Memórias do comércio da juta no baixo-amazonas
Elber Norton de Souza dos Santos1
Luciana Gonçalves de Carvalho2
Resumo: O presente trabalho procura apresentar as memórias de trabalho de antigos
produtores de juta da região oeste do Pará relacionados à cadeia produtiva da mesma
levando em consideração os agentes que faziam parte desta cadeia a partir do sistema de
trabalho conhecido como aviamento sob uma configuração que difere do modo como é
conhecida na literatura como um regime de servidão e super exploração do trabalhador
do campo. O trabalho atentou para as diferentes modalidades de trabalho relacionados à
juta, em sua produção para a extração de sementes e de fibra para a importação e
exportação devido à alta demanda do produto durante 1930 e 1980 que influenciou
drasticamente no modo de vida das pessoas que estavam ligadas em sua produção,
mapeando redes de relações através do comércio, sistema de adiantamento de crédito
entre patrão e empregado, e com o governo que incentivava a produção de sementes e
fibra através de subsídios bancários e doação de sementes. Assim através do registro
oral de trabalhadores se procura constituir uma memória desse trabalho, a partir do
ponto de vista se libertando dos moldes que engessam a história sobre tal assunto, com
temas relacionados à territorialidade, interações sociais e saberes.
Palavras-chave: Memória; Trabalho; Juta; Aviamento.
Abstract: This paper seeks to present the former producers of jute working memories
of western Pará related to the productive chain of the same taking into account the
agents who were part of this chain from the labor system known as dispensing in a
setting that differs from how it is known in the literature as a bonded and super
exploitation of the field worker. The work looked at the different working arrangements
related to jute in production for extraction of seeds and fiber for the import and export
due to high demand of the product during 1930 and 1980 that dramatically influenced
the way of life of the people who were connected in their production, mapping networks
1
Discente do curso de Antropologia da Universidade Federal do Oeste do Pará, bolsista Pibic do
Programa de Extensão Patrimônio Cultural na Amazônia/ICS/Ufopa (PROEXT/MEC). Email:
[email protected];
2
Doutora em Antropologia, professora de Antropologia na Universidade Federal do Oeste do Pará,
coordenadora do Programa de Extensão Patrimônio Cultural na Amazônia/ICS/Ufopa (PROEXT/MEC).
Email: [email protected].
of relationships through trade, credit payment system between employer and employee,
and the government encouraged the production of seeds and fiber through bank
subsidies and donation of seeds. So through the oral record of workers looking
constitute a memory of this work, from the point of view breaking free from molds that
can imprison the story on this subject, with topics related to territoriality, social
interactions and knowledge.
Keywords: Memory; Work; Juta; Aviamento.
Introdução à Cultura da Juta
A produção de juta na Amazônia teve grande impacto em diversos setores da sociedade,
entre os quais se pode citar o econômico e o social principalmente, influenciando o
modo de vida das populações que viviam nas regiões de várzea do Rio Amazonas
durante grande parte do século XX. A história da juta no estado brasileiro se inicia
paralelamente à história da economia cafeeira na região sudeste do país, onde as fibras
oriundas das plantas de juta eram utilizadas para acondicionar a produção do café, visto
que esta não interferia no aroma e no sabor dos grãos, sendo substituta das embalagens
feitas de algodão, que se apresentavam sob a forma de um tecido grosseiro e confecção
rudimentar (SOUZA, 2008).
Este item bastante produzido no século XX em diversas regiões da Amazônia ao longo
do rio Amazonas foi o “ouro”3 da economia nas cidades de Alenquer, Monte Alegre e
Santarém no Pará. O início da produção da juta se iniciou no estado do Amazonas, mas
abrangeu também alguns municípios do estado do Pará, dentre eles Alenquer, Óbidos,
Juruti e Santarém4, principalmente, influenciando drasticamente o modo de vida das
pessoas que trabalhavam em sua cadeia produtiva durante o auge de sua produção e
após a queda de sua economia. Havia dois tipos de juta, a juta branca e a juta roxa, a
primeira sendo considerada melhor para plantio visando a obtenção da fibra, pois ela
crescia bastante e “galhava” pouco, diferente da juta roxa que crescia pouco e galhava
mais.
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Categoria utilizada pelos antigos produtores referindo-se ao alto valor que a fibra de juta possuía.
Houve também plantações no atual município de Curuá, em Monte Alegre e em Prainha.
