3 a 6 de novembro de 2009 - Londrina – Pr - ISSN 2175-960X INTERAÇÕES EDUCATIVAS ENTRE PROFESSOR E ALUNOS COM NECESSIDADES EDUCACIONAIS ESPECIAIS INCLUÍDOS NA ESCOLA REGULAR. Autor (es): CLÁUDIA SOLANGE ROSSI MARTINS1 ZILDA APARECIDA PEREIRA DEL PRETTE2 UFSCAR – Universidade Federal de São Carlos - SP Introdução No campo da Educação Especial, a literatura revela a preocupação por parte das políticas públicas em superar as práticas discriminatórias para com seus alunos e a atuação das escolas em assumir o espaço central no debate sobre o seu papel na superação da exclusão, a fim de que todos os alunos tenham suas especificidades atendidas. Entretanto, vê-se também que mesmo com uma perspectiva conceitual no sentido da criação de sistemas educacionais inclusivos que garantam o acesso de todos os alunos e os apoios necessários para sua participação e aprendizagem, as políticas implementadas pelos sistemas de ensino ainda não alcançaram esse objetivo. A situação tende a se agravar quando as atenções se voltam para o aspecto das interações interpessoais entre o professor e seus alunos com ou sem necessidades educacionais especiais, por saber que nas práticas tradicionais de ensino as interações se dão quase que exclusivamente entre o professor e a classe e em menor freqüência entre professor e alunos específicos. Neste contexto, as interações sociais entre os alunos são geralmente vistas como um obstáculo, um indicador de indisciplina que, muitas vezes, os professores utilizam como justificativa para manter um padrão ritualístico de prática pedagógica. Com o propósito de auxiliar o professor em sua prática pedagógica, investigações têm sido desenvolvidas quanto à identificação e promoção de comportamentos que favorecem o processo de ensino1 Doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Educação Especial da Universidade Federal de São Carlos (UFSCAR); Mestre em Educação pela Universidade Federal do Amazonas (UFAM); Especialista em Supervisão Escolar e em Metodologia do Ensino Superior; Graduada em Pedagogia. Docente das Faculdades Integradas Adventistas de Minas Gerais (FADMINAS). Endereços: Rua Joaquim Gomes Guerra, 590. Bairro Kennedy – Lavras – MG. CEP 37.200-000. E-mail: [email protected] 2 Pós-doutora em Psicologia das Habilidades Sociais na Universidade da Califórnia; Doutora em Psicologia pela Universidade de São Paulo; Mestre em Psicologia pela Universidade Federal da Paraíba; Graduação em Psicologia pela Universidade Estadual de Londrina. Atualmente é professora titular da Universidade Federal de São Carlos e pesquisadora nível I do CNPq. Endereços: Via Washington Luiz km 235, Dep. Psicologia, 13 560 São Carlos - SP - Fone 16-33518447. E-mail: [email protected] 1788 3 a 6 de novembro de 2009 - Londrina – Pr - ISSN 2175-960X aprendizagem, quanto à caracterização da interação professor-aluno a partir de categorias relacionais, e quanto à análise da funcionalidade desse desempenho. Método Participarão deste estudo (20) vinte professores da Educação Básica (1º ao 5º ano) de escolas regulares consideradas inclusivas, na cidade de Lavras – MG. Os professores serão selecionados a partir de um levantamento prévio por parte da pesquisadora de quais escolas do sistema regular de ensino municipal têm registro de alunos com NEE matriculados. Com base neste registro buscar-se-á um número representativo da população de professores da cidade de Lavras - MG que tenham em sua classe regular pelo menos um aluno que apresente NEE – Conforme a Declaração de Salamanca (BRASIL, 1994). Para a coleta dos dados, serão utilizados como instrumentos: (1) Protocolo de Caracterização dos Professores (Anexo A); (2) Instrumento de avaliação socioeconômica (Critério Brasil) (Anexo B); (3) Carta de Apresentação (Anexo C); e (4) Questionário de Relações Interpessoais – QRI (Anexo D) (DEL PRETTE e DEL PRETTE, 2007b) - com algumas adaptações feitas pela pesquisadora, com permissão dos autores. A carta de apresentação identifica o Departamento e a Universidade nos quais a pesquisa está subordinada e também o tema a ser estudado. Finaliza com um pedido de participação (do professor) no estudo, fornecendo as respostas solicitadas no questionário. O questionário para a coleta de dados inicia abrangendo as questões 2 e 3 inseridas em uma mesma tabela a fim de oportunizar ao professor apontar os comportamentos que ocorrem em sua sala de aula em situações de