Homens providencias versus instituições “A ânsia por homens providenciais e a frustração com a sua ausência levam a apenas uma conclusão: estamos desestruturados institucionalmente”. (M.H. Simonsen) Janeiro de 2010 Por Vítor Wilher “Nosso Messias chegou!”, disse o aposentado em frente à televisão. Assistia a mais um discurso do presidente Lula, no qual o mesmo divagava sobre as realizações do seu governo. A propaganda oficial dá conta de que chegamos enfim ao paraíso do primeiro mundo. A exaltação é grande e Lula já fala em “eleição plebiscitária”: um confronto entre sua administração e a anterior. Mas, será caro leitor, que essa euforia é justificada? O comentário do professor Mário Henrique Simonsen, que serve de epígrafe a este artigo, nunca foi tão atual. Depois de um longo jejum de “homens providenciais” na cadeira de presidente, parece que o Brasil encontrou alguém para o posto. O legítimo filho da terra, por assim dizer, não se abstém e rotula a si próprio como o homem que veio para mudar o país. Não nos enganemos: a eleição deste ano não é outra coisa que o confronto entre dois mundos bastantes distintos. No mundo petista, o Estado deve ser grande, planejador, dotado de poder de intervenção sobre a atividade econômica. Já no mundo tucano, o Estado deve ser regulador, atuando pontualmente sobre as questões que a economia de mercado não consegue resolver. A sociedade brasileira, historicamente, já decidiu em qual dos dois mundos quer habitar. O Brasil importou um Estado, não o construiu. Justamente por isso os indivíduos se acostumaram a reagir e não a pressionar por mudanças. Em lugares onde a sociedade criou o Estado, tal questão não existe: os cidadãos são seres ativos, que pressionam por melhores instituições. Querem receber serviços públicos descentes em troca do imposto que pagam. Isto porque, têm a exata noção de quanto custa manter uma estrutura estatal. Confrontam tal custo com os possíveis benefícios que determinado órgão estatal pode vir a impactar. Se acreditam que os custos serão maiores do que os benefícios, os cidadãos desses países protestam. Por aqui não. Talvez por isso circule pela internet uma piada sobre quão ricos nós somos: não nos preocupamos com os custos envolvidos nas escolhas de um determinado governo. Somos, por princípio, favoráveis a qualquer interferência do Estado na atividade econômica. Afinal, ele o Estado, quer apenas nos proteger da ganância dos empresários e dos estrangeiros. Doce ilusão, caro leitor. Com tal postura, estamos condenados a nunca sabermos exatamente para que serve o Estado. O fato de termos tido dois governos na Nova República identificados com o mundo onde o Estado é regulador pode ser classificado como um ponto fora da curva. O eleitor médio acredita que o Estado (na figura do presidente da República) deve ser o responsável (para alguns, o único) pelo desenvolvimento econômico e social do país. O fato de o Estado anteceder à nação gera uma passividade sem tamanho em nossa sociedade. A iniciativa individual perde fôlego nesse contexto, o que gera uma falta de dinamismo impressionante em nossa economia. E é justamente esse pensamento, que perdura no imaginário popular, o maior indicativo de que ainda estamos muito distantes de nos tornarmos um país desenvolvido. Isto porque, a necessidade, per se, de “vontade política” para mudar indica que a sociedade ainda não está pronta para mudar. A mudança de fora para dentro é frequentemente feita por ditaduras, por déspotas esclarecidos, por governos que não respeitam contratos. Quase nunca é feita sob o regime democrático. Como diria Hayek, o estado de direito é aquele capaz de funcionar de modo eficaz sem a necessidade de “homens providenciais”. Os próprios indivíduos forçam uma mudança institucional, reduzindo custos de transação. É claro que um Estado forte é importante para que um país se torne desenvolvido. Nenhuma nação do mundo chegou a tal categoria com um Estado fraco. A questão, entretanto, é a confusão que se faz rotineiramente entre Estado forte e acúmulo de funções. O acúmulo de muitas funções acaba, isso sim, enfraquecendo o Estado. Não é outra coisa que caracteriza a ineficiência da máquina patrocinada pelo governo petista. A existência, por exemplo, de um ministério para cuidar da pesca e aqüicultura pouca coisa influencia na melhoria desse setor. Assim como a criação de uma secretaria especial para o direito das mulheres pouco impacto tem na situação das mesmas. O impacto que existe é na atividade econômica do país. O Estado, apesar de muitos acharem que sim, não foge à lei geral da escassez. Todo gasto corrente que o Estado faz reduz a capacidade da economia de produzir bens e serviços. Em outros termos, se o gasto público não for eficiente, o mesmo está diminuindo o bem-estar de toda a sociedade. Nesse contexto, ao invés de termos uma infinidade de ministérios para cuidar de uma centena de funções é muito mais prático (e civilizado) termos instituições. Se, por exemplo, o BNDES cumprisse sua função social, não seria necessário termos um ministério da pesca e aqüicultura: o mesmo viabilizaria projetos nessa área. Se o Estado tivesse sido fiscalmente responsável nos últimos 110 anos de República, nossos juros básicos seriam menores e a relação crédito/PIB da economia seria muito maior. Se, somado a um mercado de crédito evoluído, tivéssemos uma justiça que julgasse processos com rapidez, nosso ambiente de negócios seria muito melhor e teríamos muito mais emprego disponível. Mas, claro, isso não parece fazer parte de nosso pacto social. Nossa sociedade parece querer confiar em um déspota, em um Messias, ao invés de construir instituições que sirvam de base para nosso desenvolvimento. Enquanto perdurar esta visão na sociedade brasileira dificilmente alcançaremos o status de país desenvolvido. Minhas esperanças, entretanto, estão todas depositadas na educação. Quando tivermos um sistema de educação básica pública de qualidade poderemos ter indivíduos mais avessos a idéia geral de que o Estado deve ser o agente provedor do bem-estar da sociedade. Com pessoas mais instruídas, teríamos uma maior pressão social por melhores instituições, o que viabilizaria o desenvolvimento econômico e social do país. Não é por outro motivo que considero a educação a maior de todas as instituições.