Durante a viagem ao município de Alenquer conheci dona Assunção, cozinheira de
alguns barcos que fazem a linha Santarém-Alenquer-Santarém e que também trabalhou
durante certo período na extração da fibra de juta, pessoa que me acolheu e se tornou
importante interlocutora durante a pesquisa. A mesma me relatou que a juta fora o item
mais importante no comércio de sua cidade natal, tendo trabalhado nas terras de seu pai,
juntamente com seus familiares, forma de trabalho muito comum nas comunidades
ribeirinhas.
Assim se deu início à procura de mais trabalhadores que antigamente se situavam na
economia de juta, procurando entender como se organizavam as formas de trabalho, os
processos produtivos, os agentes da cadeia e principalmente as memórias dos mesmos
que estavam na base desta. A fibra de juta que era colhida nas comunidades era
armazenada em galpões onde esperavam embarcações para serem transportadas para
usinas de beneficiamento, em Santarém, onde a TECEJUTA, se fixava e em Belém5.
Manoel Onício de Souza, antigo trabalhador da região da Costa do Arapiri, município
de Alenquer, relata que foi uma das primeiras pessoas a trabalhar com a juta na região,
juntamente com seu sogro, senhor Neço Araújo. O mesmo conta que as sementes eram
fornecidas pelos japoneses e para ele que trabalhava como aviador, só cabia o trabalho
de plantar, colher e vender a safra, ao mesmo tempo em que havia subsídios de alguns
órgãos para o comércio, onde é citado o senhor Marcos Pinto da Caixa Econômica, e
também a FIBRASA além de outras empresas que não mais existem atualmente.
Seu Manoel conta que o último comprador de juta na região foi Mirton Marques, e que
com a crise da juta juntamente com o fenômeno das terras caídas – por volta do ano de
1988 – não se podia ficar mais na região, então o mesmo foi obrigado a se mudar com a
família para outro lugar, Santarém no caso.
Aviamento, Crédito e Trabalho
Em diversas regiões da Amazônia o comércio e o extrativismo foram marcados pelas
relações de trabalho baseadas em sistemas de patronagem e obtenção de crédito para o
produtor do interior, produtor de itens muitas vezes de cunho extrativista. Com a
produção da juta ao longo do rio amazonas não foi tão diferente. As relações de trabalho
que se apresentavam no interior de sua cadeia produtiva diferem em alguns aspectos do
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Ambas as cidades eram local de moradia de “patrões”, senhores que financiavam produtores em certas
comunidades e regatões para a compra da juta em outras.
que se apresenta pela literatura do sistema de aviamento na Amazônia, onde segundo
McGrath “(...) aviar significa fornecer mercadoria a prazo com o entendimento que o
pagamento será feito em produtos extrativos dentro de um prazo especificado.”
(McGrath, 1999).
Esse sistema mercantil que obedece às lógicas capitalistas de produção se detém apenas
ao controle indireto sobre o produtor, sendo que o extrativista somente fornece sua
mercadoria para venda em determinado período da produção, dependendo do produto a
ser extraído este tempo varia conforme a natureza, entregando-o ao aviador ou patrão
em tempos específicos.
Crédito e dívida são palavras fundamentais para conhecer e adentrar no sistema de
aviamento. O pequeno produtor que vive interior não tem contato com as redes de
comércio que se estabelecem nas grandes cidades, mantém contato somente com o
aviador ou patrão que o avia e recebe seus produtos, estando assim na posição mais
baixa da cadeia produtiva. Acima do produtor se encontra o aviador ou patrão,
dividindo espaço com os “regatões” ou “marreteiros” que desempenham o papel de
interligar os produtores com as casas de comércio muitas vezes onde o aviador não
possui meios para chegar. Mais acima se encontram os comerciantes e donos de casa
que estocam os produtos e os distribuem para a exportação e importação, mantendo
contato com as casas de crédito e os bancos, estes últimos que muitas vezes
incentivavam as redes de comércio a abrir crédito para os produtores e emprestavam
dinheiro aos comerciantes.
Sobre o adiantamento de crédito e o endividamento, McGrath (1999) assinala que os
mesmos servem como “um laço através do qual o credor e o endividado asseguram um
ao outro o acesso a mercadorias e a produtos florestais”. Assim sendo, é mostrada a
distância de mundos entre os produtores e seus patrões, atuando em situações e
momentos diferentes na cadeia produtiva. A expansão da globalização eminentemente
impactou os modos como eram configurados os diversos sistemas econômicos da
região, ditando as maneiras de como se devia produzir e os fins de cada produto.