interação, bem como as estratégias que utiliza para melhorar as relações interpessoais. Os comportamentos já estão relacionados nas questões de 1 a 13. O professor deve assinalar com um (X) aqueles que ocorrem em uma semana típica na sua sala de aula em suas interações com um dos seus alunos que apresentam alguma NEE. Para cada item, o professor irá então indicar (a partir de alternativas dadas), a(s) estratégia(s) que utiliza para lidar com este aluno por ele ‘escolhido’ em cada uma das situações de interação. Este estudo será elaborado de acordo com as Diretrizes e Normas Regulamentadoras de Pesquisas Envolvendo Seres Humanos, conforme a Resolução 196/96 (CNS), e submetido ao Comitê de Ética e Pesquisa da Universidade Federal de São Carlos, a fim de obter a permissão para a realização da mesma. Quanto ao tratamento dos dados obtidos, serão analisados em termos descritivos por meio do teste de correlação de Sperman (COZBY, 2003). Com vistas a um maior entendimento das relações estabelecidas entre alunos com NEE incluídos em sala de aula regular e seus professores, tem-se como objetivos: ( I ) Caracterizar aspectos da interação professor e o aluno com (NEE) incluídos em sala de aula institucionalmente considerada inclusiva no sistema regular de ensino, a partir do relato destes professores; e ( II ) Identificar possíveis práticas educativas relatadas pelos professores em situações de interação com seus alunos que apresentam NEE incluídos em sala de aula regular. Resultado (esperado) A presente pesquisa está em andamento. Na 1ª semana de Novembro /2009 será possível divulgar os resultados, com base nos dados obtidos e analisados. Com vistas a um maior entendimento das relações estabelecidas entre alunos com NEE incluídos em sala de aula regular e seus professores, os resultados esperados com este estudo 1789 3 a 6 de novembro de 2009 - Londrina – Pr - ISSN 2175-960X são: 1 - Caracterizar aspectos da interação professor e o aluno com (NEE) incluídos em sala de aula institucionalmente considerada inclusiva no sistema regular de ensino, a partir do relato destes professores; e II - Identificar possíveis práticas educativas relatadas pelos professores em situações de interação com seus alunos que apresentam NEE incluídos em sala de aula regular. Discussão (prévia) Nas últimas décadas, falar/defender e pregar a inclusão de todas as pessoas têm tido grande espaço nas discussões em geral na sociedade (FERREIRA, 2007). Nunca se falou tanto na importância da participação de minorias sociais, em ambientes antes reservados apenas àqueles que se enquadravam nos ideários preestabelecidos e perversos de força, beleza, riqueza, juventude, produtividade e perfeição. Segundo Mendes (2006), o princípio da inclusão passa a ser defendido como uma proposta da aplicação prática, ao campo da educação, de um movimento mundial denominado inclusão social, que implicaria a construção de um processo bilateral, no qual as pessoas excluídas e a sociedade buscam em parceria, efetivar a equiparação de oportunidades para todos, construindo uma sociedade democrática na qual todos conquistariam sua cidadania, a diversidade seria respeitada e haveria aceitação e reconhecimento político e social das diferenças. As dificuldades enfrentadas nos sistemas de ensino evidenciam a necessidade de confrontar as práticas discriminatórias e criar alternativas para superá-las. Para tanto, a educação inclusiva assume espaço central no debate acerca da sociedade contemporânea e do papel da escola na superação da exclusão para que todos os alunos tenham suas especificidades atendidas (MEC/ SEESP, 2007). Assim, com o objetivo de atender à diversidade, a instituição educacional busca oferecer uma educação de acolhimento, mais humanitária e mais justa ao aluno, com foco em suas habilidades e não em suas deficiências, que incorpora conceitos como interdisciplinaridade, individualização, colaboração e conscientização/sensibilização na promoção de condições viáveis e satisfatórias de acesso e a permanência na escola de todos os alunos que apresentam necessidades especiais, fazendo dessa inclusão uma experiência positiva para todos (FERREIRA, 2007). O termo "necessidades educacionais especiais" refere-se a todas aquelas crianças ou jovens cujas necessidades educacionais especiais se originam em função de deficiências ou dificuldades de aprendizagem. Muitas crianças experimentam dificuldades de