II Conferência Brasileira de Estudos em Comunicação e
Mercado – ECOM 2012
GT 2 – Comunicação de Mercado & Redes Sociais
O AGRAVAMENTO DA SITUAÇÃO DA TELEFONIA MÓVEL NO BRASIL
PELA FORÇA E ARTICULAÇÃO DOS ATORES SOCIAIS
Anelisa Maradei1
Jefferson Bassetto2
Resumo: O presente artigo tem por objetivo demonstrar que a articulação dos cidadãos nas
mídias sociais pode impelir as empresas a mudanças de atitude e maior comprometimento
social. Há uma nova dinâmica na propagação dos fatos e, por isso, o respeito ao consumidor e
a prestação de contas à sociedade nunca foi tão fundamental e estratégica para as
organizações. Investimentos em comunicação mercadológica, se não acompanhados por uma
gestão coerente com os anseios dos consumidores não alavancará a imagem de empresas
irresponsáveis com seu compromisso social. Para abordar o tema proposto, utilizaremos o
estudo de caso da recente suspensão, pela ANATEL, das atividades das operadoras de
telefonia móvel TIM, Claro e Oi.
Palavras-Chave: Telefonia Móvel, Mídias Sociais, Imagem, Reputação.
Introdução:
O presente trabalho tem por objetivo refletir sobre o recente episódio da punição que
foi imposta às operadoras de telefonia celular Claro, TIM e OI, levando essas organizações a
um agravamento da crise de imagem que já vinha se delineando em torno do segmento. A
partir do estudo deste caso, de revisão bibliográfica e de pesquisas nas mídias sociais, sites de
notícias e nos veículos de imprensa de grande projeção no País, buscaremos refletir sobre
alguns aspectos das relações entre consumidores e as organizações na contemporaneidade.
No dia 18 de julho de 2012, a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel)
anunciou a suspensão da venda de linhas da Claro, Oi e TIM. O motivo da medida foi o
1
Anelisa Maradei, mestranda em Comunicação na Universidade Metodista de São Paulo, especialista
Comunicação pela Escola Superior de Propaganda e Marketing, em Gestão da Comunicação pela Escola de
Comunicação e Artes da Universidade de São Paulo e graduada em Jornalismo pela Universidade Metodista de
São Paulo.
2
Jefferson Bassetto, mestrando em Comunicação na Universidade Metodista de São Paulo, especialista em
marketing na ISAE/FGV e graduado em Administração pela Universidade Estadual de Londrina .
aumento das reclamações de usuários. A punição não foi homogênea para todo o País,
conforme demonstra o mapa a seguir. Em cada Estado do Brasil, foi punida a empresa com o
maior número de reclamações. Segundo dados apurados em matéria publicada no jornal O
Estado de S. Paulo3, a Oi foi proibida de vender chips em cinco Estados. Já a Claro foi punida
em três Estados, entre eles São Paulo, e a TIM, com o maior corte, foi suspensa em 19
Estados, conforme demonstrado abaixo:
As medidas entraram em vigor no dia 23 de julho e, a partir de então, as referidas
operadoras tiveram 30 dias para apresentar um plano de investimento à Anatel, o que foi feito
para que retomassem suas atividades. Em caso de descumprimento da medida punitiva, as
empresas arcariam com uma multa diária de 200 mil reais.
Panorama do Segmento:
Apesar da privatização do setor de telefonia, ocorrida na década de 90 com a proposta
de melhorar os serviços nessa área, na última década, as grandes telefônicas continuaram no
topo da lista de insatisfação do consumidor. Das três empresas mais reclamadas do País nos
últimos 12 meses, no site www.reclameaqui.com.br4, a primeira e a terceira são de telefonia
móvel. Na verdade, o relacionamento entre consumidores e empresas de telefonia vem
3
http://economia.estadao.com.br/noticias/economia,anatel-suspende-venda-de-chips-de-claro-oi-etim,119671,0.htm
4
http://www.reclameaqui.com.br/ranking/
passando por percalços no decorrer dos últimos anos, seja por problemas na oferta de
serviços, por falhas no atendimento ao cliente ou cobranças indevidas. O que parece ser a
causa principal desse cenário é o fato de termos chegado a uma equação nada favorável ao
consumidor desses serviços: muito cliente para pouco investimento.