Este sistema pôde ser exemplificado na fala de Seu Manoel que era também
comerciante na comunidade, comprava mercadorias na cidade (Alenquer e Santarém) e
vendia aos trabalhadores esperando ser pago com juta. Este item então assumia a forma
moeda, em um contexto onde as relações de produção e venda eram mediadas pela fibra
da juta. Pessoas que tinham suas terras para plantarem podiam facilmente obter bens de
consumo com a venda da fibra de juta, devido à grande demanda da mesma pelo
mercado interno e externo. O contexto da produção se desenhava em uma relação entre
o comércio da juta em Alenquer e outros municípios com a venda de produtos e o
beneficiamento da fibra na cidade de Santarém, que servia de entreposto para a carga e a
descarga de produtos afins com destino final em Belém.
Em entrevista com D. Maria de Nazaré, esposa de Seu Manoel Onício, a mesma fala da
vida difícil que se tinha com o trabalho da juta, trabalho que demandava horas e horas
de corte da planta com um nível de água por volta da cintura, cuidados com a plantação,
o processo de descascar a planta e a lavar. Ela conta que começou a trabalhar com este
produto quando estava com vinte anos de idade, e a juta tinha a maior produção entre os
trabalhadores da região, explanando sobre a divisão do trabalho, onde os homens
cortavam a planta e as mulheres ficavam encarregadas da lavagem e do plantio da
mesma. Segundo ela, a planta passava pelo seguinte processo até se obter a fibra, com o
roçado sendo feito durante os meses de agosto e setembro, a queima da terra em
outubro, a semente sendo plantada em novembro e colhida entre os meses de fevereiro e
março juntamente com o corte, corte que levava ao processo de “afogamento” da planta
durante quinze dias e secagem da mesma por dois dias para se enfardar a safra para a
venda.
Dona Maria ainda relata que no tempo do comércio da fibra de juta não havia
endividamento por dívidas entre patrões e empregados, que os segundos tinham a
liberdade de escolher para quem vender e conseguiam ganhar bastante dinheiro e
comprar suas casas, terrenos, comida e outros produtos, e relata também que sente
saudades do contato com as pessoas com as quais trabalhava no roçado, das brincadeiras
e conversas que se apresentavam no trabalho.
Voltando à cidade de Alenquer, a EMATER local teve um papel importante no
melhoramento das sementes para a venda aos produtores e também na extração das
sementes. Para tratar disso deve-se ter em mente que a juta não apenas era plantada para
se extrair a fibra, mas também para se tirar as sementes dela. O trabalho deve ser
dividido da seguinte maneira: nas áreas de várzea a semente era plantada para crescer e
se tirar a fibra de seu caule, e nas áreas de terra firme a semente era plantada para
crescer e se extrair as sementes, que eram vendidas para a EMATER e distribuídas aos
produtores, acarretando assim um melhoramento genético nas sementes, escolhendo os
melhores tipos para serem entregues e plantadas para a extração da fibra. O trabalho
com a juta assim, era dividida em dois momentos, aspecto relatado somente através dos
relatos colhidos na sede da EMATER com o senhor Valdomiro e alguns trabalhadores
da terra firme no município de Alenquer.
Com a visita à sede da EMATER, foi possível delinear um campo mais extenso de
produção da fibra, que incluem as comunidades de Surubimiri (baixo e cima),
Surubiaçú, Atumã e Salvação, situando também os agentes governamentais que
integravam a cadeia produtiva da juta, sendo eles a EMATER, a Secretaria de
Agricultura e o Governo Federal, que se uniam para levar assistência técnica e
informação aos produtores de sementes e de fibras.
Seu Osmar Alves Cabral e Isaac Marreiro, trabalhadores da terra firma na produção de
sementes de juta, contam que havia muita burocracia no processo de produção das
sementes, e demandava também um longo período de trabalho das pessoas, em um
processo diário de reparo da plantação, com a colheita da planta durante o dia e a
“batida” da mesma para colher as sementes durante a madrugada. A planta precisa de
um clima úmido e frio para abrir a sua flor que fica localizada no topo, esta flor fecha
durante o dia quando o clima está seco e quente e só se abre durante a madrugada,
período em que os produtores aproveitam para bater na flor da planta com um tipo de
marreta e de lá tirar as sementes da planta. Assim é possível afirmar através dos relatos
que a produção de fibra só existia por que havia a produção de sementes, a fibra na
várzea e a semente na terra firme.