aprendizagem e portanto possuem necessidades educacionais especiais em algum momento durante a sua escolarização (BRASIL, 1994). A Política Nacional de Educação vem realizando várias ações que visam ao processo de inclusão dos alunos com necessidades educacionais especiais (MEC, 2003). Uma delas é a criação de espaços para que esta mudança de perspectiva social ocorra, ou seja, a Escola Inclusiva. Tal escola deve acomodar todas as crianças independentemente de suas condições físicas, intelectuais, sociais, emocionais, lingüísticas ou outras – incluindo as deficientes e superdotadas [...] e garantir que estas crianças tenham o direito de expressar seus desejos com relação à sua educação, da forma mais adequada às suas necessidades, circunstâncias e aspirações (BRASIL, 2005). Esse processo de inclusão dos alunos no cotidiano das salas de aula é um desafio muito grande para a escola, tendo em vista que cabe a ela a função de atender educacionalmente, com qualidade, todos os alunos nela matriculados e inclusive os alunos com necessidades educacionais especiais. Na década passada, promovida pelo Governo da Espanha e pela UNESCO, foi realizada a Conferência Mundial sobre Necessidades Educacionais Especiais culminando com a 1790 3 a 6 de novembro de 2009 - Londrina – Pr - ISSN 2175-960X produção da Declaração de Salamanca (BRASIL, 1994). Com relação às práticas inclusivas, a Declaração proclamou que: toda criança tem direito fundamental à Educação e à oportunidade de atingir e manter o nível adequado de aprendizagem; toda criança possui características, interesses, habilidades e necessidades de aprendizagem que são únicas e por isso requerem a implementação de programas educacionais no sentido de se levar em conta esta diversidade de características e necessidades; aqueles com necessidades educacionais especiais devem ter acesso à escola regular que possua orientação inclusiva por ser esta o meio mais eficaz de combater atitudes discriminatórias e de acomodar seus alunos dentro de uma pedagogia centrada na criança, capaz de satisfazer a tais necessidades (BRASIL, 1994). Neste mesmo sentido, Ferreira (2005) defende que a Educação Inclusiva não diz respeito somente às crianças com deficiência, cuja grande maioria no Brasil ainda permanece fora das escolas, mas a todas as crianças que enfrentam qualquer tipo de barreira, como a de acesso à escolarização ou de acesso ao currículo - que levam ao fracasso escolar e à exclusão social. A autora ainda define como grupos sociais de exclusão, aqueles constituídos de jovens e crianças que vivem nas ruas, que sofrem maus-tratos e violência doméstica, crianças e jovens com deficiência, meninas que são levadas a se prostituírem, crianças e jovens com o vírus do HIV/ AIDS, com câncer ou outra doença terminal, crianças e jovens que estão em conflito com a lei, crianças negras e indígenas e outros grupos que, por razões distintas, sejam produto da desigualdade social e econômica e, principalmente sejam objeto de discriminação e preconceito dentro e fora das escolas. Nesta perspectiva da Educação Inclusiva, a Educação Especial passou a integrar a proposta pedagógica da Escola Regular e contribuiu nesse processo, promovendo o atendimento às necessidades educacionais especiais de alunos com deficiência, transtornos globais de desenvolvimento e altas habilidades/superdotação. Porém, o que se sabe é que, mesmo com uma perspectiva conceitual que aponte para a organização de sistemas educacionais inclusivos que garanta o acesso de todos os alunos e os apoios necessários para sua participação e aprendizagem, as políticas implementadas pelos sistemas de ensino não alcançaram esse objetivo (MEC/SEESP, 2007). No processo de construção de uma classe inclusiva, as relações entre professor e aluno surgem como elemento de fundamental importância, já que é no contexto das relações que o respeito e a atenção pedagógica flexível e individualizada vão se efetivar. Neste sentido, o paradigma da construção de sistemas educacionais inclusivos, em desenvolvimento, requer relações interpessoais que sejam eficientemente acolhedoras para todos no atendimento às necessidades educacionais de todos (SILVA e ARANHA, 2005). Para Del Prette e Del Prette (2007a), as relações de amizade estabelecidas com os colegas, o status social adquirido no grupo, as experiências de aceitação ou rejeição e ainda as preferências pessoais, são algumas das condições que podem modelar as características do desempenho social3 de cada um dos seus participantes. Tal desempenho pode se manifestar em comportamentos de cooperação, ajuda, seguimento de regras, controle de raiva ou agressividade e outros indicadores de competência social4. Neste mesmo sentido, é certo afirmar que a influência do grupo de companheiros, especialmente se estiver associada a outros fatores de risco, pode ser um meio para induzir comportamentos antisociais e outras 3 Desempenho Social - refere-se à emissão de um comportamento ou seqüência de comportamentos em uma situação social qualquer (DEL PRETTE e DEL PRETTE, 2007a, p.31; 2008). 