Segundo dados publicados pela Revista Exame, com matéria intitulada: “Pane na
Telefonia” 5, de 2000 para cá, a receita das operadoras de telecomunicações no país aumentou
237%. Os investimentos do setor, por outro lado, não acompanharam a explosão da demanda
e cresceram apenas 63%. Como resultado, o Brasil está bem atrás do mundo no que tange à
telefonia móvel. Ao lado da eletricidade, o setor de telecomunicações é um dos pilares da
economia moderna. Difícil imaginar a vida sem o uso da telefonia móvel. Porém, as
manifestações exacerbadas dos consumidores têm demonstrado uma realidade preocupante
nesse segmento. Mas, para entender o que há de errado no setor de telecomunicações, é
preciso rememorar alguns fatos históricos.
De acordo ainda com a mesma matéria da Revista Exame, citada anteriormente, as
empresas que venceram as privatizações no final da década de 90 herdaram estruturas
sucateadas, com redes de transmissão e cobertura pouco ou nada eficientes. Os investimentos
realizados após a privatização permitiram que o Brasil saísse de 4,5 milhões para mais de 250
milhões de linhas de celulares em junho de 2012, chegando a uma penetração de 130%,
crescimento superior ao verificado na China e na Índia nos últimos cinco anos - essa foi a boa
notícia. A má notícia é que esse crescimento não veio acompanhado por investimentos
proporcionais, o que levou a total insatisfação dos consumidores em relação a esse segmento
da economia. A partir de 2009, as operadoras, alavancadas pela TIM, embarcaram em uma
ferrenha disputa de mercado. Enquanto as empresas se atropelavam em busca de clientes, as
redes foram se sobrecarregando. Segundo cálculos da Anatel, divulgados na mesma
reportagem, será preciso realizar um investimento de 380 bilhões de reais em infraestrutura
para o segmento alcançar a normalidade.
Esse cenário levou o setor a uma crise de imagem junto aos consumidores, que
passaram a reclamar e se mobilizar contra as operadoras de telefonia móvel. No mês de junho
de 2012, o Procon São Paulo divulgou um balanço sobre o elevado número de reclamações
contabilizadas pelo segmento. As três operadoras punidas apareciam entre as empresas que
mais recebem queixas dos consumidores no Estado de São Paulo. De janeiro a julho de 2012,
5
Revista Exame, edição 2012, de 8/8/2012
segundo reportagem publicada pelo jornal O Estado de S. Paulo6 , a Claro figurava como a
terceira companhia mais reclamada no estado, com 2.320 queixas. A TIM aparecia em sexto
lugar, com 1.682 reclamações, e a Oi, em 11º, com 1.164 queixas. A cobrança indevida era o
problema mais recorrente entre as três companhias.
Saindo do estado de São Paulo, sem dúvida bastante representativa para o segmento, e
lançando nosso olhar para o panorama geral brasileiro, o setor de telefonia celular foi o que
mais recebeu reclamações em todos os Procons do país no primeiro semestre de 2012. Foram
mais de 78.000 queixas, a telefonia celular vem seguida pelos setores de cartão de crédito, em
segundo lugar, e pelos bancos comerciais, em terceiro segundo a Revista Exame. Nos últimos
cinco anos, o número de reclamações contra as operadoras de telefonia fixa e celular na
Anatel dobrou, saltando de 0,7 milhões, em 2007, para 1,4 milhão em 2011, um crescimento
de 100%, conforme a mesma revista.
Novos consumidores pedem novas posturas
A situação a que chegaram as operadoras foi, na realidade, uma verdadeira “tragédia
anunciada”, seja pelos índices de insatisfação de clientes apurados pelos Procons dos estados,
pelas manifestações postadas no Reclame Aqui, ou ainda por meio dos comentários, hora
irritados, hora satíricos feitos pelos cidadãos nas redes sociais. O fato é que, os consumidores
da atualidade estão cobrando das organizações novas posturas.
