de Hicks e σ é a elasticidade de substituição dos fatores.
σ
Di
=
⋅T + σ ⋅ R
i 1− π
(64)
Substituindo (64) em (63) e chamando Z = Dk k , tem-se que:
 σ

⋅T +σ ⋅ R  + T
Z = π ⋅
 1−π

σ ⋅π ⋅T
Z=
+ σ ⋅π ⋅ R + T
1−π
 π

Z = T ⋅ 1+
⋅σ  + σ ⋅π ⋅ R
 1−π 
(65)
Logo, fica claro que o progresso técnico é diferente no conceito de Hicks e no
conceito de Fischer, isto é, Z é diferente de T. Num modelo, onde a PTF é Hicks
neutra, R é igual a 0, simplificando a Equação (65) para a expressão (66).46
π


Z = 1+
⋅σ  ⋅T
 1−π 
(66)
Ou seja, o progresso técnico neutro de Fischer sempre será um múltiplo do
progresso técnico neutro de Hicks e haverá de ser tanto maior quanto for a
elasticidade de substituição dos fatores e a parcela do capital na renda. No caso
mostrado na Tabela 16, onde σ é igual a 1, ou seja, igual ao de uma FP Cobb-Douglas
Podemos associar os dois termos do membro direito da Equação (63) com a Figura 12. O primeiro
termo que representa a acumulação de capital induzida é equivalente ao segmento CD e o segundo
termo que representa o efeito puro da PTF equivale ao segmento BC.
46
A hipótese da neutralidade de Hicks assegura, além de uma expressão mais palatável, que a PTF
obtida seja independente da trajetória, vide Hulten (2000).
45
97
e SK é igual a 0,5; o progresso técnico de equilíbrio de longo prazo é o dobro da PTF
contabilizada pelo método tradicional. 47
Todo esse desenvolvimento algébrico, embora, necessário para a melhor
explicitação e correção do problema, não precisa ser repetido para cada exercício.
Para fazer a correção, basta utilizar a Equação (66). E para tanto, a única variável
necessária adicional é a elasticidade de substituição entre os fatores. Essa
metodologia, portanto, possui outro atrativo, além da contabilização mais fiel da PTF,
que é a sua simplicidade de cálculo.
Obviamente, essa correção também tem as suas desvantagens. A primeira é
necessitar de uma estimativa ou de uma hipótese sobre a elasticidade de substituição
dos fatores de produção.48 Além disso, para explicar como o aumento do produto se
divide entre consumo e investimento, Hulten (1975) utiliza-se do conceito de PMgC e
de um mecanismo muito similar ao multiplicador de gastos keynesiano. Esses, por sua
vez, estão ligados a uma teoria e a um sentido de causação dos fenômenos
econômicos, que não são perfeitamente compatíveis com a abordagem utilizada, que
analisa a economia pelo lado da oferta.
A Tabela 16, traz os resultados comparados da metodologia tradicional de
contabilidade do crescimento, onde o progresso técnico é do tipo Hicks neutro, com a
contabilidade do crescimento, na qual o progresso técnico está corrigido de acordo
com a trajetória de equilíbrio de longo prazo do produto.
Tabela 16 – A correção de LP aumenta a importância da PTF em detrimento de K
47
Mantendo-se π constante e igual a 0,5 e diminuindo σ para 0,7; o progresso técnico de Fischer se
reduz a 1,7 vezes o progresso técnico de Hicks.
48
Na verdade, essa não é uma desvantagem em relação a maioria dos outros métodos que assumem
uma forma funcional para a FP, como uma Cobb-Douglas ou uma CES (Constant Elasticity of
Substitution), que implicam na adoção de um valor para a elasticidade.
98
Método Tradicional (Hicks)
Correção de LP (Fischer)
PTF
K
L
PTF
K
L
1941-50
1,70%
3,17%
0,86%
3,40%
1,47%
0,86%
29,7%
55,3%
15,1%
59,3%
25,6%
15,1%
1951-60
7,12%
1,73%
4,11%
1,28%
3,45%
2,39%
1,28%
24,2%
57,7%
18,0%
48,5%
33,5%
18,0%
1961-70
5,99%
1,66%
3,28%
1,05%
3,32%
1,62%
1,05%
27,7%
54,7%
17,6%
55,4%
27,0%
17,6%
1971-80
8,28%
1,72%
4,56%
2,00%
3,44%
2,83%
2,00%
20,8%
55,0%
24,1%
41,6%
34,2%
24,1%
1981-90
1,56%
-1,40%
1,68%
1,28%
-2,80%
3,08%
1,28%
-89,6%
107,5%
82,2%
-179,3%
197,1%
82,2%
1991-00
2,61%
0,41%
1,36%
0,85%
0,82%
0,95%
0,85%
15,7%
51,9%
32,4%
31,4%
36,2%
32,4%
2001-03
1,26%
-0,11%
0,96%
0,41%
-0,21%
1,07%
0,41%
-8,5%
76,2%
32,3%
-17,0%
84,8%
32,3%
a
Os números em vermelho, na segunda linha de cada subperíodo, indicam a contribuição
de cada fator para o crescimento .
Y
5,73%
Como explicitado, parágrafos acima, a PTF na sexta coluna da Tabela 16 é o
dobro daquela obtida sob o método tradicional e descrita na coluna 3.
Conseqüentemente, o ritmo de acumulação autônoma de capital é reduzido pela
metade. Como que as mudanças proporcionadas por essa correção influem na
interpretação histórica do desenvolvimento brasileiro?
Em primeiro lugar, o fato que mais chama atenção é o desempenho
excepcional da PTF, nos anos de 1941 até 1980, explicando sempre entre 40% e 60%
do crescimento do PIB. Ou seja, o modelo de desenvolvimento adotado no período, a
ISI, foi bem sucedido em ampliar a produtividade da economia como um todo e gerar
assim um crescimento sustentável de longo prazo.
Outro importante desdobramento da correção feita é o aprofundamento da
visão, de que realmente, a década de 1980 foi perdida, não somente em termos de
crescimento do produto, mas também e majoritariamente em função da forte queda da
produtividade.
Por último, é interessante notar que a taxa de crescimento do estoque de K na
década de 1980 é a mais alta de todas, o que é certamente contra-intuitivo, à luz da
99
história econômica brasileira. Porém, muito mais do que apontar para um fato
desconhecido ou desapercebido do desenvolvimento brasileiro, o dado mencionado é
um efeito colateral (indesejado) da correção.
Da mesma maneira, que a correção magnifica os efeitos positivos da PTF e
conseqüentemente diminui o crescimento autônomo do K, o efeito inverso também
ocorre. Ou seja, uma queda da PTF induz uma desacumulação de K. Porém, tal
movimento encontra limites no mundo real, como a taxa de depreciação do capital,
que depende da tecnologia e da intensidade de uso do mesmo e também limites de
mercado para se tornar líquido o capital imobilizado em máquinas. Entretanto, como o
crescimento de facto do estoque de K está dado e como a queda da PTF induz uma
desacumulação, o resultado dessa equação é um aumento da acumulação voluntária,
ainda que não planejada, do estoque de capital.
4.1.2. O Conceito da PTF Vintage
Essa subseção apresenta uma forma diferente de se extrair a PTF potencial,
aquela que entra no cálculo do produto potencial. Nos exercícios mostrados até aqui,
essa série foi obtida através do uso de filtros estatísticos. Agora, porém, ela será
estimada econometricamente a partir da série da PTF efetiva (ou resíduo de Solow) e
de outras variáveis explicativas.