Senhor Ademar da Silva, de Alenquer também, conta que o preço do Kg da semente
acompanhava o preço do Kg da carne de boi, e que atualmente não se planta mais juta,
sendo a última safra de seu conhecimento tratando de 2008, que era vendida para a
cidade de Manaus no estado do Amazonas, relatando também que nunca houve
endividamento dos trabalhadores na cadeia produtiva, falando também que se a juta
fosse aberta, a economia do município seria melhor.
Ainda em Alenquer, conheci Dona Maria Nesina, mãe de Dona Assunção, mulher de
produtor de juta da comunidade de Salvação, que relembra com sorriso no rosto do
tempo em que a juta era a principal mercadoria da região, contando sobre os tempos
fartos de comida e dinheiro que se lucrava com a venda de juta para os patrões, da
família inteira trabalhando no roçado afim de sobreviver...A mesma relata sobre as
grandes extensões de terra que a juta abrangia, no desenho que se formava na terra, os
diálogos que eram feitos no trabalho, com todos praticamente submersos no rio
cortando a planta e deixando para secar em varais...da estocagem de comida, farta,
obtida com a venda da juta, e da dificuldade de viver quando a crise do comércio de juta
caiu sobre seus ombros, de se trabalhar na produção de outros produtos –
principalmente farinha e tomate – e na mudança do local de moradia, da comunidade
para a cidade de Alenquer.
Reflexões acerca da cadeia produtiva e o sistema de crédito
A rede que abrangia as cidades citadas no presente ensaio era interligada e dependente
das pessoas que se relacionavam umas com as outras através da compra e da venda da
fibra e da semente de juta na região, de Juruti a Belém diversos eram os patrões,
produtores e atravessadores que compunham este mapa e integravam a cadeia de
produção da planta de juta. Tomando como ponto de análise para dar escopo aos dados
recolhidos em campo através dos relatos orais de antigos produtores, patrões e pessoas
que estiveram ligadas de alguma forma com o cultivo da planta, é notável uma diferença
na configuração deste sistema de aviamento e adiantamento de crédito como fora
concebido pela literatura dominante e amplamente difundida de tal tema.
Através da fala de Seu Joilson, filho de antigo produtor de juta, pode-se ver
independência por parte dos agricultores em relação aos patrões, os primeiros possuíam
autonomia sobre sua produção, assim patrões e atravessadores apenas compravam a
fibra de juta das pessoas que queriam vender para os mesmos. Nas comunidades de
Bom Jardim e Santa Rita, Seu Joilson diz que se recorda que a fibra colhida na safra de
seu pai geralmente era vendida para Santarém e Belém por meio dos atravessadores,
figura constante na economia extrativista, pesqueira e agrícola da região.
Fazendo paralelo com a literatura recorrente à economia amazônica, um contraste é
perceptível, no que diz respeito à mobilidade e capacidade de agência do pequeno
produtor para com sua produção, tendo que se sujeitar às diversas configurações de
comércio do mercado externo, endividamento constante e permanente para com o patrão
do mesmo modo como autonomia de venda de seu produto. Em meio aos dados
recolhidos pela voz de Seu Joilson, total consciência sobre seu produto e o que fazer
com ele, eram características de seu pai, como diz que o próprio escolhia para quem
vender, escolhia para quem vendia mais, assim obtendo seu lucro que era usado na
construção ou reforma de sua casa, comprando suprimentos para os seus trabalhadores
na lavoura, alimento e afins para a família.
Algumas vezes era inevitável o endividamento com os patrões, mas ainda assim, esse
débito era tomado conscientemente, sendo resultado de uma ação que visava suprir
alguma necessidade mais urgente da família. Em relação com o que acontecia no
plantio, Seu Joilson relembra das brincadeiras em meio a lavoura da juta junto com
irmãos e primos, com o nível da água elevado e a planta alta, era fácil se esconder por
entre as plantas na brincadeira, muitas vezes levantando a ira do pai, por estarem em
uma área propícia ao ataque de muitos animais peçonhentos e inclusive do puraquê.