Esses atores sociais, mais conscientes, informados e emancipados exigem, cada vez
mais, a prestação de contas por parte das empresas e medidas efetivas na solução de
problemas que afetem a sociedade. Como sugere Almeida
[...] Os distintos segmentos de público estão mudando de perfil e comportamento,
tornando-se cada vez mais exigentes. Construir relações que sejam estabelecidas
em parâmetros que gerem valor para os stakeholders e que sejam percebidas como
alinhadas às suas expectativas, torna-se fator de extrema importância para as
organizações. (apud Kunsch, 2009, vl 2, p.216)
A sociedade em que as organizações contemporâneas estão inseridas é uma sociedade
dinâmica, competitiva, de atores sociais atuantes, protagonistas do processo de comunicação
com as empresas. As organizações, hoje, não são mais avaliadas somente pelo seu patrimônio
palpável, mas também, e principalmente, por seus recursos intangíveis. Esse cenário tem sido
6
http://economia.estadao.com.br/noticias/economia,anatel-suspende-venda-de-chips-de-claro-oi-etim,119671,0.htm
modificado, porque estamos diante de um consumidor cada vez mais exigente, bem
informado, que demanda produtos e serviços cada vez melhores e um atendimento excelente.
A conduta ética e responsável das empresas é cobrada como nunca pelos atores sociais
e as operadoras de telefonia não souberam ouvir esse clamor e ajustar seus processos em favor
da estruturação de seus negócios no mercado brasileiro. O fato é que a responsabilidade
corporativa nunca esteve tão em pauta. As empresas estão tendo que se reinventar neste novo
ambiente de transparência e ativismo social, tão radicalmente diferente daquele em que elas
operavam até pouco tempo. Sob esse ponto de vista, a imagem e a reputação, conceitos que
nos interessam particularmente neste trabalho, constituem-se absolutamente fundamentais
para as organizações contemporâneas.
Embora alguns autores utilizem os conceitos de imagem e reputação organizacional
como sinônimos, há outros que estabelecem uma precisa diferença entre os termos.
Compartilhamos da percepção desse segundo grupo. De acordo Almeida (apud Kunsh, p.
232), a imagem difere da reputação na medida em que a primeira está relacionada “às
opiniões mais recentes” do público acerca de determinada organização, ao passo que a última
representa um julgamento de valor sobre suas qualidades, sendo “construída ao longo do
tempo”.
Para Bueno (2009, p.189) “A imagem corporativa é a representação mental de uma
organização construída por um indivíduo ou grupo por meio de percepções e experiências
concretas (os chamados “momentos de verdade’), informações e influências recebidas de
terceiros ou da mídia”. Por outro lado, para o autor, a reputação seria:
Uma representação mais consolidada, mais amadurecida de uma organização,
embora, como a imagem, constitua uma percepção, uma síntese mental.
Poderíamos dizer que a reputação é uma leitura mais aprofundada, mais nítida,
mais intensa de uma organização e que, na prática, apenas um número reduzido de
organizações chega a ser contemplado com tal nível de representação (BUENO,
2009, p.190).
Percebe-se que os dois autores acreditam que a reputação é mais ampla e, assim, um
status mais difícil de ser alcançado. Para Almeida (in Kuncsh vl 2 p.232), “A reputação pode
ser entendida como um crédito de confiança adquirido pela empresa, estando esse crédito
associado a um bom nome, familiaridade, boa vontade, credibilidade e reconhecimento”.
Nessa perspectiva, uma reputação negativa pode significar crédito limitado, como é o caso do
que presenciamos com as operadoras de telefonia em nosso país, que amargam problemas de
imagem e reputação desde antes da privatização. Essas companhias conseguiram uma
melhora de percepção em meados dos anos 2000 e, agora, voltam à berlinda, com o aumento
de reclamações junto aos órgãos de defesa do consumidor, problemas no fornecimento e
qualidade dos serviços e protestos frequentes dos atores sociais nas mídias sociais.