Essa PTF, chamada de PTF Vintage, embute uma noção híbrida do progresso
técnico. Por um lado, ele é suposto exógeno e, portanto, a PTF incorpora uma
tendência linear. Por outro lado, ele é visto como endógeno o que justifica a
introdução do investimento e da escolaridade como regressores, pois, esses
supostamente possuem um efeito positivo sobre a produtividade. O termo Vintage é
empregado para mostrar que as diferentes adições de trabalho e capital são distintas,
100
sendo a produtividade uma das diferenças entre elas. Assim, o investimento não só
amplia o estoque de capital, como também aumenta a eficiência dos mesmos, através
dos efeitos da tecnologia incorporados nas máquinas e equipamentos.
A principal vantagem dessa alternativa é que ela fornece um rationale teórico
para a PTF potencial, postulando uma ligação entre produtividade, educação e
investimento. Além disso, contorna-se, em parte, o problema da separação entre
capital e tecnologia ao reconhecer que o progresso técnico advém, pelo menos
parcialmente, da tecnologia incorporada nas máquinas e equipamentos.
A PTF foi estimada, então, a partir da Equação (67), onde RS é o resíduo de
Solow, INDESC é um índice que capta a evolução da escolaridade média da PEA e
INVEST é a taxa de investimento a preços constantes de 1999.49 A tendência Tt é uma
variável tal que T = 0 para t = 1976,…1980 e T = 1, 2, 3,… para t = 1981, 1982,
1983,… A Tabela 17, traz os resultados da regressão.
RS t = INVESTt + INDESCt + Tt
(67)
Tabela 17 – Especificação da PTF Vintage50
INDESC
Coef.
61,61738
Estat t
(-17,7)
* Significante a 1%
*
INVEST
1,23707
(10,2)
T
Estatísticas da Regressão
2
* -0,949466 * R
0,9219
n
28
2
R
ajust
(-6,99)
0,9157
DW
1,33
A tabela acima mostra que todos os parâmetros são estatisticamente
significantes e que além disso, obteve-se um bom ajuste da equação. Já a Figura 20,
traz no mesmo gráfico a PTF efetiva e a PTF potencial obtida pelo método acima e
pelo filtro HP. Por esse último método, a tendência da PTF obtida é muito mais suave,
podendo ela ser decomposta em dois períodos: um primeiro de queda exponencial
49
A intenção original que era mais condizente com o intuito teórico era utilizar a idade média do
estoque de capital como um dos regressores, porém, problemas econométricos impediram tal
especificação para a equação. Outras estratégias, que não a substituição da variável, implicavam na
perda da intuição teórica por trás das variáveis explicativas.
50
A regressão foi estimada empregando-se a matriz de covariância de White, minimizando assim o
problema da heterocedasticidade.
101
mais acentuada e um segundo, a partir de meados da década de 1990, onde ela cresceu
levemente de uma forma muito próxima de uma tendência linear.
105
100
95
90
85
19
76
19
77
19
78
19
79
19
80
19
81
19
82
19
83
19
84
19
85
19
86
19
87
19
88
19
89
19
90
19
91
19
92
19
93
19
94
19
95
19
96
19
97
19
98
19
99
20
00
20
01
20
02
20
03
80
PTF
PTF Vintage
PTF HP
Figura 20 – PTF Vintage é menos volátil e antecede a PTF efetiva
Já a PTF Vintage, apesar de não ser tão suave quanto a PTF HP, ainda é menos
volátil do que a PTF efetiva, o que é uma propriedade desejada de uma série de
tendência. Ademais, a PTF Vintage antecipou o movimento de inflexão da série
Bilhões de R$ de 1999
efetiva, na maior parte das mudanças verificadas acima.
1.400
1.300
1.200
1.100
1.000
900
800
700
600
Potencial (PTF HP)
Figura 21 – PIB potencial: PTF Vintage e PTF HP
102
Potencial (PTF Vintage)
2003
2002
2001
2000
1999
1998
1997
1996
1995
1994
1993
1992
1991
1990
1989
1988
1987
1986
1985
1984
1983
1982
1981
1980
1979
1978
1977
1976
500
Por último, a Figura
21 acima, mostra os efeito de se utilizar as duas
tendências distintas no cálculo do produto potencial. Em ambos, normalizou-se o
estoque de capital para 1973, assumiu-se uma NAICU de 95% e uma parcela do
capital na renda de 0,50. A NAIRU foi estabelecida em 3% para o período 1976-1990
e 6% para os anos seguintes. Fica claro que somente a introdução de uma nova forma
de se extrair a tendência da PTF não altera muito a trajetória e o crescimento do PIB
potencial. A taxa de crescimento média do produto potencial com a PTF Vintage foi
apenas 0,09 ponto percentual, maior do que no outro método.
4.2.
Um Modelo de Insumos Vintage
4.2.1. Justificativa e Metodologia
Essa seção apresenta uma outra alternativa para se obter os resultados
mostrados até agora. Aqui a contabilidade do crescimento e o produto potencial são
obtidos a partir do estoque de capital e de trabalho vintage. O termo vintage, de
origem francesa, tem a conotação de mostrar que diferentes safras, adições ao estoque
de capital e trabalho possuem características distintas, entre elas a produtividade.
É justamente devido à heterogeneidade do fator capital e do fator trabalho no
mundo real, que nesse exercício busca-se relaxar a hipótese simplificadora de que
ambos são fatores homogêneos. Por essa hipótese, o engenheiro aeronáutico e o
funcionário encarregado da limpeza do hangar, contribuem igualmente para o estoque
de trabalho, desprezando-se, portanto, os anos de educação formal e o treinamento na
empresa e a experiência adquirida na função do primeiro.
Para captar a heterogeneidade dos fatores, mesmo que parcialmente, ajustou-se
o estoque de trabalho pela escolaridade média da PEA e o estoque de capital pela
idade média do mesmo. Ou seja, a variação do estoque de capital vintage, num dado
103
ano, é o resultado da multiplicação da variação do estoque de capital original pela
variação da idade média do estoque de capital. Um aumento da idade média é uma
variação negativa e vice-versa. A variação ponta a ponta do estoque de capital, porém,
continua sendo dada pela variação ponta a ponta51 do estoque de capital original. O
mesmo procedimento é aplicado ao estoque de trabalho.
Dessa forma, o estoque de capital continua sendo medido em valores
monetários e não em alguma unidade híbrida do tipo: valores monetários x eficiência.
A razão para isso é que não se possui, por fugir do escopo dessa tese, um modelo
teórico que especifique como e quanto, as novas safras de capital atuam para
aumentar a produtividade da economia.52 Sabemos simplesmente que esse canal existe
e é relevante e por isso adotamos essa correção.
Qualquer outra correção que aumente o estoque dos fatores, além do montante
da série original, justificado pelo ajuste da heterogeneidade dos mesmos, poderia ser
acusada de inflar artificialmente os estoques dos fatores de produção e, assim, obter
por hipótese e não por decorrência lógica um produto potencial maior.
A maior desvantagem dessa opção, com certeza, se encontra na fase de
previsão do produto potencial. Pois, se anteriormente, o estoque de capital e trabalho
já estavam dados e se buscava capturar ex-post a interação entre novas adições de
capital (ou maior escolaridade, no caso do estoque de trabalho) e produtividade, agora
essa interação ainda está por ocorrer. Assim, a construção de um estoque de capital
baseado somente numa previsão estática da taxa de investimento prevista não capta
esse efeito dinâmico de interação entre novas adições e produtividade. Ainda assim,
51
Isto é, a variação observada entre o ano inicial e o ano final, nesse caso de 1976 a 2003.
A realidade descrita acima é melhor captada por modelos de capital vintage do tipo putty-clay, onde
o progresso técnico é parcialmente exógeno e parcialmente incorporado no capital.