4 Competência Social tem sentido avaliativo que remete aos efeitos do desempenho social nas situações vividas pelo indivíduo (DEL PRETTE e DEL PRETTE, 2007a, p.31; 2008). 1791 3 a 6 de novembro de 2009 - Londrina – Pr - ISSN 2175-960X condutas disruptivas – o que compromete o desenvolvimento de relações interpessoais satisfatórias e desejáveis. Consequentemente, as falhas na competência social podem produzir ruptura, oportunizando o aparecimento de comportamentos aversivos e trazendo resultados negativos para um ou ambos os envolvidos. Del Prette e Del Prette (2007a) apresentam um conjunto de diferentes classes de comportamentos sociais pertinentes ao repertório do indivíduo para lidar de maneira adequada com as demandas das situações interpessoais – são as Habilidades Sociais. Tais classes foram organizadas em 7 (sete) conjuntos5, tendo como base a análise de seu conteúdo e funcionalidade. São eles: (1) Automonitoria; (2) Habilidades Sociais de Comunicação; (3) Habilidades Sociais de Civilidade; (4) Habilidades Sociais Assertivas, Direito e Cidadania; (5)Habilidades Sociais Empáticas; (6) Habilidades Sociais de Trabalho; e (7) Habilidades Sociais de expressão de sentimento positivo. Em termos de efetividade, pode-se atribuir competência social aos desempenhos interpessoais que atendem aos critérios de: a) consecução dos objetivos da interação; b) melhora da auto-estima; c) manutenção e/ou melhora da qualidade da relação; d) maior equilíbrio de ganhos e perdas entre os parceiros da interação; e) respeito e ampliação dos direitos humanos básicos6. Todos estes critérios acima mencionados não necessitam ser atendidos em uma mesma situação. Entretanto, é correto admitir que quanto mais deles são atendidos simultaneamente, maior competência social pode ser atribuída ao indivíduo (DEL PRETTE e DEL PRETTE, 2007a). No entanto, a competência social raramente é relacionada como objetivo de formação profissional ou ocorre de forma assistemática - por vezes referido como currículo oculto. Neste aspecto importante da atividade humana, nenhum trabalho ocorre no isolamento social total, assim como há aqueles trabalhos em que a realização da tarefa se dá quase que totalmente na relação com o outro, mediadas por interações sociais - como a do professor. O trabalho em pequenos grupos (similar ao da sala de aula) mostra a necessidade de habilidades de supervisão e monitoramento de tarefas e interações relacionadas ao processo produtivo, como os de observar, ouvir, dar feedback, descrever, pedir mudança de comportamento, perguntar e responder perguntas, dentre outras (DEL PRETTE e DEL PRETTE, 2007a). As interações sociais que se dão não contexto educacional são denominadas Interações Sociais Educativas (HSE) e constituem uma classe de Habilidades Sociais de Trabalho, cuja principal finalidade é a de promover a aprendizagem e o desenvolvimento dos alunos, em situação formal ou informal. Estas interações dependem da competência interpessoal do professor (que as planeja e as conduz) como dos alunos que usufruem destas interações (DEL PRETTE e DEL PRETTE, 2007a; 2008). Tal sistema aplica-se a professores em contexto da educação escolar regular e às crianças com desenvolvimento típico ou especial. O mesmo é composto por 4 Classes e 32 Subclasses, destinado a orientar a investigação das interações educativas, tanto por meio de relato verbal quanto de observação direta não verbal (contato visual, expressão facial, gestualidade e postura corporal). Dentre estas HSE pode-se destacar: gratificar diferencialmente os comportamentos sociais dos alunos, pedir mudança de comportamento, fazer perguntas, medir a participação, discriminar a transmissão de valores 5 Ver Quadro ilustrativo em DEL PRETTE e DEL PRETTE, 2007a, p.60). Aqui pode-se entender por direitos interpessoais – correspondem à aplicação, na interação social, dos direitos humanos básicos, entendendo-se que eles são válidos para todos e que cada direito corresponde a um dever: o direito de expressar nossas opiniões corresponde ao dever de respeitar as opiniões dos demais [...] (DEL PRETTE e DEL PRETTE, 2007a, p.36). 