O que nos parece ter sido um erro estratégico por parte das operadoras foi subestimar a
capacidade dos clientes de lutar por seus direitos e se levantar contra as organizações. O
caminho percorrido pelas operadoras de telefonia móvel nos últimos anos para tentar
preservar a imagem e a reputação, foi a publicidade e a propaganda. Não nos contrapomos à
percepção de que investimentos em comunicação mercadológica são poderosas ferramentas
para disseminar uma boa imagem. Não negamos a importância e o poder da mídia no
processo de construção de imagem e reputação, seja positiva ou negativa. Porém, acreditamos
que, para ser percebida positivamente, a empresa deve ir além, adotando uma política clara,
transparente e coerente de gerenciamento de seus processos, respeito pelos seus mais diversos
públicos, oferecendo produtos e serviços de qualidade, prestando um atendimento excelente
etc. Ainda na visão de Almeida (in Kunsh vl 2, p. 230): “[...] o processo de comunicação não
consegue sustentar uma imagem que não esteja alinhada ao comportamento e às ações
empreendidos pela organização”.
As propagandas veiculadas pelas companhias, como Claro, TIM, Oi e Vivo, podem ser
conferidas nos horários nobres da principal emissora do país, a Rede Globo de televisão.
Segundo ranking do Ibope Monitor, realizado no período de janeiro a julho de 2011, e que
apresentava os 30 maiores investidores em publicidade no Brasil, as referidas operadoras
eram os principais anunciantes do País. A 16ª posição, segundo o levantamento, ficou para a
TIM; a 20ª. para a VIVO; a 22ª. para a Oi, e, por fim, a Claro figurou na 24ª. colocação.7
A divulgação feita por meio dos meios de comunicação de massa pode ser direcionada
pelas empresas, que disseminam, assim, mensagens favoráveis sobre seus produtos e serviços,
como é o caso da TIM que utiliza o seguinte slogan: “Você, sem fronteiras”, propondo que a
empresa trabalha para que o cliente possa se comunicar mais e melhor, em qualquer parte. É
importante ressaltar, no entanto, que se as mensagens não forem coerentes com a forma de
atuação, a percepção dos consumidores pode se manter alinhada a sua experiência real com
essas empresas, como o que detectamos no decorrer de nossas pesquisas, especialmente em
manifestações dos consumidores contra as operadoras nas mídias sociais.
7
Ibope divulga ranking dos 30 maiores anunciantes do Brasil. Disponível em:
<http://portalimprensa.uol.com.br/cdm/caderno+de+midia/43552/ibope+divulga+ranking+dos+30+maiores+anu
nciantes+do+brasil/> Acesso em 13 de ago. de 2012.
Apesar dos altos índices de investimento em campanhas de comunicação
mercadológica, as operadoras figuram, como já demonstrado, como líderes de reclamações
nos órgãos de defesa do consumidor. A imagem das empresas e de todo o segmento de
telefonia, bem como do de cartões de crédito e dos bancos, setores com maiores índices de
reclamação auditados pelo Procon Nacional, está associada à desconfiança, falta de respeito
ao cliente e de compromisso social.
E foi nesse contexto que as operadoras tornaram-se, nos últimos meses, alvo de
protestos nas mídias sociais, levando o setor ao agravamento de uma crise que já vinha se
processando em seus call centers. Essas empresas parecem não ter percebido que atender bem
o cliente é tão importante quanto à qualidade do produto ou serviço, que também não deve ser
negligenciada. O que fica claro é que essas empresas não souberam evitar a eclosão da grave
crise de imagem deflagrada em julho. Não foram capazes de detectar e assumir, em tempo
hábil, seus pontos fracos, aqueles suscetíveis à exposição negativa.
Esses pontos fracos estão atrelados ao péssimo tratamento oferecido por essas
organizações a seus clientes em seus serviços de atendimento ao cliente. Como propõe Lucas
(2004, p.377) o “antes” fala muito sobre uma empresa e, dessa maneira, pode fazer com que a
transição por um período de crise seja menos custosa. No caso das operadoras, os maus tratos
aos clientes pré-crise só fizeram com que os consumidores apoiassem a decisão da Anatel.