52
104
como será visto mais adiante, a aplicação da mesma metodologia na etapa de previsão
fornece, todavia, resultados diferentes do método tradicional.
Os dados utilizados para esse exercício são basicamente os mesmos dos
exercícios anteriores com as mesmas fontes, a saber: as séries de estoque de capital,
depreciação e idade média do capital vieram de Morandi & Reis (2004). Os dados de
escolaridade foram extraídos de Barro & Lee (2000) e as séries da PEA e a população
empregada foram obtidas na PNAD/ IBGE. O estoque de capital foi ajustado pelo
NUCI da FGV e depois normalizado. A parcela do capital na renda assumida foi de
0,50; a NAICU de 95% e a NAIRU de 3% de 1976 até 1990 e 6% para os anos
seguintes. A taxa de depreciação para a fase de previsão foi fixada em 3,7% ao ano.
4.2.2. Resultados e Projeções
Uma vez explicada a metodologia e a origem dos dados, pode se passar para a
apresentação dos resultados obtidos. A Figura 22, faz uma comparação da PTF obtida
pelo método dos insumos vintage e a mesma obtida da forma tradicional.
104
100
1997
96
92
88
84
19
76
19
77
19
78
19
79
19
80
19
81
19
82
19
83
19
84
19
85
19
86
19
87
19
88
19
89
19
90
19
91
19
92
19
93
19
94
19
95
19
96
19
97
19
98
19
99
20
00
20
01
20
02
20
03
80
PTF Vintage
PTF Tradicional
Figura 22 – A PTF Vintage apresenta um resultado mais favorável a evolução da produtividade
105
Apesar das duas curvas na figura acima, apresentarem comportamento
similares em alguns momentos, podemos distinguir 3 períodos distintos, que estão
delimitados pelas linhas verticais. A PTF parte do mesmo nível em 1976, em ambos
os conceitos, numa evidente tendência declinante até 1983. Porém, essa queda é muito
mais acentuada na PTF vintage que nesse período decresce em média 2,6% ao ano
comparado com uma queda de 1,7% na PTF tradicional.
Em seguida, a partir de 1983, ambas experimentam um rápido interregno de
crescimento. Na PTF tradicional, à esse breve período segue-se uma queda acentuada,
de maneira que em 1995, o nível da PTF era ainda menor que em 1983. A PTF
vintage apesar de declinar por uns anos, o faz em ritmo muito menor do que a PTF
tradicional. Conseqüentemente, o nível da PTF vintage ultrapassa o da PTF
tradicional. Além disso, a primeira volta a crescer antes, de maneira, que em 1995 ela
é 11,7% maior do que em 1983.
No último período, ambas voltam a seguir trajetórias quase que paralelas,
entretanto, a PTF tradicional apresenta um ritmo de queda maior (-0,51%), do que a
PTF vintage (-0,35%), ampliando assim a distância entre as duas.
Ao final do período: 1976-2003, a PTF tradicional apresenta uma queda duas
vezes maior que a PTF vintage. Além disso, o comportamento dessa última parece
mais palatável à luz da experiência recente, pois, ela cresce quase monotonicamente a
partir de 1990, quando houve a abertura comercial e somente volta a apresentar
oscilações negativas depois de 1997, quando a economia passou a ficar sujeita a fortes
intempéries externas.
A razão para o comportamento distinto da PTF sob os dois conceitos fica mais
clara na Tabela 18, que exibe o exercício de decomposição do crescimento.
Tabela 18 – Método Vintage redistribui a contribuição de K e L ao longo do período
106
Método Vintage
Método Tradicional
PTF
K
L
PTF
K
L
1977-86
-0,65
3,15
1,35
-0,52
2,65
1,73
-16,8%
81,7%
35,1%
-13,6%
68,8%
44,8%
1987-96
1,96
0,39
0,42
1,14
-0,44
1,28
1,15
20,2%
21,4%
58,5%
-22,5%
65,3%
58,6%
1997-03
1,74
-0,41
0,78
1,37
-0,50
1,15
1,08
-23,6%
44,7%
78,9%
-28,7%
66,4%
62,3%
1994-03
2,46
0,35
0,93
1,17
0,24
1,36
0,86
14,3%
37,9%
47,7%
9,6%
55,4%
35,0%
a
Os números em vermelho, na segunda linha de cada subperíodo, indicam a contribuição
de cada fator para o crescimento .
Y
3,86
Fica claro que o método vintage redistribui a contribuição de cada fator ao
longo do período, conseqüentemente a PTF também se altera por ser uma variável
residual. A contribuição do estoque de capital aumenta no período: 1977-86, pois,
esse foi marcado por grandes taxas de investimento, que fizeram com que a idade
média do estoque de capital caísse pelo menos no período inicial. Nos períodos
seguintes como contrapartida de um baixo investimento e de um envelhecimento do
estoque de capital, que passa de uma idade média de 12,2 (em 1987) anos para 16,2
(em 2003); a contribuição de K para o crescimento diminui.
Da mesma forma, a contribuição do estoque de trabalho não é mais
necessariamente declinante ao longo do tempo, pois, o aumento de escolaridade da
PEA aumentou a contribuição de L ao longo do período, compensando muitas vezes a
queda da taxa de crescimento da PEA.
A Figura 23, apresenta o produto potencial calculado de acordo com as duas
metodologias, além do produto efetivo.
107
Bilhões de R$ de 1999
1.400
1.300
1.200
1.100
1.000
900
800
700
600
PIB Potencial - Vintage
PIB Potencial - Tradicional
2003
2002
2001
2000
1999
1998
1997
1996
1995
1994
1993
1992
1991
1990
1989
1988
1987
1986
1985
1984
1983
1982
1981
1980
1979
1978
1977
1976
500
Efetivo
Figura 23 – PIB potencial vintage é maior do que o PIB potencial tradicional
O primeiro dado que chama atenção da observação da figura acima é o fato do
PIB potencial vintage ser maior do que o PIB potencial tradicional. A taxa anual
média de crescimento do primeiro foi de 3,1%; enquanto o segundo cresceu a uma
taxa de 2,9%. A diferença entre as taxas é tanto maior quanto maior for o
investimento e/ ou o aumento da escolaridade. Nos primeiros dez anos: de 1977 a
1986, a diferença nas taxas de crescimento foi de 0,5 ponto percentual. Tudo isso é
um indício de que a hipótese simplificadora da homogeneidade dos fatores tem um
custo, em termos de crescimento do produto potencial.
Segue-se, em decorrência, que o hiato do produto, medido em relação ao
produto potencial, é maior do que se supunha. O hiato médio, no conceito vintage, foi
de 10,7% do potencial, enquanto que no conceito tradicional, esse mesmo número foi
de 6,9%.
Fechando essa seção e o capítulo, a Tabela 19, mostra as taxas de crescimento
do PIB potencial vintage sob os mesmos três cenários, supostos na Seção 3.1.
Tabela 19 – PIB potencial vintage fornece maiores taxas de crescimento
108
Restringido
Natural
Estimulado
Taxa de Crescimento do PIB Potencial
(média do período 2004-2014)
Vintage
Tradicional
Diferença
3,96%
3,82%
0,13%
2,40%
2,20%
0,20%
5,24%
5,06%
0,18%
Como está claro o método vintage fornece maiores taxas de crescimento do
produto potencial para todos os três cenários. Esse resultado, porém, reflete apenas a
diferença da taxa de crescimento da PTF nos dois métodos, uma vez que o
crescimento total do estoque de capital e de trabalho é o mesmo.