6 1792 3 a 6 de novembro de 2009 - Londrina – Pr - ISSN 2175-960X implícitos no próprio comportamento, conduzir atividades específicas de identificação e expressão de emoções, apresentar modelo dos comportamentos sociais valorizados (demonstrar empatia, fazer a tender pedidos, expressar emoção, ouvir e outros). São pertinentes às HSE as habilidades não verbais como clareza, fluência, expressividade e uso apropriado dos gestos, da postura, do contato visual entre outros (DEL PRETTE e DEL PRETTE, 2007b). Pesquisas têm mostrado que as crenças, sentimentos, motivações e habilidades dos professores influenciam e são influenciadas por suas ações e interações educativas junto aos alunos, bem como pelos resultados em termos de rendimento acadêmico e desenvolvimento cognitivo e emocional desses alunos (DEL PRETTE e DEL PRETTE, 2005). Assim, considerando a relevância em promover o desenvolvimento socioemocional do aluno no contexto educacional, defende-se que um componente fundamental da competência profissional do professor no que se refere às suas habilidades sociais educativas (HSE), que o possibilite implementar condições interativas de ensino. No campo da Educação Especial, a literatura revela a preocupação por parte das políticas públicas em superar as práticas discriminatórias para com os alunos e a atuação das escolas em assumir o espaço central no debate sobre o seu papel na superação da exclusão. Entretanto, mesmo com uma perspectiva conceitual no sentido de criar sistemas educacionais inclusivos que garantam o acesso de todos os alunos e os apoios necessários para sua participação e aprendizagem, tais políticas ainda não alcançaram esses objetivos. Atualmente, no Brasil e no mundo, é cada vez maior o número de pesquisadores e educadores interessados na discussão a favor da educação inclusiva – pertinente à Educação Especial. Mais precisamente, na última década tem acumulado um significativo acervo de pesquisas no Brasil, que oferecem dados importantes sobre o processo de inclusão e as dificuldades enfrentadas pelo sistema educacional brasileiro para sua implementação (GLAT e FERNANDES, 2005). No mesmo sentido, a atuação do professor em sala de aula tem sido alvo de investigação permanente por parte dos pesquisadores da área educacional - enquanto mediador da relação dos alunos com o objeto de conhecimento (DEL PRETTE e DEL PRETTE et. al, 1998). Tais estudos, como os de Silva e Aranha (2005); Vila (2005); Manolio (2008); Farias (et.al., 2008); e Silva (2008) têm mostrado a necessidade de caracterizar a interação professor-aluno a partir de categorias relacionais e de analisar a funcionalidade desse desempenho. A noção de habilidades sociais educativas se insere também nessa linha de raciocínio (DEL PRETTE e DEL PRETTE, 2009). Viecili e Medeiros (2002) apontam que muitas vezes os educadores assumem uma postura mais reprodutivista na medida em que buscam cumprir a qualquer custo os planos de ensino, deixando de considerar as necessidades dos alunos e do meio no qual estão inseridos. A coerção é destacada pelos autores, como sendo um instrumento comum na sociedade e no ambiente escolar utilizado para persuadir o comportamento dos outros, trazendo ansiedade e medo. Esta realidade pôde ser constatada através de um estudo realizado (VIECILI e MEDEIROS, 2002) com dez crianças, com idade entre 8 e 12 anos, freqüentadoras do ensino fundamental de uma escola pública, juntamente com três professores. As crianças foram organizadas em dois grupos de cinco: (5) alunos com história de fracasso escolar (CFE) e (5) alunos sem história de fracasso escolar (SFE). Os dados desta pesquisa revelaram os professores utilizam coerção e estimulação positiva diferentemente com ambos os grupos, punindo mais os comportamentos dos alunos CFE e reforçando positivamente mais os comportamentos dos alunos SFE. Hildebrand (2000) em seu estudo encontrou que a interação 1793 3 a 6 de novembro de 2009 - Londrina – Pr - ISSN 2175-960X professor-aluno com dificuldade de aprendizagem não diferia quantitativamente