Mas, mais que isso, é importante observar que a falta de estrutura das operadoras para abarcar
o crescimento do número de clientes gananciosamente prospectados na última década também
levou ao colapso na telefonia móvel.
O número de linhas de celular, segundo dados
publicados pela Revista Exame, saltou de 23(vinte três) milhões, em 2000, para 256 milhões
em 2012.
Tal descaso ao consumidor, atrelado ao fato de que a sociedade em que as
organizações contemporâneas estão inseridas é uma sociedade competitiva, dinâmica, de
atores sociais atuantes, protagonistas do processo de comunicação com as empresas, levou Oi,
TIM e Claro à situação de crise, pelas recorrentes críticas sofridas nas mídias sociais. As
mídias, aliás, em suas novas configurações, estão perdendo lugar de auxiliares e passando a se
constituir como uma referência no modo de ser da própria sociedade, auxiliando nos
processos de interação entre as empresas e os cidadãos, como o que é detectado das redes
sociais, especialmente no Facebook e Twitter. E foi exatamente isso que assistimos no
presente episódio.
Castells (2003, p.28) afirma que “Esperava-se que a Internet fosse um instrumento
ideal para promover a democracia – e ainda se espera”. Numa visão otimista, e contestada
por muitos autores, ele aposta na internet como espaço para ampliar o poder dos cidadãos, um
espaço onde os atores sociais podem soltar a voz contra atos questionáveis das organizações,
ou mesmo para apurar fatos, sugerir ajustes diante de situações que não correspondem ao que
se espera das empresas.
Na atualidade, a interatividade torna possível aos cidadãos solicitar informação,
expressar opiniões e pedir respostas pessoais às organizações. Um ponto importante a se notar
é que, ao contrário de algumas previsões pessimistas de que a internet poderia causar a
alienação do mundo real, a interação social na internet parece intensificar as relações sociais
já existentes. Como sugere Castells (2003 p.99-100): “a internet foi apropriada pela prática
social em toda a sua diversidade, embora essa apropriação tenha efeitos específicos sobre a
própria prática social”. O autor argumenta ainda que a internet: “é uma extensão da vida
como ela é, em todas as suas dimensões e sob todas as suas modalidades”. Galindo (2012,
p.7), alinhado a esta perspectiva, aponta que:
[ ...a cada momento nos deparamos com sinais emitidos por um consumidor que
demonstra ter consciência de seu papel nos processos de troca e não
necessariamente responde de forma simplista ou mecânica ao jogo de sedução das
corporações que ainda insistem em formulas comportamentais behavioristas e
ignoram o poder do comportamento coletivo, resultante não apenas da repetição de
gestos individuais, mas também das mediações entre os atores sociais.]
(GALINDO, p. 7, 2012)
Nesse sentido, a lógica contida na Web, ao facilitar a participação democrática de
todos os interlocutores presentes em espaços como o Twitter, Facebook, Youtube, e ao
propiciar a interação direta e visível a qualquer um que acesse esses ambientes, potencializa a
imprevisibilidade dos fenômenos que ali se processam, como pudemos notar nas
manifestações abaixo postadas nessas mídias e, posteriormente, divulgadas na grande
imprensa8·, com a repercussão da suspensão das atividades das operadoras pela Anatel.
8
http://tecnologia.uol.com.br/album/2012/07/18/usuarios-de-telefonia-celular-fazem-piadas-na-web-comfalta-de-servico-confira.htm#fotoNav=15
http://exame.abril.com.br/tecnologia/album-de-fotos/claro-oi-e-tim-viram-piada-na-internet
Como podemos notar, os consumidores dos dias atuais parecem preferir estar
conectados com outros consumidores a estar conectados com as organizações e seus discursos
oficiais. Isso tem feito com que haja, cada vez mais, uma perda do controle que outrora as
empresas tinham em processos de crise de imagem. Em outros tempos, em um deserto de
informações, elas estavam mais próximas do comando, podiam direcionar suas propagandas a
seu favor, sem grandes espaços para contestação e debates. Agora, a situação é outra. Graças
às transformações propiciadas pelas novas tecnologias da informação, os consumidores estão
cada dia mais emancipados.