Aqui, fica claro a limitação dessa correção para se fazer previsões acerca do
crescimento do produto potencial. A base para se propor tal correção era de que os
fatores de produção são heterogêneos e, portanto, a sua qualidade e não somente a sua
quantidade deveria ser levada em conta. Ademais, uma melhor qualidade desses
fatores pode determinar uma maior acumulação dos mesmos e uma maior PTF. Isso
sem mencionar, que a medição dos fatores em alguma unidade de eficiência dos
mesmos também influiria sobre os resultados da Tabela 19.
Enquanto no cálculo do produto potencial, a correção do estoque dos insumos
influía na PTF, na projeção do mesmo, isso não ocorre. A PTF potencial nos dois
conceitos é uma mera projeção futura do ocorrido no passado, com pequenas
diferenças na taxa de crescimento, pois, desconhece-se a priori como se dá essa
mencionada interação.
Logo, se essa correção proposta se mostrou válida para se avaliar ex-post o
PIB potencial, o mesmo não pode ser dito quanto a sua capacidade de previsão, uma
vez que nas condições atuais da economia brasileira ela provavelmente subestima o
produto potencial.
5. Um Modelo Evolucionário de Desenvolvimento
109
O objetivo desse capítulo é mostrar que um modelo evolucionário de
desenvolvimento econômico, como o apresentado em Nelson & Winters (1982) e
Nelson & Pack (1999), aborda grande parte das questões levantadas ao longo dos 4
capítulos iniciais.
5.1.
Relevância e Pertinência do Enfoque Evolucionário
A abordagem evolucionária da teoria econômica pode parecer, para alguns,
inapropriada ao foco dessa dissertação. De fato, desconhece-se um método de cálculo
do produto potencial de matriz teórico explicitamente evolucionista. Tampouco, tal
cálculo será apresentado aqui.
A introdução e a pertinência desse capítulo se justificam por duas razões. A
primeira razão está ligada à insatisfação de muitos economistas com o estágio atual do
conhecimento acerca dos métodos de cálculo do produto potencial. As frustrações
decorrentes do irrealismo das hipóteses, problemas de medição, etc têm levado à
busca de novos caminhos. Um desses caminhos: o enfoque evolucionista, que é
explorado nesse capítulo, parece promissor, pois, apresenta premissas mais realistas,
corroborada por resultados iniciais, que mostram uma aderência dos resultados
gerados pelo modelo com o desempenho efetivo da economia brasileira. Um caminho
natural, portanto, para essa linha de pesquisa, seria expandir tal modelo para
acomodar explicitamente um conceito teórico similar ao produto potencial.
A segunda razão está ligada ao debate acerca das interpretações do
desenvolvimento econômico brasileiro. O Capítulo 3, principalmente nas seções 3.2 e
3.3 mostrou que exercícios de contabilidade do crescimento e produto potencial estão
intrinsecamente ligados à diagnósticos, julgamentos e interpretações sobre o
desempenho histórico da economia brasileira. Tais análises se coadunam, em maior
110
ou menor grau, com o referencial teórico ortodoxo e exposam conclusões críticas
sobre o desempenho passado e opiniões céticas quanto às perspectivas. Esse capítulo
visa, então apresentar um outro enfoque para o desenvolvimento brasileiro, a partir de
um referencial teórico evolucionista.
Internacionalmente, um expoente dessa visão ortodoxa são os artigos de
Young (1992, 1996). Como contraponto, dentro da abordagem evolucionista, um
artigo representativo é o de Nelson & Pack (1999). No resto dessa seção, esse debate
será resumidamente introduzido, como forma de contrapor a teoria evolucionista à
teoria neoclássica. 53
Na primeira metade da década de 1990, Alwyn Young, numa série de artigos,
questionou a existência de um milagre econômico asiático, com base em exercícios de
contabilidade do crescimento e estimativas da PTF (Young, 1992, 1995). O autor
afirma que quando se leva em conta o aumento das taxas de acumulação dos fatores
de produção como capital físico e capital humano, além do aumento da taxa de
participação da população na PEA, o crescimento da produtividade (PTF) nos países
asiáticos não é tão extraordinário assim, equiparando-se ao registrado historicamente
pelos países da OCDE e países latino-americanos.
Dentre os países asiáticos, os casos extremos seriam Cingapura e Hong-Kong,
que registraram taxas de crescimento da PTF de 0,2% e 2,3% respectivamente.54 A
explicação fornecida pelo autor é de que o modelo dirigista da economia cingalesa,
teria forçado um progresso demasiadamente rápido em direção a adoção de novas
tecnologias, nas quais Cingapura não era eficiente e teria impedido assim, que a
economia se beneficiasse dos efeitos do tipo ‘learning by doing’ das tecnologias
53
Para uma resenha a respeito do debate sobre contabilidade do crescimento, estimação da PTF e a
existência de um milagre econômico no Leste Asiático, vide (Felipe, 1999).
54
Crescimento da PTF agregada da economia entre 1970 e 1985, dados extraídos da Tabela XIII em
(Young, 1995).
111
descartadas. Como contraponto, o modelo liberal e favorável às alocações de mercado
da economia de Hong-Kong teria evitado essa busca obsessiva pela adoção da
tecnologia mais avançada, o que permitiu que a produtividade do país avançasse
beneficiada pelo mesmo ‘learning by doing’.
Outros artigos, com concepções teóricas similares ou distintas, obtiveram
resultados frontais ou parcialmente contraditórios ao de Young. Por exemplo, Marti
(1996) usando uma versão mais atualizada da mesma base de dados de Young,55
encontrou uma taxa de crescimento da PTF de 1,49% para Cingapura no mesmo
período analisado em Young (1994).
Na seqüência dessa seção, comentar-se-á o artigo já referido de Nelson & Pack
(1999), por ele ser um contrapeso a corrente da literatura exemplificada por Young,
(1992, 1996). Além disso, sua concepção teórica acerca da incorporação e função da
tecnologia fornece uma visão distinta da lógica do desenvolvimento, que se operou
nesses países asiáticos. Em adição, procurar-se-á mostrar que tal lógica não é
particular do caso asiático, senão um enfoque mais geral o qual possui um futuro
promissor, quanto a sua capacidade de fornecer previsões qualitativas e quantitativas
inclusive.
Como comentado pari passu, a visão neoclássica, principalmente na sua
variante mais ortodoxa e tradicional, vê o processo de desenvolvimento como uma
mera acumulação de fatores de produção, onde o aumento do estoque de capital e de
trabalhadores qualificados pode ocorrer independentemente do progresso técnico.
A firma se defronta com um cabedal de escolhas tecnológicas, cada qual
resumida num par ordenado (insumo, produto), o qual ela escolhe com base na
maximização do lucro. Estudos mais recentes tentam endogeneizar o progresso
55
A base de dados usada em ambos os exercícios foi a PWT.
112
técnico, mas o fazem introduzindo mais variáveis no lado direito da equação da FP da
firma. Assumem implicitamente, que o produto resultante do investimento em P&D é
um bem privado e que seu resultado pode ser perfeitamente previsto ex-ante.
Em contraste, na visão evolucionista a própria conceituação da firma já é
diferente. As firmas possuem várias capacitações, procedimentos e regras de decisão,
que determinam suas ações. Elas também se engajam em operações de “busca”, onde
descobrem, consideram e avaliam possíveis mudanças. As firmas cujas regras de
decisão são lucrativas se expandem, enquanto aquelas que possuem regras de decisão
não-lucrativas se contraem. Logo, a existência de uma fronteira de possibilidades de
produção disponíveis a serem escolhidas pelas firmas não está aqui contemplada.