da interação com crianças sem dificuldades, porém, havia diferença qualitativa. A autora percebeu que o professor, embora interagisse a mesma quantidade de vezes com os dois grupos, emitia poucos comportamentos sociais favoráveis à aprendizagem das crianças que apresentavam dificuldades acadêmicas. Martini (2003) caracterizou as ações interativas dos professores com alunos com alto e baixo desempenho acadêmico. Entre as professoras participantes duas foram consideradas como facilitadoras da aprendizagem e duas como dificultadoras e tal classificação foi realizada em etapa anterior da pesquisa. A autora ressalta que, em relação às professoras facilitadoras, observou-se que essas interagem com mais freqüência com alunos de baixo desempenho escolar e que professoras dificultadoras interagem com maior freqüência com alunos de alto desempenho. Estes estudos reforçam a tese de que em geral os professores ainda não se sentem preparados para receber alunos que apresentem necessidades educacionais especiais (NEE) em sua sala de aula. Muitas vezes os professores exibem idéias preconcebidas ou concepções equivocadas com relação aos seus alunos com NEE, atribuindo-lhes imagens depreciativas que se refletem em sua própria postura frente às atitudes que assume em relação a estas crianças (SILVA e PEREIRA, 2003). Ou ainda por defrontarem-se diariamente com a possibilidade de não obterem respostas diante de uma intervenção pedagógica com tal aluno (FARIAS et al, 2008). Neste caso, Murray (2007) concorda que de fato, o professor tende a deixar determinados alunos mais distantes de si, dirige menos o olhar a eles, faz perguntas de baixo nível, os chama menos frequentemente, oferece poucas sugestões quando solicitado pelo aluno e os elogia menos. Desta maneira, os alunos tendem a produzir em níveis inferiores em relação aos alunos que são tratados de forma diferenciada. Ou seja, daqueles que interagem mais frequentemente e por esta razão, recebem mais atenção do professor. Adalsteinsdóttir (2004) defende que quando um professor tem a habilidade de compreender as reações de um aluno, ele está demonstrando uma consciência sensível às necessidades de um aluno; está (é) receptivo e compreende como o aluno percebe a aprendizagem. Conseqüentemente, a aprendizagem é facilitada quando os alunos são compreendidos - especialmente quando julgados ou avaliados. Assim, conclui-se que as interações educativas entre os alunos em sala de aula requerem disciplina da classe e ainda um conjunto de habilidades interpessoais do professor para conceber, planejar, participar e coordenar as interações educativas com e entre os alunos (DEL PRETTE e DEL PRETTE et. al, 1998). Neste sentido, Silva e Aranha (2005) defendem a construção de sistemas educacionais inclusivos que promovam o desenvolvimento das relações interpessoais que atendam também as necessidades dos alunos com NEE. Para tanto, duas dimensões fundamentais da competência educativa de professores e educadores em geral são destacadas: ter conhecimentos relacionados aos conteúdos programáticos - que inclui domínio de matérias específicas; e ter habilidades para estabelecer interações sociais com e entre os educandos (DEL PRETTE e DEL PRETTE, 2009). Conclusões (prévias) Neste aspecto, considerando que no processo de construção de uma classe inclusiva, as relações entre professor e aluno surgem como elemento de fundamental importância, sabendo que é no contexto das relações que o respeito e a atenção pedagógica flexível e individualizada vão se efetivar (SILVA e ARANHA, 2005); que em geral os professores 1794 3 a 6 de novembro de 2009 - Londrina – Pr - ISSN 2175-960X ainda não se sentem seguros quanto às suas práticas educativas para lidar com alunos que apresentem (NEE) em sua sala de aula; que ainda são poucas as pesquisas e práticas educacionais validadas cientificamente que mostrem como as interações ocorrem entre professor e alunos que apresentem diferentes tipos de necessidades educacionais especiais; e que estudos detalhados sobre as interações professor-aluno com ênfase na identificação e caracterização das HSE do professor podem contribuir para o processo de inclusão de alunos com NEE, entende-se relevante aplicar o tema das relações entre HSE de professores e as interações entre os alunos que apresentem diferentes tipos de NEE em uma sala de aula regular. 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