Com seu Guido Arruda, proprietário de Supermercados em Monte Alegre, foi possível
ter uma percepção menos turva sobre o universo da compra e da venda da juta, tendo-se
ideia da amplitude da rede de comércio que se estendia, como dito anteriormente, de
Juruti a Belém. Seu Guido conta que começou a trabalhar com a fibra de juta no ano de
1960, quando deixou a cidade de Monte Alegre e foi para o município de Prainha atrás
de emprego, ajudando um comerciante da região. A comunidade de Cuçari foi seu ponto
de partida na carreira da juta, aonde após certo tempo de trabalho viria a ser financiador
de pequenos produtores e intermediário de patrões de Belém e Santarém com os
agricultores do interior. Além disso, pegava dinheiro com o Banco para ajudar no
financiamento, se munindo dos seguros oferecidos pelo governo6 caso algo ruim viesse
a acontecer com a produção.
Da mesma forma como tinha sua produção em Cuçari, Seu Guido ajudava alguns
agricultores adiantando produtos de um comércio local ao qual era dono, financiando as
ferramentas para o trabalho na lavoura, suprindo em alguns momentos certas
necessidades urgentes de algumas famílias além de comprar a safra de outros pequenos
produtores para vender aos patrões com quem tinha acordos firmados. Desta forma,
observa-se que ao mesmo tempo em que Seu Guido pode ser classificado como patrão
na cadeia de produção, ele também trabalha para alguém que está acima dele mais
próximo do mercado externo e ciente dos acontecimentos gerais na região.
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Mais conhecidos como ProAgro, programas de seguro realizados pela EMATER dos municípios que
levava assistência aos produtores como forma de proteger a produção em caso de infortúnio com a
mesma.
Após a época da plantação da juta, a malva foi o que continuou a impulsionar a
economia local, sendo plantada nas áreas de várzea e de terra firme, ambas com o
intuito de se extrair a fibra, no ultimo caso sendo as plantas semeadas nas beiras de
igarapés e açudes de forma semelhante à margem do Amazonas.
Alguns nomes citados por seu Guido podem ajudar a vislumbrar o universo que era o
comércio da juta, tais como Coimbra; Marcos Pinto; Akata; Tuji. Estes eram de pessoas
as quais Seu Guido vendia sua safra juntamente com a juta que comprava em algumas
comunidades como atravessador ou regatão “periódico”, e assumia este papel devido
aos patrões pedirem para que o mesmo fosse nas comunidades produtoras comprar suas
safras, já que Seu Guida possuía certa credibilidade com tais produtores devido, como
ele mesmo diz, “saber administrar seus negócios e não ser muito ganancioso”,
respeitando os acordos que estabelecia de forma informal com todos os produtores e
patrões. Um ciclo que iniciava nos grandes centros compradores de juta no exterior,
seguindo em direção aos bancos financiadores juntamente com as políticas de
assistência aos grandes e pequenos produtores, indo para os patrões donos de posses nas
cidades e no interior que tinham também áreas de plantação de juta que compravam
muitas vezes a safra dos pequenos produtores financiados pelos patrões ou donos de
seus próprios negócios se verifica na fala de Seu Guido, que mostra claramente como as
relações eram estabelecidas nessa época onde o ouro da região era representado por uma
planta.
Desta maneira pode-se ver que a literatura referente ao tema não supre completamente à
realidade vivida por quem presenciou o “sistema de aviamento” em seu cotidiano,
preenchendo algumas lacunas oriundas deste, e ainda mais, fornecendo novas
possibilidades de pesquisa atentando para os produtores, que quebram com a lógica
mercantilista acerca da dominação e subjugação dos mesmos pelo mercado, tendo plena
consciência do sistema ao qual estão postos e liberdade de compra e venda de seu
produto.
Referências Bibliográficas:
ARAMBURU, Mikel. Aviamento, modernidade e pós-modernidade na Amazônia.
Revista Brasileira de Ciências Sociais. São Paulo, 1994, nº. 25, ano 9;
MCGRATH, David. Parceiros no crime: o regatão e a resistência cabocla na
Amazônia Tradicional. Novos Cadernos NAEA, vol. 2, nº 2, dezembro 1999;
SOUZA, Narda Margareth Carvalho Gomes. A Trajetória Da Companhia Têxtil De
Castanhal: a mais pura fibra da Amazônia. Dissertação (Mestrado) – Universidade
Federal do Pará, Núcleo de Altos Estudos Amazônicos, Programa de Pós-Graduação em
Desenvolvimento Sustentável do Trópico Úmido. Belém, 2008.
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