A inovação ocorre através dessas operações de “busca” das firmas, que assim
descobrem novas possibilidades a partir das existentes ou criam algo que não existia
antes. Esse processo difere do procedimento de fabricação, onde a firma usa de suas
capacitações para manufaturar o produto final, pois, ele não é um comportamento
rotineiro, ele é inovador e como tal seu resultado não pode ser antevisto.
No caso específico dos países em desenvolvimento, o procedimento de
“busca” difere daquele dos países desenvolvidos, uma vez que a inovação se dá muito
mais pela assimilação de tecnologias já existentes nos países mais avançados do que
pela criação de algo totalmente novo. Isso não elimina, contudo, a incerteza associada
à adoção das mesmas. Nesse caso, ela surge da necessidade de desenvolver e utilizar
novas habilidades e conhecimentos (em relação aos existentes no país em
desenvolvimento) para se implementar a nova tecnologia.
Portanto, em oposição à teoria neoclássica, a diferença entre o produto per
capita das nações em desenvolvimento e desenvolvidas não se resume somente a
diferentes dotações de fatores numa FP comum. Os países diferem, sim pela dotação
113
de fatores, mas também e mais importante, distinguem-se pela gama de tecnologias
empregadas em cada um. O processo de desenvolvimento é visto, portanto, como uma
situação de desequilíbrio envolvendo uma cesta de tecnologias em uso, específica
para cada país.
Uma vez que se fala em assimilação de tecnologia, surge nesse contexto um
papel relevante para alguns aspectos negligenciados pela teoria neoclássica tais como
o aprendizado, o empreendedorismo e a política governamental. Os dois primeiros são
essenciais na tarefa de “busca” mencionada acima. A política governamental é uma
importante coadjuvante, na medida que incentiva e recompensa tais comportamentos.
Como última conseqüência, se o desenvolvimento, principalmente nos países
atrasados, se dá majoritariamente pela assimilação das tecnologias existentes, que é
introduzida através de novas máquinas e equipamentos, torna-se necessário, portanto,
o investimento em capital físico. Analogamente, o conhecimento não é um bem
exclusivamente público e acessível a todos, muito dos conhecimentos e habilidades
necessários para se operar essas máquinas são tácitos, logo, se faz necessário o
investimento em capital humano, cuja função é entender, adaptar e pôr em uso
eficientemente essas máquinas. Eis, portanto, o porque, que no âmbito evolucionista,
não cabe dissociar capital físico e humano da tecnologia.
Esse modelo, que será formalmente exposto na seção seguinte, aborda muitas
das críticas, que foram levantadas ao longo dos capítulos anteriores, que versavam
sobre a heterogeneidade dos fatores de produção, a interação entre tecnologia e os
mesmos, além da conciliação do processo de desenvolvimento com uma trajetória
ascendente, ainda que temporária, da parcela do capital na renda.
114
5.2.
Modelo Evolucionário Simples de Desenvolvimento numa Economia de
Dois Setores
O modelo formalizado nessa seção tem por objetivo descrever, em linhas
gerais, as principais macro-características do processo de desenvolvimento dos países
atrasados. Por simplificação, assume-se que a economia pode ser representada por
dois setores, um moderno (m) e outro artesanal (c),56 cada qual caracterizado por uma
tecnologia diferente.
Nesse modelo, inexiste a possibilidade de se aumentar o produto por
trabalhador, ampliando-se simplesmente a intensidade do capital, ou seja, a relação
capital por trabalhador, pois, pressupõem-se uma FP de Leontief (coeficientes fixos)
em ambos os setores. O desenvolvimento se dá a medida que o setor moderno cresce
mais rapidamente que o setor artesanal. A velocidade dessa mudança estrutural da
economia depende da prontidão com que os empresários respondem as oportunidades
de lucro que aparecem. No modelo, esse aspecto está associado ao valor do parâmetro
(e).
Formalmente, cada setor pode ser descrito por uma FP com retornos
constantes de escala e coeficientes fixos. A característica de cada uma delas está
resumida em (68), onde K e L indicam capital e trabalho e Q representa o produto,
enquanto que m e c são os subscritos para cada setor da economia.
K K
  = 
 Q  m  Q c
Q Q
  > 
 L  m  L c
K K
  > 
 L  m  L c
56
Do inglês: craft.
115
(68)
Isto é, a relação capital/ produto é a mesma nos dois setores, mas a relação
produto por trabalhador e capital por trabalhador é maior no setor moderno. Se a
remuneração dos fatores de produção for igual em ambos os setores, então, o custo
unitário será menor no setor moderno. Uma outra diferença entre os dois setores está
na mão-de-obra demandada, que no setor moderno é qualificada, recebendo por isso
um prêmio (g) no seu salário. Já no setor artesanal, ela não necessita de qualquer
qualificação.
A situação hipotetizada pelo modelo, supõe que em qualquer economia em
qualquer momento do tempo, as duas tecnologias convivem uma com a outra. Em
especial, no início do processo de desenvolvimento, o setor artesanal responde pela
maior parte da produção. Porém, o setor moderno não é inexistente e sua presença
funciona como a semente do processo de desenvolvimento.
O produto por trabalhador nessa economia, por definição, é uma média
ponderada da produtividade do trabalho nos dois setores, como mostra (69).
 Q   Q   Lm   Q   Lc 
  =   ⋅  +   ⋅ 
 L   L  m  L   L c  L 
Q
e
 m
Chamando
am =  L 
Q
, onde
 c
ac =  L 
am > ac ,
(69)
então, a equação acima
pode ser reescrita como:
Q
 Lm 
 Lc 
  = am ⋅   + ac ⋅  
L
 L 
L
Sabe-se que
L
m
+ Lc = L . Logo,
(70)
Lc = L − Lm . Fazendo uso dessa relação em
(70), temos:
116
 Lm 
 L − Lm 
Q
  = am ⋅  + ac ⋅ 

L
 L 
 L 
Q
 Lm 
 L
 Lm 
  = am ⋅  + ac ⋅   − ac ⋅ 
L
 L 
 L
 L 
(71)
Q
 Lm 
 Lm 
  = am ⋅  + ac − ac ⋅  
L
 L 
 L 
Q
 Lm 
  = a c + (a m − a c )⋅  
L
 L 
(72)
A Equação (72) mostra que o piso para a produtividade do trabalho nessa
economia é dado pela produtividade do setor artesanal, pois, se
Lm é
igual a zero,
então (Q L ) = ac . Porém, a medida que o emprego no setor moderno se expande, o
produto por trabalhador também cresce. Assim como o produto por trabalhador da
economia aumenta, a relação capital por trabalhador também tem que crescer na
mesma proporção para que a relação capital/ produto se mantenha fixa, que é uma das
premissas do modelo.
Como exposto no início dessa seção, o processo de desenvolvimento se dá
pelo aumento relativo do setor moderno em detrimento do artesanal. Essa transição
ocorre através da migração do capital do setor artesanal para o setor moderno. Para se
modelar isso, são necessárias algumas hipóteses e equações sobre o lucro de cada
setor e o processo de acumulação de capital. O lucro unitário no setor artesanal ( π c ) é
dado pela Equação (73).
π c = P−r⋅
K c − w⋅
a′c
Qc
(73)
P é o preço do produto e é suposto igual para os dois setores da economia, r é a
remuneração do fator capital e w é a remuneração ao fator trabalho, que como dito
anteriormente também é idêntico em ambos o setor da economia. Por último,
117
a ′c
éo
inverso de
ac .
O lucro unitário no setor moderno ( π m ), por sua vez, é dado pela
Equação (74), onde a maior diferença em relação à Equação (73) é a presença da
variável g, que mede o prêmio acrescido ao salário pela maior qualificação do
trabalhador.