É importante observar, que os consumidores não são passivos no consumo de ideias,
valores e produtos e não estão dispostos a absorver as imposições do mercado, como alguns
teóricos da Escola de Frankfurt propõem. Como bem ressalta Michel de Certeau (2008, p.19):
“Sempre é bom recordar que não se devem tomar os outros por idiotas”. O autor considera
ser um erro supor que o consumo de ideias, valores e produtos pelos anônimos sujeitos do
cotidiano é uma prática passiva, uniforme, feita de puro conformismo às imposições do
mercado e dos poderes sociais e propõe que existem sempre apropriações e ressignificações
imprevisíveis, incontroláveis, modificadoras de pretensões previstas na origem, no
planejamento, na idealização das coisas.
Nesse cenário, o que as organizações informam por meio de propaganda é
questionado, especialmente nas mídias sociais, pelos cidadãos fortalecidos.
[...] a audiência deve ser vista como uma entidade ativa, que procura aquilo que
quer, que rejeita assim como aceita ideias formuladas pelos meios de comunicação,
que interage com os membros de seus grupos sociais, e que testa a mensagem
transmitida pelos meios, falando sobre elas com outras pessoas e comparando o
conteúdo de um meio com o de outros. (TORQUATO, 1986, p. 21)
Alinhando-se à Torquato, Certeau, e outros autores, Noedström e Ridderstrale também
salientam que a visão do consumidor/cliente passivo, manipulado e à mercê das organizações
já não encontra espaço em nossa sociedade. Os autores nos propõem que:
[...] O cliente, o funcionário e o cidadão crédulos, fiéis e humildes não existem
mais. Os eleitores estão desafiando os políticos; os subordinados estão desafiando
os gerentes; os estudantes estão desafiando os professores; os pacientes estão
desafiando os médicos; os filhos estão desafiando os pais; os clientes estão
desafiando as empresas; e as mulheres estão desafiando os homens [...] Agora o
poder pertence às pessoas. (NOEDSTRÖM; RIDDERSTRALE, 2001, p.46)
Isso é uma realidade irrefreável. Os cidadãos da contemporaneidade não estão mais
submetidos a uma mediação centralizada pelos canais oficiais e tradicionais de comunicação
em processos de divulgação de mensagens das organizações. Há uma nova dinâmica na
propagação dos fatos e, por isso, o respeito ao consumidor e a prestação de contas à sociedade
nunca foi tão fundamental e estratégica. É pelas mãos dos cidadãos, muitas vezes, que as
empresas, os políticos, figuras públicas, ONGs etc têm seus episódios críticos divulgados e
suas condutas e práticas questionadas. Como sugere Maria José da Costa Oliveira (apud
Farias, p. 85,2011): “Ele deixa de ser objeto e passa a ser sujeito; deixa de ser receptor e
passa a ser interlocutor; deixa de ser público e passa a ser agente social”.
Sendo assim, é questão vital para as organizações agir com transparência e agilidade, o
que não ocorreu no caso das operadoras de telefonia aqui analisadas, que optaram pelo
descaso e pela inércia. As empresas podem, como propõe Lucas (2004, p.18), “oferecer fatos
que demonstrem seu visível comprometimento com soluções para o problema. Quanto mais a
empresa mergulhar na inércia, mais o que ficará em evidência é o ônus crescente que ela
produziu para a sociedade”. Por outro lado, levar em conta os anseios de esclarecimento da
sociedade pode minimizar o impacto negativo de uma tragédia anunciada, como a que
culminou com as medidas drásticas tomadas pela Anatel em julho de 2012.
Considerações Finais:
Não poucos os exemplos de empresas expostas negativamente na mídia. Somente em
2011, tivemos notícia de crises vivenciadas por organizações como: Zara, Arezzo, Playcenter,
Chevron , Brastemp , entre outras. Esse ano, somente em julho, as operadoras de telefonia
móvel foram surpreendidas (mas nem tanto) pela decisão da Anatel e, no mesmo período, a
Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) suspendeu o direito de comercialização de
268 planos de saúde, administrados por 37 operadoras, por descumprimento de prazos
estabelecidos pela agência para atendimento médico, realização de exames e internações 9.