π m = P−r⋅
K m − g.w.
a ′m
Qm
(74)
Supondo que não há depreciação, o modelo assume que todo o lucro é
reinvestido, ou seja, vira estoque de capital no período seguinte. Então, a taxa de
crescimento do estoque de capital pode ser descrita para o setor artesanal e moderno
pela Equação (75) a e b respectivamente.
K& c = e ⋅ (P − r − w⋅ ′ )
ac
Kc
K& m = e ⋅ (P − r − g ⋅w⋅ ′ )
am
Km
(a)
(75)
(b)
O lucro do setor moderno é reinvestido totalmente no próprio setor, porém, o
mesmo pode não acontecer no setor artesanal, pois, se o diferencial de lucro entre os
dois setores da economia, que é dado na Equação (76), for positivo, então há um
incentivo para que o capital migre do setor artesanal para o moderno, pondo em
movimento o processo de desenvolvimento econômico.
∆π =π m −π c = w⋅(a′c − g ⋅a′m )
Essa migração se dá ao ritmo dado pela derivada no tempo da razão
(76)
(K K ) ,
m
c
que está descrita na Equação (77).
 Lc   L m 
 Km 


 = e ⋅ w ⋅   − g ⋅
Q
Q
K
c


 c   m 
118
(77)
Em resumo, quando o diferencial de lucro é nulo ou negativo, a acumulação de
capital no setor artesanal e no setor moderno é descrito respectivamente pelas
equações (75)a e (75)b. Porém, quando esse diferencial é positivo, a acumulação de
capital no setor artesanal, é dada pelo resultado da subtração da Equação (77) da
Equação (75)a e no setor moderno, a acumulação de capital é dada pela soma das
Equações (77) e (75)b.
Por último, resta analisar a evolução da participação do capital na renda.
Como dito anteriormente, a fração do capital na renda em países em desenvolvimento
tende a ser maior do que nos países avançados. Porém, pelas próprias hipóteses do
modelo de que a relação capital/ produto é igual nos dois setores e que o custo do
capital também é o mesmo nos dois setores, decorre-se que a parcela do capital na
renda tem que ser a mesma no período inicial e no período final. Essas duas
características, apesar de aparentemente conflitantes, são compatíveis, pois, a maior
parcela do capital na renda se deve a existência de quase-rendas do capital, que
diminuem à medida que o processo de desenvolvimento aproxima-se do final.
Formalmente, a parcela do capital na renda nessa economia de dois setores é
dada pela Equação (78).
 P⋅Qc − w⋅a′c  Qc  P⋅Q m − g ⋅w⋅Lm  Q m

 ⋅ + 
 ⋅
P⋅Q m
 P⋅Qc  Q 
 Q
(78)
Expressando o salário em termos do preço do produto e se utilizando do fato
de que
Q
c
= Q − Q , obtém-se a Equação (79).
m
(1− w⋅a′c)+ w⋅(a′c − g ⋅a′m)⋅ Qm
Q
119
(79)
Na equação acima, o primeiro termo entre parênteses é a parcela do capital no
setor artesanal e o segundo termo é o diferencial de lucratividade dos dois setores da
economia, multiplicado pela participação relativa do setor moderno na produção. Ou
seja essa quase-renda será tanto maior quanto for o diferencial de lucratividade, ou
seja, ela será proporcional ao montante de capital que migra do setor artesanal para o
setor moderno.
Para saber a parcela do capital na renda no período inicial e no período final,
supondo que esses dois coincidam com os casos extremos onde
Qc Q = 1
e
Qm Q = 1 , basta substituir essas condições na Equação (79). Já que pelas hipóteses do
modelo, SK deve ser igual em ambos os períodos, pode-se igualar as expressões de SK
para as situações extremas. Fazendo isso, obtém-se a condição de equilíbrio, que deve
vigorar no período final, descrita na Equação (80).
g = a ′c
a ′m
5.3.
(80)
Resultados e Conclusões Preliminares
Essa última seção do Capítulo 5, apresenta os dados que foram necessários
imputar para se simular o modelo apresentado na seção anterior, bem como seus
primeiros resultados e conclusões.
Em primeiro lugar, foi necessário determinar os valores iniciais para o estoque
de capital e de trabalho. O mais importante aqui, não é reproduzir fielmente o
montante em valores correntes do estoque de fatores de produção para a economia
brasileira, mas sim a dinâmica do desenvolvimento da mesma. Assim, a distribuição
inicial dos fatores entre os dois setores é que se torna a variável a ser ajustada para se
iniciar a simulação.
120
As estatísticas históricas de produção industrial compiladas pelo IBGE57,
permitem que se construa uma série da proporção dos trabalhadores (totais ou
operários), no setor moderno da economia em relação ao número total de
trabalhadores, desde 1952 até 1995, com algumas interrupções ao longo desse
período.58 Para os anos cuja informação inexiste, fez-se uma interpolação linear
simples para se preencher a série. Em ambas as séries, trabalhadores totais ou
operários, a participação dos trabalhadores do setor moderno no ano inicial situa-se
entre 31% e 32% do número de trabalhadores totais. Portanto, adotou-se para o
período inicial uma proporção dos trabalhadores no setor moderno em relação ao total
de 0,31.
Já para a mesma relação, referente ao estoque de capital, não há nenhuma
fonte primária de informação, que possa ser utilizada como guia. Sabe-se, entretanto,
que devido a maior relação capital/ trabalho do setor moderno, a proporção de capital
no mesmo, em relação ao total, deve ser maior do que a mesma razão para o fator
trabalho. Tendo isso em mente escolheu-se, portanto, uma relação inicial de 0,4.
Os coeficientes da FP, tanto do setor moderno como do setor artesanal, foram
ajustados de maneira a se adequar às hipóteses explicitadas em (68), às condições
iniciais da distribuição dos fatores entre os dois setores e de forma a se obter o maior
diferencial de produtividade entre os setores moderno e artesanal.
57
Série: Produção Industrial – Resultados da Apuração do Registro Industrial. Fonte primária:
Departamentos Estaduais de Estatísticas e Secretaria-Geral do Conselho Nacional de Estatística. Tabela
extraída dos Anuários Estatísticos do Brasil e disponível no capítulo sobre trabalho nas Estatísticas do
Século XX (IBGE, 2003).
58
A divisão dos setores da indústria de transformação entre moderno e artesanal tem, sem dúvida, um
grau de arbitrariedade, pois deriva do julgamento do autor, baseado na história da industrialização
brasileira e mundial, do que seriam indústrias modernas e artesanais. Nesse caso consideraram-se as
seguintes indústrias como artesanais: Madeira, Mobiliário, Borracha, Couros, Peles e Similares, Têxtil,
Vestuário, Calçados e Artefatos de Couro, Produtos Alimentares, Bebidas, Fumo, Editorial e Gráfica,
Indústrias Diversas. Foram consideradas como sendo do setor moderno da economia, as seguintes
indústrias: Transformação de Minerais Não-metálicos, Mecânica, Metalúrgica, Material Elétrico e de
Comunicações, Material de Transporte, Papel e Papelão, Química, Produtos Farmacêuticos e
Medicinais, Produtos de Perfumaria, Sabões e Velas, Produtos de Matérias Plásticas.
121
A dinâmica do fator capital está bem descrita nas equações do modelo, porém,
diversas especificações para a evolução do fator trabalho são compatíveis com o
modelo descrito na seção anterior. Como o trabalho é um fator de produção abundante
no Brasil, em especial para o período analisado, assumiu-se que o fator trabalho não é
um limitante para o desenvolvimento. Assim, seu ritmo de crescimento é totalmente
endógeno, sendo dado pelo crescimento do estoque de capital. Ou seja, o estoque de
trabalho cresce ao longo do tempo de maneira a manter constantes as relações
descritas em (68).
O prêmio pela qualificação do trabalhador (g) também foi obtido a partir das
estatísticas históricas compiladas pelo IBGE. A pesquisa sobre a produção industrial
traz o montante de salários e vencimentos pagos para os ramos da indústria de
transformação, a partir do qual é possível calcular um salário anual médio pago em
cada um. Essas médias, então, podem ser agregadas, de acordo com a taxonomia:
moderno ou artesanal, para se obter o fator multiplicativo, que diferencia os salários
entre os dois setores. A evolução desse prêmio pela qualificação está na Figura 24.
1,8
1,7
1,6
1,5
1,4
1,3
1,2
1,1
19
80
19
82
19
84
19
86
19
88
19
90
19
92
19
94
19
58
19
60
19
62
19
64
19
66
19
68
19
70
19
72
19
74
19
76
19
78
19
52
19
54
19
56
1,0
Prêmio pela Qualificação - (g)
Figura 24 – Prêmio pela qualificação (g) apresenta tendência crescente ao longo do período
122
Esse prêmio oscila entre 15% até 75% do salário pago no setor artesanal,
apresentando uma inequívoca tendência crescente ao longo de todo o período. Esse
crescente prêmio pela qualificação, pode ser, por um lado, um incentivo, num
referencial neoclássico, para que os trabalhadores invistam em mais anos de estudo,
porém, como mostra a Equação (76), diminui também a velocidade do processo de
migração do capital do setor artesanal para o setor moderno, podendo até estancá-lo.
Também é necessário assumir um valor para o parâmetro (e), que representa a
efetividade do empresário em responder as oportunidades de lucro que surgem no
setor moderno. Em todas as simulações feitas, assumiu-se o valor unitário para o
parâmetro. Esse é um valor neutro, no sentido que ele não diminui nem reforça os
incentivos para a migração do capital, fornecidos pelo diferencial de lucratividade
entre os setores.
Por último, é necessário imputar valores para o preço do produto (p) e para o
salário (w). Quanto a isso, duas especificações distintas foram simuladas. Na primeira,
mais simples, w e p foram supostos constantes ao longo de todo o período. Já na
segunda situação, p é fixo, porém, w varia de acordo com o preço relativo dos bens
industriais em função dos bens de consumo, representados respectivamente pelo IPC
(Índice de Preços ao Consumidor) e pelo IPA (Índice de Preços no Atacado), ambos
da FGV.59 A intenção é que o preço relativo entre p e w na simulação se aproxime do
preço relativo entre produtos e salários na economia brasileira.
Na Figura 25, que mostra a participação dos trabalhadores no setor moderno
no total de trabalhadores, três simulações com especificações e valores diferentes para
w foram feitas. Na primeira e na terceira rodada, w foi mantido constante, enquanto
que na segunda ele variou ao longo do período, de acordo com a regra estabelecida
59
Devido ao período de tempo coberto pela amostra, o IPC utilizado abrange somente a cidade do Rio
de Janeiro.
123
acima. Ademais, na primeira e na segunda rodada, o valor do salário imputado foi
compatível com o ponto de break-even do setor artesanal no período inicial.60 Por
outro lado, na terceira rodada o salário estabelecido foi um pouco menor, de maneira
que no período inicial, a tecnologia artesanal ainda gerava um lucro para os seus
produtores, porém, menor do que no setor moderno da economia.
Nas 3 rodadas, dadas as especificações do modelo e os valores imputados, o
lucro no setor moderno (πm) é negativo em alguns períodos, o mesmo acontecendo
com o lucro no setor artesanal (πc) na segunda e terceira rodada. Como essa queda na
lucratividade é causada pelo aumento no prêmio pela qualificação (g), em alguns
períodos a atividade no setor artesanal torna-se mais lucrativa do que no setor
moderno.
60
55
50
45
40
35
Efetivo
1a. Rodada
2a. Rodada
19
88
19
90
19
92
19
94
19
78
19
80
19
82
19
84
19
86
19
66
19
68
19
70
19
72
19
74
19
76
19
56
19
58
19
60
19
62
19
64
19
52
19
54
30
3a. Rodada
Figura 25 – Participação dos trabalhadores do setor moderno no total: efetivo x simulações
Analisando a figura acima, vê-se que em geral, os modelos conseguiram
reproduzir de maneira razoavelmente satisfatória a trajetória efetiva da variável. Em
particular, a terceira rodada da simulação segue mais próxima da trajetória efetiva até
60
Para a segunda rodada, refere-se ao valor imputado no período inicial.
124
1970, ocorrendo o inverso com a primeira e a segunda, que se aproximam melhor da
trajetória efetiva, a partir de meados da década de 1970.
Tal fato pode ser um indício de alguma mudança num parâmetro estrutural do
modelo tal como a efetividade do empresário ou a própria tecnologia, aumentando o
diferencial de produtividade, o que por sua vez teria determinado esse rápido avanço
do processo de desenvolvimento.
Olhando somente para as curvas geradas nas duas primeiras rodadas da
simulação, percebe-se que o efeito prático de se introduzir uma variação nos salários
ao longo do tempo é gerar uma maior flutuação da trajetória. Essa, entretanto, ainda é
menor do que a verificada na série efetiva, sugerindo que outros fatores além do preço
relativo entre salários e produtos estejam por trás das oscilações.
Por último, é nítido na Figura 25, que a partir de meados da década de 1980, o
impulso do processo de desenvolvimento perdeu força, quando se tinha um pouco
mais do que a metade da força de trabalho empregada no setor moderno da indústria
de transformação. Os fatores, que dentro do modelo, podem explicar tal
comportamento são uma queda na efetividade do empresário (e), no salário (w) ou
uma alta no prêmio pela qualificação (g) . Contudo, o que mais chama atenção é, sem
dúvida, o aumento do prêmio pela qualificação do trabalhador, que diminui a
vantagem comparativa do setor moderno, podendo até invertê-la, tornando o setor
artesanal mais lucrativo do que o moderno. Além disso, não se pode esquecer que o
período de estagnação do processo de desenvolvimento, coincide também com um
momento de aceleração inflacionária, que desorganiza o sistema de preços, podendo
alterar preços relativos e também dificultar a prospecção de oportunidades lucrativas
por parte dos empresários.
125
As duas próximas figuras mostram como esse processo de desenvolvimento se
reflete na produtividade da economia, através da evolução da relação capital por
trabalhador e produto por trabalhador.
2,08
2,05
2,02
1,99
1,96
1,93
1,90
1,87
19
52
19
54
19
56
19
58
19
60
19
62
19
64
19
66
19
68
19
70
19
72
19
74
19
76
19
78
19
80
19
82
19
84
19
86
19
88
19
90
19
92
19
94
1,84
1a. Rodada
2a. Rodada
3a. Rodada
Figura 26 – Evolução da relação produto por trabalhador (Q/L)
A relação produto por trabalhador dessa economia, como mostrada na Figura
26, é como explicitado na Equação (72), uma média ponderada da relação produto por
trabalhador nos dois setores da economia. A relação total para a economia cresce
enquanto a participação do setor moderno aumenta, uma vez que esse possui uma
maior relação produto por trabalhador, o que está refletido nos anos desde o período
inicial até meados da década de 1970. Em seguida, como reflexo do estancamento do
processo de migração do capital, a produtividade da economia também regride a partir
de meados da década de 1980. Raciocínio similar também pode ser aplicada a relação
capital por trabalhador, que está representada na Figura 27.