Mas, se pode ser considerada uma vitória para o consumidor, num campo de batalha
que ainda tem muitas etapas a serem vencidas, a reação da Anatel, nosso objeto de estudo, foi
tardia. Embora comemorada por alguns segmentos da sociedade, ela é uma medida paliativa e
que, se não for levada adiante, levará o País ao sério risco de ver, por exemplo, uma pane do
setor durante a Copa do Mundo em 2014, pelo aumento do número de usuários durante o
evento.
A agência reguladora, nesse sentido, não tem tido a força necessária para ajudar a
colocar o setor nos eixos, afinal, um bom regulador não é o que pune, mas o que fiscaliza e
evita problemas ao cidadão e à sociedade. Assim, se por um lado a decisão da Anatel no dia
18 de julho de proibir a venda de serviços de dados e voz das operadoras repercutiu
positivamente entre os usuários insatisfeitos, por outro a medida veio, tardiamente, coroar um
clamor que já vinha sendo propagado via redes sociais há algum tempo.
As operadoras têm investido em campanhas milionárias de mídia de massa para captar
clientes, mas se esqueceram de que, por outro lado, esses mesmos clientes querem ser bem
atendidos e exigem que as promessas realizadas via meios de comunicação sejam cumpridas.
Em termos de divulgação, ou seja, manifestação visual da realidade, essas empresas tem sido
bem-sucedida, tendo em vista o grande contingente de clientes que elas têm conseguido atrair
nos últimos anos. Em 10 anos houve um aumento de1013%, diante de um investimento no
setor que cresceu apenas 63%, conforme dados apresentados pela Revista Exame.
Resultado: hoje, nome, logomarca, produtos e serviços dessas companhias são
conhecidos, porém, não são reconhecidos. Queremos ressaltar com isso que no quesito de
9
http://g1.globo.com/economia/noticia/2012/07/ans-impede-que-268-planos-de-saude-facam-novasvendas.html
manifestação via propaganda essas operadoras tem trabalhado arduamente. Porém, a prática
não tem refletido a excelência prometida por essas organizações. E, aí, elas se colocam em
uma complicada zona de risco. Como sugere Argenti (2006, p. 81), “a identidade é um
conjunto de esforços que parte da organização, mas a imagem é a organização sob o ponto
de vista de seus diferentes públicos”. E essa imagem, no caso das operadoras de telefonia, não
anda nada bem.
Para Argenti (2006, p. 95), “A imagem de qualquer organização é uma função de
como os diferentes públicos percebem essa organização com base em todas as mensagens
que ela envia”. E o mau atendimento, não podemos nos enganar, é uma mensagem que atinge
negativamente os clientes. Na verdade, os públicos geralmente têm percepções sobre uma
organização antes mesmo de começar a interagir com ela. Mas, a partir do momento em que
passam a se relacionar com a empresa, querem ter uma boa experiência com seus produtos e
serviços. E, a partir desse momento, não há campanha de comunicação mercadológica que o
satisfaça ou iluda.
Mas, se é inegável que existem problemas, como os serviços de qualidade duvidosa e
os preços inflados pelos altos impostos, por outro lado, a mudança desse cenário passa por
medidas mais abrangentes do que as adotadas pela Anatel. Seria necessária a formulação de
políticas públicas e uma fiscalização mais rigorosa da operação dessas empresas. Esperar que
os problemas se agravem, para, só então, aplicar punições, não parece ser o melhor caminho a
ser trilhado, pois, para chegarmos aos números de reclamações aqui apresentadas, com
certeza, muito prejuízo foi causado ao consumidor brasileiro, seja em dinheiro, tempo ou
energia para tentar solucionar pendências com as operadoras. A Anatel, antes mesmo de
chegar à medida punitiva, deveria ter exercido seu papel regulador e cobrado e avaliado
projetos de ampliação e modernização, calculando a cobertura, medindo a intensidade do
sinal, detectando indícios de congestionamento, advertindo as operadoras para a melhoria do
tratamento aos usuários, exigindo investimento adequado antes de qualquer expansão.
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