126
0,83
0,82
0,81
0,80
0,79
0,78
0,77
0,76
0,75
19
52
19
54
19
56
19
58
19
60
19
62
19
64
19
66
19
68
19
70
19
72
19
74
19
76
19
78
19
80
19
82
19
84
19
86
19
88
19
90
19
92
19
94
0,74
1a. Rodada
2a. Rodada
3a. Rodada
Figura 27 – Evolução da relação capital por trabalhador (K/L)
As figuras acima trazem 2 pontos, em conexão com aqueles já levantados pela
figura anterior, que merecem ser destacados. Em primeiro lugar, a trajetória descrita
na segunda simulação se mostrou mais volátil do que a primeira, igualmente ao
verificado na proporção (Lm/L), resultante da variação de w ao longo do tempo.
Novamente, a primeira e a segunda rodada mostram um maior crescimento da
produtividade no período, em comparação com a terceira rodada, fruto do maior
diferencial de lucratividade entre os setores.
Por último, esse modelo, assim como os apresentados anteriormente, não está
livre de críticas ou limitações teóricas ou na sua implementação, que precisam ser
resolvidas. No campo teórico, ele está claramente restrito a uma dinâmica de
desenvolvimento industrial, quando atualmente em grande parte dos países, mesmo
nos subdesenvolvidos, o setor de serviços responde por uma maior parcela do PIB.
Quanto à sua aplicação empírica, a maior barreira com certeza é definir o que seria a
tecnologia moderna e o que seria a tecnologia artesanal. Correspondências ao nível
setorial como feito nesse exercício é, sem dúvida, apenas uma primeira aproximação.
127
Pois, um mesmo setor pode comportar firmas produzindo sob diferentes tecnologias
com diferentes produtividades.
6. Conclusão
Essa dissertação se dedicou a avaliar criticamente os estudos empíricos sobre o
produto potencial brasileiro, sua aplicabilidade e uso na formulação de políticas
econômicas, bem como possíveis melhoramentos nos seus cálculos. Na penúltima
seção, ainda se avaliou um modelo de matriz teórico evolucionista como um possível
ponto de partida para uma abordagem alternativa com um provável maior poder
explicativo.
No que tange à avaliação dos resultados obtidos até agora na literatura, alguns
resultados comuns, principalmente em relação a PTF e a relação capital/ produto,
emergiram. Essa última apresenta-se estável desde meados da década de 1980, após
um período de rápida elevação iniciado ao final da década de 1960. Já a PTF
apresenta uma evolução positiva até o ano de 1980, a partir do qual ela declina para
apresentar uma leve melhora ou estabilidade, dependendo do estudo, na década de
1990. A grande distância entre a trajetória do PIB efetivo e potencial, depois do ano
de 1980, é também outro ponto comum entre os exercícios.
Já em relação à taxa de crescimento do PIB potencial, o traço comum é a
amplitude das projeções. O primeiro exercício do Capítulo 3 fornece um intervalo de
taxas de crescimento do PIB de 1,7% até 6,2%, dependendo das hipóteses assumidas.
No terceiro exercício do mesmo capítulo, obtém-se uma taxa de crescimento de 4,3%,
mas que no curto prazo está restrita pela taxa de crescimento do estoque de capital, o
potencial torna-se, então igual a 3,2%.
128
Tal fato não é exclusividade brasileira. Como apontado na resenha da
bibliografia internacional no Capítulo 2, diferentes métodos aplicados a Suécia
forneceram um intervalo de crescimento entre 0,9% e 4,2% para um mesmo ano.
Algumas críticas foram levantadas quanto aos métodos utilizados na medição
do PIB potencial brasileiro, incluindo as de viés prático e outras de enfoque mais
teórico. Em relação a essas últimas, deve-se ressaltar a impropriedade de se projetar
um cenário potencial para o Brasil, a partir do desempenho da década de 1980 e 1990,
sem levar em conta que esse período é pouco informativo sobre o presente momento e
os seus desdobramentos.
Quanto as primeiras é importante reforçar a incerteza no tocante a medição do
estoque de capital,a homogeneidade dos fatores, a sensibilidade dos resultados às
hipóteses e parâmetros iniciais e outras arbitrariedades como a definição da NAIRU e
da correção pelo grau de utilização dos fatores. Tudo isso torna o resultado final muito
sensível às especificações iniciais, que no fundo refletem uma concepção teórica a
priori sobre a economia brasileira.
Tendo isso em vista, o objetivo do capitulo 4 foi incorporar algumas dessas
críticas com o objetivo de se obter um diagnóstico mais abrangente, que incorporasse
outros aspectos relevantes da realidade. Para isso propôs-se uma correção de longo
prazo na contabilidade do crescimento, de modo a contabilizar corretamente a
contribuição da PTF e do estoque de capital e dois modelos que incorporam a
heterogeneidade dos fatores.
Por último, o Capítulo 5 apresenta um modelo de desenvolvimento, onde
tecnologia e capital físico e humano não estão dissociados, a produtividade é dada
pela tecnologia e a participação do capital na renda varia ao longo do tempo. Por
contemplar essas características entre outras, que são deixadas de lado nos modelos de
129
produto potencial, é que esse modelo evolucionista se torna pertinente, podendo se
tornar o ponto de partida para o desenvolvimento de uma metodologia alternativa
daqui pra frente.
A força da teoria evolucionista decorre do seu poder de reproduzir fatos
econômicos estilizados ao menos tão bem quanto a teoria neoclássica ortodoxa,
utilizando-se de hipóteses menos restritivas e mais realistas. Dessa maneira, princípios
como: o pleno conhecimento de todas as escolhas possíveis a uma firma, a completa
previsão de seus resultados e a capacidade de uma firma de tomar a decisão que
maximiza esse problema, são deixados de lado.
Ao contrário, a teoria evolucionista trabalha com a idéia de que as firmas
diferem entre si pelo seu conjunto de rotinas, sendo que a seleção natural é que
determinará quais rotinas são as mais eficientes para a sobrevivência da firma.
Mecanismos de busca junto com mecanismos de mutação é que explicam a expansão
de certas rotinas e a introdução de novas que podem vir a se tornar predominantes ou
serem eliminadas naturalmente. Esse processo todo está longe de poder ser
caracterizado como um equilíbrio, pelo contrário o motor desse mecanismo é
justamente o desequilíbrio.
Além de todos os aspectos práticos e teóricos levantados acerca do produto
potencial, a discussão feita ao longo da dissertação, principalmente os exercícios de
contabilidade do crescimento, tem clara repercussão sobre as interpretações acerca do
desenvolvimento econômico brasileiro. A primeira vista, os resultados de baixa
produtividade e potencial de crescimento, além de comparações com outros países,
parecem corroborar com a visão de que a trajetória do desenvolvimento brasileiro,
principalmente na segunda metade do século XX produziu efeitos perniciosos sobre a
economia brasileira. Porém, quando se incorpora as correções feitas no Capítulo 4 e
130
outras ponderações feitas, principalmente, ao longo do Capítulo 3, as evidências
empíricas deixam de amparar a visão mencionada acima.
Em suma, os métodos disponíveis e usados atualmente apresentam alguns
problemas, porém, não há substitutos imediatos que não sofram dos mesmos
problemas ou similares e que forneçam resultados superiores. Por isso, não se deve
abandonar os métodos existentes, mas usá-los com muita cautela e não com um fervor
fundamentalista na formulação de políticas econômicas, em especial a política
monetária, enquanto se avança na pesquisa de métodos alternativos. Nesse ínterim,
melhoramentos como aqueles propostos no Capítulo 4 devem ser levados em
consideração.
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